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Execução contra a Fazenda Pública.

Peculiaridades e prerrogativas dos entes fazendários

11/12/2008 às 00:00

Resumo:


  • A execução contra a Fazenda Pública possui um processo autônomo, com regras específicas, como a expedição de precatório.

  • Os créditos de natureza alimentícia, os de pequeno valor e os comuns são exemplos de tipos de execução que podem ser realizados contra a Fazenda Pública.

  • A legislação estabelece limites para os créditos de pequeno valor, que podem ser pagos sem a necessidade de precatório, seguindo critérios específicos.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

A permanência de um processo autônomo de execução contra a Fazenda Pública sinaliza um descompasso. A Fazenda Pública restou blindada diante das reformas do Código de Processo Civil.

Sumário:1. Breve introdução. 2. Conceito e natureza jurídica de execução. 3. Espécies de execução. 3.1. Execução por quantia certa fundada em título judicial em face da Fazenda Pública.3.1.1 Créditos de natureza alimentícia. 3.1.2 Créditos de pequeno valor. 3.1.3 Créditos comuns. 4. Conclusão


1. Breve introdução

O presente trabalho é iniciado com uma abordagem geral do processo de execução, passando, em seguida, a abordar brevemente as espécies de execução em que a Fazenda Pública pode figurar como executada. À execução por quantia certa contra a Fazenda Pública, subespécie da execução por quantia certa, daremos especial enfoque, sobretudo no que diz respeito às prerrogativas da Fazenda Pública.


2.

Ao indivíduo é negado o direito de efetivar a justiça com as próprias mãos, salvo raríssimas exceções, devendo este submeter-se ao poder estatal, ao qual compete a implementação da justiça, lançando mão da coerção e da expropriação patrimonial sempre que necessárias. Dentro da esfera estatal, compete tipicamente ao Poder Judiciário esse mister de solucionar os conflitos de interesses que lhes são submetidos, bem como resolver as súplicas inerentes à jurisdição voluntária.

Sem dúvida, a inteligência é o grande diferencial da espécie humana. Humberto Theodoro Júnior (2004, p. 3) esclarece que o ser racional observa a seqüência "saber-decidir-agir" no desenvolvimento de suas atividades diárias. Tal qual o homem, o órgão judicial, diante da lide a solucionar, primeiro conhece os fatos e o direito; em seguida decide qual a melhor solução jurídica aplicável àqueles fatos apresentados; por fim, se a solução jurídica decidida não for espontaneamente acatada, o órgão judicial age para fazer valer seu imperativo.

A jurisdição cognitiva gravita em torno da busca da verdade formal, incumbindo às partes a ampla argumentação e produção de provas. O juiz deve proceder ao sopesamento dos fatos, ao exame dos documentos, à tomada de depoimentos de testemunhas e dos sujeitos do processo, no afã de prolatar uma sentença que se aproxime do grau máximo de Justiça, apontando qual das partes do processo está com a ratio. Já na jurisdição executória, o Estado atua para fazer valer aquela decisão cognitiva que o sucumbente não cumpriu voluntariamente, daí a denominação de "execução forçada". Conforme observa Enrico Tullio Liebman (apud THEODORO JÚNIOR, 2004, p. 5):

Enquanto no processo de conhecimento o juiz examina a lide para ‘descobrir e formular a regra jurídica concreta que deve regular o caso’, no processo de execução providencia ‘as operações práticas necessárias para efetivar o conteúdo daquela regra, para modificar os fatos da realidade, de modo que se realize a coincidência entre as regras e os fatos’.

Carnelutti (apud ARAKEN DE ASSIS, 2007, p. 72) legou-nos brilhante metáfora segundo a qual, "em sede cognitiva, a missão judicial transforma o fato em direito; na execução, o direito, ou seja, a regra jurídica concreta, há de traduzir-se em fatos".

Com o advento da Lei nº 11.232, de 22 de dezembro de 2005, que trouxe significativas reformas para o Código de Processo Civil, não mais existe processo autônomo de execução fundada em título judicial, sendo o cumprimento da sentença uma simples fase do processo de conhecimento. Doravante, a sentença possui, por si só, força coercitiva e deve ser objeto de simples cumprimento, em substituição ao autônomo processo de execução forçada.

