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O STF e a (im)possibilidade de mutação constitucional

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18/05/2009 às 00:00
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4 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE BRASILEIRO

O modelo de controle de constitucionalidade no Brasil é bastante peculiar. Conseguimos importar e conjugar as características dos diversos modelos e sistemas espalhados pelo mundo, resultando num complexo e amplo sistema de aferição de constitucionalidade.

Tantas são as classificações, tantas serão as formas como se manifesta o controle de constitucionalidade pátrio.

Primeiramente, no sistema pátrio o controle pode ser exercido tanto preventivamente quanto repressivamente. Em ambos os casos este controle é misto, ou seja, exercido por órgãos políticos e jurisdicionais.

Antes de a lei entrar em vigor, existe o controle por parte do Congresso Nacional, por intermédio de suas Comissões de Constituição e Justiça, às quais incumbe verificar a compatibilidade do projeto de lei com o ordenamento jurídico. Assim, já existe um controle prévio acerca da constitucionalidade da norma.

Ainda preventivamente, temos o controle exercido pelo Chefe do Poder Executivo, ao exercer seu poder de veto em relação às leis que entender incompatíveis com a Constituição.

Pode-se falar, também, num controle preventivo exercido pelo Poder Judiciário, nos casos em que aprecia mandado de segurança impetrado por parlamentar objetivando resguardar a lisura do processo legislativo.

Quanto ao controle repressivo, será ele, em regra, exercido pelo Poder Judiciário. Excepcionalmente, poderá ser exercido pelo Congresso Nacional, quando este decide sustar os atos do Poder Executivo que exorbitem seu poder regulamentar ou exorbitem a matéria delegada, ou quando aprecia a constitucionalidade das medidas provisórias.

Agora seguindo a regra, o controle repressivo, no sistema brasileiro, será exercido pelo Poder Judiciário. E nosso modelo de controle é fruto duma conjunção dos sistemas norte-americano e austríaco, pois coexistem tanto o controle difuso-incidental quanto o controle concentrado-principal.

No Brasil, todos os juízes e tribunais podem apreciar a constitucionalidade das leis ou atos normativos suscitada num caso concreto, incluindo o Supremo Tribunal Federal. Acrescente-se que, além dessa competência para julgar os casos concretos, o órgão máximo do Judiciário brasileiro também possui a competência originária para julgar ações diretas que envolvam a constitucionalidade das leis ou atos normativos, ações abstratas, desvinculadas de qualquer caso concreto.

4.1 O CONTROLE CONCENTRADO

Conforme já visto, falar em controle concentrado de constitucionalidade é falar de um processo abstrato, objetivo, no qual não existe conflito de interesse entre partes, desvinculado de um caso concreto, exercido por órgão exclusivamente competente para tanto e exercido por meio de ações diretas.

No Brasil, o controle de constitucionalidade concentrado, nos moldes estabelecidos pela Constituição Federal de 1988, é exercido exclusivamente pelo Supremo Tribunal Federal e, em face das Constituições Estaduais, pelo Tribunal de Justiça respectivo. Contudo, nos ateremos apenas ao controle exercido pelo Supremo Tribunal.

O art. 102, inciso I, alínea "a" da Constituição Federal prevê que compete ao Supremo Tribunal Federal julgar, originariamente, a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal.

O órgão de cúpula do Poder Judiciário brasileiro funciona, nos moldes estabelecidos no artigo supracitado, como verdadeiro Tribunal Constitucional.

Consoante acontece nos demais países que adotam este tipo de controle, os legitimados a provocar a manifestação da Corte Constitucional, no caso o Supremo Tribunal, são taxativamente enumerados pelo próprio texto constitucional. Assim, podem propor as ações diretas perante o STF o Presidente da República, a Mesa do Senado Federal, a Mesa da Câmara dos Deputados, Governador de Estado, a Mesa da Assembléia Legislativa, o Conselho Federal da OAB, Partido Político com representação no Congresso Nacional, o Procurador-Geral da República e a confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

São esses os únicos competentes para iniciar a jurisdição concentrada, relembrando que o rol foi consideravelmente ampliado com o advento da CF/88.

