9. Conclusão
O dano moral, na perspectiva tratada neste ensaio, atinge os direitos da personalidade, também denominados de direitos fundamentais da pessoa, dentre outras expressões usuais em doutrina, envolvendo o trabalhador e o tomador dos serviços, haja ou não vínculo de emprego, enquanto sujeitos de um contrato de trabalho. Hoje são reconhecidos como direitos subjetivos.
A dignidade da pessoa humana é fundamento da república brasileira, sendo atributo inerente ao ser humano, figurando como condição sine qua non para a realização de expressiva parcela dos direitos da personalidade, devendo servir de inspiração para todo o ordenamento jurídico na regulação da vida em sociedade.
O dano moral, ao contrário do que prega parte da doutrina, notadamente a mais antiga, não é a dor, o sofrimento, a humilhação, a angústia, a aflição, que nada mais são que projeções do dano moral, simultaneamente conteúdo e efeito deste.
O dano moral é, na verdade, aquela lesão que atinge algum direito (não-patrimonial) assegurado à pessoa humana pela ordem jurídico-constitucional, privando-a do seu exercício, ou diminuindo-o de algum modo, a exemplo da liberdade, integridade psicofísica, dignidade, reputação, imagem, intimidade e vida privada.
A situação que indicará ser ou não necessário demonstrar o dano moral, em certa medida, condiciona-se à gravidade da conduta irregular alheia e sua aptidão de lesar ou não os direitos não-patrimoniais da pessoa humana. Portanto, somente o caso concreto poderá ensejar investigação e atividade probatória.
Pode-se citar como exemplos o atraso no pagamento de salários e a falta de depósitos do FGTS, que poderão ou não atingir expectativas legítimas do trabalhador, gerando repercussão em sua vida pessoal, familiar e social, e assim, em princípio, revestindo-se de gravidade suficiente para frustrar o exercício de certos direitos, como provocar dano à sua reputação pelo não pagamento aos seus credores (supermercado, farmácia, mensalidade escolar, plano de saúde, financiamento bancário, levando a cobranças públicas e inclusão do seu nome em cadastros de proteção ao crédito).
Muitas vezes, o dano moral é presumido pelo fato em si, considerando sua gravidade e extensão, como o acidente de trabalho, por culpa do empregador, ou na hipótese de aplicação da teoria do risco, que causa deformação física, atingindo o direito à integridade física, ou a morte do trabalhador, lesando o direito dos seus familiares à integridade psíquica.
A reparação pecuniária, finalmente, tem por finalidade principal compensar a perda de um ou mais direitos, ou sua diminuição, acarretados pela conduta culposa do agente ativo ou pelo risco da atividade econômica do tomador dos serviços, pois, não tem aquela o condão de restabelecer o status quo ante, somente possível quando se cuida de ressarcimento de dano ao patrimônio.
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Notas
- Para Dinamarco, em seu sentido mais amplo, a tutela jurídica é definida como sendo "a proteção que o Estado confere ao homem para a consecução de situações consideradas eticamente desejáveis segundo os valores vigentes na sociedade – seja em relação aos bens, seja em relação a outros membros do convívio", esclarecendo que a tutela jurídica estatal realiza-se em dois planos: o da fixação de preceitos reguladores da convivência e o das atividades destinadas à efetividade desses preceitos. Sinteticamente, pode-se dizer que tutela jurídica é a proteção conferida pelo Estado, através das disposições contidas no ordenamento jurídico, seja através de um órgão administrativo, seja por meio de um órgão jurisdicional. Tem-se a expectativa de que haja o cumprimento voluntário das disposições integrantes do ordenamento jurídico, mas, sabidamente, nem sempre isso se sucede, e diante da violação da lei, incumbe ao Estado assegurar a atuação do direito objetivo, mediante a imprescindível provocação do interessado, fazendo surgir o que se denomina de tutela jurisdicional (apud PAROSKI, Mauro Vasni. Direitos fundamentais e acesso à justiça na Constituição. São Paulo: LTr, 2008, p. 199-201).