Permanece, por razões óbvias, o processo autônomo de execução para os títulos executivos extrajudiciais, arrolados no art. 585 do CPC. No caso da execução por quantia certa contra as Fazendas Públicas, continua a regra antiga: há processo autônomo de execução, estando este disciplinado no Livro II do CPC, precisamente nos arts. 730 e 731. O art. 741 cuida dos embargos opostos pela Fazenda Pública, relacionando as matérias que podem ser versadas em tais embargos. Sendo assim, o autor da ação que verse sobre obrigação pecuniária contra a Fazenda Pública, de posse do acórdão transitado em julgado (o art. 475, I, do CPC determina o duplo grau obrigatório sempre que a sentença condenar as Fazendas Públicas), deverá intentar uma ação de execução fundada no título judicial (acórdão), aguardar a Fazenda embargar, para só então, julgados improcedentes os embargos da devedora, ter expedido seu precatório judicial.

A locução Fazenda Pública abrange a administração pública direta nas três esferas, Fazenda Federal, Estadual, Municipal (inclusive a Distrital), além das autarquias e fundações públicas. O Supremo Tribunal Federal considerou impenhorável o patrimônio da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, que é uma empresa pública, incluindo-a na execução mediante precatório, levando em conta o princípio da supremacia do interesse público e o da continuidade dos serviços públicos (2ªT. do STF, AI 313.854-AgR-CE, DJU 26.10.2001, p. 38). São estas, pois, as pessoas jurídicas que se sujeitam à sistemática do precatório.

Com isso, temos elementos suficientes para trilharmos o campo conceitual da execução que, segundo Misael Montenegro Filho (2005, p. 259):

[...] é o instrumento processual posto à disposição do credor para exigir o adimplemento forçado da obrigação através da retirada de bens do patrimônio do devedor ou do responsável, suficientes para a plena satisfação do exeqüente, o que se operará em seu benefício e independentemente da vontade do executado – e mesmo contra a sua vontade – conforme entendimento doutrinário unânime.

Cristiane Souza de Castro (2006, p. 20) relaciona o conceito de execução à satisfação de uma obrigação, podendo esta ser decorrente de dois tipos de atividade:

O conceito de execução, no sentido jurídico, está relacionado à satisfação de uma obrigação, seja ela decorrente da vontade das partes envolvidas (atividade negocial) ou da norma de direito material reconhecida em decisão do órgão judicial competente (atividade jurisdicional).

Araken de Assis (2007, p. 89) comenta sobre a peculiaridade e o objetivo do processo de execução:

Tem o ato executivo de peculiar, distinguindo-o, destarte, dos demais atos do processo e dos que do juiz se originam, a virtualidade de provocar alterações no mundo natural. Objetiva a execução, através de atos deste jaez, adequar o mundo físico ao projeto sentencial, empregando a força do Estado (art. 579 do CPC). Essas modificações fáticas requerem, por sua vez, a invasão da esfera jurídica do executado, e não só do seu círculo patrimonial, porque, no direito pátrio, os meios de coerção se ostentam admissíveis. A medida do ato executivo é seu conteúdo coercitivo.

E qual seria a natureza jurídica da execução? Na nossa percepção, a execução possui natureza jurisdicional, por materializar a vontade abstrata da lei através dos órgãos judiciais, substituindo a atividade privada das partes. Corroborando com nosso parecer, vejamos o magistério de Araken de Assis (2007, p. 111-113):

É quase unânime, hoje, a tendência doutrinária que outorga autonomia à função jurisdicional executiva. Correlatamente, idênticos pendores reconhecem ao processo de execução, estrutura representativa daquela, natureza jurisdicional.

[...]

Em verdade, a natureza jurisdicional da execução deriva do imperium, que constitui o núcleo dos atos executivos, exercido pelos magistrados.

Logo, concluímos que a execução é a atividade jurisdicional que visa assegurar ao detentor de título executivo, judicial ou extrajudicial, a satisfação de seu direito mediante o uso da coerção ou da expropriação patrimonial contra o executado.


