Em face da forte influência do capital especulativo (neoliberalismo), que não respeita soberanias, procuramos discutir através deste artigo a importância da manutenção e criação de leis que protejam o trabalhador.
I) Introdução:
Até chegarmos à atual concepção de trabalho é inevitável que voltemos nossos olhos para o passado a fim de que se possa compreender que os direitos que hoje subsistem não são originados de dádivas, mas, em revés, são produto de árduas lutas que culminaram em importantes conquistas e, como tal, não podem ser suprimidas a custas de interesses que colidam com os dos trabalhadores.
Assim o trabalho humano na Antiguidade representava punição, derrota, submissão, haja vista que somente quem trabalhava eram os povos vencidos nas batalhas que, em conseqüência, viam-se escravizados. Dessa forma, o trabalho em nada dignificava o homem e sim o humilhava. E é em tal contexto que se pode inserir o feudalismo como processo de virtuosa evolução, dado que o trabalho deixou de ser escravo e passou a ser servil. Mesmo que para receber a proteção do senhor feudal, o trabalho começa a encontrar alguma bilaterialidade, e agora não somente vinculado à exploração do homem pelo próprio homem.
Obviamente que, à medida que se assistiu ao crescimento populacional, a pequena produção de subsistência não iria ser suficiente para suprir as necessidades emergentes dessas grandes massas humanas. Mas antes de atingir o alto grau de avanço tecnológico encontrado na Revolução Industrial, haveria a precedência da importante fase das corporações de ofício, cujos principais atores eram os mestres que ensinavam o artesanato aos aprendizes, alcançando, portanto, algum grau de especialização que, por suas condições inadequadas de trabalho, e ainda produção rudimentar, sucumbiriam rapidamente com o advento da explosão da Revolução Industrial.
Com a Revolução Industrial e seus avanços tecnológicos, a humanidade mergulharia numa fase em que a ordem natural dos acontecimentos econômicos deveria caminhar para uma única direção: produção em massa em função do acúmulo de capitais( lucro ). Ordem essa, em que se relegaria o ser humano a um plano secundário, dando início ao período de maior exclusão social da história da existência humana.
É nesse desiderato que se procurará demonstrar o quão importante se faz a preservação e expansão dos direitos trabalhistas conquistados ao longo desses últimos 50 séculos, em face da crescente influência do capital especulativo dinamizador da desregulamentação e flexibilização desses direitos.
II) O LIBERALISMO
A bandeira econômico-filosófica incipiente, com a decadência do feudalismo, foi a do liberalismo ( laissez-faire, laissez-passer ): deixe fazer, deixe passar; era o individualismo atomista, em que as leis de mercado deveriam ditar as regras da economia. Assim, essa seguiria seu curso natural, atendendo a teoria Darwiniana da seleção natural, da lei do mais forte, e ao Estado caberia intervir apenas para garantir tal funcionamento quando fosse ameaçado de desviar de seu curso.
A relação de emprego, portanto, não seria afetada e, se o indivíduo se esforçasse, haveria emprego; o desemprego duradouro só ocorreria se voluntário; se involuntário, ocorreria por não adaptação estatal aos mecanismos do mercado, leia-se corrupção dos governantes. A Economia seria uma ciência autônoma, que não deveria ligar-se a aspectos sociais. Seria o que se convencionou chamar de "mão invisível". A teoria em comento teve como, se não seu fundador, pelo menos um dos liberais clássicos de maior importância, Adam Smith com sua "riqueza das nações", obra essa que serviria de fundamental subsídio aos ideais capitalistas emergentes e, por dedução lógica, contrários ao absolutismo que teimava em manter-se, daí que também a separação dos poderes em Montesquieu serviria como mais um útil fator de refutação ao absolutismo monárquico.
