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A multa do caput do artigo 475-J do CPC e a sua repercussão no âmbito do processo civil e a sua aplicabilidade no processo do trabalho

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10/02/2009 às 00:00
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3.termo inicial de contagem do prazo para pagamento da multa

Indiscutível que a Lei nº 11.232/05 trouxe significativo avanço quanto aos procedimentos processuais destinados a dar efetiva celeridade e concretização ao cumprimento da sentença que traz condenação por quantia certa, destacando-se a inovação contida no caput do artigo 475-J que institui o pagamento da multa de dez por cento a cargo do devedor, se este voluntariamente não efetua o pagamento no prazo de quinze dias.

Entretanto, o legislador foi infeliz na redação ao não deixar expresso a partir de que momento começa a fluir referido prazo, o que tem gerado interpretações diversas na doutrina e na jurisprudência.

Diante deste descuido do legislador, na prática, tem se observado a interposição de medidas judiciais por parte daqueles que se sentem prejudicados ante a interpretação adotada pelo juiz no tocante ao início da contagem do tempus iudicati de quinze dias para pagamento. Ou seja, se de um lado houve nítida preocupação em otimizar a prestação jurisdicional em sintonia com a reforma introduzida pela Emenda Constitucional nº 45/2004, a qual acrescentou o inciso LXXIII ao artigo 5º da Carta Magna de modo a garantir a razoável duração do processo aos litigantes, de outro lado, ainda que involuntariamente, contribuiu para elastecer no tempo a duração da lide diante do nó górdio que se estabeleceu pela omissão contida no texto legal, o que se equacionará, a médio prazo, na medida em que as Cortes Superiores venham a consolidar uma interpretação uniforme, quiçá por meio de súmula, concernente ao início do prazo estabelecido no caput do artigo 475-J, por óbvio, tendo como lastro a estrita observância dos princípios constitucionais do devido processo legal (art. 5º, LIV), da ampla defesa e do contraditório (LV).

Feitas estas observações preliminares, atualmente, pode-se identificar três correntes doutrinárias: a primeira defende que o início da contagem do prazo de quinze dias se concretiza com a intimação do advogado; a segunda reputa como condição indispensável a intimação pessoal do devedor, já que a obrigação de pagar é de caráter pessoal; e a terceira corrente entende que o início do prazo para pagamento voluntario ocorre a partir do momento em que a sentença ou acórdão se torna exeqüível, independente de qualquer nova intimação.

Para melhor compreensão, abaixo transcrevemos os argumentos que sustentam cada um dos posicionamentos mencionados.

3.1INTIMAÇÃO DO ADVOGADO

3.1.1Cássio Scarpinella Bueno [40]

Por isto, forte na noção constitucional de que o cumprimento escorreito do julgado pressupõe adequada publicidade e condições materiais suficientes que atestam haver uma decisão judicial eficaz, apta para ser cumprida (e que tais condições limitem-se ao recebimento dos autos em que proferida a decisão exeqüenda ao primeiro grau de jurisdição, importa menos), é que mantenho o entendimento de que o prazo do art. 475-J depende de prévia ciência do devedor, por intermédio de seu advogado [41] [42], de que o julgado reúne as condições suficientes para cumprimento. E o ‘cumpra-se o v. acórdão’, para manter os olhos na vida do foro, parece-me, ainda, ser um bom momento para tanto. Não exclusivo e não necessário, evidentemente, mas oportuno para manter, para a ‘fase de cumprimento da sentença’, as garantias exigidas pela Constituição Federal e que devem afetar todo o ‘ser’ do processo civil.

3.1.2Daniel Amorim Assumpção Neves, Glauco Gumerato Ramos, Rodrigo da Cunha Lima Freire e Rodrigo Mazzei [43]

"Apesar de tais argumentos, parece ser admissível que a parte seja intimada na pessoa de seu advogado. É evidente que nesse caso haverá tão-somente uma presunção de que a parte saiba da existência da determinação do valor pretendido pelo demandante, o que é argumento suficiente para se apontar para uma insegurança jurídica, permitindo-se a continuidade do processo, agora em sua fase de cumprimento da sentença, sem que se tenha certeza se o demandado sabia do início da contagem do prazo para o cumprimento da obrigação. (...)