3. Espécies de execução

A ação de execução é gênero, da qual são espécies a execução para entrega de coisa (certa e incerta), a execução das obrigações de fazer e de não fazer e a execução por quantia certa (contra devedor solvente e contra devedor insolvente). Na espécie da execução por quantia certa, inserem-se as subespécies da execução de prestação alimentícia, da execução fiscal e da execução contra a Fazenda Pública, à qual dedicaremos maior atenção por se tratar do foco do presente estudo. Como bem aponta Misael Montenegro Filho (2005, p. 400):

A diferença que há entre as espécies é orientada pelo objeto da execução, indicando a prestação a ser satisfeita pelo credor (pagar, entregar coisa, fazer ou não fazer). Nas subespécies, temos regras específicas, que se originam da preocupação de serem tutelados os interesses de uma das partes do processo, em vista da necessidade de uma prestação jurisdicional mais célere e efetiva (como ocorre na situação que envolve a execução de prestação alimentícia), do interesse público revelado na lide (na execução fiscal) ou na impossibilidade de ser efetivada a penhora em bens da parte devedora (na execução contra a Fazenda Pública).

Tendo em vista que o artigo em curso trata da execução em face da Fazenda Pública, abordaremos as espécies de execução supra apresentadas na perspectiva da Fazenda Pública figurando como executada. Feita essa consideração, cumpre ressaltar que as subespécies execução de prestação alimentícia e execução fiscal não serão estudadas neste trabalho, já que em nenhuma delas a Fazenda pode figurar como devedora.

a) Execução de obrigação de fazer, não fazer e entregar coisa. Com a vigência da Lei nº 10.444, de 7 de maio de 2002, deixou de existir execução fundada em título judicial para se exigir o cumprimento de obrigação de fazer, não fazer e entregar coisa, certa ou incerta. Sendo o título judicial, tais obrigações serão cumpridas na forma dos arts. 461 e 461-A do CPC, pertencentes ao Título V (Do Procedimento Ordinário), Capítulo VIII, que trata da sentença e da coisa julgada, a saber:

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

[...]

§ 5º Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial. (Redação dada pela Lei nº 10.444, de 7.5.2002)

[...]

Art. 461-A. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação.

[...]

§ 2º Não cumprida a obrigação no prazo estabelecido, expedir-se-á em favor do credor mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel. (Incluído pela Lei nº 10.444, de 7.5.2002)

[...]

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Assim, proferida a sentença e descumprida a obrigação ali consignada, o juiz, valendo-se dos dispositivos acima transcritos, deverá determinar o cumprimento da obrigação. Somente se o título executivo for extrajudicial haverá ação de execução autônoma, seguindo-se a sistemática dos arts. 621 a 631 para a execução da obrigação de entregar coisa (certa e incerta) e dos arts. 632 a 643 para a execução das obrigações de fazer e de não fazer.

Em se tratando de ação contra a Fazenda Pública, não há regra diferente, já que as obrigações de fazer, não fazer e entregar coisa não observam a sistemática do precatório.

b) Execução por quantia certa fundada em título extrajudicial e em título judicial contra a Fazenda Pública. A doutrina processualista, até 16 de junho de 2003, era vacilante quanto à possibilidade da execução fundada em título executivo extrajudicial contra a Fazenda Pública. Naquela data, o Superior Tribunal de Justiça publicou a Súmula 279, amainando, porém não encerrando, os embates doutrinários. Textualiza aquela Súmula: "É cabível execução por título extrajudicial contra a Fazenda Pública".

Os que defendem a impossibilidade da execução contra a Fazenda, fundada em título extrajudicial, fazem uma interpretação literal do art. 100 da Constituição Federal de 1988, que assim determina:

Art. 100. À exceção dos créditos de natureza alimentícia, os pagamentos devidos pela Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.

O texto magno fala em "sentença judiciária" como pressuposto para expedição dos precatórios. Sendo assim, segundo essa corrente, não se afiguraria cabível ajuizar-se contra a Fazenda Pública execução fundada em título extrajudicial, sabido que no feito executivo não há prolação de sentença. Daí porque, mesmo dispondo de título executivo extrajudicial, deveria o credor ajuizar ação de conhecimento para, obtendo a sentença (título judicial), promover a ação de execução, para só então ser possível a expedição do precatório requisitório.