Mas de antemão, e apesar do estereótipo imposto pela linha neoliberal, de "febre de nacionalismo" a quem assim pensa, não há como conceber uma atividade econômica se ela, apesar de repercutir seus efeitos diretos nos meios sociais em todas as suas esferas, nega-se às responsabilidades advindas dessas atividades; e apesar do gritante absurdo, assim foi a economia do liberal clássico, e agora bem mais acentuado pelo neoliberalismo, desvencilhada do " mínimos "de ética social . E é nesse contexto degradante e surrealista que se iria ver inserido o trabalhador nos últimos três séculos, haja vista que se defendia um avanço tecnológico ao alcance de todos, mas que na verdade só viria a beneficiar os detentores dos meios de produção.
O capitalismo encabeçado pelas invenções da máquina a vapor, locomotivas e demais avanços tecnológicos surgidos com a Revolução Industrial na Inglaterra, em meados do século XVIII, trouxe consigo, em contraposição, grande exploração da mão-de-obra.
Há relatos de infindáveis horas de trabalho, casos em que, com o aparecimento da lamparina a gás, o trabalho pôde ser prolongado até altas horas, chegando-se a 18 horas diárias, sem distingüir homens ou mulheres e, até mesmo crianças de menos de oito anos de idade viam-se exploradas. Não raramente, esses trabalhadores dormiam nas próprias fábricas em condições díspares com as de um ser humano, chegando mesmo a sofrer castigos físicos, quando a produção não atingia as cifras almejadas pelos patrões. E, nessa condição, diferenciavam-se dos escravos apenas por um salário exíguo que iria terminar por servir unicamente para cuidar das enfermidades que as degradantes condições de trabalho lhes propiciava.
III) A REAÇÃO DO PROLETARIADO
É diante desse quadro de penúria e, portanto, tempestivamente, que surgiram teorias e movimentos sociais que iriam de encontro àqueles sustentados pela elite burguesa.
No início foram quebrados equipamentos industriais, demonstrando o nível de intolerância em que se encontravam os trabalhadores. Karl Marx difunde a idéia de uma sociedade comandada pelo proletariado, em que não existiria desigualdade social; a própria igreja católica, através da encíclica Rerum Novarum de Leão XIII, denunciou as injustiças praticadas e a necessidade da intervenção estatal na economia. Na mesma época o mundo capitalista assiste estarrecido à ascensão ao poder do Comunismo na Revolução Russa de 1917; era a ameaça vermelha que pairava no ar. Foi assim, a duras custas, com sacrifício de preciosas vidas de trabalhadores, que aos poucos foram sendo conquistados direitos trabalhistas em vários países do mundo, através das constituições sociais.
Direitos como o descanso semanal, redução na jornada de trabalho e sistema sindical livre vão sendo gradualmente inseridos nas cartas constitucionais de vários países. A começar pela Constituição do México em 1917, seguido por Weimar; mas, aqui no Brasil, tais conquistas só se concretizariam com a Constituição de 1934.
Enquanto o bloco socialista manteve-se firme, ainda havia alguma garantia da manutenção de direitos trabalhistas, conquistados e garantidos mais por receio ao seu avanço do que por questão de justiça social .
Mas, com a queda do muro de Berlim em 1989, ergueu-se um outro de proporções bem mais devastadoras, o muro invisível da exclusão social que o capital especulativo iria impor. Assim, diante da derrocada e fragilidade que o socialismo deixou transparecer, não haveria mais porque manter-se aqueles direitos trabalhistas surgidos e- nunca é demais lembrar- principalmente- em razão do temor que a Revolução Russa representava aos capitalistas. E desde então, o neoliberalismo insurge-se contra o "well fare state" keynesiano, buscando fundamentalmente a desregulamentação e flexibilização das leis trabalhistas, máxime nos países subdesenvolvidos, vez que a dependência do capital estrangeiro, por parte desses países, avilta-se a cada dia, impondo, como se verá, como condição sine qua non desse investimento, a desproteção dos mercados internos.