- Cumpre esclarecer que não é fácil a tarefa de se conceituar o que vem a ser bem. Há, ainda, o termo coisa. Os conceitos não pertencem apenas aos domínios do Direito e nem se restringem a uma determinada disciplina jurídica. No Direito Civil, a primeira noção é a de que BEM é tudo aquilo que tem existência corpórea (uma casa, um veículo, um imóvel) ou incorpórea (direitos autorais, direitos obrigacionais, energia elétrica, energia térmica, energia fonética), desde que tenha valor econômico, seja útil para satisfazer alguma necessidade ou interesse humano e seja raro (utilidade e raridade). Nesse enfoque, nem toda COISA é um BEM que tenha relevância para o Direito. Noutra noção, diz-se que BEM é tudo que pode ser objeto de relações jurídicas. Numa perspectiva mais ampla, BEM, em sentido jurídico, não é apenas isso. O conceito de bem jurídico abarca não apenas as categorias de bens reguladas pelo Código Civil (art. 79 a 103), e nem todo BEM, seguramente, pode ser objeto de relações jurídicas, assim como, nem todo BEM tem valor econômico. Portanto, parece mais apropriado compreender BEM como tudo que pode ser objeto do DIREITO, não necessariamente de relações jurídicas. Nesse conceito, estão incluídos, além das categorias tradicionais do Direito Civil (que compõem o chamado PATRIMÔNIO), também os direitos da personalidade, que não têm valor econômico, embora sua violação possa resultar em dano patrimonial, e que nem por isso deixa de ter interesse para o Direito, pois, deste recebe tutela na Constituição e nas leis infraconstitucionais, como a vida, a liberdade, a dignidade, o nome, a honra, a integridade psicofísica, a imagem e a intimidade. Apropriadas são as palavras de Nery Júnior: Preferimos usar a expressão ‘patrimônio’ com o sentido daquilo que contém tudo quanto seja suscetível de se tornar objeto de direito, considerando como bens tudo quanto possa ser desejado e cobiçado pelos homens e, por isso, alvo de proteção e tutela do direito, quer se tratem de coisas materiais, quer se tratem de bens imateriais, quer componham aquilo que em linguagem coloquial se usa explicitar como ‘patrimônio moral’ de alguém (Código Civil Comentado, 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 221).
- Lembra Theodoro Júnior que: No convívio social, o homem conquista bens e valores que formam o acervo tutelado pela ordem jurídica. Alguns deles se referem ao patrimônio e outros à própria personalidade humana, como atributos essenciais e indisponíveis da pessoa. É direito seu, portanto, manter livre de ataques ou moléstias de outrem os bens que constituem seu patrimônio, assim como preservar a incolumidade de sua personalidade (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Dano moral. 4a ed. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2001, p. 1).
- RODRIGUES, Sílvio. Direito civil: responsabilidade civil. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 1979.
- Dicionário da Língua Portuguesa Caldas Aulete, versão digital. Disponível em: http://baixatudo.globo.com/Baixatudo/Categoria/Aprender_e_descobrir. Acesso em: 30 maio. 2008.
- VARELA, João de Matos Antunes. Direito das obrigações. Rio de Janeiro: Forense, 1977, p. 241.
- Os direitos da personalidade são pluridisciplinares. Não se pode dizer, no estágio atual, que eles situam-se no direito civil ou no direito constitucional, ou na filosofia do direito, com exclusividade. Sua inserção na Constituição deu-lhes mais visibilidade, mas não os subsumiu inteiramente nos direitos fundamentais. Do mesmo modo, a destinação de capítulo próprio do novo Código Civil brasileiro, intitulado "Dos Direitos da Personalidade", não os fazem apenas matéria de direito civil. O estudo unitário da matéria, em suas dimensões constitucionais e civis, tem sido melhor sistematizado no direito civil constitucional, apto a harmonizá-las de modo integrado. (...) Os direitos da personalidade são direitos subjetivos, sem a restrição histórica que estes tiveram, de exprimirem e perseguirem valores econômicos, segundo o paradigma do direito de propriedade. São direitos subjetivos não patrimoniais, no sentido de estarem previstos e tutelados pelo direito objetivo. Assim, todos os direitos subjetivos que não tenham objeto econômico e sejam inatos e essenciais à realização da pessoa são direitos da personalidade (NETTO LÔBO, Paulo Luiz. Danos morais e direitos da personalidade. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/4445>. Acesso em: 03 jun.2008).
