CONCLUSÃO
Por todo o exposto, sustentamos inadmissível a estipulação de jornadas superiores a 10 horas em contratos individuais de trabalho, acordos coletivos, convenções coletivas e mesmo em acórdãos normativos, por contrariar o texto constitucional, o ordenamento jurídico vigente e os princípios que informam o Direito do Trabalho.
Tendo os magistrados trabalhistas necessidade de pronunciamento sobre o tema aqui examinado, que sigam o ensinamento de Alípio Silveira, citado por Ismair Roberto Poloni:
"Alípio Silveira faz registrar, em estudo sobre a lógica do razoável, que a lógica, como ciência formal, não pode ser aplicada ao direito, que não possui silogismos e enunciados mas sim normas que são aplicadas a cada caso, buscando-se como solução a justiça, aplicando-se, para tanto, a lógica do razoável na interpretação da norma, isto é, na exegese da norma; deve o julgador ser suficientemente flexível em sua interpretação, e não matemática e estritamente interpretativo, buscando, sempre dentro da ordem jurídica expressa, aquilatar as circunstâncias do fato e do direito, a fim de ser o mais justo possível. Não se admite, a bem da verdade, possa o julgador inovar, criando direito inexistente ou julgando contra a lei. Mas deve, pela própria natureza evolutiva do direito e das relações humanas, interpretar a norma, ainda que por equidade, de forma razoável, flexível e justa, de conformidade com o momento histórico e com as circunstâncias especiais de cada caso" [29].
Conseqüentemente, deve a Justiça do Trabalho, nos feitos que versem sobre duração diária do trabalho superior a 10 horas, declarar a nulidade das cláusulas insertas em quaisquer instrumentos e que prevejam tal jornada, não sendo demais sugerir a atuação do Ministério Público do Trabalho com a finalidade buscar a anulação, através de ações próprias, cláusulas que tais.
Que nossos magistrados trabalhistas atuem como os sifograntes – "sábios em idade madura", magistrados eleitos por trinta famílias -, narrados por Thomas Morus em sua obra A Utopia [30], impedindo que os empregados sejam explorados por empregadores ávidos em lucrar sem limites com a exploração da força de trabalho alheia.
Notas
- SÜSSEKIND, Arnaldo et alii. Instituições de Direito do Trabalho, volume 2. 19 ed. Rio de Janeiro: LTr, 1999, p. 800.
- KROST, Oscar. A Caracterização do Regime de Sobreaviso Diante das Inovações Tecnológicas dos Meios de Comunicação; in Revista Justiça do Trabalho. Porto Alegre: HS Editora, 2007, v. 283, p. 47.
- NETTO, José Nascimento Araújo. Liberalismo e Justiça do Trabalho: Seis Décadas de Confronto. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 109 e 110.
- MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional – Teoria da Constituição. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 125.
- BARROSO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas – Limites e Possibilidades da Constituição Brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 286 e 287.
- Op. cit., p. 287.
- Op. Cit., p. 312 e 313.
- Op. Cit., p. 316.
- NETTO, José Nascimento Araújo. Op. Cit., p. 114.
- Op. Cit., p. 112.
- CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional. Coimbra: Almedina, 1993, p. 227.
- Op. Cit., p. 315 e 316.
- BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 200.
- Op. Cit., p. 496.
- Sentença proferida no processo 333-2007-064-01-00-7.
- Notícias do TST, 10 de agosto de 2006.
- Notícias do TST, 2 de outubro de 2007.
- Notícias do TST, 5 de outubro de 2007.
- Notícias do TST, 5 de outubro de 2007.
- E não se diga que os trabalhadores aceitam de bom grado tais escalas, porquanto, como noticiado em O Liberal de 10 de abril de 2007, mais de 32 milhões de trabalhadores extrapolam a jornada normal com a finalidade de prover sua subsistência com o recebimento de horas extras.
- Op. Cit., p. 9.
- OLEA, Manuel Alonso. Introdução ao Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 1984, p. 234.
- BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. 9. ed. Campus, 1991, p. 21.
- CANOTILHO, J.J. Gomes. Fundamentos da Constituição. 6. ed. Coimbra: Almedina, 1993.
- MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade. Estudos de Direito Constitucional. São Paulo: Celso Bastos, 1998, p. 32.
- CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 3. ed. Coimbra: Almedina, 1998, p. 255 e 256.
- VIEIRA, Oscar Vilhena. A Constituição e sua Reserva de Justiça. Um ensaio sobre os limites materiais ao poder de reforma. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 224.
- LICC, art. 5º. Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum; CLT, art. 8º, caput: As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente de direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.
- POLONO, Ismair Roberto. Técnica Estrutural da Sentença Cível. Juízo Comum e Juizado Especial. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 74.
- MORUS, Thomas. A Utopia. Rio de Janeiro: l&PM, 2006, p. 76: "A principal e quase única função dos sifograntes é zelar que ninguém permaneça inativo, mas que se entregue ativamente ao seu ofício, não porém a ponto de nele se esgotar do nascer do dia ao cair da noite, como um animal de carga, existência pior que a dos escravos, e que no entanto é a dos operários em quase todos os países, exceto em Utopia".