IV) O " BUG SOCIAL"
Assim, pode-se ver o temerário quadro em que se encontra inserido o trabalho e, no caso especial do Brasil, a sociedade em toda sua conjuntura, como definiu com grande propriedade o ex-governador do Distrito Federal, Cristovam Buarque, em artigo publicado no fim do ano passado - o "bug social" - em que vemos o ressurgimento de doenças como tuberculose e febre-amarela, há muito erradicadas, e bolsões de miséria espalhados por todos os cantos do país, somatizando-se aos alarmantes índices de desemprego, e segundo pesquisa divulgada no último dia 28 de janeiro pelo Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em 1999 o Brasil atingiu o terceiro lugar no ranking mundial de desemprego com 7,5 milhões de desempregados. Percebe-se, dessa forma, o quão fundamental se faz primarmos pela efetivação de normas trabalhistas íncitas na Constituição e em leis trabalhistas especiais e, mais do que em épocas passadas, a necessidade da maior atuação dos sindicatos.
A nossa Carta Constitucional abarca o trabalho não apenas como direito social, mas acima de tudo como direito fundamental da pessoa humana, e versa também sobre a proteção ao emprego em face da automação e proteção quanto à despedida arbitrária ou sem justa causa.
Pois bem: a fim de preservar-se a dignidade da pessoa humana, faz-se mister que a ela seja dada a liberdade de acesso a qualquer trabalho, de modo que possa locupletar-se; mas esse simples direito de trabalho não será de forma alguma viável se não lhe forem dados meios de atingi-lo. Melhor, para sair da fila do desemprego, ou conseguir acompanhar o deslocamento de mão-de-obra que a automação gera, o candidato deve ter o mínimo de conhecimento e capacitação técnica que os avanços tecnológicos requerem; de outra forma veremos cada vez mais as raras oportunidades de trabalho não ser preenchidas por falta de mão-de-obra apta.
É dizer-se, ter direito a uma vida digna é ter acesso à educação que lhe dará chances de ser protegido em face da automação; do contrário, teremos um verdadeiro cerceamento do direito de liberdade. Enfim, querer retirar esses direitos é querer retirar direitos fundamentais e por conseguinte permitir a demissão arbitrária, e pior : atentar contra os preceitos constitucionais é querer desestruturar o próprio Estado Democrático de Direito.
Outrossim, não há como conceber-se direitos fundamentais se não os inserir num sistema. Assim, a proteção em face da automação só alcançará seu fim se houver investimento na educação, viabilizando cursos técnicos e não instituindo trabalhos temporários que somente privilegiam os detentores dos meios de produção, já que desse modo vêem seus encargos sociais reduzidos ao mínimo ou mesmo eliminados.
Conforme supracitado, o neoliberalismo não agride tão-somente as normas constitucionais, mas também os princípios trabalhistas em suas essências. Fere o princípio da continuidade do trabalho com a instituição do emprego temporário, como também o da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas, e da proporcionalidade, visto que a automação não leva em conta o ser humano trabalhador, não importando se uma máquina vai tomar o lugar de três pais de família. Não permite que o hipossuficiente tenha alguma forma de proteção, ou reivindicação, haja vista, como já se mencionou, a fragilidade de nossos sindicatos.
Sem embargo, o fim de toda economia de um país deverá ser o da satisfação das necessidades humanas; dessa forma a exclusão social que gerar e, portanto, a insatisfação da maioria deve ser afastada para que se restabeleça a justiça social. Assim cabe ao Estado intervir e não se afastar como o quer com toda a veemência o neoliberal, de modo que os preceitos constitucionais assecuratórios dos direitos trabalhistas sejam satisfeitos. Mas os interesses dos capitais especulativos vêem-se cada vez mais presentes em nossa economia, caminhando para, num futuro não muito distante, tal qual ocorreu recentemente no Equador, total dolarização da economia. Caso não sejam tomadas medidas necessárias, no sentido de impedir tais acontecimentos.
V) A "MÃO INVISÍVEL"
Como é sabido, a partir do momento que a atividade econômica tem repercussão na esfera social, ela não é mais neutra, haja vista que necessita do respaldo do principal interessado, aquele que vê seus interesses geridos pelo capital especulativo oriundo dessa economia aberta. Diante disso, é possível verificar a ligação capital especulativo e sociedade, quando observamos indivíduos que não elegemos gerirem nossos interesses mais até que aqueles que escolhemos como nossos governantes.