- A personalidade civil, ou simplesmente, personalidade, é a qualidade de quem é pessoa e é a marca determinante de individualização do sujeito como sendo aquele determinado e específico sujeito de direito, não outro. (...) Todo o direito objetivo e, portanto, todo o direito subjetivo foi criado para satisfazer interesses humanos. (...) Essa capacidade de ser sujeito de direito (inerência da personalidade) dota também a pessoa dos atributos que a distinguem dos outros sujeitos de direito (...), e especifica aspectos que irão contribuir, ao depois, para o traço próprio da individualidade de cada qual, criando o arcabouço daquilo que se entende por indivíduo. (...) Dá-se o nome de atributos da personalidade aos elementos que permitem a identificação precisa da pessoa, sujeito de direito. (...) São atributos da personalidade os seguintes: a) nome; b) estado; c) domicílio; d) capacidade; e) fama (NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil Comentado. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 165).
- Op. cit., p. 179-180.
- BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade. 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006, p. 1.
- AMARAL, Francisco. Direito Civil: introdução. 4ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 243.
- Carrejo, afirma: en el lenguaje jurídico actual la expresión ‘derechos de la personalidad’ tiene significado particular, referido a algunos derechos cuya función se relaciona de modo más directo con la persona humana, pues se dirigen a la preservación de sus más íntimos e imprescindibles intereses. En efecto, esos derechos constituyen un mínimo para asegurar los valores fundamentales del sujeto de derecho: sin ellos, la personalidad quedaría incompleta e inperfecta, y el indivíduo, sometido a la incertidumbre en cuanto a sus bienes jurídicos fundamentales (CARREJO, Simón. Derecho Civil. Bogotá: Themis, 1972, p. 299).
- Para De Cupis: Não é possível denominar os direitos da personalidade como ‘direitos inatos’, entendidos no sentido de direitos respeitantes, por natureza à pessoa. Entende este autor que com as modificações sociais, transforma-se, igualmente, o âmbito e os valores dos direitos essenciais à personalidade (DE CUPIS, Adriano. Os direitos da personalidade. Lisboa: Livraria Morais Editora, 1961, p. 18).
- Não obstante alguns estudiosos se referirem a patrimônio moral, tradicionalmente assim não é concebido pela doutrina, como se vê de Diniz: O patrimônio é o complexo de relações jurídicas de uma pessoa, apreciáveis economicamente. Incluem-se no patrimônio: a posse, os direitos reais, as obrigações e as ações correspondentes a tais direitos. O patrimônio abrange direitos e deveres redutíveis a dinheiro, conseqüentemente nele não estão incluídos os direitos da personalidade, os direitos pessoais entre cônjuges, os direitos oriundos do poder familiar, os direitos políticos (DINIZ, Maria Helena. Código Civil anotado. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 100-101).
- Os bens imateriais da pessoa (parte deles consistente em direitos da personalidade) não se esgotam no restrito rol do inc. X, do art. 5º, da Constituição (intimidade, vida privada, honra e imagem), que apenas menciona que os mesmos são invioláveis, e na hipótese de ofensa, o dano daí derivado (material e moral) é passível de indenização. Trata-se de lista meramente exemplificativa, dúvida não podendo haver sobre isso. Ou será que a igualdade, a liberdade e a dignidade, nessa perspectiva e conforme as características particulares que só o caso concreto pode oferecer, quando agredidas, não são "bens" ou "direitos" da pessoa? Alexandre Agra Belmonte/Leonardo Dias Borges ensinam: Com efeito, se um dos fundamentos da República Federativa do Brasil é a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CRFB) e o direito à dignidade consiste no respeito à integridade física e psíquica das pessoas, através dos pressupostos materiais e imateriais mínimos necessários ao exercício da vida e da liberdade (mínimo existencial), a violação à dignidade também caracteriza dano moral, independentemente de repercussão nos sentimentos da pessoa humana. Revista LTR79-02/149.
- DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 2ª ed. São Paulo: LTR, 2003, p. 608/609.
- CAHALI, Yussef Said. Dano moral. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 22.
- TEIXEIRA FILHO, João de Lima. Instituições de direito do trabalho. 19ª ed. São Paulo: LTr, 2000, p. 632.
- COUTO MACIEL, José Alberto. O trabalhador e o dano moral. São Paulo: Síntese Trabalhista. Maio. 1995, p. 8.
- DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 730, v. 2.
- DALAZEN, João Oreste. Aspectos do dano moral trabalhista. Revista do Tribunal Superior do Trabalho, Brasília, v. 65, n. 1, p. 69-84 out./dez. 1999.
