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Substituição tributária progressiva.

Jurisprudência e teoria

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06/11/2008 às 00:00
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3.ANÁLISE LÓGICO-EPISTEMOLÓGICA

3.1.SOBRE A PRESUNÇÃO

Em Direito, é comum utilizar a figura da presunção, conquanto até o advento da Substituição Tributária Progressiva, jamais, ao que se saiba, com o mesmo significado.

Assim, temos a presunção juris tantum quando, impossibilitados de vermos com os nossos próprios olhos, nos permitimos imaginar uma dada situação de fato com base em indícios razoáveis. Trata-se aqui do conceito de presunção mais próprio, porque submisso à produção de prova material em contrário, caracterizando-se pelo caráter precário e provisório.

Quando, no entanto, inferimos, que determinada situação de fato realmente aconteceu, e/ou como aconteceu, ainda que não presente a prova material, mas aqui então plenamente dispensável, pela análise de indícios veementes e que, juntos, conduzem a um só resultado, a esta forma de presunção chamamo-la de juris et juris .

Observe-se como, até então os conceitos jurídicos tradicionais de presunção se caracterizam pelo exercício da dedução de uma situação de fato que não se pode enxergar, mas que, de fato, já ocorreu, no tempo e no espaço, e que pode também, se houver indícios suficientes, ser mensurada em seus aspectos qualitativo e quantitativo.

Com relação à substituição tributária "para frente", contudo, opera-se situação diversa, pois se deduz sobre fato que ainda não aconteceu. Conquanto o senso comum, ou mesmo lógico, permita-nos apostar, com provável chance de acerto, que o fato futuro realmente acontecerá, não nos permite, todavia, dizer ao certo quando, e muito menos nos permite mensurar os seus efeitos.

Ademais, por força da definitividade conferida pela jurisprudência firmada com base no julgamento da ADIn 1851-4/AL, teremos aqui um caso bizarro de uma "presunção relativa absoluta", que já não será nem mais uma presunção, porque lhe faltem os atributos de provisoriedade e precariedade, mas também não será sequer a prova de um fato, porque decretado que suas feições serão outras.

3.2.SOBRE A DEFINIÇÃO DO SUJEITO PASSIVO

Durante o decorrer das pesquisas que serviram de embasamento ao desenvolvimento do tema, percebeu-se a dificuldade da definição da figura do sujeito passivo. Em uma corrente, antes minoritária, mas até que, ao final, vencedora, por força da jurisprudência advinda da julgada ADIn 1.851-4/AL, atribuía-se ao substituto, somente, com completo desprezo em relação à figura do substituído, a relação Fisco-contribuinte, colocando, portanto, o substituto na condição de contribuinte, segundo o conceito previsto no CTN, no art. 121, I.

Neste sentido, assim expõe o Senhor Ministro Ilmar Galvão, em seu voto de relator na ADIn supracitada: "Se a base de cálculo é previamente definida em lei, não resta nenhum interesse jurídico em apurar se correspondeu a ela à realidade." [18]

Quanto à corrente oposta (e vencida), esta vislumbra, ao contrário, que contribuinte é o substituído, porquanto guardando relação pessoal e direta com o fato gerador que há de acontecer, por obra de sua própria vontade.

Considerando o problema apenas pelo lado teórico, já que, em concreto, resta irrecorrível, para a elucidação do caso é necessário definir de qual fato gerador se fala.

3.3.SOBRE O CONCEITO DE FATO GERADOR

Segundo o entendimento do Senhor Ministro Ilmar Galvão:

Aliás, a LC nº 87/96 não apenas definiu o modo de apuração da base de cálculo na substituição tributária progressiva, mas também o aspecto temporal do fato gerador presumido, consubstanciado, obviamente, na saída da mercadoria do estabelecimento do contribuinte substituto, não havendo cogitar, pois, de outro momento, no futuro, para configuração do elemento. A providência não é de causar espécie, porquanto, na conformidade com o disposto no art. 114 do CTN, fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência. [19]

Do acima transcrito, forçoso é reconhecer que o substituto reveste-se da condição de contribuinte de jure original, por força de fato gerador que não é mais o que acontecerá no futuro, mas o seu próprio, aqui denominado de "fato gerador presumido", ingressando desta forma como figura autônoma no mundo jurídico.