Leonardo José Carneiro da Cunha (2007, p. 275-276, grifo original), comentando sobre a interpretação cabível, afirma que:

A expressão ‘sentença judiciária’ referida no texto constitucional não deve ser tomada no sentido estritamente técnico, pois, na realidade, o que se executa é o acórdão que confirmou ou que reformou a sentença proferida pelo juízo de primeiro grau. Nas causas originárias dos tribunais, não haveria, então, possibilidade de se expedir precatório, eis que não existiria uma ‘sentença judiciária’, mas sim um acórdão, não se encaixando na previsão constitucional. Significa que a interpretação estritamente literal do dispositivo constitucional poderia conduzir a uma conclusão absurda como essa.

A discussão parece superada. Não há qualquer razoabilidade em ajuizar-se uma ação de conhecimento fundada num título executivo. Qualquer entendimento contrário vai de encontro aos Princípios da Razoabilidade e da Celeridade Processual, este último tão em voga hodiernamente, inclusive com assento constitucional e status de direito fundamental no art. 5º, inciso LXXVIII, da Carta Magna.

Segundo a orientação ministrada pelo STJ, o art. 730 do CPC, ao disciplinar o procedimento da execução contra a Fazenda Pública, não estabelece qualquer distinção entre título judicial e extrajudicial, não havendo qualquer incompatibilidade do rito dos precatórios com o título extrajudicial. E não poderia ser diferente, visto que no sistema processual civil brasileiro, o título executivo extrajudicial equivale à sentença condenatória transitada em julgado.

O mesmo Leonardo José Carneiro da Cunha (2007, p. 276, grifo original), sobre a Súmula do STJ, levanta o seguinte questionamento:

Esse entendimento sumular subsiste em face da Emenda Constitucional nº 30/2000?

É que o parágrafo 1º do art. 100 da Constituição da República, na redação que lhe foi conferida pela Emenda Constitucional nº 30/2000, impõe, já se viu, que a expedição do precatório depende do prévio trânsito em julgado, não havendo correlação entre os institutos.

Novamente, há que se interpretar o dispositivo de forma teleológica. Conforme dito acima, o sistema processual civil brasileiro considera o título executivo extrajudicial equivalente à sentença condenatória transitada em julgado. A menção, no texto constitucional, ao trânsito em julgado, veda, isto sim, a inclusão, no orçamento público, de despesa judicialmente controvertida (é que por envolver interesse público, o erário só deve despender com aquilo que for incontroverso), permitindo, em decorrência lógica, a execução definitiva, que poderá ser fundada em título extrajudicial ou em sentença condenatória transitada em julgado. Ademais, no título extrajudicial consta uma obrigação assumida pela própria Administração Pública.

Alinhamo-nos com a conclusão do próprio Carneiro da Cunha (2007, p. 278, grifo original), segundo o qual: "A Súmula 279 do STJ não contraria a norma constitucional que exige o prévio trânsito em julgado para expedição do precatório. Possível, portanto, a execução fundada em título extrajudicial contra a Fazenda Pública".

Resta difícil configurar hipóteses em que a Administração Pública emita um cheque, subscreva uma duplicata ou tenha contra si expedida uma letra de câmbio. Contudo, há casos de contratos celebrados com o Poder Público, que possuem força executiva, quando encaixados na previsão do art. 585 do CPC, sendo equiparados a uma sentença transitada em julgado.

O art. 745 do CPC prevê as matérias que podem ser versadas nos embargos à execução fundada em título extrajudicial contra a Fazenda Pública, não se aplicando as restrições do art. 741.

Sobre a execução judicial por quantia certa fundada em título judicial, trataremos no item a seguir, por merecer especial atenção.

3.1. Execução por quantia certa fundada em título judicial em face da Fazenda Pública

O patrimônio público é revestido dos atributos da inalienabilidade (à exceção dos bens dominicais, como por exemplo, terras devolutas, prédios desativados, bens móveis inservíveis etc.) e, conseqüentemente, da impenhorabilidade, razão pela qual não se aplica frente à Fazenda Pública a regra de responsabilidade patrimonial insculpida no art. 591 do CPC. Conforme já ensinava Pontes de Miranda (1971, p. 142), "Todos os bens públicos somente podem ser alienados se a lei o permite e segundo o que ela permita".

Incluem-se neste conceito de bens públicos (Código Civil, art. 99) as rendas ou verbas públicas, pertencendo estas à categoria de bens de uso especial, segundo entendimento de doutrinadores prestigiados como Seabra Fagundes (1979, p. 192) e Araken de Assis (2007, p. 953). Na dicção do art. 100 do Código Civil, "os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial são inalienáveis, enquanto conservarem a sua qualificação, na forma que a lei determinar".