A busca incessante da certeza jurídica prejudica o procedimento, e por conseqüência macula a prestação jurisdicional, em nítida afronta ao princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição, atualmente entendido como a garantia de acesso à ordem jurídica justa. (...)

Como conclusão é defensável a tese de que, apesar de ser uma obrigação pessoal do demandado a de realizar o pagamento da quantia certa fixada em sentença, sendo necessária sua intimação para que se considere iniciado o prazo de quinze dias, será dispensada sua intimação pessoal. O máximo com que a celeridade buscada pelo legislador poderá conviver será a intimação na pessoa do advogado [44] [45] do demandado, sob pena de ressuscitar percalços materiais – a dificuldade na localização do demandado de má-fé – que tradicionalmente sacrificam o andamento da fase de satisfação do direito, quer seja num processo autônomo, quer seja numa mera fase procedimental.

3.1.3Flávio Luiz Yarshell e Marcelo José Magalhães Bonício

Ao que parece, a incidência da referida multa é automática e precede o requerimento do credor acompanhado da apresentação da memória de cálculo. Vale dizer: basta o decurso do prazo de quinze dias da condenação para que incida a multa de tal sorte que na memória – e, conseqüentemente no mandado de penhora – já será incluída a penalidade, acrescida ao principal. Isso não conflita com a idéia de que é vedada a inclusão da multa de ofício pelo juiz. Uma coisa é dizer que a multa incide automaticamente, tanto que decorrido o prazo legal; outra, é dizer que é ônus do credor promover a respectiva cobrança da qual, eventualmente, pode até mesmo dispor, conforme antes salientado.

(...) Intimado o demandado – na pessoa de seu advogado [46] – da decisão condenatória não sujeita a recurso com efeito suspensivo (e sempre suposto que o débito seja liquido), daí começa a fluir o prazo estatuído pela lei [47]

3.1.4Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery

O devedor deve ser intimado para que, no prazo de quinze dias a contar da efetiva intimação, cumpra o julgado e efetue o pagamento da quantia devida. A intimação do devedor deve ser feita na pessoa de seu advogado [48], que é o modo determinado pela reforma da L 11232/05 para a comunicação do devedor na liquidação de sentença e na execução para cumprimento da sentença. A intimação do advogado do devedor, que se faz, de regra, pela imprensa oficial, para o cumprimento do julgado é ato de ofício do juiz, em decorrência do impulso oficial do CPC 262. [49]

3.2INTIMAÇÃO PESSOAL DA PARTE

3.2.1Alexandre Freitas Câmara [50]

(...) Penso que o termo a quo desse prazo quinzenal é a intimação pessoal [51] do devedor para cumprir a sentença. Não pode ser mesmo de outro modo. Em primeiro lugar, é expresso o art. 240 do CPC em afirmar que, salvo disposição em contrário, os prazos para as partes correm da intimação. Ora, se não há expressa disposição em contrário no art. 475-J (ou em qualquer outro lugar), o prazo de quinze dias ali referido tem de correr da intimação. Não pode, pois ser aceita a idéia da fluência automática do prazo por ser uma opinião data venia contrária à lei. Isso, porém, não é tudo. Há de se levar em consideração, ainda, o fato de que a fluência desse prazo de forma automática implicaria, a nosso ver, uma violação à garantia constitucional do processo justo, decorrente do princípio do devido processo legal, uma vez que poderia acontecer de a multa incidir sem que a parte sequer soubesse que já se iniciara o prazo para o pagamento. Basta pensar nos casos em que o advogado não comunica à parte o momento inicial da eficácia da sentença ou, pior ainda, aqueles casos em que por alguma razão haja dificuldade em estabelecer com precisão a partir de que momento se deu o início da produção de efeitos da sentença. Não tenho, pois, qualquer dúvida em sustentar a necessidade de intimação pessoal do executado para que pague o valor da dívida, sob pena de incidir a multa referida no art. 475-J do CPC.

3.2.2Humberto Theodoro Júnior [52]

Há, porém, um prazo legal para cumprimento voluntário pelo devedor, que corre independentemente de citação ou intimação do devedor. A sentença condenatória líquida, ou a decisão de liquidação da condenação genérica, abrem, por si só, o prazo de 15 dias para o pagamento do valor da prestação devida.