- Como muito bem ensina Netto Lobo: A rica casuística que tem desembocado nos tribunais permite o reenvio de todas os casos de danos morais aos tipos de direitos da personalidade. Nenhum dos casos deixa de enquadrar-se em um ou mais de um tipos, conforme acima analisados. A referência freqüente à "dor" moral ou psicológica não é adequada e deixa o julgador sem parâmetros seguros de verificação da ocorrência de dano moral. A dor é uma conseqüência, não é o direito violado. O que concerne à esfera psíquica ou íntima da pessoa, seus sentimentos, sua consciência, suas afeições, sua dor, correspondem a dos aspectos essenciais da honra, da reputação, da integridade psíquica ou de outros direitos da personalidade. O dano moral remete à violação do dever de abstenção a direito absoluto de natureza não patrimonial. Direito absoluto significa aquele que é oponível a todos, gerando pretensão à obrigação passiva universal. E direitos absolutos de natureza não patrimonial, no âmbito civil, para fins dos danos morais, são exclusivamente os direitos da personalidade. Fora dos direitos da personalidade são apenas cogitáveis os danos materiais (Op. cit.).
- Nesse tema, adverte Valler, citando Zannoni: Todavia, essas dores, angústias, aflições, humilhações e padecimentos (...) não são mais do que estados de espírito, conseqüência do dano. A dor que experimenta a viúva pela morte violenta de seu esposo, a humilhação de quem tenha sido publicamente injuriado ou caluniado, o padecimento de quem deve suportar um dano estético visível, a tensão ou violência que experimenta quem tenha sido vítima de um ataque à sua vida privada, etc. ‘son estados del espiritu de algún modo contingentes y variables en cada caso y que cada cual siente o esperimenta a su modo’. Estes estados de espírito constituem o conteúdo do dano, e o direito não ressarce qualquer dor, humilhação, aflição ou padecimento, senão aqueles que sejam conseqüência da privação de um bem jurídico sobre o qual ‘el dolorido, humillado, padeciente o afligido tenia um interés reconocido juridicamente’. (...) O que define o dano moral, como afirma acertadamente ZANNONI, não são, em si, a dor e os padecimentos. ‘Ellos serán resarcibles a condición de que se provoquem por la lesión a una faculdad de actuar que impide o frustra la satisfacción o goce de intereses no patrimoniales reconocidos a la victima del evento dañoso por el ordenamiento juridico. Y estos intereses, es prudente reiterarlo, pueden estar vinculados tanto a derechos patrimoniales como a derechos extrapatrimoniales’ (A reparação do dano moral no direito brasileiro. São Paulo: E.V. editora, 1994).
- MOARES, Maria Celina Bodin de. Danos à pessoa humana: uma leitura civil-constitucional dos danos morais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 130-131.
- Geralmente a idéia de moral está vinculada à ética, ao caráter e aos costumes. É o procedimento que está em conformidade com o direito, os bons costumes, a honestidade e a justiça. Essa compreensão, entretanto, não é apropriada para que seja entendido o dano de ordem moral. Na acepção que interessa ao Direito, o dano moral se reveste de conseqüências jurídicas, que nem sempre vêm acompanhadas de conteúdo ético. Muitas vezes as infrações às regras éticas não têm repercussão no âmbito do Direito. Determinada conduta ofensiva pode não ser moralmente reprovável pela sociedade, mas, ainda assim, ser lesiva a bens imateriais do ofendido. Logo, moral é o adjetivo que define o dano causado a bens imateriais, insuscetíveis de apreciação econômica, não se confundindo com a conduta de quem praticou a ofensa, se está ou não em harmonia com aquilo que a sociedade concebe como sendo preceitos morais. Este aspecto é irrelevante para o estudo do dano e seus efeitos (apud PAROSKI, Mauro Vasni. Dano moral e sua reparação no Direito do Trabalho. Curitiba: 2005, p. 45).
- BENASSE, Paulo Roberto. A personalidade, os danos morais e sua liquidação de forma múltipla. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 59-60.
- LOPEZ, Teresa Ancona. O dano estético: responsabilidade civil. 2ª ed. São Paulo: RT, 1999, p. 24-25 e 127. Apud Paulo Roberto Benasse, op. cit., p. 60-61.