Por conseguinte, tais legitimados necessitam de meios que lhes permitam exercer seu papel, e esses meios são as ações diretas. São as ações específicas para se questionar abstratamente a constitucionalidade de uma lei ou ato normativo do Poder Público, possuindo características próprias e regramento especial. No ordenamento jurídico pátrio existem cinco tipos de ações aptas a instaurar o controle concentrado: a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC), a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN), a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADIN por omissão), a Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva (ADIN Interventiva) e a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF).

Num simplório resumo, especificaremos as particularidades de cada ação.

A Ação Declaratória de Constitucionalidade é utilizada quando se pretende obter um pronunciamento do STF no sentido de declarar ser a norma impugnada compatível com a Carta Magna, portanto, constitucional. Sendo incontroverso que as leis e atos normativos são revestidos de uma presunção de legalidade, exige-se, para a instauração da Ação, que exista divergência jurisprudencial significativa em relação à matéria impugnada, divergência esta apta a causar uma insegurança jurídica.

De outro modo não poderia ser. A princípio, cogitar uma Ação direta destinada a confirmar a constitucionalidade de uma norma resultaria numa ação inócua, posto que a própria presunção de legalidade que as abraça seria suficiente para obstar o prosseguimento de qualquer questionamento neste sentido. Entretanto, uma vez que convive no Brasil, ao lado do controle concentrado, o controle difuso, permitindo a qualquer juiz ou tribunal apreciar a compatibilidade das leis com a Constituição, é inevitável que surjam divergências, pois a atividade de interpretação é, por natureza, subjetiva.

Assim, a fim de se evitar que coexistam no país decisões contrárias em relação a casos semelhantes, causando extrema insegurança e desconforto para os jurisdicionados, permite-se o ajuizamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade, com o escopo de extirpar as discrepâncias e uniformizar a jurisprudência num só sentido. Ressalte-se, por fim, que apenas as leis e atos normativos federais podem ser questionados pela ADC.

No sentido inverso, temos a Ação Direta de Inconstitucionalidade.

Mais antiga e mais utilizada Ação direta, a ADIN é utilizada quando se objetiva obter uma declaração do STF no sentido de que a norma impugnada é inconstitucional. Sempre que um dos legitimados entender que uma lei ou ato normativo contrariar os dispositivos constitucionais, provocará a manifestação do Tribunal para que resolva o aparente conflito.

Como se percebe, distingue-se da Ação Declaratória de Constitucionalidade pelo fato de possuir "sinal trocado", como defende a doutrina. Enquanto naquela almeja-se a declaração de constitucionalidade, aqui se almeja a declaração de inconstitucionalidade da norma. E o "sinal trocado" decorre da seguinte lógica: caso o Tribunal não acolha a alegação de constitucionalidade, estará, consequentemente, declarando a inconstitucionalidade da norma. De outro modo, caso desacolha a alegação de inconstitucionalidade da norma, estará declarando a constitucionalidade da norma. Resultará, sempre que adentrar no mérito, numa ou noutra solução.

Não existe necessidade de se demonstrar divergência jurisprudencial quando do ajuizamento da ADIN, contrariamente ao que ocorre na ADC. Os próprios argumentos contidos na peça servirão de fundamento para justificar a manifestação do STF, independente de como estão decidindo sobre a matéria os juízes e tribunais do país.

Convém ressaltar, entretanto, a maior amplitude conferida à ADIN. Por meio dela, pode-se impugnar as leis e os atos normativos federais e, também, os estaduais. Na ADC, apenas os atos normativos federais são passíveis de questionamento. Assim, vislumbra-se que a Ação Direta da Inconstitucionalidade possui um objeto mais abrangente.

Impende salientar, apenas para registro, que essa distinção não possui razão de ser. O bom senso indica que a tendência é igualarem-se seus objetos, culminando numa completa natureza dúplice entre ambas as ações.

A Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão é um dos instrumentos à disposição para que se busque a efetividade da Constituição Federal.

