Capa da publicação Bolsonaro, um mito em mutação
Capa: Ton Molina/STF

Bolsonaro, um mito em mutação

19/07/2025 às 18:54

Resumo:


  • Jair Bolsonaro criou um mito sobre sua atuação no Exército que nunca foi confirmado por oficiais.

  • O sucesso político de Bolsonaro se deve mais às vicissitudes do Brasil do que às suas próprias virtudes.

  • A vitória eleitoral de Bolsonaro contou com ajuda decisiva de Sérgio Moro e do general Villas Boas.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Quando foi chutado do Exército e entrou na política, Jair Bolsonaro criou para si um mito: o de que ajudou as Forças Armadas a combater o bando guerrilheiro de Lamarca no Vale do Ribeira. Essa história muito improvável nunca foi confirmada por nenhum oficial que tenha comandado as tropas em Eldorado. Ademais, a valentia que o ex-presidente sempre ostentou é negada pelos motivos alegados e comprovados no processo que acarretou sua exoneração do Exército. Bolsonaro foi considerado um mau militar: ganancioso, insubordinado, muambeiro, preguiçoso e covarde.

O sucesso dele na política parece um mistério. Todavia, esse mistério que pode ser explicado menos pelas virtudes do seu Jair do que pelas vicissitudes do Brasil. O sistema político e administrativo do nosso país sempre premiou a incompetência desde que o incompetente seja capaz de fazer escandalosas demonstrações públicas e privadas de submissão aos interesses poderosos que gravitam em torno dos municípios, dos estados e da União. É o dinheiro idiota.

Os grandes sanguessugas que dependem das concorrências viciadas e que obtém lucro com contratos públicos superfaturados precisam de amigos fiéis. Então eles alimentam os pequenos sanguessugas. Jair Bolsonaro era um pequeno sanguessuga na Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro. Ele foi crescendo, crescendo, crescendo até chegar à presidência da república. Esse é o caminho que está sendo trilhado pelos filhos dele, com sucesso é preciso ser dito.

Durante a campanha presidencial que venceu, a mitologia bolsonarista ganhou grande impulso. Ele foi alçado à condição de “salvador da pátria”, uma espécie de Dom Sebastião evangélico um messias com discurso messiânico, Bolsonaro prometeu fuzilar a petralhada. Assumiu um compromisso com a derrota do comunismo (o que quer que isso significasse no imaginário dos eleitores dele). E sobretudo ele se apresentou como um herói viril do heterossexualismo de direita contra o gayzismo da esquerda.

A vitória eleitoral dele, entretanto, foi produzida muito antes e por razões diversas. Ela foi o resultado de uma década do antipetismo diariamente vomitado pela grande imprensa e do vácuo político criado pelo golpe de estado disfarçado de impeachment contra Dilma Rousseff.

É evidente, ademais, que Jair Bolsonaro venceu o PT com ajuda decisiva de Sérgio Moro e do general Villas Boas. Apesar de ser suspeito e não ter competência territorial para julgar o caso do triplex, o primeiro ignorou regras processuais básicas para dirigir o processo, condenar Lula e decretar a prisão do único candidato capaz de ameaçar a vitória eleitoral do seu Jair. O segundo ameaçou o presidente do STF impedindo aquele Tribunal de conceder HC a Lula fazendo valer a regra de que a sentença condenatória só produz efeitos depois que for transitada em julgado.

Iludido pela vitória fácil que foi em grande medida manufaturada por terceiros, o líder da extrema direita brasileira se tornou uma mitologia ambulante. Entretanto, forças econômicas poderosas o impediram de romper com a China, de fazer o Brasil sair do BRICS ou de colocar nosso país naquela maldita organização militar antieslava que ameaça agora provocar uma guerra contra a Rússia que explodirá a Europa inteira (refiro-me à OTAN).

Espremido entre aprofundar sua própria agenda de extrema direita, não dar prejuízo aos produtores rurais que exportam alimentos para a China e salvar sua imagem diante dos fanáticos seguidores, seu Jair oscilou três anos entre salvar o circo democrático e tocar fogo na democracia brasileira. Quando percebeu que perderia a eleição para Lula, ele partiu para o ataque. O resto está bem documentado nos autos da Ação Penal n. 2.668 – Brasília/DF e nas alegações finais que foram apresentadas pelo PGR há alguns dias.

Agora seu Jair tenta desesperadamente se salvar da condenação, da prisão e do melancólico final numa cela de presídio. Os grandes sanguessugas da União já estão se afastando dele. Impossibilitado de trocar nada e nenhum futuro por algo (sua anistia), o mito e seus filhos passaram a depositar todas suas esperanças em Donald Trump. Ao causar prejuízos aos brasileiros que exportam produtos para os EUA seu Jair piorou sua própria situação?

