5. Da imunidade constante no art. 149, § 2º, I – Aplicação para as receitas advindas de exportação nas contribuições destinadas ao SENAR (§ 5º do art. 22-a da lei nº. 8212/1991)
As regras imunizantes carregam, no plano axiológico, valores para a concreção de um Estado Democrático de Direito, protegendo cernes fundamentais como a liberdade política, religiosa, de expressão, etc. A República Brasileira atravessa um instante de menoscabo aos direitos e garantias individuais tributárias, corroborado pela crescente (e extenuante) arrecadação tributária [18].
A EC nº. 33/2001, como já mencionado, inseriu o art. 149, § 2º, I, colimando incentivar sobremodo o desenvolvimento nacional (objetivo nevrálgico da República - art. 3º, I), dispondo que algumas das contribuições do art. 149 não incidiriam sobre a(s) receita(s) advinda(s) de(as) exportação(ões). A intenção central do legislador derivado é de manter o resultado favorável da balança comercial, fruto em parte das exportações praticadas, desonerando o custo de operações destinadas ao mercado internacional ou regiões equiparadas, tendo em vista a integração da economia mundial (globalização), dos diversos blocos econômicos e ou países [19].
Sobre a referida imunidade, o enunciado do art. 149, § 2º, I da CRFB é categórico ao dispor que:
"Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico (...)
§ 2º As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que trata o caput deste artigo:
I - não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação."
Não é necessário dispendioso esforço exegético para se extrair do enunciado sobrescrito que (ainda que numa interpretação perfunctória literal) a referida imunidade atinge duas espécies do gênero contribuição, quais sejam a "social" e a "de intervenção no domínio econômico". Outrossim, se verifica que a base econômica desonerada foi o signo "receita" não a qualificando (se bruta ou líquida). Logo, três são os requisitos necessários para que o respectivo contribuinte goze da apontada imunidade. Primeiro é ser sujeito passivo de contribuição "social" ou CIDE; Segundo. Devem referidas espécies tributárias onerar a base econômica "receita". E por derradeiro, o terceiro é que a referida "receita" advenha de exportação (ou operação equiparada).
A classificação, portanto, feita pela RFB na Nota COSIT nº. 312 e na Solução de Consulta DISIT 04 n.º 49/2008 carece do devido amparo doutrinário e jurisprudencial. É inadmissível que o equívoco cometido pelo referido órgão da administração pública obstaculize a concreção de direitos e garantias imanentes contidos na CRFB. Dessa forma, entende-se que o sujeito passivo tributário da contribuição destinada ao SENAR (§ 5º do art. 22-A da Lei nº 8212/1991), subclassificada como CIDE, poderá deixar de oferecer a tributação às receitas advindas das operações de exportação (ou equiparadas), uma vez que a regra imunizante contida no art. 149, § 2º, I, as abrange, podendo no hodierno quadro fático aludido sujeito parcial valer-se das medidas processuais preventivas cabíveis (ante a existência de "justo receio"), ou defender-se na esfera administrativa e ou opor-se judicialmente contra eventual exigência indevidamente realizada.
6. Conclusão
Avulta-se no hodierno estudo das questões tributárias o exame das estruturas ontológicas. As contribuições (que não as "de melhoria") ainda carecem de uma ascese cognitiva mais aprofundada para o deslinde de pontos gravitantes nevrálgicos e que sobremodo influenciam diretamente o cotidiano (mundo fenomênico) dos contribuintes/responsáveis tributários.
A RFB na Nota COSIT nº 312 (igualmente na Solução de Consulta DISIT 04 n.º 49), em resposta a consulta realizada pela própria entidade SENAR, asseriu que as receitas advindas de exportação, base econômica atingida pela Contribuição destinada a reportado ente (§ 5º do art. 22-A da Lei nº 8212/1991), não estão abrangidas pela regra imunizante contida no art. 149, § 2º, I, (inserida na CRFB pela EC nº. 33/2001), tendo em vista que estruturalmente são subclassificadas como contribuições "corporativas" (ou "de interesse das categorias profissionais ou econômicas").
Tal entendimento não possui o devido amparo na jurisprudência dos Tribunais Superiores e da doutrina. O cotejo analítico abstrato da finalidade e da regra-matriz de incidência das contribuições "sociais gerais do art. 240 da CRFB", das CIDE´S e das contribuições "corporativas", revela, num exame aferente in concreto que a Contribuição destinada ao SENAR (§ 5º do art. 22-A da Lei nº 8212/1991) no verídico deve ser enquadrada como CIDE, justamente pela finalidade perquerida e pelos demais aspectos da regra-matriz de incidência desta.
Assim, a rotulação feita pela RFB em referida Nota e Solução não se figura escorreita, cabendo ao eventual sujeito passivo tributário valer-se dos meios processuais consentâneos com o escopo (profilático ou não) de trazer concreção aos direitos e garantias constitucionais pertinentes.