Há disciplina especial para a execução por quantia certa contra a Fazenda Pública, não incidindo sobre esta a penhora ou a expropriação de bens para alienação judicial, a fim de satisfazer o crédito executado. Deve-se ajuizar a ação com base no procedimento capitulado no art. 730 do CPC, seguindo-se a oposição de embargos pela Fazenda Pública para, ao final, ser, então, expedido o precatório, em reverência à regra constitucional encartada no art. 100.

Conforme registramos no item 1.1 supra, a Lei nº 11.232/2005 pôs fim ao processo autônomo de execução fundada em título judicial, devendo a sentença, doravante, ser objeto de simples cumprimento. Tal sistemática não atinge a execução proposta contra a Fazenda Pública. Esta continua sendo uma execução autônoma, cabendo embargos do devedor. O regramento da execução contra a Fazenda Pública encontra-se no Livro II do CPC, que trata do processo autônomo de execução.

Os arts. 730 e 731 do CPC não foram alterados e possuem a seguinte redação:

Art. 730. Na execução por quantia certa contra a Fazenda Pública, citar-se-á a devedora para opor embargos em 10 (dez) dias; se esta não os opuser, no prazo legal, observar-se-ão as seguintes regras:

I - o juiz requisitará o pagamento por intermédio do presidente do tribunal competente;

II - far-se-á o pagamento na ordem de apresentação do precatório e à conta do respectivo crédito.

Art. 731. Se o credor for preterido no seu direito de preferência, o presidente do tribunal, que expediu a ordem, poderá, depois de ouvido o chefe do Ministério Público, ordenar o seqüestro da quantia necessária para satisfazer o débito.

O art. 741, alterado pela Lei nº 11.232, por seu turno, passou a tratar dos embargos à execução opostos pela Fazenda Pública, nos termos seguintes:

Art. 741. Na execução contra a Fazenda Pública, os embargos só poderão versar sobre:

I – falta ou nulidade da citação, se o processo correu à revelia;

II - inexigibilidade do título;

III - ilegitimidade das partes;

IV - cumulação indevida de execuções;

V – excesso de execução;

VI – qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que superveniente à sentença;

Vll - incompetência do juízo da execução, bem como suspeição ou impedimento do juiz.

Parágrafo único. Para efeito do disposto no inciso II do caput deste artigo, considera-se também inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tidas pelo Supremo Tribunal Federal como incompatíveis com a Constituição Federal.

Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart (2007, p. 392-393) assinalam, ainda, a possibilidade de se executar a sentença proferida em ação monitória contra a Fazenda Pública.

Caso a sentença que condenou a Fazenda Pública não apresente valores líquidos, esta deve ser objeto de uma liquidação para, somente depois, poder ser executada. A liquidação de sentença passou a ser disciplinada nos arts. 475-A a 475-H do CPC, sendo tais regras aplicáveis ao processo de que faça parte a Fazenda Pública. Se a determinação do valor da condenação depender apenas de cálculo aritmético, o credor já pode intentar a execução, instruindo o pedido com a memória de cálculo (CPC, art. 475-B).

Leonardo José Carneiro da Cunha (2007, p. 236), a respeito da liquidação, afirma:

A liquidação da sentença proferida contra a Fazenda Pública deverá – seguindo-se a nova sistemática do art. 475-A do CPC – ser iniciada por requerimento, vindo a Fazenda Pública a ser apenas intimada na pessoa do procurador que atua nos autos, e não mais citada, para responder à liquidação. Ainda que a apelação interposta contra a sentença tenha o duplo efeito, poderá ser iniciada a liquidação da sentença (CPC, 475-A, parágrafo 2º).

É possível a execução provisória contra a Fazenda Pública, na pendência de apelação sem efeito suspensivo na ação de conhecimento? Dispõe o parágrafo 1º do art. 475-I do CPC que: "É definitiva a execução da sentença transitada em julgado e provisória quando se tratar de sentença impugnada mediante recurso ao qual não foi atribuído efeito suspensivo". A resposta é positiva, porém o art. 100 (parágrafo 1º) da CF/88 condiciona a expedição do precatório ao esgotamento das vias recursais cognitivas e executórias (ARAKEN DE ASSIS, 2007, p. 965). Em síntese: o precatório e a requisição de pequeno valor só devem ser expedidos após o trânsito em julgado da decisão cognitiva e da decisão executória, não necessariamente nesta ordem.