Com o máximo respeito, a divergência merece atenção, por advir de razões oriundas de um exame lógico do mandamento contido no § 7º do art. 150 da CF/88, que, para conforto, o transcrevemos: "A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido".

Decerto, tomou o ministro a expressão "fato gerador presumido" ao pé da letra, como a inauguração de um novo conceito no Direito Tributário. No entanto, o exame do artigo demonstra que, por infelicidade na redação do texto constitucional, na verdade o constituinte derivado quis dizer: "o fato gerador que se presume". Isto, pelas seguintes razões:

a)Porque a mesma frase já se refere ao fato gerador "que deva ocorrer posteriormente", denotando que o redator quis evitar a abundância que empobreceria o texto, emprestando-lhe fealdade;

b)Porque o mandamento constitucional já enquadra expressamente o substituto na condição de "responsável". Ora, ninguém é contribuinte e responsável ao mesmo tempo;

c)Porque, ao assegurar "a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido", a Carta Magna está a ordenar a restituição ao substituído, e não ao substituto, vez que ele já se ressarciu, por conta da repercussão que se opera por sobre a operação mercantil. Ora, se "fato gerador presumido" é uma espécie autônoma de fato gerador, então ele sempre se realiza, desde que o substituto entregue a mercadoria ao substituído. Logicamente, se a CF fala em fato gerador presumido que não se realize, está a se referir ao fato gerador do substituído, que, apesar de presumido, não se realizou. Donde se demonstra que inexiste a figura de "fato gerador presumido" como figura autônoma.

3.4.SOBRE SER PAGAMENTO OU RECOLHIMENTO

Do exame do item acima, forçoso é reconhecer que o substituto recolhe o imposto (ainda que por ocasião de uma venda a prazo), dado que se reveste na condição de responsável tributário, logicamente, por imposto, cujo fato gerador (a ser) provocado por outrem, entende-se, possivelmente acontecerá no futuro.Da lição do Dr. José Julberto Meira Junior:

[...]ao definir genericamente o contribuinte como aquele que paga (grifo mesmo) o tributo e atribuir a responsabilidade a terceiros para fazê-lo em nome do primeiro, não consideraram, nos idos de 1996, que a mera troca poderia, mais tarde, gerar a possibilidade, também, de antecipação. [20]

Adiante, o professor define, com base em critérios econômicos, mas subsumidos à aplicação do direito, como fonte subsidiária a servir para a atualização do anacronismo encontrado no conceito tradicional de contribuinte e substituto, que o substituto, na condição de responsável, "recolhe" o tributo, e que o substituído, na condição de contribuinte original, "paga" o tributo.

Se fosse o substituto o contribuinte do imposto, não deveria se preocupar a Constituição em estabelecer a restituição ao substituto, em hipótese alguma, mesmo a de o fato gerador futuro não se realizar, até porque não existiria mais o fato gerador futuro, e sim, somente o presente, cunhado como "fato gerador presumido".

Ademais, na escrituração do substituto, não haveria de acontecer dois destaques de imposto, um para si e outro para o substituído, mas um só, resultante de uma alíquota única, assim como ocorre com a CIDE.

3.5.SOBRE A CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO

Como se percebe, em função do encadeamento lógico ministrado nos itens anteriores, o substituído permanece na condição de contribuinte de jure, original. Jamais tratou a Constituição Federal, por conta de seu § 7º do art. 150, de desconsiderar a existência do fato gerador que "deva ocorrer posteriormente" e olvidar a figura de quem lhe dará causa.

Conseqüentemente, perde-se o sentido de definitividade consubstanciado em interpretação, ao que parece, equivocada, sobre a previsão de base de cálculo para entrega aos cofres públicos, feita com base em estimativa, ainda que prevista por lei.

