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A Justiça do Trabalho do ano 2000:

as Leis 9756/98, 9957 e 9958/00 e a EC 24/99

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01/02/2000 às 01:00
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RITO SUMARÍSSIMO

Importante conquista para a modernização do Processo do Trabalho foi a aprovação, no final de 1999, do PL 4.693/98 (PLC 28/99 no Senado), relativo à instituição do procedimento sumaríssimo para as pequenas causas trabalhistas. O projeto, de autoria do Tribunal Superior do Trabalho, foi encampado pelo governo, que se empenhou para sua aprovação, como contribuição concreta para a modernização da Justiça do Trabalho.

A nova Lei 9.957, de 12 de janeiro de 2000, representa elemento de suma importância para o desafogamento dos Tribunais do Trabalho e a simplificação procedimental na 1ª instância, diminuindo o formalismo e imprimindo celeridade aos julgamentos.

Com efeito, pela nova lei, as causas de valor até 40 salários mínimos terão tratamento procedimental mais célere, através do rito sumaríssimo (CLT, art. 852-A), que corresponde aos juizados de pequenas causas na Justiça Comum. Com ela, teremos:

Solução das demandas trabalhistas em audiência única (CLT, art. 852-C), no prazo máximo de 15 dias (CLT, art. 852-B, III), podendo dilatar-se para no máximo 45 dias (CLT, art. 852-H, § 7º), em caso de haver necessidade da produção de prova pericial (CLT, art. 852-H, § 4º);

Possibilidade da lavratura dos acórdãos nos tribunais pela simples certidão de julgamento, consignando-se que a sentença foi mantida pelos seus próprios fundamentos, quando confirmada pelo Tribunal (CLT, art. 895, § 1º, IV);

Limitação do recurso de revista, nas causas sujeitas ao rito sumaríssimo, às hipóteses de violação à Constituição ou contrariedade a súmula do TST (CLT, art. 896, § 6º).

O projeto previa ainda, para o recurso ordinário, a mesma feição do recurso de revista, limitando às questões jurídicas sua abrangência. No entanto, por acordo com a CNI, cuja bancada na Câmara dos Deputados não admitia a aprovação do projeto sem a possibilidade de revisão da matéria fática em 2ª instância, o inciso I do § 1º do art. 895 da CLT, acrescentado pelo projeto, acabou sendo vetado, de modo a garantir o duplo grau de jurisdição em questões de fato.

Também restaram vetados os §§ 2º do art. 852-I e 5º do art. 852-H: o primeiro em razão da impossibilidade do juiz verificar os cálculos no momento da audiência, para prolatar sentença líqüida na própria audiência única; e o segundo, pelo possível cerceamento ao direito de ampla defesa que poderia ocorrer no afastamento rotundo da indicação de assistente técnico para elaboração da perícia.

Tais vetos decorreram do acordo firmado no Senado Federal, com o Senador MOREIRA MENDES, relator do projeto, para sua aprovação imediata, sem que houvesse necessidade de alterações de redação que, mesmo que pudessem supor um aperfeiçoamento do texto original, comprometeriam sua pronta entrada em vigor, por carecer de reexame das modificações pela Câmara dos Deputados.

Assim, com período de vacância de 60 dias, necessários para que as novas Varas Trabalhistas possam se preparar para adotá-lo de imediato quando entrar em vigor, o novo rito sumaríssimo no Processo do Trabalho representará um significativo avanço na pronta solução das pequenas causas laborais, ofertando ao trabalhador um instrumento célere e efetivo de obtenção do respeito aos seus direitos fundamentais no campo trabalhista.

O receio que o setor patronal demonstrou, durante a tramitação do projeto no Congresso Nacional, no sentido de que o atrativo de um processo célere poderia estimular a corrida à Justiça do Trabalho, com a propositura de ações temerárias, mas com boas perspectivas de sucesso, em face do desaparelhamento da 1ª instância para fazer frente ao propalado aumento de 80% nas reclamatórias trabalhistas, não tem razão de ser, uma vez que o projeto em tela foi encaminhado, discutido e aprovado concomitantemente com o projeto de lei que institui as comissões de conciliação prévia no âmbito das empresas e dos sindicatos, como instância prévia de composição dos conflitos laborais, o que contribuirá para desafogar a 1ª instância, como um dique de contenção dos dissídios individuais, que permitirá uma análise consciente e ponderada das demandas que escaparem à conciliação voluntária das partes.