O presidente dos EUA usa a família Bolsonaro para seus próprios interesses. Mas em algum momento ele também irá jogá-los no esgoto. A crença de Eduardo Bolsonaro de que a Casa Branca pode realmente intervir no Brasil (colocar um porta-aviões no Lago Paranoá, como ele tem dito) é risível. A pressão em favor do seu Jair está sendo rapidamente dissolvida, porque os empresários norte-americanos que beneficiam, embalam e comercializam produtos brasileiros nos EUA reagiram com vigor. Isso para não mencionar os prejuízos que as Big Techs terão no Brasil em decorrência da reciprocidade adotada pelo nosso país.

Quando era presidente Bolsonaro encantava os tolos repetindo exaustivamente “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”. O medo da prisão o faz agir como se estivesse a dizer “O Brasil abaixo dos EUA, minha liberdade acima de Deus e de todos”. Essa mutação do mito fará bem menos sucessos do que a anterior. A política adora os narcisistas, mas as pessoas de negócios gostam muito mais dos seus próprios lucros. Quando um narcisista começa a dar prejuízo ele geralmente é abandonado à própria sorte.

Narciso terminou aprisionado. Jair Bolsonaro cumprirá o mesmo desígnio mitológico. Mas o final dele não será trágico, apenas obscuro. Ele será esquecido por Donald Trump e por todos que ainda tentam salvá-lo. Na prisão, seu Jair será visitado apenas pelos filhos, exceto Eduardo (que está nos EUA e morre de medo de ser enjaulado no Brasil).

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As lições que o “caso Bolsonaro” dão ao Brasil são muitas. A principal delas é a de que um país soberano não pode abrir mão de processar, julgar e eventualmente condenar e prender aqueles que colocam em risco o sistema democrático. Certamente alguns livros serão escritos sobre esse assunto. Mas o Brasil continuará sendo Brasil e aprenderá pouco ou nada.

O sistema político e administrativo brasileiro segue intocado. Os municípios, estados e a União continuarão firmemente nas garras dos grandes sanguessugas endinheirados. E eles já estão alimentando pequenos sanguessugas ambiciosos com as mesmas inclinações patológicas e disposições imorais que o seu Jair. O espaço deixado por ele será rapidamente preenchido. Esse é o verdadeiro problema sobre o qual nós deveríamos nos debruçar nesse momento. Jair Bolsonaro é passado, mas a realidade que o criou, alimentou e engordou continuará interrompendo o futuro do nosso país. O que pode ser feito?


Eu já tinha terminado de escrever esse texto quando Donald Trump e Marco Rubio redobraram a aposta em defesa de Bolsonaro. O presidente norte-americano e seu pequeno capanga proibiram os ministros do Supremo Tribunal Federal de viajar aos EUA porque eles considerarem ilegais e inaceitáveis as ameaças de Jair Bolsonaro à autonomia da Corte, ordenando que a Polícia Federal colocasse um bracelete eletrônico na canela dele.

O ultraje imposto ao Brasil é evidente e extremamente grave, uma clara violação do princípio internacional de respeito à soberania do Brasil para resolver casos criminais dentro do seu território na forma da legislação nacional. O presidente dos EUA não tem poder para perdoar Jair Bolsonaro, tampouco pode punir os membros da Corte encarregada de avaliar e decidir o processo criminal com base nas evidências que foram coletadas.

Trump e Rubio pisaram agora na linha vermelha e isso deve resultar em medidas duras contra os EUA na ONU. A decisão de ambos equivale a uma declaração de guerra e pode ser levada ao conhecimento do Conselho de Segurança da ONU. É intolerável a permanência de militares norte-americanos no Brasil num contexto de clara agressão da Casa Branca contra autoridades brasileiras. Lula pode e deve imediatamente rescindir o acordo que permite aos EUA utilizar a Base de Alcântara dando prazo para os militares norte-americanos deixar o território nacional.

Jair Bolsonaro ganhou uma tornozeleira eletrônica. Isso provocou a raiva e a reação irracional dos líderes do White Ass Apes Empire, pois eles estão completamente enlouquecidos e acreditam que podem governar tudo e todos, em qualquer lugar, o tempo todo.

Se ousarem vir ao Brasil após ameaçarem o Supremo Tribunal Federal e coagirem seus ministros a não decidir o caso de Jair Bolsonaro de forma independente, de acordo com a lei brasileira, levando em consideração as provas do caso, Donald Trump e Marco Rubio podem ser enjaulados. Mas seria mais adequado colocar braceletes tradicionais norte-americanos em ambos.

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Sobre o autor
Fábio de Oliveira Ribeiro

Advogado em Osasco (SP)

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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