- Leciona Moraes, com precisão: Aquele que sofre um dano moral deve ter direito a uma satisfação de cunho compensatório. Diz-se compensação, pois o dano moral não é propriamente indenizável; ‘indenizar’ é palavra que provém do latim, ‘in dene’, que significa devolver (o patrimônio) ao estado anterior, ou seja, eliminar o prejuízo e suas conseqüências – o que, evidentemente, não é possível no caso de uma lesão de ordem extrapatrimonial. Prefere-se, assim, dizer que o dano moral é compensável, embora o próprio texto constitucional, em seu artigo 5º, X, se refira a indenização do dano moral (Op. cit., p. 145).
- Para ilustrar, segundo narrado por magistrado do trabalho no Paraná, há uma demanda em que o trabalhador pede do empregador reparação por dano moral, em razão de que no trajeto de sua casa para o local da prestação dos serviços, foi mordido por um cão abandonado, e ao chegar para trabalhar não recebeu a devida atenção do seu superior hierárquico. E quem patrocina a causa não parece ter nenhum constrangimento em tentar ser bem sucedido na pretensão.
- Ensina Gustavo Tepedino: A prioridade conferida à cidadania e à dignidade da pessoa humana (art. 1º, I e III, CF), fundamentos da República, e a adoção do princípio da igualdade substancial (art. 3º, III), ao lado da isonomia formal do art. 5º, bem como a garantia residual estipulada pelo art. 5º, § 2º, CF, condicionam o intérprete e o legislador ordinário, modelando todo o tecido normativo infraconstitucional com a tábua axiológica eleita pelo constituinte. Com efeito, a escolha da dignidade da pessoa humana como fundamento da República, associada ao objetivo fundamental de erradicação da pobreza e da marginalização, e de redução das desigualdades sociais, juntamente com a previsão do § 2º do art. 5º, no sentido da não exclusão de quaisquer direitos e garantias, mesmo que não expressos, desde que decorrentes dos princípios adotados pelo texto maior, configuram uma verdadeira cláusula geral de tutela e promoção da pessoa humana, formada como valor máximo pelo ordenamento (A tutela da personalidade no ordenamento civil-constitucional brasileiro. Temas de direito civil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2001).
- Outro não tem sido o entendimento da doutrina especializada, como se observa das lições de Santos: O que caracteriza o dano moral é a conseqüência de algum ato que cause dor, angústia, aflição física ou espiritual ou qualquer padecimento infligido à vítima em razão de algum evento danoso. É o menoscabo a qualquer direito inerente à pessoa, como a vida, integridade física, a liberdade, a honra, a vida privada e a vida de relação. O dano moral somente ingressará no mundo jurídico, com a conseqüente obrigação de indenizar, em havendo alguma grandeza no ato considerado ofensivo a direito personalíssimo. Se o ato tido como gerador do dano extra-patrimonial não possui virtualidade para lesionar sentimentos ou causar dor e padecimento íntimo, não existiu o dano moral passível de ressarcimento. Para evitar a abundância de ações que tratam de danos morais presentes no foro, havendo uma autêntica confusão do que seja lesão que atinge a pessoa e do que é mero desconforto, convém repetir que não é qualquer sensação de desagrado, de molestamento ou de contrariedade que merecerá indenização. O reconhecimento do dano moral exige determinada envergadura. Necessário, também, que o dano se prolongue durante algum tempo e que seja a justa medida do ultraje às afeições sentimentais. As sensações desagradáveis, por si sós, que não trazem em seu bojo lesividade a algum direito personalíssimo, não merecerão ser indenizadas. Existe um piso de inconvenientes que o ser humano tem de tolerar, sem que exista o autêntico dano moral (SANTOS, Antonio Jeová. Dano Moral Indenizável. 4ª edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p.113).
- A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I – a soberania; II – a cidadania; III – a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político.
- NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 45.
- GOMES, Dinaura Godinho Pimentel. Direito do trabalho e dignidade da pessoa humana, no contexto da globalização econômica: problemas e perspectivas. São Paulo: LTr, 2005, p. 21.
- Op. cit., p. 46, 48-49.
- A dignidade da pessoa humana, como fundamento de um estado de direito, guarda estreita relação com os direitos da personalidade, para muitos denominados de direitos fundamentais da pessoa. Conforme Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos: Os direitos da personalidade, que têm como objeto os atributos físicos, psíquicos e morais da pessoa em si e em suas projeções sociais, na defesa da essência do ser humano, de início, chegaram a ser negados como direitos subjetivos, sob a alegação de que não poderia haver direito do homem sobre ele mesmo. No entanto, com a evolução da ciência jurídica, impôs-se o reconhecimento dos direitos da personalidade, que transcendem o ordenamento positivo, por encontrarem a ‘ratio essendi’ no direito natural. In BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade. 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006, prefácio.