Em comparação idêntica, não há de se falar que o empregador é contribuinte do IRPF de seus empregados. Ele é somente um responsável. Da mesma forma como no instituto da substituição tributária passiva, também há, no IRPF, a previsão legal de uma base de cálculo para recolhimento, que não será por esta razão definitiva, mas sempre provisória, haja vista que o verdadeiro contribuinte, qual seja, o empregado, haverá de fazer a declaração de ajuste em momento legalmente oportuno, sobrando-lhe um de três resultados possíveis: a coincidência com saldo zero, o imposto a pagar, e o imposto a restituir.

Uma vez que a alegação de definitividade do tributo é a coluna mestra do argumento apresentado pelos que reprovam o dever de restituição por diferença de apuração entre a base de cálculo presumida e a efetiva, e como aqui se demonstra, pelo encadeamento do raciocínio lógico, que se apresenta como falaciosa, forçoso concluir pela necessidade de haver um ajuste a posteriori.

Adicionalmente, contrariando certa facção desta mesma linha de entendimento, por parte de advogados de contribuintes, que defende haver somente o caso de restituição do tributo, sem a contrapartida da hipótese de haver saldo imposto a pagar, sustento que o ajuste deve resultar tal como acontece com o IRPF, ou seja, deve prever a existência de saldo zero, imposto a restituir, ou, ainda que infelizmente, imposto a restituir.


4.EXAME DA ADIN 1.851-04/AL

4.1.DA EMENTA E DO RELATÓRIO

A Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1851-04/AL teve como requerente a Confederação Nacional do Comércio, tendo como requeridos o Sr. Ministro de Estado da Fazenda e os Srs. Secretários de Fazenda, Finanças ou Tributação dos seguintes Estados: AL, AC, AP, AM, BA, CE, ES, GO, MA, MT, MS, MG, PA, PB, PI, RJ, RN, RS, RO, RR, SE, TO e DF.

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A referida ação teve por objeto a cláusula segunda do Convênio ICMS 13/97 e os §§ 6º e 7º do art. 498 do Decreto nº 35.245/91, redação dada pelo artigo 1º do Decreto nº 37.406/98, do Estado de Alagoas.

O Convênio ICMS 13/97, em sua cláusula segunda, vedava a restituição por diferença a maior entre a cobrança presumida e antecipada do ICMS em regime de substituição tributária progressiva e a efetivamente verificada em processo de apuração mensal.

Por sua vez, a legislação alagoana previa a celebração de interessante convênio com as empresas optantes pelo regime que instituía, de modo a cobrar o ICMS em uma única operação monofásica, nos moldes da substituição tributária progressiva, com as vantagens de alíquotas diferenciadas (reduzidas) e exigindo, em contrapartida, que as convenentes se abstivessem de futuramente exigir diferenças a título de restituição, seja no âmbito administrativo, seja no judiciário.

As requerentes alegavam, em ambos os casos, a negação ao pedido de restituição, e no segundo caso, também o cerceamento do direito de petição e o direito de acesso ao Judiciário.

Adicionalmente, que a utilização do regime de substituição tributária haveria de ser neutra relativamente ao arquétipo do imposto, de forma a evitar que resulte tributação maior que a devida, em prejuízo dos consumidores e dos substituídos, que assim se acharão em pé de desfavorável desigualdade em relação aos concorrentes sujeitos ao regime de tributação tradicional.

Na assentada de 13.09.98, o Plenário, por unanimidade, deferiu, em parte, o requerimento da medida cautelar, para o fim de suspender a eficácia da cláusula segunda do Convênio ICMS nº 13/97.

Após as informações prestadas pelas requeridas, que assim expuseram as suas razões, manifestaram-se a Advocacia-Geral da União e a Procuradoria-Geral da República, no sentido de considerar a ação improcedente.

Por fim, o Tribunal, por unanimidade, conheceu da ação e por maioria (vencidos os Senhores Ministros Carlos Veloso, Celso de Mello e o Presidente, o Senhor Ministro Marco Aurélio), julgou improcedente o pedido formulado na inicial e declarou a constitucionalidade da Cláusula Segunda do Convênio ICMS nº 13, de 21 de março de 1997.