É do trânsito em julgado que se conta dito prazo, pois é daí que a sentença se torna exeqüível. Se, porém, o recurso pendente não tiver efeito suspensivo, e, por isso, for cabível a execução provisória, o credor poderá requerê-la com as cautelas respectivas, sem, entretanto, exigir a multa. Se o trânsito em julgado ocorre em instância superior (em grau de recurso), enquanto os autos não baixarem à instância de origem, o prazo de 15 dias não ocorrerá, por embaraço judicial. Será contado a partir da intimação às partes [53], da chegada do processo ao juízo da causa.

3.2.3José Carlos Barbosa Moreira [54]

Ponto de grande importância, mas a cujo respeito guarda silêncio a lei, é o do termo inicial para a incidência da multa. À primeira vista, parece lógico o entendimento de que esse termo inicial se localiza no próprio dia em que a sentença se torna exeqüível. Permitimo-nos aqui, todavia, uma ponderação.

Em mais de um caso, pode surgir dúvida sobre o momento em que se configura a exeqüibilidade. Pense-se, por exemplo, na hipótese de coincidir esse momento com o do trânsito em julgado (execução definitiva). Se do último recurso interposto não conheceu o órgão ad quem, v.g. por intempestivo, no rigor da técnica a decisão impugnada terá passado em julgado quando o recurso se tornou inadmissível:

(...) A interpretação acima exposta, suscita, destarte, uma justificável incerteza acerca do começo da incidência da multa e, por conseguinte, do respectivo valor. Afigura-se preferível situar o dies a quo da incidência em momento inequívoco. Daí optarmos pela necessidade de intimar-se o executado – o que se harmoniza, por sinal, com o disposto no art. 240, caput, a cuja luz, ‘salvo disposição em contrário, os prazos para as partes (...) contar-se-ão da intimação.

3.2.4Misael Montenegro Filho [55]

Diante da omissão legislativa, entendemos que o devedor deve ser intimado em antecedência à apresentação do requerimento manifestado pelo credor, que verdadeiramente inaugura a fase executiva. Em tese, essa intimação pode ser aperfeiçoada na pessoa do devedor ou na do seu advogado, independentemente de se encontrar munido de poderes especiais, posto que nos encontramos diante de intimação, como espécie de comunicação processual, não de citação, a justificar a atração da regra estampada no art. 38 da Lei de Ritos.

Em nossa compreensão, em face da conseqüência detalhada na norma (incidência de multa em percentual inegavelmente expressivo), entendemos que a intimação deve ser aperfeiçoada na pessoa do devedor [56], preferencialmente através do cumprimento do mandado judicial, com a advertência contida na parte final do art. 285 do CPC, aplicável à espécie por analogia.

Interessante observar que esta tese vem predominando no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, conforme se extrai do voto emitido pelo Desembargador Sérgio Cavalieri Filho [57], relator do Agravo de Instrumento nº 26.236/2006, integrante da 13ª Câmara Cível, in verbis:

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A questão nodal no presente recurso é saber a partir de que momento torna-se devida a multa prevista no artigo 475-J do CPC. Há controvérsia na doutrina sobre o tema e, no III Encontro de Desembargadores Civis deste Tribunal não se chegou a um entendimento comum. Particularmente, entendo que a razão está com o douto juiz que proferiu a decisão, a seguir transcrita nos pontos essenciais:

– a uma, porque a executada não foi intimada para cumprimento de sua condenação, tendo, na verdade, se adiantado na execução;

– a duas, porque, ainda que assim não fosse, a executada se deu por intimada em 04.10.2006, quando do requerimento de expedição de guia de depósito, tendo efetuado o depósito do valor a que foi condenada em 19.10.2006, ou seja, antes do término do prazo previsto no artigo 475-J do Código de Processo Civil;

– a três, porque a aplicação da multa, acaso devida, deverá incidir tão somente sobre a diferença do débito não depositada, o que está literalmente previsto no § 4º do artigo 475-J do Código de Processo Civil.

Tal entendimento ampara-se na jurisprudência dominante deste Tribunal, segundo a qual é necessária a prévia intimação do devedor, para efeitos de contagem do prazo da multa prevista no artigo legal acima mencionado. Isso, basicamente, em homenagem às garantias constitucionais da ampla defesa e do contraditório (CR, 5º, LV). Com efeito, ainda que a mens legis seja a de agilizar a forma de satisfação do credor, essa diretriz deve se harmonizar com os princípios constitucionais retromencionados. Essa a exigência do postulado maior do acesso à ordem jurídica justa (CR, 5º, XXV, LIV, LV, LXVIII).

