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Só os títulos executáveis autorizam a inscrição do nome do devedor no cadastro de inadimplentes

26/11/2008 às 00:00
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1. Em julgamento datado de 22.10.2003, a Segunda Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, no REsp nº 527.618/RS, da relatoria do eminente Ministro César Asfor Rocha, traçou parâmetros para a proteção cautelar ou antecipatória de tutela, para o impedimento de inscrição do nome dos devedores em cadastros restritivos de crédito. A proteção cautelar somente é possível quando presentes, concomitantemente, três requisitos: a) existência de ação proposta pelo devedor contestando a existência parcial ou integral do débito; b) que haja efetiva demonstração de que a contestação da cobrança indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada desta Corte ou do Supremo Tribunal Federal; e c) que, sendo a contestação de apenas parte do débito, deposite, ou preste caução idônea, ao prudente arbítrio do magistrado, o valor referente à parte tida por incontroversa (cf.. AgRg nos EDcl no Ag 684185 / RS –STJ, 3ª Turma, Relator Min. Sidnei Beneti, j. 18.09.2008, DJ 03.10.2008).

2. Contrario sensu, é lícito afirmar-se que para a inscrição do nome do devedor em cadastros restritivos de crédito é necessário tratar-se de débito referente a título executável, ou seja, fundado em obrigação certa, líquida e exigível, a teor do art. 586 do Código de Processo Civil.

É que deve haver paralelismo entre os requisitos para a inscrição do nome do devedor em cadastros negativos e os requisitos para a proteção cautelar.

3. Assim, para autorizar a inscrição no nome do devedor no cadastro de inadimplentes o débito deve ser referente a título executivo extrajudicial (CPC, art. 585).

4. Não custa observar que a enumeração de títulos contida no art. 585 do CPC é taxativa e exaustiva, não podendo tal dispositivo ser interpretado de forma extensiva, sob pena de ser atribuída força executiva a documento que, em essência, não corporifica uma dívida certa e exigível.

5. Além de estarem descritos e arrolados no art. 585 do CPC, têm os títulos ali descritos, para revestirem-se da condição especialíssima de títulos executivos extrajudiciais hábeis à propositura de ação de execução, de ser líquidos, certos e exigíveis, nos termos do art. 586 do CPC, in verbis: "Art. 586. A execução, para cobrança de crédito fundar-se-á sempre em título de obrigação certa, líquida e exigível".

6. Não basta, deste modo, que os títulos estejam arrolados no rol taxativo do art. 585 do CPC.

É preciso, ainda, que eles corporifiquem, em sua essência, um crédito líquido e certo e exigível. Alia-se à tipificação a necessidade destes requisitos, sem os quais não será lícito ao credor valer-se do processo de execução.

Afigura-se absurda a inscrição do nome do devedor no cadastro de inadimplente se o débito não se referir a título líquido, certo e exigível.

O Colendo Superior Tribunal de Justiça já teve a oportunidade de se manifestar a respeito da necessidade de certeza da dívida para a execução, inadmitindo expressamente a via executiva para contratos bilaterais sujeitos a eventos futuros e condicionados, como se verá.

7. Se o débito for discutível, vale dizer, não se referir a título executável, e se, mesmo, assim, em razão do mesmo, o devedor, por fas ou por nefas, tiver o nome inscrito no cadastro de inadimplentes, encontrará imensa dificuldade para, em tutela antecipada, obter a exclusão do nome do cadastro negativo.

8. Assim, é relevante saber se o débito se refere a título executável ou não.

9. Examinemos alguns débitos discutíveis consubstanciados em títulos não executáveis.

9.1 -. Repasse de receita

O repasse de receita pode ser feito através de nota fiscal.

Entretanto, a simples emissão da nota fiscal, sem a competente extração da fatura, no caso impossível, pois se trata de repasse de receita e não de venda de bens ou de serviços, não autoriza o credor a sacar duplicata mercantil. Se o fizer esta não será considerada como duplicata, embora possa estar formalizada em documento que contenha todos os requisitos exigidos, pois lhe falta seu original, ou seja, a fatura, para que ela possa ser a cópia. É impossível duplicar-se algo que não existe.

O Convênio de Criação do Sistema Nacional Integrado de Informações Econômico-Fiscais, assinado no Rio de Janeiro, em 15 de dezembro de 1970, pelo Ministro da Fazenda e pelos Secretários de Fazenda ou de Finanças dos Estados e do Distrito Federal, autorizou a utilização da Nota Fiscal como fatura (a denominada Nota Fiscal-Fatura ou NF-Fatura), dispõe no art. 19, § 7º:"A Nota Fiscal poderá servir como fatura, feita a inclusão dos elementos necessários, caso em que a denominação prevista no inciso I passa a ser Nota Fiscal-Fatura".

Se assim é, o credor não tem um título executivo extrajudicial contra o devedor, mas, apenas, possui um documento para eventual ação de conhecimento, caso o devedor não efetue o repasse da receita no tempo e modo devidamente contratado.

De observar-se que só a nota fiscal-fatura pode gerar a duplicata, que é título executivo extrajudicial (CPC, art. 585, I).