COMISSÕES DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA

O PL 4.694/98, enviado pelo governo e também elaborado originariamente pelo TST, concernente às comissões de conciliação prévia, foi alvo de acentuados debates, sendo consideravelmente alterado até a sua aprovação final, para se transformar na Lei 9.958, de 12 de janeiro de 2000.

A idéia original era a de que as referidas comissões fossem obrigatoriamente instituídas nas empresas com mais de 50 empregados, como forma de se obter, impositivamente, a adoção do modelo de composição autônoma dos conflitos individuais de trabalho.

Nas reuniões promovidas pelo Min. FRANCISCO DORNELLES no Ministério do Trabalho para discutir o projeto com as 4 Centrais Sindicais (CUT, CGT, Força Sindical e SDS) e nas consultas formuladas informalmente a 4 das principais Confederações Patronais (CNI, CNC, CNA e FENABAN), dois pontos se destacaram como pomos de discórdia entre patrões e empregados:

O setor obreiro insistia na garantia de estabilidade aos empregados que fossem eleitos para as comissões de conciliação prévia, como forma de assegurar sua atuação imparcial e autônoma (o projeto original não contemplava a estabilidade);

O setor patronal rejeitava o modelo impositivo das comissões nas fábricas, mormente em face da criação de mais uma modalidade de estabilidade.

Solução alternativa, ventilada nas discussões, foi a de ancorar as comissões no art. 11 da Constituição Federal, uma vez que a estabilidade estaria assegurada constitucionalmente para os representantes dos empregados eleitos nas empresas com mais de 200 empregados. No entanto, nem essa alternativa era aceita pelo setor patronal, especialmente pela CNI, que não desejava de forma alguma que o referido dispositivo constitucional fosse regulamentado.

Assim, o impasse só foi superado e o projeto de lei pôde ser votado e aprovado pela Câmara dos Deputados, quando foi reformulado, tornando facultativa a criação das comissões, tanto nas empresas quanto nos sindicatos (CLT, art. 625-A), mas assegurando a estabilidade de seus membros (CLT, art. 625-B, § 1º).

O modelo facultativo tem, contra si, a fragilidade que traz ao sistema, pois se não houver uma generalização na instituição espontânea das comissões de conciliação prévia, o desafogamento do Judiciário Laboral não poderá ocorrer, o que comprometerá a eficácia do recém-aprovado rito sumaríssimo para as pequenas causas trabalhistas.

Ciente das implicações do insucesso do modelo, a CNI, principal responsável pela mitigação do projeto, comprometeu-se com o governo a envidar todos os esforços para, num prazo de 6 meses da publicação da lei, conseguir que as comissões de conciliação prévia sejam criadas de forma generalizada em todos os setores produtivos, quer no âmbito das empresas, quer nos sindicatos ou mediante acordos intersindicais. Em caso de não obtenção desse objetivo, o governo adotaria, por medida provisória, a fórmula impositiva das comissões de conciliação prévia, de modo a desafogar a Justiça do Trabalho, que ficaria impossibilitada de dar vazão, no procedimento sumaríssimo, ao volume desproporcionado de reclamatórias que lhe chegam anualmente (mais de 2 milhões e meio).

A grande vantagem para os empregadores com a adoção das comissões de conciliação prévia nas empresas é a de não serem surpreendidos na Justiça, com a propositura de reclamação trabalhista, cuja citação postal, às vezes deficiente, pode gerar revelia em matéria fática, de difícil reparação. Além disso, a nova lei prevê que pelo acordo, o empregado dará quitação geral sobre a demanda que tiver (podendo, no entanto, fazer ressalvas específicas sobre títulos não conciliados – CLT, art.625-E, parágrafo único), o que evitará futuras ações sobre questões já discutidas no momento da dispensa ou da solução da pendência na vigência do contrato.

A vantagem para os empregados é a solução mais rápida e satisfatória de suas pendências trabalhistas, com recebimento imediato das parcelas que lhe são devidas. A lei estabelece que o termo de conciliação firmado perante as comissões de conciliação prévia valem como título executivo extrajudicial, podendo o empregado, caso não receba a parcela que lhe foi reconhecida como devida no prazo fixado no termo, promover a imediata execução do termo. O dispositivo incluiu também, de forma expressa, os termos de ajuste de conduta firmados perante o Ministério Público do Trabalho como títulos executivos extrajudiciais a serem executados perante a Justiça do Trabalho, findando, assim, com a controvérsia sobre a competência para a execução de tais termos de compromisso (CLT, art. 876).