Como já foi dito, a inércia do Poder Público em regulamentar as matérias que a Constituição expressamente determina é mácula que a ofende de igual maneira. É preciso, então, dispor de meios que possibilitem o saneamento deste vício, garantindo a plena eficácia constitucional. Com este objetivo é que foi criada a Adin por Omissão.

Ajuíza-se a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão para obter do Supremo Tribunal Federal uma decisão que reconheça a inércia do Poder Público em regulamentar a Constituição. Mas essa regulamentação restringe-se às normas de eficácia limitada, na famosa classificação de José Afonso da Silva. São aquelas normas que, por si só, são insuficientes para implementar um direito ou obrigação. Necessita-se, assim, de uma lei infraconstitucional para efetivar o comando constitucional que, até então, existia sem efetividade.

Interessante ressaltar que o art. 103, §2º da Constituição Federal se refere à omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional. Neste sentido, reconhece-se uma amplitude no referido conceito, englobando não só as leis em sentido estrito, mas qualquer preceito de caráter normativo que poderia ser editado pelo Poder Público. Acrescente-se, ainda, que não será o Poder Legislativo o único responsabilizado pela inércia normativa, mas também qualquer dos outros Poderes (Judiciário ou Executivo), bem como qualquer órgão administrativo que reúna competência para tanto.

Reconhecendo o STF que houve a omissão inconstitucional, constituirá em mora o Poder competente, dando-lhe ciência do descumprimento de sua obrigação constitucional e reconhecendo formalmente sua inércia. No caso de órgão administrativo, dará prazo de até 30 dias para que elabore a lei, sob pena de responsabilidade.

Embora não seja o objetivo do presente trabalho adentrar nas particularidades de cada Ação Direta, chamamos atenção para o recente entendimento do STF acerca do seu papel no controle das omissões legislativas, em especial o MI 712, no qual o Ministro Marco Aurélio salientou:

Cabe ao Judiciário, por força do disposto no art.5º, LXXI e seu §1º, da CF, não apenas emitir certidão de omissão do Poder incumbido de regulamentar o direito a liberdades constitucionais, a prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania, mas viabilizar, no caso concreto, o exercício desse direito, afastando as conseqüências da inércia do legislador.

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Ressaltamos que, não obstante a decisão em comento ter sido proferida em sede de Mandado de Injunção, o regramento deste remédio constitucional é plenamente aplicável à ADIn por Omissão, e vice-versa.

A Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva, por sua vez, foge à regra da fiscalização da constitucionalidade das leis e atos normativos, característica marcante do processo objetivo realizado junto ao Supremo Tribunal Federal. Diferente do que ocorre com as demais Ações Diretas, a ADIn Interventiva não servirá para analisar a compatibilidade de uma lei ou ato normativo face à Constituição. Seu objetivo é por termo a grave conflito federativo existente no país.

A Constituição Federal de 1988, em seu art. 34, VII, autoriza a União a intervir nos Estados-membros quando for necessário assegurar a observância dos doutrinariamente chamados princípios sensíveis. São eles o sistema representativo e o regime democrático, os direitos da pessoa humana, a autonomia municipal, a prestação de contas da administração pública, a aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.

Assim, caso um Estado-membro, incluído o Distrito Federal, não respeitar um desses princípios, a União está autorizada a intervir para garantir seu acatamento. Contudo, essa intervenção, para concretizar-se, não depende de vontade política do Executivo, mas sim de um provimento judicial, emanado do STF. E este provimento judicial será proferido, exatamente, nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva,

A mencionada Ação só poderá ser proposta pelo Procurador-Geral da República e julgada pelo Supremo Tribunal Federal. Julgada procedente, o Presidente do STF comunicará a decisão aos órgãos do Poder Público interessados e requisitará a intervenção ao Presidente da República, o qual estará obrigado a acatar a decisão judicial.