4.2.DOS VOTOS

4.2.1Do Sr. Ministro Ilmar Galvão

Apenas com a finalidade de extrair interessante trecho da parte que não nos interessa no estudo presente, qual seja, a relativa ao cerceamento do direito de petição e de busca do Judiciário, o relator da ação, com relação ao convênio instituído pelo Estado das Alagoas, declara o seu reconhecimento ao dever de restituir saldo de imposto a maior, decorrente de diferença entre as bases de cálculo presumida e efetiva, "... , problema cuja solução teve por presente na redução da carga tributária".

Quanto à argüição de inconstitucionalidade da cláusula segunda do Convênio ICMS nº 13/97, o ilustre magistrado conclui pela improcedência, ou seja, a favor do entendimento segundo o qual a base de cálculo estipulada pelo regime de substituição tributária reveste-se de caráter permanente, afastando, por conseqüência, a tese de serem necessários ajustes periódicos por parte do substituído, que o relator julga como improcedentes. De forma resumida, os argumentos do ilustre magistrado:

a)Que todas as objeções ao instituto (caráter de empréstimo provisório, ofensa à capacidade contributiva, ofensa à legalidade estrita, ausência de vínculo entre o substituto e o fato gerador, ofensa ao princípio da não cumulatividade) foram afastadas pelo Plenário do STF no julgamento do RE 213.396, que em síntese, declara não haver falta de previsão legal, em face da vigência do DL 406/68, e que, por isto mesmo não há que se falar em exigência tributária despida de fato gerador;

b)Que o "fato gerador presumido" foi instituído pela própria Constituição, enquadrando-se, portanto, no conceito definido pelo art. 114 do CTN;

c)Que, recorrendo a Marco Aurélio Greco [21], a exigência de a obrigação depender da ocorrência do fato gerador desconsidera o fato de as normas jurídicas serem produto da vontade do legislador, desde que esta não contrarie a Constituição;

d)Que, em vista do supracitado, a substituição tributária resultou de uma opção legislativa, não arbitrária, em que a previsão do fato gerador e o seu dimensionamento econômico são aferíveis com razoável grau de acerto: "Ao fazê-lo, cuidou o legislador de prefixar uma base de cálculo cuja estimativa se aproxime o mais possível da realidade, ajustando o respectivo valor às leis do mercado, para não onerar o contribuinte e tampouco prejudicar o Fisco."; [22]

e)Que o fato gerador do ICMS e a respectiva base de cálculo, pelas razões já expostas aqui, revestem-se de definitividade;

f)Que, em face da letra supra, não há que se falar em restituição de imposto, exceto no caso de o fato gerador futuro não se realizar;

g)Que, admitir o contrário, acarretaria a inviabilização do próprio instituto da substituição tributária progressiva, visto que implicaria, no que concerne ao ICMS, o retorno ao regime de apuração mensal do tributo e, conseqüentemente, o abandono de um instrumento de caráter eminentemente prático, porque capaz de viabilizar a tributação de setores de difícil fiscalização e arrecadação;

h)Que, em suma, propicia o regime de substituição tributária progressiva maior comodidade, economia, eficiência e celeridade na atividade estatal ligada à imposição tributária;

i) Que não seria admissível que o legislador, diante de tais efeitos práticos, decisivos para a adoção do regime, viesse a inviabilizar a utilização do valioso instituto com a adoção da compensação mensal de eventuais excessos ou faltas, prática que teve por escopo obviar.

4.2.2.Da Sra. Ministra Ellen Gracie

A Senhora Ministra, em pronunciamento breve, informou não ter acompanhado a deliberação da medida cautelar, mas que, entretanto, ouviu com atenção ao relatório e colocou seu voto em acompanhamento integral ao do Sr. Ministro-Relator, lembrando que a restituição deve apenas acontecer na hipótese de não-realização do fato gerador presumido.

