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A requisição de servidores públicos para a Justiça Eleitoral do Ceará.

Análise histórica e perspectivas futuras

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17/12/2008 às 00:00
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5 Perspectivas para os servidores requisitados

5.1 A questão da prorrogação das requisições

Em relação ao período de tempo das requisições para os cartórios eleitorais, assim está previsto no parágrafo único do art. 7º e no art. 10 da Resolução TSE nº 20.753/2000:

Art. 7º [...]

Parágrafo único. O Tribunal Superior Eleitoral, ao deferir o pedido, fixará o prazo da requisição. Esgotado o prazo, o servidor será desligado automaticamente, retornando à sua repartição de origem.

[...]

Art. 10. As requisições serão feitas pelo prazo de um ano, prorrogável, e não excederão a um servidor por dez mil ou fração superior a cinco mil eleitores inscritos na zona eleitoral (Lei no 6.999, art. 2o, § 1o). (BRASIL, 2006, v. 2, p. 124-125).

Em relação às requisições para as secretarias dos Tribunais, o art. 14 da mesma resolução assim disciplina:

Art. 14. As requisições para as secretarias do Tribunal Superior Eleitoral e dos tribunais regionais eleitorais serão feitas por prazo certo, não excedente de um ano, exceto no caso de nomeação para cargos em comissão (Lei nº 6.999/82, art. 4º). (BRASIL, 2006, v. 2, p. 126).

A partir do ano de 2001, o TSE tem decidido sucessivamente em diversas resoluções pela suspensão da vigência dos artigos que limitam as prorrogações das requisições. A alegação é de que, apesar dos cargos criados pela Lei nº 10.842/2004, o número de servidores efetivos da Justiça Eleitoral é insuficiente para o bom andamento de suas atividades, conforme Resolução TSE nº 22.630/2007. Atualmente, esta resolução ampara a renovação das requisições até 31 de dezembro de 2008.

5.2 Projetos legislativos atuais sobre servidores requisitados

Tramitam atualmente no Congresso Nacional dois projetos que, caso venham a ser aprovados, certamente mudarão em muito a situação dos servidores requisitados, sendo que um deles é específico para a Justiça Eleitoral e o outro afetaria a União como um todo.

5.2.1 Projeto de Lei nº 3.252/04

O primeiro é o PL nº 3.252/04, de autoria do deputado federal Marcondes Gadelha (PTB/PB), o qual altera os arts. 5º e 9º da Lei nº 6.999/82, justamente a lei que dispõe sobre a requisição de servidores públicos pela Justiça Eleitoral, já comentada anteriormente neste trabalho. O texto atual destes artigos diz o seguinte:

Art. 5º - Os servidores atualmente requisitados para as Secretarias dos Tribunais Eleitorais poderão ter suas requisições renovadas anualmente.(grifo nosso)

[...]

Art. 9º - O servidor requisitado para o serviço eleitoral conservará os direitos e vantagens inerentes ao exercício de seu cargo ou emprego. (BRASIL, 1982, p. 02, grifo nosso).

O PL nº 3.252/04, em caso de aprovação sem emendas, modificaria sensivelmente a situação dos servidores requisitados, conforme transcrição abaixo:

O Congresso Nacional decreta:

Os arts. 5º e 9º da Lei nº 6.999, de 7 de junho de 1982, passam a vigorar com as seguintes alterações:

"Art. 5º Os servidores requisitados para as Secretarias dos Tribunais Eleitorais poderão ter suas requisições renovadas anualmente.

Art. 9º O servidor requisitado para o serviço eleitoral conservará os direitos e vantagens inerentes ao exercício de seu cargo ou emprego, recaindo o ônus da remuneração sobre o órgão cedente.

Parágrafo único. Os servidores requisitados para as Secretarias dos Tribunais Eleitorais poderão receber os auxílios relativos a transporte, alimentação e assistência pré-escolar devidos aos servidores ocupantes de cargos efetivos, nas mesmas condições vigentes para estes, recaindo os ônus correspondentes sobre o órgão cessionário." (BRASIL, 2004, p. 14.521).