Verifica-se que não se trata de um clássico processo abstrato, mas sim um nítido caso concreto, a envolver a União, de um lado, e o Estado-membro, do outro, cada um defendendo seus interesses. Em que pese o reconhecimento de não-observância dos princípios sensíveis resultar de uma declaração incidental de inconstitucionalidade, não é ela o objetivo desse processo, sendo esta declaração apenas meio para se alcançar a decretação da intervenção federal.

Por fim, ainda temos a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental como instrumento para instaurar o processo objetivo junto ao Supremo Tribunal Federal.

A ADPF é o instrumento hábil para se evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público, ou para resolver relevante controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual, municipal e, inclusive, anteriores à CF/88.

A primeira particularidade desta Ação consiste em definir o que seria preceito fundamental. Até o momento não existe conceituação legal nem decisão do STF nesse sentido. Assim, cabe a doutrina tentar delimitar o objeto desta Argüição.

Para UADI LAMMEGO BULOS (2008, pg241), fundamentais seriam os preceitos que informam o sistema constitucional, que estabelecem comandos basilares e imprescindíveis à defesa dos pilares da manifestação constituinte originária. Ainda, inclui a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho, da livre iniciativa, do pluralismo político, sem esgotá-los.

Já para o Professor Cássio Juvenal Faria, citado por PEDRO LENZA (2008, pg.212), preceitos fundamentais seriam as normas qualificadas, que veiculam princípios e servem de vetores de interpretação das demais normas constitucionais. A título de exemplo, enumera os princípios fundamentais do Título I da Constituição, os integrantes da cláusula pétrea, os princípios constitucionais sensíveis, os que integram os direitos e garantias fundamentais, os princípios da atividade econômica, dentre outros.

Em que pese a autoridade dos conceitos enumerados acima, fato é que a tarefa de conceituar preceito fundamental mostra-se bastante complexa, sendo certo que apenas o Supremo Tribunal Federal, quando apreciar diretamente o tema, poderá por fim à diversidade de conceitos encontrados doutrinariamente.

Outra observação importante diz respeito ao caráter subsidiário da ADPF. O STF, juntamente com a grande maioria da doutrina, entende que a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental só poderá ser utilizada caso não exista outro meio capaz para sanar a lesividade, tal como qualquer das outras Ações Diretas.

Convém, neste ponto, atentar para o quanto observado pelo Ministro Celso de Mello, para o qual o princípio da subsidiariedade só poderá ser invocado quando os instrumentos disponíveis mostrarem-se capazes de neutralizar, de maneira eficaz, a situação de lesividade que se busca obstar com o ajuizamento da ADPF.

Neste sentido, a possibilidade de interposição de outros meios processuais, tais como o recurso extraordinário, ou mandado de segurança, posto que desprovidos de objetividade, não seriam suficientes para obstar o prosseguimento da Argüição.

Embora o presente trabalho não objetive aprofundar no estudo sobre a ADPF, não podemos deixar de mencionar as idéias do professor ANDRE RAMOS DE TAVARES (2007, pg.59). Numa apertada síntese, esclarecemos que o ilustre doutrinador defende a tese, bastante sedutora, de que a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental não possui caráter subsidiário, mas sim um caráter principal. Para ele, toda vez em que se falar em ofensa a preceito fundamental, está se falando em utilização da ADPF. Assim, subsidiárias seriam as outras Ações Diretas, caso não se tratasse de lesão a preceito fundamental.

Sobre o tema, merece aqui a transcrição de um trecho de sua obra:

(...) tem-se que, com a introdução da ADPF, o mais coerente e constitucionalmente admissível será para ela desviarem-se todos – insista-se uma vez mais – todos os casos de descumprimento de preceitos fundamentais da Constituição. A especialidade (e essencialidade) do instituto da ADPF encontra-se, portanto, aqui.

Em que pesem as características peculiares de cada Ação Direta, as mesmas possuem um ponto em comum, imprescindível para a configuração do modelo concentrado brasileiro, distinguindo-o do controle difuso. Estamos nos referindo aos efeitos das decisões.

A regra do processo judicial é que uma sentença só produzirá efeitos para aqueles que foram parte no litígio. Terceiros não poderão ter sua esfera jurídica atingida por uma sentença oriunda de um processo do qual não participaram. Esta é a lógica processual.