É dever precípuo da ciência jurídica tributária a elisão de eventuais cizânias, sendo aquela atinente à classificação (e subclassificação) dos tributos ainda de extrema complexidade e sem uma solução suasória e unívoca, em que pesem os laboriosos dispêndios doutrinários nesse sentido. Contudo, repise-se que não podem os órgãos da administração fazendária distorcer a extensão e o alcance dos institutos tributários erigidos durante décadas de intenso debate doutrinário, rotulando-os desarrazoadamente como fê-lo na situação sob estudo (conjuntura amiúde ocorrente também para outras figuras jurídicas), com a nítida volição de afastar a aplicabilidade de normas jurídicas desonerativas.
6. Referências bibliográficas
, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1972.CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. Saraiva: São Paulo, 2004.
CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Tributário. 22 ed. Malheiros: São Paulo, 2006.
GRECO, Marco Aurélio. Contribuições (uma figura sui generis). Dialética: São Paulo, 2000.
MEDINA, Jefferson Marcos Biagini. REIS, Franciélle. A impossibilidade da incidência da contribuição social sobre o lucro líquido in Tributação e direitos fundamentais – propostas de efetividade. Organizadora Melissa Folmann. Editora Juruá: Curitiba, 2006.
PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 8 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006.
SCHOUERI, Luís Eduardo. Exigências da CIDE sobre Royalties e Assistência Técnica ao Exterior. Revista de Estudos Tributários nº. 37/144, jun/04.
7. Referências eletrônicas
http://www.senarce.org.br/arquivos/Receita%20Federal.pdf. (acessado em 21/02/2009).
http://www.senar.org.br/index.asp?wi=1024&he=768 (acessado em 21/02/2009).
http://www.senar.org.br/atividades/form_prof.asp?wi=1024&he=768 (acessado em 21/02/2009).
http://www.senar.org.br/atividades/pdf/relatorios/atividades/relatividades_2006.pdf (acessado em 21/02/2009).
Notas
- Para ter acesso a integralidade do conteúdo de referida Nota COSIT nº. 312 vide o link: http://www.senarce.org.br/arquivos/Receita%20Federal.pdf (Acessado em 21/02/2009).
- É de se frisar ainda que na Nota COSIT nº. 312, a RFB no item 10, contrariando o entendimento pacífico do STF (RE nº. 146.733/SP), afirmou que as contribuições do art. 240 da CRFB não seriam contribuições "sociais gerais", mas, contribuições de interesse das categorias econômicas. Observe-se: "(...) As de interesse imediato de categorias econômicas destinam-se, principalmente, ao custeio de entidades privadas de serviços sociais e de formação profissional referidas no art. 240 da Constituição."
- PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. EMPRESAS PRESTADORAS DE SERVIÇOS. EXIGIBILIDADE DAS CONTRIBUIÇÕES AO SEBRAE. LEGALIDADE. 1. A Primeira Seção desta Corte pacificou entendimento no sentido de que as empresas prestadoras de serviços estão incluídas entre as que devem recolher Contribuição para o SESC e SENAC, porquanto enquadradas no plano sindical da Confederação Nacional do Comércio. 2. A exação destinada ao SEBRAE, consoante jurisprudência do STF e do STJ, constitui Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CF, art. 149) e, por isso, é exigível de todos aqueles que se sujeitam às Contribuições devidos ao SESC, SESI, SENAC e SENAI, independentemente do porte econômico, porque não vinculada a eventual contraprestação dessas entidades. 3. "A interpretação dos artigos 4º do Decreto-Lei nº 8.621/46 e 3º do Decreto-Lei nº 9.853/46, sob o enfoque do novo conceito de empresa e da ordem constitucional em vigor, leva à conclusão de que as prestadoras de serviços estão incluídas entre os estabelecimentos comerciais sujeitos ao recolhimento da contribuição." (REsp 900.780/SP, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 10.04.2007, DJ 27.04.2007). 4. Agravo Regimental não provido. (AgRg no Ag 805.175/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 11.09.2007, DJ 30.10.2007 p. 267)