Da pesquisa que realizamos no "site" desta Corte, encontramos 42 (quarenta e duas) decisões sob o argumento "cumprimento – sentença – intimação – multa". Dessas, cerca de 22 (vinte e duas) pertinem ao tema, dentre as quais 16 (dezesseis) pugnam pela necessidade de prévia intimação do devedor. Exempli gratia, vejam-se as seguintes ementas:

(...)

A intimação do devedor é mesmo necessária. Asseguram-se, assim, alguns valores e princípios indispensáveis para a efetiva prestação jurisdicional, na fase executiva, tais como a segurança jurídica, a ampla defesa e contraditório, a menor onerosidade possível, etc. Tais cânones devem ser compatibilizados com o da celeridade e economia processual.

(...)

Temos que a norma contida no artigo 475-J do CPC é excepcional, porquanto interfere diretamente na esfera jurídica da parte. É norma de natureza cominatória, coercitiva que impele o devedor a cumprir sua obrigação. Ao agregar o valor da multa ao valor da condenação, inegavelmente atinge o patrimônio do devedor.

(...)

À vista dessas considerações, nega-se provimento ao recurso.

Rio de Janeiro, 22 de fevereiro de 2007.

Des. Sergio Cavalieri Filho

Presidente e Relator

3.3INTIMAÇÃO DA PUBLICAÇÃO

3.3.1Araken de Assis

(...) o artigo 475-J, caput, estipulou o prazo de espera de quinze dias, no curso do qual o condenado poderá solver a dívida pelo valor originário, ou seja, sem o acréscimo da multa de 10% (dez pro cento). O prazo flui da data em que a condenação se tornar exigível. É o que se extrai da locução ‘condenado ao pagamento de quantia certa, ou já fixada em liquidação’ [58]

3.3.2Athos Gusmão Carneiro [59]

Assim, na sentença condenatória por quantia líquida (ou na decisão de liquidação de sentença), a lei alerta para o tempus iudicati de quinze dias, concedido para que o devedor cumpra voluntariamente sua obrigação. Tal prazo passa automaticamente a fluir, independentemente de qualquer intimação, da data em que a sentença (ou o acórdão, CPC, art. 512) se torne exeqüível, quer por haver transitado em julgado, quer porque interposto recurso sem efeito suspensivo.

(...) A multa de dez por cento, prevista no texto legal, incide de modo automático casa devedor não efetue o pagamento no prazo concedido em lei. Visa, evidentemente, compeli-lo ao pronto adimplemento de suas obrigações no plano do direito material, desestimulando as usuais demoras "para ganhar tempo". Assim, o tardio cumprimento da sentença ou as eventuais posteriores cauções não livram o devedor da multa já incidente (...).

3.3.3Ernane Fidélis dos Santos [60]

Nas obrigações de pagamento de quantia certa, ou no simples reconhecimento da obrigação, considera-se implícito, sem necessidade de qualquer referência, o prazo de quinze dias para o pagamento espontâneo (artigo 475-J).

O prazo começará a fluir, necessariamente, quando o recurso contra a sentença tiver efeito suspensivo, a partir do trânsito em julgado da decisão, havendo, aqui, tormentosas questões de ordem prática a enfrentar.

(...) Vai haver, na prática, certa questão que merece a contemporização dos julgadores, quando o trânsito em julgado ocorrer nos tribunais. No comum, há certa demora e embaraços na baixa dos autos à comarca de origem, o que, principalmente para aqueles que não têm advogados acompanhando o processo em instâncias superiores, acontece com certa dificuldade no conhecimento do trânsito em julgado. Nesse caso, é de bom alvitre que o prazo de pagamento comece a correr após a descida dos autos, o que será noticiado na forma própria de intimação.

3.4CONSIDERAÇÕES FINAIS

Uma leitura atenta das razões que fundamentam cada uma das três correntes doutrinárias irá revelar posições sólidas e defensáveis juridicamente. Entretanto, a nosso ver, a melhor interpretação atinente ao início da contagem do prazo de quinze dias para pagamento voluntário da quantia certa fixada em sentença, necessariamente deverá ter por norte, ante a omissão do texto legal, o objetivo da norma em consonância com os princípios constitucionais, destacando-se o da ampla defesa, do contraditório e da duração razoável do processo.