9.2 - Nota de débito

Ensina o Professor Adriano Blatt: "Nota de débito é uma nota muito utilizada para se efetuar, por exemplo, cobrança de valores para os quais não seja compatível a emissão de nota fiscal. A nota de débito diz que seu sacado é devedordo sacador. Uma de suas utilizações práticas é para a cobrança de encargos referentes a duplicatas e outros títulos que tenham sido pagos em cartório (cf. Adriano Blatt, "Títulos e documentos de contas a receber" – site da Equifax – seção Comunidade de Negócios – www.scinet.com.br ).

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Mas, adverte: "Cabe ressaltar que a nota de débito não é título de crédito, não sendo passível de protesto, tampouco de ação judicial de execução de dívida" (idem, ibidem).

Realmente, a nota de débito não se encontra no rol do art. 585 do Código de Processo Civil, não sendo, pois, título executivo extrajudicial.

Assim, o credor não tem um título executivo extrajudicial contra o devedor, mas, apenas, possui um documento para eventual ação de conhecimento.

9.3 – "O documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas" (CPC, art. 585, II) é instrumento de confissão de dívida e não contrato.

O título executivo extrajudicial, previsto no art. 585, II, do Código de Processo Civil, "é o documento que contém a obrigação incondicionada de pagamento de quantia determinada (ou entrega de coisa fungível) em momento certo. Os requisitos da certeza, liquidez e exigibilidade devem estar ínsitos no título. A apuração de fatos, a atribuição de responsabilidades, a exegese de cláusulas contratuais tornam necessário o processo de conhecimento e descaracterizam o documento como título executivo" (REsp 3.567/MG –STJ, 3ª Turma, Rel. Min. Waldemar Zveiter, j. 15.12.1993, DJ 07.03.1994, p. 3663).

O art. 585, II, do Código de Processo Civil cuida de confissão de dívida, mesmo porque dos contratos cuida o art. 585, III, do mesmo Código.

Na lição de Pedro Nunes, confissão de dívida é "o ato pelo qual alguém reconhece, de modo inequívoco, por instrumento público ou particular, que verdadeiramente deve a outrem uma soma certa e determinada de dinheiro ou de coisa equivalente" (Pedro Nunes, "Dicionário de Tecnologia Jurídica, 2ª Ed., 1951).

É o que diz o art. 585, II, do Código de Processo Civil, fazendo menção à assinatura do devedor, expressão que o legislador não utilizaria se fosse para abranger os contratos, porquanto estes sempre contam as assinaturas dos contratantes.

Em se tratando de contrato, o pacto sinalagmático, com recíprocas obrigações, vinculado o pagamento a cargo de um contratante, ao adimplemento da prestação de dar, fazer ou não fazer pelo outro contratante, não o torna um título executivo extrajudicial, por lhe faltar a certeza, liquidez e exigibilidade, que devem estar ínsitos no contrato.

Como ensina Ernane Fidélis dos Santos, "a simples forma pública do documento, ou a forma particular com subscrição de testemunhas, não o fazem título executivo quando, para a obrigação especificamente, faltarem os requisitos da certeza, liquidez e exigibilidade. Ditos requisitos deverão estar ínsitos no título, sem necessidade de apuração posterior de fatos" (Ernane Fidélis dos Santos, "Manual de Direito Processual Civil", v. 3, nº 1063, Saraiva, 1987).

E exemplifica: "Contrata-se prestação de serviço por certo preço. Não pode o preço ser cobrado executivamente, pois a realização efetiva do serviço não está no título; falta-lhe o requisito da certeza" (idem, ibidem).

Adotando esse conceito, entendeu-se não ser título executivo o "contrato de apoio" à realização de espetáculo artístico, com reciprocidade de obrigações entre o estabelecimento bancário e a empresa promotora dos eventos (REsp 1080/RJ, STJ, 4ª Turma, Rel. Min. Athos Carneiro, j. 31.10.1989, DJ 27.11.1989, p. 17573, RSTJ, vol. 8, p. 371).

Também já se entendeu que a multa rescisória cobrada em razão de inadimplemento de contrato de prestação de serviços não pode ser objeto de execução direta porque o contrato rescindido não tem força de título executivo extrajudicial (REsp 813.662/RJ, STJ, 1ª Turma, Rel. Min. Denise Arruda, j. 24.10.2006, DJ 20.11.2006).

10. Esses débitos discutíveis consubstanciados em títulos não executáveis, a toda evidência, não autorizam a inscrição do nome do devedor no cadastro de inadimplentes..

11. Oportunamente, abordar-se-á se o órgão mantenedor do cadastro de proteção ao crédito tem, ou não, o dever de examinar, ao menos perfunctoriamente, a natureza do título encaminhado pelo credor para inclusão no cadastro de inadimplentes.

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Sobre o autor
Tomaz Mituo Shintati

Procurador de Justiça aposentado. Advogado Cidade:Bauru-SP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SHINTATI, Tomaz Mituo. Só os títulos executáveis autorizam a inscrição do nome do devedor no cadastro de inadimplentes. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1974, 26 nov. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12010. Acesso em: 4 nov. 2024.

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