- Apud SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais. 3ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado editora, 2004, prefácio.
- SARLET, op. cit., p. 59.
- Op. cit., p. 59-60.
- Ilustra-se, com as seguintes decisões: 1) DANO MORAL - INEXISTÊNCIA - Para configuração do dano moral é preciso, inequivocamente, a prova de três circunstâncias, da efetiva ocorrência de uma ação ou omissão, dos efeitos produzidos (dano)- e do nexo causal, de tal forma que se possa dizer extreme de dúvida que houve ação ou omissão culposa ou dolosa do empregador. Ou seja, o dano moral passível de reparação exige prova robusta da prática do ilícito, além da ampla demonstração do prejuízo sofrido, requisitos que observo não restaram demonstrados nos autos. Sentença que se reforma para excluir o pagamento de indenização por danos morais. TRT-PR-02327-2005-513-09-00-7-ACO-06041-2007 – 4ª TURMA - Publicado no DJPR em 09-03-2007. 2) Os fatos alegados pelo reclamante não autorizam concluir que causaram um dano moral. O dano moral, passível de indenização pecuniária, não pode ser presumido, exigindo prova real e efetiva de sua existência. Na esfera trabalhista a indenização por dano moral, inserida entre os direitos não patrimoniais, somente é cabível quando a agressão perpetrada pelo empregador fere a dignidade do trabalhador. A honra possui um valor subjetivo, de manifestação complexa e difícil de ser definida. Esse bem jurídico se apresenta sobre dupla face, uma interna, honra em sentido subjetivo, outra externa, honra em sentido objetivo. Mas, seja qual for a modalidade da lesão, para que tenha relevância jurídica, a ofensa à honra deve denegrir a imagem, a reputação, com conseqüências nocivas à consideração e o respeito que cercam o ofendido no meio em que vive ou trabalha. Esses fatos não estão demonstrados no caso presente, sendo que a rescisão do contrato antes do prazo final, por si só, não faz presumir a existência de dano moral. De outra parte, a alegada perseguição em razão de paralisação do serviço visando o recebimento de salários não restou provada. Dessa forma, o juízo não poderá acolher o pedido de indenização por dano moral. Sentença - TRT-PR-RT-00620-2006-072-09-00-7.
- Assim têm entendido os Tribunais Regionais do Trabalho: 1) DANO MORAL - ATRASO NO PAGAMENTO DE SALÁRIOS - INDENIZAÇÃO - NÃO-CABIMENTO - É certo que a mora salarial pode causar inúmeras dificuldades e dissabores ao empregado, mas não alberga a pretendida indenização por dano moral, pois, para a espécie, já existe sanção própria, qual seja: a rescisão indireta do contrato de trabalho, com os consectários inerentes. Refira-se, ademais, que a reclamada, visando amenizar o impacto das dificuldades econômicas que a compeliram a atrasar os salários, forneceu cestas básicas a seus empregados. Improcedência que se mantém. TRT 15ª R. - RO 37.322/2000-6 - 5ª T. - DJSP 04.03.2002 - p. 09. 2) DANO MORAL. ATRASO NO PAGAMENTO DE VERBAS SALARIAIS. INDENIZAÇÃO. NÃO CABIMENTO. Para que se configure o ato ilícito faz-se imprescindível a presença dos seguintes requisitos: fato lesivo voluntário, decorrente de ação ou omissão, por negligência ou imprudência do agente; dano material ou moral experimentado pela vítima; e nexo causal entre o dano sofrido e o comportamento do agente, sem os quais não cabe o pleito indenizatório. O mero atraso no pagamento de verbas salariais não tem a automática repercussão moral, tratando-se de dano distinto daquele de cunho patrimonial. Necessária a demonstração da sujeição do trabalhador a lesão em sua esfera moral, causando-lhe efetivo dano. Com efeito, a prova do dano torna-se imprescindível à obrigação de indenizar, constituindo ônus de prova do reclamante (arts. 818 da CLT e 333, I, do CPC). Recurso Ordinário da Reclamante a que se nega provimento. TRT-PR-01909-2005-411-09-00-5-ACO-05738-2007-publ-06-03-2007.