4.2.3.Do Sr. Ministro Maurício Corrêa

O Sr. Ministro Maurício Corrêa lembrou que a questão já havia passado pelo STF, por ocasião do Recurso Extraordinário nº 266.523, e também do precedente havido no Recurso Extraordinário 203.996, para, sustentando o mesmo ponto de vista, afirmar não ter havido ofensa aos princípios da capacidade contributiva e tampouco ao da não-cumulatividade, desta forma acompanhando integralmente o voto do Sr. Ministro-Relator.

4.2.4.Do Sr. Ministro Carlos Veloso (vencido)

Manifestando-se contrariamente aos votos já proferidos, e assim mantendo seu entendimento com relação à cautelar, o eminente Ministro apresentou os seguintes argumentos:

a)Que a base de cálculo do fato gerador é a sua dimensão material e sua expressão valorativa, segundo os ensinamentos de Geraldo Ataliba;

b)Que constitui o fato gerador do ICMS as operações relativas à circulação de mercadorias ou prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (CF, art. 155, II);

c)Que a garantia prevista no § 7º do art. 150 da CF se inscreve no "Estatuto dos Contribuintes", segundo constantes proclamações neste sentido pelo Senhor Ministro Celso de Mello, ao se referir às limitações constitucionais do poder de tributar.

d)Que, lembrando os estudiosos de hermenêutica constitucional, os direitos e garantias inscritos na Constituição devem ser interpretados de modo a emprestar-se a esses direitos e garantias a máxima eficácia, e adicionalmente, que a máxima eficácia é recomendada para todas as normas constitucionais, principalmente para as materialmente constitucionais, o que era o caso em questão;

e)Que, se o fato gerador tem na base de cálculo a sua expressão valorativa, força é convir que o fato gerador se realiza nos termos dessa sua dimensão material, "...nem mais, nem menos.";

f)Que, caso se segue o direito à restituição do excesso de ICMS recolhido, o Fisco poderá fixar, na pauta de valores, valores superiores aos de mercado, que resultarão em enriquecimento ilícito, que a teoria geral do direito repele e o senso comum dos homens não admite.

4.2.5.Do Sr. Ministro Sepúlveda Pertence

O respeitado Ministro posicionou-se pela improcedência da ação, modificando seu entendimento firmado na cautelar, convencido que foi pela "leitura do magnífico memorial apresentado pelos Estados", especialmente o das Alagoas.

Em resposta à exposição do Sr. Ministro Carlos Veloso, apresentou o Sr. Ministro a ressalva ínsita à máxima eficácia dos dispositivos constitucionais, qual seja, a de que a regra hermenêutica é "de mão dupla".

Assim, sustentou que se a garantia constante do §7º do art. 150 da CF viesse a ser interpretada de modo a inviabilizar o instrumento fiscal que se autorizou, o que se estaria negando seria a própria efetividade no sentido principal.

4.2.6.Do Sr. Ministro Sydney Sanches

O Ministro acompanhou o voto do relator, enfatizando, em breve exposição, que a norma infraconstitucional já existia e jamais fora declarada inconstitucional, e que, adicionalmente, a emenda constitucional veio à luz com a finalidade de assegurar a restituição da quantia paga caso não se realize o fato gerador presumido.

Ainda, que a solução encontrada pelo constituinte derivado foi em busca da praticidade que a substituição viabiliza, o que não ocorreria, esvaziando o próprio instituto da substituição tributária, caso fosse diverso o entendimento, no sentido de se prover a restituição em caso de pagamento a maior, por força da utilização da base de cálculo presumida. Enfim, reforçando o pronunciamento do Sr. Ministro Sepúlveda Pertence, que não se deve interpretar norma constitucional que a esvazie ou a torne inócua.

4.2.7.Do Sr. Ministro Moreira Alves

O douto Ministro, também em breve explanação, reforçou seu posicionamento em face da praticidade do regime da substituição tributária, com ênfase sobre a vantagem do combate à sonegação, e mais uma vez lembrando da inocuidade da norma, caso prevalecesse o entendimento a favor da restituição em face de pagamentos a maior. Ademais, questionou o Constituinte Derivado, por não ter contemplado em seu texto a previsão para este caso de restituição.