A mudança no art. 5º permitiria que não somente as requisições da época da publicação da lei pudessem ser indefinidamente renovadas a cada ano, estendendo esta propriedade a todas as requisições atuais e futuras. Já no art. 9º, além de deixar claro que o desembolso da remuneração é do órgão que cede o servidor, foi acrescentado o parágrafo único. Este permite que a Justiça Eleitoral pague aos servidores requisitados auxílio-transporte, alimentação e assistência pré-escolar nos mesmos valores devidos aos servidores efetivos. Em sua justificativa o deputado Marcondes Gadelha argumenta que:

[...]registra-se a ausência de expressa previsão legal que autorize tanto a ampliação do prazo de permanência dos servidores requisitados quanto o pagamento dos benefícios citados.

A presente proposta reveste-se de extrema relevância para os interesses da Justiça Eleitoral e não é, de modo algum, antieconômica, pois significa a viabilização do funcionamento dessa Justiça especializada ao custo do pagamento dos referidos auxílios e com a permanência de servidores já treinados e familiarizados com os procedimentos eleitorais. (BRASIL, 2004, p. 14.522).

Vale salientar que o parágrafo único do art. 9º deste projeto de lei, da forma como foi redigido, contempla apenas os servidores requisitados para as Secretarias dos Tribunais Eleitorais, inexplicavelmente excluindo dos seus benefícios os servidores requisitados para as zonas eleitorais.

O PL nº 3.252/04 já foi aprovado pela Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados, encontrando-se atualmente na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados.

5.2.2 Proposta de Emenda Constitucional nº 02/03

O outro projeto em questão é bem mais polêmico que o anterior e não trata apenas dos servidores requisitados pela Justiça Eleitoral. Trata-se da Proposta de Emenda à Constitucional (PEC) nº 02/03, a qual, se aprovada, permitirá que servidores públicos requisitados optem pela alteração de sua lotação funcional do órgão cedente para o órgão cessionário. Em sua justificativa o autor da proposta, deputado Gonzaga Patriota (PSB/PE), afirma que:

A criação de órgãos públicos implementada por ocasião da promulgação da Constituição Federal de 1988 e enfatizada nos anos posteriores através de Emendas Constitucionais e leis ordinárias esparsas, nem sempre tem sido acompanhada pela pertinente criação de cargos capazes de suprir as necessidades de material humano – servidores públicos – para que exerçam atividades nos mais diversos órgãos situados nas três esferas de Poderes da União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

Ocorre que a crescente demanda por funcionários nestes órgãos tem ocasionado um contínuo deslocamento de servidores de seu órgão de origem para órgão diverso, por meio de requisição, que lá permanecem exercendo atividades por anos a fio.

A incongruência que se verifica na vida funcional do servidor, após tantos anos exercendo atividade diversa da que ordinariamente exerceria no órgão cedente, é relevante ao ponto de se observar que em alguns casos, como se dá, por exemplo, na Justiça Eleitoral e na Justiça do Trabalho, onde muitos servidores já atuam há mais de uma década, e, por isso, já não têm quaisquer afinidades com as suas atividades de origem desempenhadas nos Poderes Executivo e Legislativo.

Daí a necessidade de uma regra constitucional transitória, que sem afastar a prevalência do "princípio do livre acesso aos cargos públicos via concurso", inserto no art. 37, inciso II da Constituição Federal, ampare os servidores que se encontrem na situação de requisitados, em face da distorção imposta pelo desvio de função a que estão submetidos.

Ressalte-se por último, que esta regra transitória não só resolveria o problema daqueles servidores, como também obstaria uma virtual paralização dos serviços públicos essenciais dos órgãos onde eles se encontrem exercendo atividades por requisição. (BRASIL, 2003, p. 26.442).