A pretensa inconstitucionalidade, vislumbrada por alguns, na obrigatoriedade da passagem prévia da demanda perante a comissão de conciliação, não tem qualquer procedência. As comissões de conciliação prévia não constituem óbice ao acesso ao Judiciário, assegurado pelo art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, na medida em que são apenas instância prévia conciliatória, em que a comissão deve dar resposta à demanda em 10 dias (CLT, art. 625-F), o que, de forma alguma, representa óbice ao acesso ao Judiciário.

O próprio Supremo Tribunal Federal, em questão análoga, referente à imposição, por lei, da necessidade do postulante de benefício comunicar ao INSS a ocorrência do acidente, como condição da ação indenizatória, com vistas a uma possível solução administrativa da pendência, entendeu que não há inconstitucionalidade na criação da condição (cfr. RE 144.840-SP, Rel. Min. MOREIRA ALVES, julgado em 2/4/96, Informativo n. 25 do STF). Assim, não há que se pretender seja inconstitucional a passagem obrigatória dos litigantes na comissão conciliatória prévia.

Assim, a nova lei exige que, nas localidades ou empresas onde houver comissão de conciliação prévia instituída, o empregado apresente sua demanda à comissão, para apreciação prévia (CLT, art. 625-D), constituindo a exigência pressuposto processual para o ajuizamento de ação trabalhista, caso não seja bem sucedida a conciliação. A negociação prévia passará a ser exigida tanto para os dissídios coletivos quanto para os dissídios individuais, como forma de se prestigiar as soluções autônomas dos conflitos trabalhistas.

Com a extinção da representação classista, a tão propalada vocação conciliatória natural dos vogais poderá ser satisfatoriamente canalizada para a atuação nas comissões de conciliação prévia, onde exercerão função conciliatória de conflitos do setor específico a que estão ligados e, por isso, com conhecimento preciso dos problemas próprios do setor. Serão bancários compondo conflitos de bancários e portuários resolvendo questões portuárias, com soluções mais satisfatórias do que aquelas passíveis de imposição pela Justiça do Trabalho.

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Assim, espera-se que, na esteira da terceira onda de reformas no processo, tão propalada por MAURO CAPELLETTI, que prestigia especialmente as formas alternativas de composição dos conflitos em sociedade, possam as comissões de conciliação prévia representar um elemento de pacificação dos confrontos entre patrões e empregados, a par de desafogar o Judiciário Trabalhista da quantidade sobre-humana de processos que deve resolver diuturnamente.


PODER NORMATIVO E AÇÕES COLETIVAS

Se, do ponto de vista dos projetos de lei recém-aprovados, o perfil da Justiça do Trabalho vai mudar substancialmente a partir do ano 2000, já sob o prisma do que vem pela frente em termos de Reforma do Judiciário, há alguns pontos que exigem reflexão.

Desde a proposta de revisão constitucional de 1994, tem-se discutido sobre a conveniência de se manter o poder normativo da Justiça do Trabalho. O relator da revisão, Min. NELSON JOBIM, calcado na experiência do Direito Comparado, defendeu a extinção do Poder Normativo, como forma de se prestigiar a negociação coletiva e acabar com o paternalismo estatal, do qual as partes em litígio esperavam a solução de todos os conflitos e a concessão de benefícios não previstos em lei (cfr. op. cit., pgs. 48-55).

A questão veio à tona novamente com a Reforma do Judiciário, tendo o Dep. ALOYSIO NUNES, em seu parecer, proposto a extinção do Poder Normativo, enquanto o parecer da Dep. ZULAIÊ COBRA, que ora se discute na Câmara dos Deputados, apresenta solução menos drástica, admitindo o exercício de poder normativo apenas nas hipóteses de greve em serviços essenciais, devendo ser proposto apenas pelo Ministério Público do Trabalho.

