CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do que se abordou, concluímos que o negócio jurídico praticado por aqueles menores absolutamente incapazes mas que ostentam discernimento em suas ações produz efeitos.
A respectiva orientação legal ditada pelo Direito Civil brasileiro vem contrariando não somente os nítidos princípios jurídicos relativos ao conceito de vontade e incapacidade, como anotamos, mas também, ainda mais, as conclusões filosóficas e naturais encampadas pelo próprio corpo social quando se trata de aferir os negócios realizados na vida cotidiana por menores absolutamente incapazes.
A prática o revela nos atos de vida corrente nos quais se verifica a atuação absolutamente normal daqueles nas pertinentes relações comerciais no dia a dia, inclusive com o estímulo implementado por legítimos e ponderados segmentos sociais, como a família e a mídia em evidentemente orientação histórica e idelógica do capitalismo, que não sobrevive sem o consumo.
De outro lado, a quase que ausência de precedentes judiciais a respeito, seja julgados conferindo validade àqueles negócios jurídicos ou lhes repelindo eficácia igualmente indica a aceitação geral - chegando quase à indiferença - de tais atos pela sociedade.
É evidente, como sinalizamos que, não basta que a vontade do incapaz na prática daqueles atos esteja com traços bem nítidos da presença de seus elementos estruturais - o querer e a consciência de ação - assim igualmente refletida a presença da autonomia privada; é preciso também que tais atos se revistam do manto purificador da boa fé e que, especialmente, não traga qualquer prejuízo ao menor. Também é impossível conceber a idéia de total validade a atos ou negócios jurídicos formais praticados pelos referidos incapazes pois com relação a estes, que exigem forma ou solenidade, impossível será a participação do menor senão por intermédio do representante legal.
Assim, como em algumas civilizações estrangeiras conforme já anotado, nada impede que o legislador brasileiro insira no direito civil positivo o caráter de anulabilidade - e não nulidade - daqueles negócios jurídicos praticado por menores absolutamente incapazes, nas condições expostas. Até porque, repise-se, estaria nada mais do que chancelando os regulares, previsíveis e extremamente bem controlados hábitos da própria sociedade em nítida revelação de que os costumes e o interesse geral já agasalharam essa regra de conduta.
Nem se diga, como já fizemos anotar, que o instituto da representação, como dispositivo da parte geral então a ser utilizado em sentido implícito, supra a deficiência legislativa e resolva o problema em referência. É que, nos casos em que ausente por qualquer motivo essa representação - tácita - torna à dúvida a realidade factual, novamente sendo necessário que se lance mão das conclusões e soluções que, em síntese, o trabalho apresenta.
Concluindo, fica estampada a idéia então de que os atos ou negócios jurídicos denominados da vida corrente (nem todos indistintamente, excluindo-se como anotado, os formais ou solenes em que a representação é imprescindível) praticados por menores absolutamente incapazes (alguns também, porque aqueles de muito tenra idade ou de incapacidade total comparada às dos indivíduos com problemas de ordem psico-somática se excluem do conceito) são válidos porque esteiados nos princípios da autonomia privada, costumes e boa fé, condicionados porém à circunstância de não trazerem qualquer prejuízo moral ou material ao incapaz.
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