4.2.8.Do Sr. Ministro-Presidente Marco Aurélio (vencido)

O ilustre Ministro, em exposição eloqüente, prolongada e seguida por acalorada discussão entre eles e seus pares, manifestou-se contrariamente ao voto do relator, cujos destaques são:

a)Manifestou desconfiança de que os Estados praticariam pautas de valores super-estimadas: "Isso ocorre porque há parâmetros ditados unilateralmente. Porque dificilmente teremos uma hipótese em que o valor presumido ficará aquém daquele resultante do fato gerador."; [23]

b)Também alerta o Sr. Ministro-Presidente sobre o avanço do desequilíbrio na relação Fisco-contribuinte, em face da jurisprudência que vem se formando: "Assusta-me, sobremaneira, o risco de olvidarem-se os parâmetros constitucionais de um tributo. Assusta-me até mesmo a jurisprudência que vem se formando no tocante à relação tributária, nesta Corte, dia após dia, desequilibrando-se o embate que a Carta da República visa a equilibrar."; [24]

c)Enfatizou que a garantia prevista no § 7º do art. 150 da CF não se assenta no dever de restituição, que haveria de qualquer modo acontecer, mesmo no caso da ausência desta parte no texto da EC 03/93, tendo-se em vista a interpretação ampla da Constituição, mas sim, no dever do Estado de provê-la, de forma "imediata e preferencial.";

d)Assevera o polêmico Presidente, que a situação é muito diferente daquela do Imposto de Renda, em que se pode partir para o lucro presumido, devido à existência da opção, pelo contribuinte, que assim escolhe a mais vantajosa, diferente, portanto, da imposição estatal verificada na instituição do regime de substituição tributária progressiva, que leva, inexoravelmente, ao enriquecimento sem causa.

4.3.COMENTÁRIOS AOS VOTOS

Preliminarmente, observa-se que houve uma prevalência do debate sobre o aspecto material da norma consagrada pela Emenda Constitucional nº 03/93: de um lado, a favor do Estado, ficaram aqueles que sustentaram a inviabilidade do regime de substituição tributária progressiva, caso viesse a ser considerada inconstitucional a cláusula estipulada pelo Convênio 13/97 que proibia a restituição de diferenças entre as bases de cálculo presumida e efetiva; de outro, ao lado dos contribuintes, destacando-se a veemente defesa do Sr. Presidente Marco Aurélio, a apontar a tendência de os Fiscos utilizarem-se de sua situação de supremacia para majorarem indiretamente os tributos, por meio de estipulação de pautas de valores superestimadas.

Com relação ao aspecto da análise jurídico-constitucional, ao meu ver, tratada com menor ênfase, concentrou-se, de um lado, a argumentação segundo a qual não se deve interpretar a norma constitucional de modo a torná-la inócua ou sem sentido, e de outro, sobre os aspectos ligados ao plano temporal do fato gerador, a denunciar flagrantes ofensas aos direitos individuais, em especial o da capacidade contributiva, o da não-cumulatividade, o da legalidade e o da anterioridade e, por fim, o próprio decorrente da definição do ICMS (art. 155, II).

Parece ter havido excessivo zelo que os Senhores Ministros devotaram à causa da viabilidade do instituto, sem uma percorrida mais profunda em procurar antever as conseqüências que adviriam em caso do acolhimento da tese da procedência da ação: ora, não ficaria prejudicado o Fisco pelo problema do combate à sonegação, vez que praticamente a totalidade do imposto seria retida logo no início da cadeia econômica, e com a vantagem do recebimento antecipado, o que significa, sem dúvida, um plus financeiro considerável.

Por outro lado, o regime parece não garantir que o substituto ficaria inteiramente livre da fiscalização a posteriori – isto porque ele pode ficar vinculado ao cumprimento das obrigações acessórias, bem como trabalhar com outros produtos, sujeitos ao regime de tributação tradicional.