Destarte, se à sentença do processo de conhecimento não foi dado efeito suspensivo, pode o credor adiantar a ação de execução, ganhando tempo. A Fazenda será citada para oferecer embargos, os quais serão processados e julgados, podendo haver interposição de recurso de apelação. Encerrado todo o processamento da execução, deve-se aguardar o trânsito em julgado do processo de conhecimento para se expedir o precatório ou a R.P.V.

Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart (2007, p. 393) asseguram:

Desde que não haja a expedição do precatório, ou, ao menos, desde que para esta expedição seja exigida caução idônea, na forma do que prescreve o art. 475-O, III, do CPC, nada obsta a admissão da execução de decisão provisória contra a Fazenda Pública.

Leonardo José Carneiro da Cunha (2007, p. 273, grifo original) complementa, apontando para a única, porém importante, utilidade da execução provisória contra a Fazenda Pública, nos termos seguintes:

Significa, então, que é possível a execução provisória em face da Fazenda Pública apenas para processamento da demanda executiva. A expedição do precatório é que fica condicionada ao prévio trânsito em julgado da sentença proferida no processo de conhecimento. Nessa hipótese, a execução provisória serve, apenas, para adiantar o processamento da execução contra a Fazenda Pública, eliminando uma etapa futura.

Há, no entanto, uma exceção à possibilidade da execução provisória contra a Fazenda Pública. Trata-se do art. 2º-B da Lei nº 9.494/1997, incluído pela Medida Provisória nº 2.180-35, de 2001, de constitucionalidade duvidosa, segundo o qual:

Art. 2º-B. A sentença que tenha por objeto a liberação de recurso, inclusão em folha de pagamento, reclassificação, equiparação, concessão de aumento ou extensão de vantagens a servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, inclusive de suas autarquias e fundações, somente poderá ser executada após seu trânsito em julgado.

De posse da sentença líquida, o credor deve ajuizar a execução em face da Fazenda Pública, que será citada para, querendo, opor embargos do devedor no prazo de trinta dias (Lei nº 9.494/1997, art. 1ª-B, na redação da MP nº 2.180-35/2001), os quais somente poderão versar sobre as matérias previstas no art. 741 do CPC. Da decisão que rejeita os embargos, não haverá reexame necessário, tendo em vista que o inciso II do art. 475 do CPC apenas trata dos embargos em execução fiscal, consoante entendimento pacífico do STJ (ver, por exemplo, STJ, 6ªT., REsp 197455/SP, DJU 04.12.2006). Araken de Assis (2007, p. 965), contudo, posiciona-se em sentido contrário, alegando que a sentença que julga improcedente os embargos é sentença proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal ou o Município, enquadrando-se na regra do reexame necessário prevista no art. 475, I, do CPC.

Quando os embargos forem parciais, a execução, nos termos do art. 739-A, parágrafo 3º do CPC, prosseguirá quanto à parte não embargada, expedindo-se o precatório ou a requisição de pequeno valor para pagamento do valor incontroverso. Conforme assevera Leonardo José Carneiro da Cunha (2007, p. 264), estribado na jurisprudência dominante do STJ, "Em tal situação, não está havendo o fracionamento vedado no parágrafo 4º do art. 100 da Constituição, eis que não se trata de intenção do exeqüente de repartir o valor para receber uma parte por RPV e a outra por precatório".

Resta saber se o caput do art. 739-A do CPC, segundo o qual "os embargos do executado não terão efeito suspensivo", bem como a ressalva do parágrafo 1º, aplicam-se à Fazenda Pública na condição de executada. Para Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart (2007, p. 394, grifo original), não resta dúvida:

[...] os embargos à execução, inclusive os oferecidos pela Fazenda Pública, não são mais recebidos no efeito suspensivo (art. 739-A). A atribuição de efeito suspensivo aos embargos, após a Lei 11.382/2006, depende da presença de determinados requisitos, previstos no art. 739-A, § 1º, do CPC.