A relatora atual da Reforma do Judiciário teve o discernimento de perceber duas realidades que se contrapõem no campo dos dissídios coletivos de trabalho:

A possibilidade de recurso fácil ao Poder Judiciário, quando as negociações diretas entre as partes não evoluem, ou mesmo quando uma delas não está disposta a negociar, constitui um desestímulo a que os agentes sociais resolvam diretamente suas controvérsias coletivas, fazendo com que o país tenha sempre um sindicalismo fraco e um setor empresarial avesso ao diálogo; e

A extinção pura e simples do poder normativo da Justiça do Trabalho deixaria a sociedade sem um meio de solução para os impasses na negociação, quando deflagradas greves em serviços essenciais, em relação aos quais o interesse público na manutenção dos serviços exigiria uma intervenção estatal.

Nesse sentido, pode-se reduzir o poder normativo da Justiça do Trabalho às hipóteses em que greve em serviço essencial começa a afetar diretamente o atendimento às necessidades inadiáveis da população. A intransigência das partes em litígio – empresa e sindicato – não pode transformar a população em refém, pela carência dos serviços básicos (energia, transporte, saúde, comunicação, etc). A intervenção estatal, através do Ministério Público, para postular em juízo a composição do litígio ou, ao menos, a garantia do atendimento mínimo às necessidades inadiáveis da população durante a greve, faz-se necessária. Daí a previsão dos dissídios coletivos de greve como matéria de competência da Justiça do Trabalho. Essa foi a solução adotada no último parecer da Reforma do Judiciário, aprovado na comissão especial da Câmara dos Deputados:

"Art. 115. (...)

§ 2º Em caso de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público, o Ministério Público do Trabalho poderá ajuizar dissídio coletivo, competindo à Justiça do Trabalho decidir o conflito".

No entanto, isso ainda é pouco. Se, até o momento, a Justiça do Trabalho prestou relevantes serviços à sociedade, resolvendo, através de seu poder normativo, os conflitos coletivos de trabalho, fixando condições e normas de trabalho consentâneas com a realidade de cada setor produtivo, não se deve desprezar esse arcabouço judicial de composição dos dissídios coletivos. Se o intuito maior da extinção do poder normativo é o de estimular as formas alternativas de composição de conflitos, entre as quais se destacam a negociação coletiva, a mediação e a arbitragem, parece conveniente aproveitar a experiência da Justiça do Trabalho na apreciação dessas questões, fazendo com que sua estrutura possa ser utilizada para a arbitragem dos dissídios coletivos.

Assim, os dissídios coletivos de natureza econômica poderiam continuar a ser apreciados pela Justiça do Trabalho, mas apenas em duas hipóteses:

- dissídio coletivo de greve, quando afetado o interesse público, pela falta de atendimento às necessidades inadiáveis da população quanto aos serviços essenciais definidos em lei, facultando-se a propositura do dissídio não apenas ao Ministério Público, mas também às partes em litígio; e

- dissídio coletivo de mútuo acordo, quando ambas as partes concordam em submeter à Justiça do Trabalho a solução da questão, caso em que o Judiciário Laboral atuaria como juízo arbitral.

Ademais dos dissídios coletivos de natureza econômica, não se deve esquecer que os dissídios coletivos de natureza jurídica, onde não há exercício de poder normativo, mas de típica jurisdição, com interpretação do ordenamento jurídico vigente, devem ser contemplados especificamente na Emenda Constitucional que aprovar a Reforma do Judiciário, pois constituem elemento de aglutinação de ações individuais, permitindo a redução de demandas judiciais, pela concentração das questões similares num único processo exegético.

Nesse sentido, mereceriam ser incluídos, no parecer da relatora da reforma do judiciário, relativo à competência da Justiça do Trabalho, mais dois incisos, do seguinte teor:

"Art. 115. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:

(...)

X – os dissídios coletivos de natureza econômica, quando ambas as partes concordarem em submeter o conflito à Justiça do Trabalho, podendo esta fixar normas e condições de trabalho;

XI – os dissídios coletivos de natureza jurídica".

A limitação do poder normativo da Justiça do Trabalho, diminuindo o volume de processos a serem apreciados pela SDC do TST e pelos Grupos Normativos dos TRTs, poderá ser compensada pela elevação da competência originária para apreciação das ações civis públicas.

De fato, o futuro aponta para a coletivização do processo, pela concentração de ações semelhantes em processos únicos, em que a solução, que deve ser a mesma para todos os afetados, fica garantida pelo julgamento por órgão judicial com jurisdição sobre todo o território em que se estende a lesão ao direito.

A Reforma do Judiciário não pode olvidar a fixação da competência originária dos Tribunais para a apreciação das ações civis públicas relativas a lesões cuja abrangência ultrapasse a base territorial dos órgãos de 1ª instância.