Portanto, parece-nos bastante razoável a interpretação de que o início do prazo se estabelece com a intimação do advogado do devedor para que cumpra o julgado, oportunidade em que se tem a certeza jurídica de que o devedor, por meio de seu patrono, está ciente do valor a pagar em decorrência da condenação judicial.

E aqui é importante registrar que o advogado por força do instrumento de procuração outorgado pelo cliente, ato que pressupõe indelevelmente a confiança estabelecida entre ambos, tem a obrigação contratual e ético-moral de comunicá-lo de qualquer ocorrência significativa no processo e aquele, por sua vez, a obrigação de manter os seus contatos atualizados, já que está sendo demandado em juízo.

Ademais, não se pode admitir que o advogado deixe de informar a seu cliente de que se iniciou o prazo para pagamento, sob pena de responder por perdas e danos decorrente de negligência profissional, pois é o mínimo que esse espera de um profissional cônscio de seus deveres contratuais e legais, a teor do disposto nos artigos 31, 32 e 33 da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994 [61], e artigo 8º do Código de Ética do Advogado [62].

Não se olvide ainda que o advogado com a Constituição de 1988 foi guindado a patamar constitucional ao ser considerado indispensável à administração da justiça (art. 133 C.F.).

Ademais, a plenitude do Estado Democrático de Direito encontra na figura do advogado um de seus pilares e a busca constante do aperfeiçoamento da atividade jurisdicional é dever de todos, mormente daqueles que dela participam, destarte, se mostrando irrefutável a participação ética e jurídica do advogado que in casu se concretiza com a intimação e suas conseqüências.

Desta feita, a corrente doutrinária que se apega ao fato de haver necessidade de intimação pessoal do devedor com fulcro no artigo 240 do CPC, permissa venia, deixa de efetuar uma análise mais abrangente e consentânea com os novos tempos que, antes de tudo, refletem o desejo da sociedade na busca de maior efetividade com acentuada valorização do papel do advogado.

Concernente à corrente doutrinária que defende a fluência automática do tempus iudicati de quinze dias a partir do instante em que a sentença ou acórdão se torne exeqüível, sem necessidade de nova intimação, a priori, quer nos parecer uma interpretação por demais draconiana, a qual vai de encontro [63] ao sistema processual vigente, principalmente tendo como premissa básica o fato do processo se constituir o instrumento transparente sem possibilidade de trazer surpresas ou insegurança jurídica aos litigantes.

Ademais, o curial é que haja intimação do advogado, não se justificando a sua ausência em prol de uma alegada celeridade processual, porém, com desrespeito ao princípio do devido processo legal.

Interessante observar que já se identificam decisões judiciais que adotam esta tese, verbi gratia, o Tribunal de Justiça de São Paulo no agravo de instrumento nº 477.830-4/7-00, relator Desembargador Oscarlino Moeller, ao assim decidir:

O prazo transcorre a partir do momento em que a decisão jurisdicional reúne eficácia suficiente para autorizar a execução do julgado, mesmo quando a hipótese comportar ainda execução provisória. Não assiste razão, data venia, àqueles que sustentam a necessidade de que o demandado seja pessoalmente intimado para que fique em mora e comece a fluir o prazo de 15 dias para o adimplemento da prestação determinada na sentença condenatória. Com a intimação da sentença, o réu está ciente do prazo previsto em lei para que cumpra a decisão e pague a quantia devida. Não o fazendo, estará inadimplente, e sujeito à incidência da multa.

Neste sentido, também assim decidiu o Superior Tribunal de Justiça, por meio de sua terceira turma, em votação unânime, com voto condutor do Ministro Humberto Gomes de Barros, conforme ementa abaixo:

LEI 11.232/2005. ARTIGO 475-J, CPC. CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. MULTA. TERMO INICIAL. INTIMAÇÃO DA PARTE VENCIDA. DESNECESSIDADE.

1. A intimação da sentença que condena ao pagamento de quantia certa consuma-se mediante publicação, pelos meios ordinários, a fim de que tenha início o prazo recursal. Desnecessária a intimação pessoal do devedor.