Vejam-se os megainvestidores, como George Soros, que, a propósito , foi por muito tempo assessorado pelo atual presidente do Banco Central, Armínio Fraga, que deslocam vultosos montantes de capitais puramente especulativos, acarretando em total instabilidade das economias nacionais, percebidos com grandes reflexos com quedas de bolsas, repercutindo em: retirada de capitais do país, alta do dólar, aumento da taxa de juros e, como não poderia deixar de ser, a inflação; isso gera milhares de desempregados, pais de família que venham a não ter como suprir as necessidades básicas de seus dependentes, aumentando assim os encargos estatais, criminalidade, caos na previdência e conseqüente aumento da dívida pública, agravada mais ainda pela alta de juros interno.
Mecanismos devem ser criados, talvez a responsabilização civil com indenizações para suprir necessidades daqueles que se vissem desempregados em virtude da movimentação financeira puramente especulativa, a fim de que se resguardem os interesses nacionais em face dos que, conforme se procurou demonstrar de forma mais suscinta possível, são capazes de alterar o destino de milhares de pesssoas, literalmente, da noite para o dia.
Mas, certamente, não será com a aceitação pacífica da falácia de que a inserção em órgãos financeiros nacionais governamentais de verdadeiros "marionetes" de megainvestidores (leia-se o atual presidente do Banco Central, Armínio Fraga), com a justificativa de que irá nos guiar pelo caminho da estabilidade econômica e social, que conseguiremos frear esse "entreguismo" a que assistimos nos últimos anos. Pelo contrário, essa presença só irá servir como catalisadora do processo de neocolonialismo a que estamos fadados no próximo século.
Sem embargo, o capital especulativo tem respaldo em entidades financeiras internacionais como o FMI, BIRD e Banco Mundial, que impõem como principais exigências para concessão de novos empréstimos aos países, como o Brasil, que não conseguem nem pagar os infindáveis juros da dívida externa: contenção da inflação, abertura do mercado e pagamento da dívida externa.
Como se pode perceber, não há preocupação por parte do neoliberal com o emprego e em conseqüência com o mercado consumidor, já que o raciocínio imediatista do lucro acima do ser humano lhe permite não lembrar que o desemprego faz com que não haja como consumir os produtos por ele produzido. É nesse viés que se vê com limpidez o quão assaz o neoliberal é em relação ao clássico liberal, já que este último, principalmente a Inglaterra, preocupou-se em preservar o mercado consumidor, chegando mesmo ao ponto de patrulhar as costas dos países que insistiam com o tráfico negreiro.
E o Brasil, atendendo prontamente a essas deliberações, abre cada vez mais seu mercado às multinacionais, dando-lhes inclusive subsídios fiscais, não obstante a superioridade destas em relação às nossas indústrias. Essa abertura descontrolada de nosso mercado ao capital estrangeiro teve impulso mais recentemente na Era Collor, em que se sugeria que assim iríamos ter acesso aos avanços tecnológicos, gerando concorrência, com conseqüente queda de preços das mercadorias, beneficiando desse modo o consumidor e gerando emprego.
Ora, permitir que indústrias bem mais avançadas que as nossas aqui se instalem, haja vista as superioridades técnicas que possuem em relação às nacionais, vez que são detentoras da tecnologia de ponta, não poderia induzir a outro caminho, a não ser o de grande quebra de nossas indústrias, em vez de concorrência, junto com descapitalização na medida em que essas multinacionais remetem o dinheiro aqui ganho para as respectivas matrizes em seus países de origem. É mais provável que o grande atrativo do nosso país seja a mão-de-obra barata e a cada dia mais desprotegida, em virtude de nossa legislação ineficaz no seu papel de resguardar os interesses do hipossuficiente (trabalhador), sem conseguir diminuir as desigualdades naturais entre este e o empregador.
VI) "INTEGRAR PARA NÃO ENTREGAR"
Ao invés de só nos limitarmos a importar tecnologia que, mesmo assim, quando aqui chega, já está há muito obsoleta em seu país de origem, deveriam nossos governantes não retirar incentivos como vêm fazendo há muito, mas sim estimular a pesquisa nas universidades, destinando mais verbas para o desenvolvimento de nossas próprias pesquisas tecnológicas.