Por outro flanco, Carneiro da Cunha (2007, p. 241, grifo original) discorda, argumentando que:

Como a expedição do precatório ou da requisição de pequeno valor depende do prévio trânsito em julgado, é curial que os embargos devem, sempre, ser recebidos no efeito suspensivo. Logo, o parágrafo 1º do art. 739-A do CPC não se aplica à Fazenda Pública, por ser incompatível com o regime da execução contra ela proposta.

Alinhamo-nos ao entendimento de Carneiro da Cunha, pois, nos termos do art. 739-A, parágrafo 1º, o efeito suspensivo depende de penhora, depósito ou caução, institutos aos quais a Fazenda Pública não se sujeita. Demais disso, a expedição do precatório ou da requisição de pequeno valor depende do prévio trânsito em julgado (CF/88, art. 100, parágrafos 1º e 3º). Assim, se os embargos opostos pela Fazenda Pública forem rejeitados, esta poderá apelar (como vimos, aqui não há remessa obrigatória), permanecendo suspensa a execução até o trânsito em julgado da decisão final sobre os embargos, já que é inviável a expedição de um precatório provisório.

Encerrado todo o processo de execução contra a Fazenda Pública, ou seja, transitada em julgado a sentença que apreciou os embargos, caberá ao juízo de 1º grau da execução a elaboração do precatório ou da requisição de pequeno valor e o seu encaminhamento ao presidente do Tribunal a que está sujeita a decisão exeqüenda. O presidente do Tribunal competente repassará a requisição ao ente condenado para que este inclua em orçamento aquela despesa.

O precatório deverá ser inscrito até o dia 1º de julho para que seja o correspondente montante inserido no orçamento que ainda será aprovado, realizando-se o pagamento até o final do exercício subseqüente (31 de dezembro do ano seguinte). Caso o precatório somente seja inscrito após o dia 1º de julho, haverá a perda de um exercício financeiro, devendo ser incluído no orçamento seguinte para ser pago até o dia 31 de dezembro do exercício posterior ao subseqüente.

3.1.1 Créditos de natureza alimentícia

O art. 100, parágrafo 1º-A, da Constituição Federal, incluído pela Emenda Constitucional nº 30, de 2000, prescreve quais são os créditos (o texto legal usa a expressão "débito", já que o comando é dirigido ao devedor) de natureza alimentícia:

§ 1º-A Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou invalidez, fundadas na responsabilidade civil, em virtude de sentença transitada em julgado.

Resta saber se referido rol é exemplificativo ou taxativo. Ao que nos parece, o rol é taxativo, pois o dispositivo trata de norma excepcional, ou seja, o §1º-A da CF/88 ressalva a ordem cronológica dos precatórios, criando nova ordem, especial. Neste sentido: Araken de Assis (2007, p. 956) e Leonardo José Carneiro da Cunha (2007, p. 246-247). Este último ainda conclui: "Sendo a regra excepcional, impõe-se a interpretação restritiva". Em sentido contrário: Juvêncio Vasconcelos Viana (2003, p. 59).

Deste modo, os honorários advocatícios não integram o taxativo grupo de créditos com natureza alimentar. Os honorários são decorrentes do êxito, inserindo-se numa álea, incompatível, pois, com a natureza alimentícia (Acórdão unânime da 2ª Turma do STJ, ROMS 19.027/RS, rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 18/08/2005, DJ de 10/10/2005, p. 269).

Araken de Assis (2007, p. 957) levanta interessante argumento, segundo o qual:

Uma disciplina privilegiando os honorários e, por sua natureza, apartando-os do destino do crédito principal provocaria grave distorção axiológica aos olhos dos profanos, pois ensejaria ao advogado receber antes do cliente. É o que ocorreria, por exemplo, nas desapropriações. Assim os honorários ostentam natureza acessória do crédito principal, seja ele comum ou alimentar.

Com isso, tem-se que os honorários devem seguir a mesma disciplina do crédito principal: se este for alimentar, com ele serão pagos os honorários, ou seja, preferencialmente; noutro giro, se o crédito principal não for alimentício, os honorários serão pagos também em conjunto com ele, sem qualquer preferência.

Os créditos de natureza alimentar, se de pequeno valor, sujeitam-se à sistemática da requisição de pequeno valor.