- TRIBUTÁRIO. ADICIONAL DE 0,3% AO SESI/SENAI E AO SESC/SENAC. Art. 8º, § 3º, DA LEI 8.029/90. LEI 8.154/90. CONTRIBUIÇÃO AUTÔNOMA AO SEBRAE, DESVINCULADA DAS ORIGINÁRIAS. INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO. LEI COMPLEMENTAR. DESNECESSIDADE. ART. 149, CF/88. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1 - A Lei n° 8.154/1990 alterou o § 3º do art. 8º da Lei nº 8.029/90, incluindo as alíneas a, b e c, criando um adicional de 0,3% às contribuições devidas ao SESI/SENAI e SESC/SENAC, serviços sociais previstos no art. 1° do DL n° 2.318/86. 2 - A Lei nº 10.668/2003 e a Lei nº 11.080/2004 deram nova redação aos §§ 3º e 4º do art. 8º da Lei nº 8.029/90. 3 - Esses adicionais perfazem uma contribuição totalmente autônoma de 0,6% destinada somente ao SEBRAE até a edição da Lei nº 10.668/2003, sendo que após esta lei também destinada à APEX e, ainda, posteriormente à Lei nº 11.080/2004, repassada à ABDI, além do SEBRAE e da APEX. Esta contribuição é desvinculada das contribuições das quais derivou, sem ofensa aos arts. 5º, II, e 150, I, da CF/88 e ao art. 97 do CTN, porquanto lei instituidora das contribuições já existia (Lei nº 8.029/90) e os adicionais foram estabelecidos através da Lei nº 8.154/90. 4. O STF já decidiu que a contribuição para o SEBRAE é contribuição de intervenção no domínio econômico (art. 149, caput, da CF/88), não se tratando de contribuições especiais de interesse de categorias profissionais ou econômicas (RE 396266/SC, Pleno, DJU de 27/2/2004, p. 22), motivo pelo qual é devida por todas as empresas e não somente por aquelas que dela se beneficiam. 5 - As contribuições de intervenção no domínio econômico, já previstas no art. 149 da CF/88, de regra, podem ser instituídas por lei ordinária. Somente a instituição de contribuição nova necessita de lei complementar (art. 146, III, CF/88) para definir seu fato gerador, base de cálculo e contribuintes, nos termos do art. 154, I, da CF/88. 6 - Pedido de redução da verba honorária não conhecido, mantendo-se a condenação da autora ao pagamento de honorários advocatícios de 5% sobre o valor da causa a cada réu, atualizados até o efetivo pagamento. 7 - Apelação não conhecida em parte e improvida na parte conhecida. (TRF4, AC 2002.70.01.011418-9, Primeira Turma, Relator Álvaro Eduardo Junqueira, DJ 01/03/2006).
- AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONTRIBUIÇÃO AO SEBRAE. CONSTITUCIONALIDADE. 1. O Tribunal a quo limitou-se a decidir acerca da recepção das contribuições ao Sesi e ao Senai pelo art. 240 da Constituição Federal, sem debater qualquer vício formal na sua instituição na década de 1940, faltando a esse tema o devido prequestionamento. Súmulas STF nºs 282 e 356. 2. As alegações trazidas a esta Corte no recurso extraordinário e reiteradas no presente agravo regimental foram examinadas e rejeitadas pelo Plenário, no julgamento do RE 396.266, rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 27.02.2004, quando se declarou a constitucionalidade da contribuição de custeio do Sebrae. 3. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental ao qual se nega provimento. (RE-ED 389104/PR, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Julgamento: 07/03/2006, Órgão Julgador: Segunda Turma, DJ 31-03-2006, PP-00038)
- A "patologia do óbvio" verifica-se (com o perdão do tautologismo) na ausência de averiguação do que é "óbvio", por ter-se tido o paradigma construído como exauriente daquela matéria, sendo despiciendo revolvê-lo; eis sua suposta imutabilidade. Becker assim se manifestou: "O Direito Tributário está em desgraça e a razão deve buscar-se – não na superestrutura – mas precisamente naqueles seus fundamentos que costuma ser aceitos como demasiado óbvios para merecerem a análise crítica". (BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1972, p. 10-1).
- GRECO, Marco Aurélio. Contribuições (uma figura sui generis). Dialética: São Paulo, 2000, p. 138.
- PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 8 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 149.
- CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. Saraiva: São Paulo, 2004, p. 280-340.
- CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Tributário. 22 ed. Malheiros: São Paulo, 2006, p. 570.
- Idem, Ibidem.
- CARRAZZA, Roque Antonio. Op. Cit., p. 571.
- SCHOUERI, Luís Eduardo. Exigências da CIDE sobre Royalties e Assistência Técnica ao Exterior. RET 37/144, jun/04.
- Ano II, n.º 7, pág.23.
- http://www.senar.org.br/index.asp?wi=1024&he=768 (acessado em 21/02/2009).
- http://www.senar.org.br/atividades/form_prof.asp?wi=1024&he=768 (acessado em 21/02/2009).
- http://www.senar.org.br/atividades/pdf/relatorios/atividades/relatividades_2006.pdf (acessado em 21/02/2009).
- MEDINA, Jefferson Marcos Biagini. REIS, Franciélle. A impossibilidade da incidência da contribuição social sobre o lucro líquido in Tributação e direitos fundamentais – propostas de efetividade. Organizadora Melissa Folmann. Editora Juruá: Curitiba, 2006, p. 99.
- MEDINA, Jefferson Marcos Biagini. REIS, Franciélle. Op. Cit., p.100.