Investindo assim, estariam investindo na própria educação. Mas um povo consciente, não alienado, que reivindique pelo exercício da cidadania, certamente não condiz com interesses daqueles que têm na persuasão (leia-se "pão e circo") sua principal arma de conservação e expansão nefasta do poder.
Mas os mesmos países que nos pressionam a abrir o mercado, por incrível que pareça, e se não fosse trágico seria engraçado, procuram enrijecer cada vez mais seus já fortalecidos mercados internos com medidas extremamente protecionistas. Demonstração disso foi a última reunião da Organização Mundial do Comércio (OMC) realizada em Seatlle, nos Estados Unidos, em que ficou bem claro qual será o direcionamento dado nos próximos anos à política econômica das grandes potências em relação aos países dos "outros mundos": barreiras inexoráveis em relação à entrada dos produtos destes em seus mercados. Mais especificamente em relação ao Brasil, essa intenção pôde ser notada no discurso dissimulado, encobertando outras intenções bem menos éticas do Chefe maior do governo americano, de que os nossos sapatos não teriam acesso ao mercado de seu país por serem, em grande parte, oriundos do trabalho infantil.
É bem verdade que, segundo dados veiculados na própria TV Senado, no Brasil temos três milhões de crianças entre sete e quatorze anos trabalhando, mas o presidente americano não se lembrou de falar que aqui no Brasil essas crianças trabalham para se tentar amenizar o flagelo que o capital especulativo lhes impôs, o desemprego dos pais, ao passo que se tem notícia de que nos Estados Unidos, mesmo tendo em cada grupo de cem pessoas em condições de trabalhar, apenas quatro estando desocupadas, ainda assim há crianças trabalhando no Estado da Califórnia.
Essa é a mesma retórica da campanha contra o extermínio dos judeus, mas se esquecem de que soltaram bombas atômicas matando milhares de pessoas apenas para se conhecer o poder de destruição delas; ou mesmo esquecem que dizimaram suas populações indígenas.
Os Estados Unidos são também incoerentes quando combatem o desmatamento da Amazônia dizendo ser o "pulmão do mundo", que como se sabe, trata-se de expressão tecnicamente incorreta, ao passo que todos sabemos que são eles os maiores poluidores do mundo.
Da mesma forma se dizem preocupados com nossas crianças, sendo que são em grande parte patrocinadores desse grande problema social do trabalho infantil, na medida em que procuraram de todos os meios desarticular nossa legislação obreira, com a falácia de que a flexibilização atrairá mais investimento estrangeiro para o Brasil e em conseqüência gerará mais emprego. Mas, conforme já se demonstrou, isso não ocorre e na verdade faz-nos cada vez mais reféns, submissos e apáticos em face da exploração a que nos submetem, fazendo com que as famílias não tenham muita escolha: ou expõem suas crianças ao trabalho a fim de locupletarem-se ou morrem à míngua, na indigência.
Diga-se então que, ao invés de avanço, tem-se o maior retrocesso dos últimos séculos, haja vista que se condena o indivíduo a condições subumanas de trabalho, talvez até inferiores às submetidas nos sombrios tempos da escravidão.
Caso a maior potência econômica do mundo estivesse realmente preocupada com o bem-estar das crianças dos países subdesenvolvidos, não adotaria uma política econômica que visasse tão-somente ao lucro, não respeitando fronteiras, nem soberanias, não respeitando o direito de trabalho que efetivaria os trabalhadores e não permitiria que seus filhos fossem obrigados a perder a fase mais sublime de suas vidas, da inocência cambiada pelo trabalho, a fim de suprir essa falta que eles, os que criticam o trabalho infantil, lhes proporcionam.