Créditos de pequeno valor

A Lei Federal nº 10.259, de 12 de julho de 2001, instituiu os Juizados Especiais Cíveis no âmbito da Justiça Federal, dando-lhes competência para processar, conciliar e julgar as causas com valor até 60 (sessenta) salários mínimos. O art. 17, parágrafo 1º, do referido diploma legal estabeleceu que "Para os efeitos do § 3º do art. 100 da Constituição Federal, as obrigações ali definidas como de pequeno valor, a serem pagas independentemente de precatório, terão como limite o mesmo valor estabelecido nesta Lei para a competência do Juizado Especial Federal Cível". Logo, no âmbito federal, débitos de pequeno valor são aqueles que têm como limite 60 (sessenta salários mínimos).

Aos Estados, Municípios e Distrito Federal cabe fixar o limite considerado de pequeno valor para que seja dispensada a expedição do precatório. Enquanto não editadas as respectivas leis, deve prevalecer o art. 87 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (acrescido pela Emenda Constitucional nº 37/2002), que prevê: 40 (quarenta) salários mínimos, perante as Fazendas dos Estados e do Distrito Federal; e 30 (trinta) salários mínimos, perante as Fazendas dos Municípios.

Conforme observa Leonardo José Carneiro da Cunha (2007, p. 259):

Tais limites previstos no art. 87 do ADCT da Constituição Federal não constituem critérios mínimos nem máximos, não ostentando a feição de pisos nem tetos definitivos, de forma que os Estados, os Municípios e o Distrito Federal podem fixar limites inferiores ou superiores àqueles estabelecidos no referido dispositivo do ADCT.

Por último, os créditos de pequeno valor tanto podem ser alimentícios quanto comuns, a depender do objeto da ação de execução.

Créditos comuns

A identificação de créditos comuns se faz por exclusão da definição de créditos de natureza alimentícia. São comuns os demais créditos passíveis de execução contra a Fazenda Pública, extraídos os de natureza alimentar, já que, como vimos, o rol destes é taxativo. São exemplos: a indenização por desapropriação de imóvel; a indenização por danos materiais; a indenização por danos morais; valores a receber, decorrentes de contrato com a administração pública; os lucros cessantes decorrentes de uma apreensão indevida, realizada pela administração pública, de algum bem gerador de frutos civis; uma recompensa prometida e não paga pelo Estado etc.

Os créditos comuns podem ser de pequeno valor ou não, observados os tetos federal, estaduais, distrital e municipais.


4. Conclusão

Diante do exposto, é forçoso concluir que a permanência de um processo autônomo de execução contra a Fazenda Pública sinaliza um descompasso na evolução processualista brasileira. Ao que nos parece, a Fazenda Pública restou blindada diante das reformas do Código de Processo Civil. Mesmo o art. 739-A, caput, que retirou o efeito suspensivo dos embargos do devedor, parece não ter atingido os entes fazendários. Com isso, temos de percorrer uma verdadeira légua tirana para alcançar o trânsito em julgado da ação de conhecimento e o da ação de execução contra a Fazenda Pública, em face dos incontáveis instrumentos processuais de postergação de que dispõe o Estado.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ASSIS, Araken de. Manual da Execução. 11. ed. São Paulo: RT, 2007.

CASTRO, Cristiane Souza de. Execução Forçada contra a Fazenda Pública. São Paulo: LTr, 2006.

CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A Fazenda Pública em Juízo. 5. ed. São Paulo: Dialética, 2007.

FAGUNDES, Miguel Seabra. O Controle dos Atos Administrativos pelo Poder Judiciário. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1979.

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil vol. 3. São Paulo: RT, 2007.

MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de Direito Processual Civil vol. II. São Paulo: Atlas, 2005.

PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. 3. ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1971.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil vol. I. 41. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

VIANA, Juvêncio Vasconcelos. Novas Considerações acerca da Execução contra a Fazenda Pública. Revista Dialética de Direito Processual, São Paulo, nº 5, 54-68, ago. 2003.

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Sobre o autor
Luis Lima Verde Sobrinho

Advogado. Pós-graduando em Direito Tributário.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VERDE SOBRINHO, Luis Lima. Execução contra a Fazenda Pública.: Peculiaridades e prerrogativas dos entes fazendários. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1989, 11 dez. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12070. Acesso em: 27 dez. 2024.

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