Esta PEC encontra-se pronta para votação desde 2005 e, a partir daí, dezenas de requerimentos de deputados dos mais diversos partidos políticos foram enviados ao Plenário e à Mesa Diretora da Câmara dos Deputados solicitando a inclusão da mesma na ordem do dia para votação. Após algumas alterações nas comissões da Câmara dos Deputados, o texto da PEC nº 02/03 a ser votado é o seguinte:

Art. 1º O Ato das Disposições Constitucionais Transitórias passa a vigorar acrescido do seguinte art. 95:

"Art. 95. Os servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, ocupantes de cargo efetivo, que se encontrem cedidos a outro órgão, por meio de requisição, em exercício continuado há mais de três anos poderão optar pela efetivação em cargo do órgão cessionário de atribuições semelhantes e do mesmo nível de escolaridade, especialidade ou habilitação profissional do cargo efetivo do órgão de origem.

Parágrafo único. O disposto neste artigo se aplica aos servidores cuja investidura haja observado as correspondentes normas constitucionais e ordinárias anteriores a 5 de outubro de 1988, ou, se posterior a esta data, tenha derivado de aprovação em concurso público de provas ou de provas e de títulos, na forma do disposto no art. 37, II, da Constituição Federal."

Art. 2º O prazo para exercício da opção a que se refere o art. 95 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias será de noventa dias, a contar da data de publicação desta Emenda. (BRASIL, 2005, p. 21.320).

Caso aprovada nestes termos, a proposta permitirá, por exemplo, que milhares de servidores, tanto da União como de Estados e Municípios, passem a integrar, sem concurso público específico, o Judiciário Federal, em especial a Justiça Eleitoral, onde o número de requisitados é bastante expressivo.

Há quem defenda que esta proposta poderia ser legítima caso a mudança de lotação ocorresse somente dentro do mesmo poder para não ser violado o princípio do pacto federativo, ou seja, da autonomia político-administrativa entre os poderes da República, prevista na Constituição Brasileira de 1988 (CASTRO FILHO, 2005). Contudo, acreditamos ser mais correta a posição de que a PEC nº 02/03 fere até mesmo cláusulas pétreas da Carta Magna, a qual prevê no caput do seu art. 5º que todos são iguais perante a lei, o que não deixa de ser um dos pilares da isonomia, isonomia essa que nossa Constituição considera como um dos princípios da Administração Pública. A burla ao instituto do concurso público na nomeação para cargos públicos, prevista nesta PEC, certamente será contestada junto ao Supremo Tribunal Federal, caso a mesma seja aprovada (ROCHA, 2005).

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6 CONCLUSÕES

Conhecendo melhor a história da Justiça Eleitoral no nosso país, verifica-se que esta parte do serviço público teve início exclusivamente com utilização de servidores requisitados. Além disso, é impossível não perceber a grande importância destes mesmos servidores para que o serviço público prestado pelos Tribunais Eleitorais seja considerado exemplo de eficiência. É pública e notória a eficiência na realização das eleições e a rapidez com que seus resultados oficiais são divulgados, situação esta que leva nossos pleitos a serem modelo até para outros países.

Contudo, também é preciso reconhecer que o aumento do quadro de servidores efetivos possibilita uma maior profissionalização da Justiça Eleitoral e uma menor dependência em relação aos outros órgãos governamentais. Parece existir, inclusive, uma conscientização por parte do TSE de que o número ideal de servidores efetivos nos cartórios eleitorais ainda não foi alcançado, como foi visto anteriormente neste trabalho quando abordado o PL nº 7.493/02, que originou a Lei nº 10.842/2004.

Assim, é necessária uma adequação do número de cargos efetivos nas zonas eleitorais, pois não faz sentido que tanto uma zona com dez mil eleitores quanto outra com cem mil tenham o mesmo número de servidores efetivos. Deste modo, é importante que o TSE, paulatinamente, modifique tal situação com a proposição de um projeto de lei que crie novos cargos para as zonas eleitorais, levando em conta, desta vez, o número de eleitores em cada uma delas. Certamente, isto poderá levar a uma diminuição futura da necessidade de servidores requisitados.