2. Transitada em julgado a sentença condenatória, não é necessário que a parte vencida, pessoalmente ou por seu advogado, seja intimada para cumpri-la.

3. Cabe ao vencido cumprir espontaneamente a obrigação, em quinze dias, sob pena de ver sua dívida automaticamente acrescida de 10%.

Por pertinente, destacamos a seguinte passagem do voto condutor:

O excesso de formalidades estranhas à lei não se compatibiliza com o escopo da reforma do processo de execução. Quem está em juízo sabe que, depois de condenado a pagar, tem quinze dias para cumprir a obrigação e que, se não o fizer tempestivamente, pagará com acréscimo de 10%.

(...) o termo inicial dos quinzes dias previstos no art. 475-J do CPC deve ser o trânsito em julgado da sentença. Passado o prazo da lei, independente de nova intimação do advogado ou da parte para cumprir a obrigação, incide a multa de 10% sobre o valor da condenação (Grifamos)

Ex positis, quer nos parecer que a corrente doutrinária optante pela intimação do executado se encontra em um extremo diametralmente oposto a outro extremo representado pela tese da fluência automática do prazo para pagamento da multa, portanto, sem intimação do advogado.

Outrossim, o posicionamento de que há necessidade de intimação do advogado para que se inicie o prazo para pagamento por parte do devedor, a priori, revela-se mais consentâneo com os princípios que informam a Lei Maior e o CPC.

E aqui, permitimo-nos invocar a sábia lição de Carlos Maximiliano que com muita propriedade afirma:

No meio termo está a virtude: os vários processos completam-se reciprocamente, todos os elementos contribuem para a descoberta da verdade e maior aproximação do ideal da verdadeira justiça. Aos fatores verbais aliem-se os lógicos, e com os dois colaborem, pelo objetivo comum, os sociais, bem modernos, porém já pressentidos pelos jurisconsultos clarividentes da Roma antiga. Todos os exageros são condenáveis; nenhum exclusivismo se justifica. Devem operar os três elementos como forças sinérgicas, conducentes a uma resultante, segura, precisa.

Não é de rigor que se empreguem todos simultaneamente; pode um dar mais resultado do que outro em determinado caso; o que se condena é a supremacia absoluta de algum, bem como a exclusão sistemática de outro. Cada qual tem os defeitos das suas qualidades; é em tirar de cada processo o maior proveito possível, conforme as circunstâncias do caso em apreço, que se revela a habilidade e a clarividência do interprete. [64]

Ademais, não se deve olvidar que a cultura de um país não se modifica a fórceps mas, decorre de um processo sociológico em constante mutação resultante da percepção que o cidadão tem do que é melhor para si, na perspectiva de uma sociedade mais justa e democrática.

In summa, é fundamental refletir sobre a observância dos princípios constitucionais que informam o processo para que não se recrudesça no tempo, conforme alerta Fredie Didier Jr. nesta inspirada passagem:

É preciso, porém, fazer uma reflexão como contraponto. Bem pensadas as coisas, conquistou-se, ao longo da historia, um direito à demora na solução dos conflitos. A partir do momento em que se reconhece a existência de um direito fundamental ao processo, está-se reconhecendo, implicitamente, o direito de que a solução do conflito deve cumprir, necessariamente, uma série de atos obrigatórios, que compõem o conteúdo mínimo do devido processo legal. A exigência do contraditório, o direito à produção de provas e aos recursos, certamente, atravancam a celeridade, mas são garantias que não podem ser desconsideradas ou minimizadas. É preciso fazer o alerta, para evitar discursos autoritários, que pregam a celeridade como valor insuperável. Os processos da Inquisição poderiam ser rápidos. Não parece, porém, que se sente saudade deles. [65]

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Sobre o autor
Carlos Eduardo Príncipe

Graduado em Direito pela Universidade de São Paulo. Pós-graduado, em nível de Especialização Lato sensu, em Direito Processual Civil e Direito do Trabalho. Mestre em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Advogado e consultor

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PRÍNCIPE, Carlos Eduardo. A multa do caput do artigo 475-J do CPC e a sua repercussão no âmbito do processo civil e a sua aplicabilidade no processo do trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2050, 10 fev. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12319. Acesso em: 29 mar. 2024.

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