Adiante, este autor observa uma falha de raciocínio, quando os Senhores Ministros enfatizam (e decidem preponderantemente com base neste ponto de vista) a questão da economia e praticidade do Estado. Com recorrência, neste país, costuma-se tomar o conceito de Sociedade pelo de Estado, consagrando o bem público como sendo o bem do Estado. Entretanto, o Estado não é a Sociedade; O Estado é uma entidade dotada de personalidade jurídica própria e diversa das dos membros que compõem a sociedade, e existe para cumprir determinados fins, aliás, quase sempre diferentes dos que os cidadãos planejam para si mesmos, quando não, às vezes, absolutamente antagônicos.

Portanto, não se pode atribuir senão irrefletida pressa ao argumento tomado como verdade sabida de que algo que seja bom, por prático ou econômico, para o Estado, o seja também, e necessariamente, para a sociedade. Uma alegada economia do Estado proveniente da diminuição dos seus custos de fiscalização deveria ser confrontada com os respectivos gastos da sociedade, na contra-parte que lhe cabe, devendo ambas as expressões de valor ser estimadas por processos estatísticos razoavelmente confiáveis; assim, seria realmente econômica, e traduziria um benefício à busca da prosperidade do país, a medida cuja economia por parte do Estado fosse maior do que o gasto empreendido pelos particulares para cumprir as exigências nele previstas, bem como pelos prejuízos econômicos que sofreriam; do lado oposto, seria contraproducente, e tendente a provocar o empobrecimento da nação, se fosse verificado o contrário.

A singeleza deste trabalho não comporta uma exposição do montante desta parcela que foi solenemente olvidada por todos, inclusive, ao que parece (e se for, infelizmente), pelos próprios autores da ação. Todavia, algumas pistas podem ser levadas em conta:

a)os ônus contábeis adicionados aos substitutos;

b)os ônus financeiros impostos aos substitutos, por conta do pagamento adiantado do imposto, ônus este que poderia ser reinvestido em produção, e que, portanto, deve ser incluído ao chamado custo-Brasil – somente como início, pensemos em cerca de 17% do valor agregado pelo substituto, multiplicado pelo PIB brasileiro – certamente atingiria a cifra de centenas de bilhões de reais;

c)o ônus advindo da majoração disfarçada do tributo, que certamente soe acontecer;

d)os custos (de ambas as partes) advindos de uma eventual interpretação no sentido de acolher a tese da restituição do tributo pago a maior (ou a menor).

Outra conseqüência digna de nota é a de, na hipótese de o regime se expandir para expressiva parte das atividades econômicas, inaugurar-se-á um retorno à indesejável estatização dos preços, devido ao fato de os empresários, com justa razão, passarem a interpretar como prejuízo a diminuição do preço abaixo do estimado na pauta de preços do Fisco, visto que, em face da tributação prefixada, seu peso relativo na composição do preço final do produto tender a aumentar. Tornaria frágil o princípio da livre concorrência, com prejuízo aos consumidores e sugerindo tendências de servir como fonte de aumento da inflação.

Com relação ao pronunciamento do ilustre Ministro Ilmar Galvão, segundo o qual a estimativa aproxima-se "o mais possível da realidade", parece discutível, senão a requerente não estaria em lide acaso não sentisse na pele os efeitos que alegava sofrer. Com efeito, quando falamos de grandezas econômicas, nem os centavos são dispensados, ainda mais quando se trata de um fenômeno pautado pelo caráter de invasividade e supremacia que é o tributo, caracterizando qualquer extração de riqueza a mais o confisco e a inconformidade do cidadão.

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Sobre o autor
Klauber Cristofen Pires

Analista Tributário da Receita Federal do Brasil. Bacharel em Ciências Náuticas. Especialista em Direito Tributário "Lato Sensu" pela ESAF/UFPA. Graduando em Direito pela Faculdade Integrada Brasil-Amazônia (FIBRA) em Belém (PA).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PIRES, Klauber Cristofen. Substituição tributária progressiva.: Jurisprudência e teoria. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1954, 6 nov. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11910. Acesso em: 18 abr. 2024.

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