Em matéria de competência hierárquica para apreciação das ações civis públicas, a jurisprudência do TST oscilou, desde o reconhecimento da competência originária do TST para ações de âmbito nacional (TST-ACP 92.867/93, Rel. Min. MANOEL MENDES DE FREITAS, in LTr 58-05/564, decisão proferida pela SDC), até a atribuição de competência às Juntas de Conciliação e Julgamento (TST-ACP 154.931/94, Rel. Min. RONALDO LOPES LEAL, julgada em 24/9/96 pela SDI). Após esta última decisão, não houve alteração na orientação do TST, conforme bem reportado pelo Ministro RONALDO LEAL nos debates que se seguiram à sua conferência no 4o. Ciclo de Estudos de Direito do Trabalho, realizado em Comandatuba, sob os auspícios da Escola Nacional da Magistratura, e recolhido no artigo "Competência do Ministério Público do Trabalho - Ações Civis Públicas, com Ênfase na Segurança Bancária e na Segurança e Saúde do Trabalhador" (in "Revista do Tribunal Superior do Trabalho", n. 1 da nova série, Síntese - dezembro/1999 - Brasília, pgs. 64-68).

Ora, a edição da Lei 9.494/97, que alterou a redação do art. 16 da Lei 7.347/85, limitando a eficácia das sentenças prolatadas em ações civis públicas à competência territorial do órgão prolator, veio a trazer novamente à tona o debate a respeito da competência originária para a apreciação das ações civis públicas.

A Lei 9.494/97 resultou da conversão da Medida Provisória 1.570-4/97 que, conforme reconheceu o Min. RONALDO LEAL nos debates acima referidos, importaria numa alteração no ordenamento jurídico, capaz de ensejar a revisão da orientação atual do TST.

Quando sustentamos, em nosso "Processo Coletivo do Trabalho", que a competência originária das ações civis públicas de âmbito nacional seria do TST, fizemo-lo por considerar que a natureza da ação civil pública é a mesma do dissídio coletivo de natureza jurídica, ou seja, a aplicação de norma jurídica existente para toda a categoria representada na ação (LTr – 1996 – São Paulo, pgs. 219-221).

Ainda que o objetivo da Lei 9.494/97 tenha sido o de restringir os efeitos das sentenças em ações civis públicas, de modo a evitar que abraçassem a todos os lesados no território nacional, pode-se concluir que permite sustentar a competência originária dos Tribunais, quando se tratar de lesão de âmbito regional ou nacional. Isto porque a indivisibilidade do objeto da ação civil pública, ao defender interesses difusos ou coletivos (Lei 8.078/90, art. 81, parágrafo único, I e II), faz com que não se possam dar provimentos jurisdicionais distintos para integrantes do mesmo grupo ou categoria. E o art. 16 da Lei 7.347/85, ao falar em "competência territorial do órgão prolator" da sentença, sem definir qual seja, permite a conclusão de que seja um tribunal.

Convém recordar que o parecer do Min. NELSON JOBIM, na relatoria da revisão constitucional de 1994, contemplava a competência originária dos tribunais para a apreciação das ações civis públicas também para a Justiça Federal (cfr. op. cit., pg. 8).

De qualquer forma, seria muito importante, num contexto global de redução do poder normativo, a valorização das ações civis públicas como elemento de composição ampla das grandes questões trabalhistas, enobrecendo sua feição com a atribuição da cognição originária a um órgão colegiado, dada a extrema relevância que as questões jurídicas adquirem quando veiculadas através da ação civil pública, pois uma solução equivocada, por se estender a toda a categoria representada pelo sindicato ou defendida pelo Ministério Público, pode comprometer irremediavelmente a viabilidade econômica da empresa acionada.

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Sobre o autor
Ives Gandra da Silva Martins

advogado em São Paulo (SP), professor emérito de Direito Econômico da Universidade Mackenzie, presidente do Centro de Extensão Universitária, presidente da Academia Internacional de Direito e Economia, presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARTINS, Ives Gandra Silva. A Justiça do Trabalho do ano 2000:: as Leis 9756/98, 9957 e 9958/00 e a EC 24/99. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 39, 1 fev. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1223. Acesso em: 23 abr. 2024.

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Texto também publicado na Revista Jurídica Virtual do Palácio do Planalto, edição de janeiro de 2000

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