Contudo, tal regra não se aplica no processo concentrado, provocado pelas Ações Diretas. Ao questionar-se abstratamente a validade de uma norma, está se percorrendo um processo objetivo, desvinculando-se do conceito de partes. Por conseguinte, não é exagerado concluir que os legitimados a propor as Ações Diretas, quando o fazem, atuam representando a coletividade. E se é a própria coletividade que está ali envolvida no processo, será ela abraçada pelos efeitos da decisão que vier a ser proferida.

Em decorrência desse raciocínio, resta evidente que as decisões proferidas em sede de controle concentrado de constitucionalidade possuem efeito erga omnes. De outra forma não poderia acontecer. A grande valia de se provocar diretamente a Corte Constitucional é obter uma decisão que fulmine de uma só vez qualquer divergência que possa envolver a matéria. E este objetivo é alcançado justamente a partir do momento em que todos se submetem aos efeitos da decisão.

E a Constituição Federal de 1988 vai além. Não só terão eficácia contra todos, aí o efeito erga omnes, mas as decisões proferidas em controle concentrado terão efeito vinculante aos demais órgãos do Judiciário e da Administração Pública. Ou seja, os mencionados órgãos públicos não poderão contrariar o quanto decidido pelo Supremo Tribunal Federal.

Assim, tantos os particulares, que possuem interesse em determinada matéria, quanto a Administração Pública, ao lidar com a mesma, deverão observar, de forma cogente, o quanto decidido pela Suprema Corte.

Esta é, portanto, a característica primordial do controle concentrado brasileiro.

4.2 O CONTROLE DIFUSO

O controle difuso, conforme já esclarecido, desvencilha-se da noção de processo objetivo, abstrato, sendo exercido no modelo clássico de processo subjetivo.

No sistema brasileiro, ele poderá ser exercido por todo e qualquer juiz ou tribunal, ao apreciar toda e qualquer demanda. A apreciação é, portanto, livre, sendo desnecessário o preenchimento de quaisquer requisitos para tal desiderato.

O controle difuso é realizado por meio da chamada via de exceção. É que a alegação de inconstitucionalidade de determinada norma servirá apenas como fundamento para o acolhimento do pedido principal. Em outras palavras, não se objetiva unicamente o reconhecimento da incompatibilidade da norma com o ordenamento jurídico, mas sim que esse reconhecimento dê ensejo a uma outra conseqüência, neste caso, a procedência do pedido principal.

Assim, tanto o autor poderá alegar a inconstitucionalidade da norma na petição inicial quanto o réu poderá alegá-la ou rechaçá-la na peça contestatória, além de todos aqueles que participem da demanda, tais como assistentes, o Ministério Público, bem como pelo próprio magistrado.

Diz-se, nesse sentido, que a questão sobre a constitucionalidade é prévia, incidente, utilizada apenas para solucionar o litígio principal.

Quando se diz que qualquer Tribunal poderá exercer o chamado controle difuso, inclui-se aí, além dos Tribunais de Justiça, todos os Tribunais Superiores e, obviamente, o Supremo Tribunal Federal.

No caso do STF, o controle difuso será exercido quando o Tribunal estiver atuando como órgão recursal. Assim, apenas em sede de recurso extraordinário e ordinário é que se poderá falar em controle difuso de constitucionalidade.

Até este ponto, nota-se que não existem maiores dificuldades para se compreender e analisar o controle de constitucionalidade pelo modo difuso.

Na esteira do raciocínio já explanado, convém, agora, tecer considerações acerca dos efeitos das decisões proferidas no modelo de controle de constitucionalidade em tela.

Retomando o que fora dito inicialmente, temos que o controle difuso ocorre dentro do que chamamos de processo subjetivo. Esta classificação do processo reúne as características clássicas do mesmo, trazendo a noção de partes, litígio, interesse contraposto etc. Consequentemente, em se tratando de processo subjetivo clássico, não tem como se desvencilhar dos efeitos das decisões que a ele são inerentes.