- Nessa direção, andaram bem as decisões abaixo transcritas: 1) De qualquer forma, ainda que assim não fosse, entendo que a obrigação pela reparação surge com o simples fato da violação, não se exigindo do lesado demonstração do sofrimento, pois uma mesma conduta pode caracterizar dano para uma pessoa e não para outra, pois este é sentido em diferentes gradações, tendo caráter subjetivo, dependendo, não raras vezes, da personalidade do ofendido. Seria irrelevante, portanto, se não existisse prova robusta do sofrimento ou do prejuízo íntimo para o recorrido. TRT-PR-99506-2005-660-09-00-4-ACO-28027-2007-publ-28-09-2007. 2) Ação de indenização. Doença profissional gerando incapacidade para o trabalho. LER ou DORT. Cerceamento de defesa. Nexo causal. Juros moratórios. Danos morais. Precedentes da Corte. (...) 4. A jurisprudência da Corte já assentou que não há falar em prova do dano moral, mas, apenas, do fato que lhe deu causa. 5. Recurso especial conhecido e provido, em parte. REsp 595.355/MG - Ac. 3ª T - Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito - DJ 11.4.2005, p. 290. 3) Na concepção moderna da reparação do dano moral prevalece a orientação de que a responsabilização do agente se opera por força do simples fato da violação, de modo a tornar-se desnecessária a prova do prejuízo em concreto. STJ, 4ª T., R. Esp. nº 173.124/RS, Rel. Min. César Asfor Rocha, DJ 19.11.01.
- Colhe dos ensinamentos de Cavalieri Filho: Por se tratar de algo imaterial ou ideal a prova do Dano Moral não pode ser feita através dos mesmos meios utilizados para a comprovação do dano material. Seria uma demasia, algo até impossível, exigir que a vítima comprove a dor, a tristeza ou a humilhação através de depoimentos, documentos ou perícia; não teria ela como demonstrar o descrédito, o repúdio ou o desprestígio através dos meios probatórios tradicionais, o que acabaria por ensejar o retorno à fase da irreparabilidade do dano moral em razão de fatores instrumentais (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 100-101). Lecionam Garat e Sacchi: São as conseqüências que o juiz, como homem, e como qualquer homem criterioso, atendendo ao que ordinariamente acontece (quod plerumque accidit) extrai dos fatos da causa, ou suas circunstâncias, e nas quais assenta sua convicção quanto ao fato probando, baseadas no critério da anormalidade ou em certos standards jurídicos (GARAT, Annabel; SACCHI, Carlos. Manual de responsabilidad extracontractual. Tomo I, p. 188. Apud VALLER, Wladimir. A Reparação do Dano Moral no Direito Brasileiro. São Paulo: E.V. Editora, 1994). Para Diniz: A reparação de dano moral supõe que tenha havido lesão a um interesse que visa a satisfação ou gozo de um bem jurídico extrapatrimonial contido nos direitos da personalidade (como a vida, a integridade corporal, a liberdade, a honra, o decoro, a intimidade, os sentimentos afetivos, a própria imagem) ou nos atributos da pessoa (como o nome, a capacidade, o estado de família) (DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro).
- Nessa linha de raciocínio, as seguintes ementas: 1) ACIDENTE DE TRABALHO - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - Cabe às empresas cumprir e fazer cumprir as normas de segurança do trabalho, instruindo seus empregados, através de ordens de serviço, quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais. Não logrando o empregador provar qualquer fato excludente da responsabilidade pelo acidente do trabalho ocorrido, impõe-se o reconhecimento da culpa in vigilando e in eligendo, condenando-o ao pagamento de indenização por danos morais. TRT 8ª R. - RO 01260-2004-003-08-00-0 - 1ª T. - J. 24.10.2006. 2) INDENIZAÇÃO DANO MORAL - ACIDENTE DO TRABALHO - O não cumprimento do dever legal de adoção e uso de medidas individuais e coletivas de proteção e segurança do trabalhador, resulta na culpa do empregador pela ocorrência do acidente do trabalho, circunstância suficiente para imprimir-lhe a obrigação de reparar os danos morais advindos do infortúnio laboral. TRT 9ª R. - Proc. 01691-2004-071-09-00-9 - (06222-2006) - DJPR 7.3.2006.