Não se purga aqui por um Estado com economia hermética, mesmo porque as evoluções por que passamos não embasaria tal concepção econômica. Mas sim, que essa relação econômica com as outras nações do mundo venha realmente imbuída de benefício ao povo brasileiro e para tanto é que deve a abertura de mercado ser concebida de forma responsável, de modo que signifique crescimento nacional e não dependência do capital estrangeiro.
Passamos por uma época em que a ordem é a busca desenfreada pelo lucro, num caminho suicida, em que se despreza o ser humano, e não há preocupação com os alarmantes índices mundiais de desemprego, que, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 1995 era de 130 milhões- em 1999 atingiu-se 138 milhões- e de empregos informais, de 800 milhões.
Em outros tempos, aboliu-se a escravidão para que se tivesse mercado consumidor para a grande demanda que os produtos fabricados ensejavam, mas o neoliberal não parece ter a mesma preocupação de outrora.
Um bom exemplo de pressão desses grupos alienígenas no intuito de penetrar em nosso mercado foi a imposição de destituição da estabilidade com o advento do FGTS , e que por ironia do "acaso" , ou forma de destorção da realidade, serviria até como bandeira de campanha eleitoral ao Senado Federal, por seu idealizador, Roberto Campos e, como todos sabem, há muito colaborador do neoliberalismo, como se esse instituto tivesse significado algum ganho para o trabalhador.
Veja-se ainda, a extinção das restrições aos investimentos estrangeiros em bolsas de valores, anunciada pelo Conselho Monetário Nacional no corrente mês de janeiro, no qual o investidor externo terá total liberdade para especular em nossas bolsas e com vantagens sobre o investidor nacional.
O Congresso Nacional aprovou a lei 9958/2000 que alterou e acrescentou artigos à CLT, de iniciativa do Presidente da República que tem em seu conteúdo principal a solução de conflitos trabalhistas através de convenção coletiva de trabalho com força de lei. Tal proposta poderia ser viável, e mesmo assim com a devida reserva, se os sindicatos pátrios, e usando-se o brocardo obreiro, " o sindicato é o alter-ego do empregado", fossem realmente ativos, representativos dos interesses dos seus filiados. Mas sabe-se que a realidade é bem outra: os nossos representantes sindicais, em sua maioria, defendem interesses de cunho unicamente particular e muitas vezes representam mais aqueles contra os quais deveriam pleitear os direitos de suas categorias, do que seus próprios membros. Assim, assiste-se mais uma vez, às escâncaras, à forte influência dos interesses do patronato em detrimento do trabalhador.
Como já se mencionou, a Constituição Federal recepcionou preceito da maior importância em face do fantasma da automação, mas que na realidade não vemos lei regulamentadora que combata, ou ao menos crie mecanismos de adaptação do trabalhador ao rápido processo de automação. Em lugares em que observávamos vários trabalhadores, tem-se apenas um e, ainda assim, auxiliando alguma máquina; basta observar-se os caixas bancários, correios eletrônicos, portões de garagens etc.
Mas felizmente, breves momentos de lucidez ainda fazem-se presentes entre nossos legisladores, tal qual se vê com a promulgação da Lei que proibiu a adaptação em postos de gasolina de bombas automáticas de abastecimento.
Não obstante, o avanço tecnológico só deve ser concebido quando traga em sua bagagem um mínimo de benefício à sociedade, e não apenas a uma parcela mínima dela. O que iria ocorrer se não fosse elaborada a contento tal lei, pois somente quem se beneficiaria seriam os proprietários dos postos de gasolina, que reduziriam de forma significativa seus gastos, não tendo que se preocupar com os constantes assaltos nem de arcar com despesas com empregados, haja vista que não haveria mais necessidade dos famosos "frentistas" a que estamos tão acostumados, que no caso seriam mais de cem mil desempregados em todo o país, e de outro lado que o consumidor iria ficar mais desprotegido, sem segurança na hora de abastecer seu veículo.
Definitivamente, a solução dos constantes assaltos em postos de gasolina não coaduna com a mazela de milhares, é problema de segurança pública, e como tal deve ser solucionado sem gerar outro problema ainda maior, já que, a cada porta que se fecha para o emprego, abrem-se várias outras para a criminalidade.