Mas, para que isto ocorra, parecem ser necessárias, também, alterações na Lei nº 6.999/82, a qual permite uma requisição para cada dez mil eleitores ou fração superior a cinco mil. Como já demonstrado neste trabalho, pelo menos no TRE-CE, não ocorreu diminuição do número de requisitados nas zonas eleitorais com a chegada dos servidores efetivos previstos na Lei nº 10.842/2004. Caso esta situação se repita na maioria dos estados brasileiros, seria recomendável pesquisar os motivos disto ocorrer e, se for o caso, modificar a lei para forçar a diminuição do número de requisitados. Consequentemente, ocorreria a desoneração dos órgãos da Administração Pública que cedem servidores, diminuindo a dependência da Justiça Eleitoral para com eles. Além disso, um menor número de requisitados tornaria menos oneroso e mais factível a valorização destes servidores através de incentivos como, por exemplo, o pagamento de auxílio-alimentação, conforme prevê o PL nº 3.252/04, anteriormente citado.

Enquanto isso não ocorre, porém, seria interessante que a legislação fosse alterada para permitir a renovação das requisições, evitando a necessidade da publicação de resoluções periódicas do TSE suspendendo os artigos da Resolução TSE nº 20.753/2000 que limitam as referidas renovações.

Neste ponto, torna-se fundamental a pergunta: poderá algum dia a Justiça Eleitoral prescindir totalmente dos servidores requisitados em seus quadros? A nossa avaliação é de que isso dificilmente deverá ocorrer, motivado pelas características únicas da Justiça Eleitoral em relação ao restante do Poder Judiciário Federal. A primeira delas é sua capilaridade. Diferentemente das outras, ela está presente em milhares de municípios brasileiros através dos cartórios eleitorais. Desta forma, qualquer ampliação do número de cargos resulta em considerável aumento dos gastos governamentais, devendo o administrador público consciente pesar o custo-benefício de tal medida.

A outra característica das atividades da Justiça Eleitoral é a sua sazonalidade, ou seja, a variação existente entre a quantidade de atividades necessárias para o funcionamento dos cartórios e secretarias dos Tribunais Eleitorais nos anos com e sem eleição. Apesar de estar longe da realidade o senso comum de que a Justiça Eleitoral só trabalha a cada dois anos, não resta dúvida que suas atividades crescem sobremaneira nos meses que antecedem as eleições, bem como também nos meses seguintes.

Porém, mesmo em anos não eleitorais, os dois cargos efetivos previstos na Lei nº 10.842/04 para cada zona eleitoral são certamente insuficientes para o bom funcionamento da grande maioria delas, como se verifica pelo número reduzido de cartórios eleitorais que funcionam somente com servidores efetivos. Até porque, precisam ser realizadas continuamente atividades de alistamento, transferência e revisão eleitorais, emissão de 2ª via de título de eleitor, visita aos locais de votação, acompanhamento de processos eleitorais, entre outras. Para os anos em que ocorrem eleições e, por conseguinte, aumento nas atividades cartorárias e nas Secretarias dos Tribunais, já existe possibilidade de serem realizadas requisições extraordinárias, conforme, acertadamente, prevê o caput do art. 3º da Lei nº 6.999/82.

A utilização futura somente da faculdade da requisição extraordinária, contudo, certamente requer um amplo estudo para sabermos se este realmente é o melhor caminho não só para manter, como também para aprimorar as atividades da Justiça Eleitoral brasileira.

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Sobre o autor
Edgar Chaves Júnior

Analista Judiciário - Área Administrativa do Tribunal Regional Eleitoral do Ceará. Chefe de Cartório da 29ª Zona Eleitoral do Ceará. Pós-Graduado em Administração Pública pela Faculdade Integrada do Ceará (FIC).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CHAVES JÚNIOR, Edgar. A requisição de servidores públicos para a Justiça Eleitoral do Ceará.: Análise histórica e perspectivas futuras. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1995, 17 dez. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12090. Acesso em: 22 dez. 2024.

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