Primeiramente, reforçamos que só participará do processo aquele que tiver interesse direto na causa. É preciso que o bem jurídico em litígio relacione-se diretamente com autor e réu, pois serão eles os únicos legitimados a demandar em juízo por aquele. Assim, diz-se que o autor e o réu estão a defender interesses exclusivamente próprios.

Neste ponto já se observa uma diferença em relação ao controle concentrado, pois, neste caso, a parte (leia-se interessado) não atua em nome próprio, defendendo interesse exclusivamente seu, mas sim em nome da coletividade, defendendo interesses que dizem respeito à sociedade.

Continuando, a regra primordial do processo é que a coisa julgada só produzirá efeitos para aqueles que participaram da demanda. Apenas quem pôde se manifestar e se defender é que poderá sofrer as conseqüências do quanto decidido pelo Judiciário. Tal previsão encontra fundamento nos princípios do contraditório e ampla defesa, posto que sua observância é imprescindível para a legitimidade de todo processo judicial.

Raciocinando: se alguém não teve a oportunidade de se defender, de se manifestar, de apresentar sua visão, seu entendimento sobre determinada causa ou assunto, produzir provas, obviamente que não poderá ter sua esfera jurídica atingida por uma discussão que envolveu apenas terceiros. Esta é a lógica do processo subjetivo.

E, seguindo esta lógica, podemos concluir que a decisão do juiz ou Tribunal que apreciar a inconstitucionalidade de determinada lei ou ato normativo produzirá efeitos apenas para as partes envolvidas no processo que ensejou tal decisão. Ou seja, O Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, por exemplo, poderá concluir que tal lei viola a Constituição Federal e que, por isso, o autor tem determinado direito. Por mais que existam inúmeros outros casos nitidamente semelhantes, aquela decisão do Tribunal só terá validade para as partes do processo em que foi proferida.

Contudo, ressaltamos que esse modelo não se resume às instâncias ordinárias, merecendo destaque o papel do Supremo Tribunal Federal no julgamento desses casos concretos.

No sistema jurídico brasileiro, por meio do Recurso Extraordinário, o STF poderá ser provocado para se pronunciar acerca de um caso concreto, desde que a discussão em tela envolva matéria constitucional.

Neste molde, funcionará ele como um Tribunal recursal, porém, com um reduzido âmbito de atuação. Bem verdade, o que se reduz é o acesso ao STF, é a possibilidade de provocar a manifestação do Tribunal. Caso o recurso preencha os requisitos exigidos pela legislação processual, o Supremo Tribunal terá a liberdade para resolver o que entender cabível no caso apresentado, sempre analisando as questões constitucionais.

Em consonância com o panorama já apresentado, impende salientar que, ao julgar os Recursos Extraordinários, o STF analisa um caso concreto. É certo que se limita à matéria constitucional, porém, continua a atuar num caso concreto.

Tal distinção é importante para se ter em mente os efeitos das decisões do Tribunal nesses casos. Assim, conforme a regra processual apresentada anteriormente, se a decisão é proferida num caso concreto, num processo chamado subjetivo, terá ela efeito apenas para as partes envolvidas. Em se tratando de STF, apreciando Recursos Extraordinários, aquilo decidido pelo Tribunal apenas vinculará as partes envolvidas, produzindo seus efeitos apenas dentro do processo que originou esta decisão.

Assim, reforçando o já explicado no tópico anterior, temos que o Supremo Tribunal Federal atua, em nosso sistema, com dupla função, apresentando dois jurídicos. Um deles é o de Tribunal Constitucional, com a competência única de guardar a Constituição Federal, competência essa exercida no interior de um processo objetivo, destinado exclusivamente a provocar a jurisdição constitucional. Já num outro plano, o STF atua como um Tribunal Recursal, analisando a insatisfação das partes nos casos concretos, desde que tal insurgência se volte a matérias constitucionais.

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Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RIBEIRO, Daniel Leite. O STF e a (im)possibilidade de mutação constitucional. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2147, 18 mai. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12876. Acesso em: 26 nov. 2024.

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