V. CONCLUSÕES
Em suma, diante de todo o exposto acima, é possível afirmar
que os chamados dados cadastrais dos titulares de linhas telefônicas não
estão incluídos no conceito de comunicação telefônica — nem mesmo no de
comunicação de dados —, não sendo alcançados, por conseguinte, pela
inviolabilidade de sigilo prevista no inciso XII do art. 5º da Constituição
Federal de 1988.
Da mesma forma, embora tais informações integrem a
inviolável intimidade do indivíduo, a cuja divulgação ele não pode ser
compelido, não se presume o seu sigilo, podendo a informação ser prestada
pela concessionária de serviço de telefonia fixa e/ou móvel diretamente ao
Ministério Público se ele a solicitar. Apenas a utilização pela própria
empresa, no seu interesse particular, exige autorização expressa.
Por fim, no caso de dados cadastrais cujo titular vedou a
divulgação, tendo em vista a sua natureza e fazendo a devida ponderação de
valores, entendo que o Ministério Público — em todos os seus ramos (da
União e dos Estados) — pode requisitá-los diretamente das empresas
concessionárias dos serviços de telefonia, desde que o faça demonstrando o
interesse público envolvido, caracterizado pela necessidade de instruir
inquérito policial, inquérito civil público ou procedimento administrativo
correlato.
E vale sempre lembrar, a título de arremate, que o
fornecimento de dados sigilosos ao Ministério Público não se confunde com
autorização para divulgação dos mesmos, cabendo ao Judiciário, uma vez
provocado, fiscalizar tais condutas, reprimir abusos e possibilitar a
reparação dos lesados.
Não vislumbro, respeitadas as opiniões em contrário, outra
maneira de conciliar os valores constitucionais envolvidos na questão, mormente
diante do atual quadro da nossa vida em sociedade.
VI. BIBLIOGRAFIA
MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso de Direito
Constitucional. São Paulo: Saraiva: 2007.
RODOTÀ, Stefano. A vida na sociedade da vigilância: a
privacidade hoje. Rio de Janeiro: Renovar, 2008.
SAMPAIO, José Adércio Leite. A Constituição
reinventada pela jurisdição constitucional. Belo Horizonte: Del Rey, 2002.
SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional
Positivo. São Paulo: Malheiros, 2005.
TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional.
São Paulo: Saraiva, 2007.
Notas
Aqui entendida como gênero, abrangendo tanto o acesso ao conteúdo da
comunicação telefônica propriamente dita quanto a informação acerca das
ligações feitas e recebidas, embora, particularmente, compartilhe do
entendimento que vislumbra somente naquele primeiro caso a quebra de
"sigilo telefônico", estando, este segundo, inserido no conceito de
"sigilo de dados" e da privacidade.
MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso de Direito
Constitucional. São Paulo: Saraiva: 2007. p. 375, n. 67.
TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. São
Paulo: Saraiva, 2007. p. 587.
MENDES, Gilmar Ferreira et al. Op. cit., p. 367.
FERRAZ, Tércio Sampaio. Sigilo de dados: o direito à privacidade e
os limites à função fiscalizadora do Estado, Cadernos de Direito
Constitucional e Ciência Política, n. 1, p. 77, apud MENDES, Gilmar
Ferreira et al. Op. cit., p. 368.
SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo.
São Paulo: Malheiros, 2005. pp. 206-7.
Omitimos, aqui, a honra e a imagem porque a questão relativa ao
sigilo a elas não se aplica.
A título de exemplo: o indivíduo que trata de assuntos relativos à
sua intimidade pelo celular, em plena via pública e em voz alta está
permitindo que outras pessoas tomem conhecimento dos mesmos, que não são
presumidamente sigilosos; no entanto, tal atitude não autoriza o acesso ao
número de telefone com o qual mantinha contato, nem mesmo ao conteúdo integral
da conversa, pois a comunicação telefônica, esta sim, é presumidamente
sigilosa e seu sigilo é inviolável.
"Art. 3° O usuário de serviços de telecomunicações
tem direito: (...) VI - à não divulgação, caso o requeira, de seu
código de acesso;"
"Art. 3° O usuário de serviços de telecomunicações
tem direito: (...)IX - ao respeito de sua privacidade nos
documentos de cobrança e na utilização de seus dados pessoais pela prestadora
do serviço;"
"Art. 72. Apenas na execução de sua atividade, a
prestadora poderá valer-se de informações relativas à utilização
individual do serviço pelo usuário. § 1° A divulgação das
informações individuais dependerá da anuência expressa e específica do
usuário."
"Art. 3ºOs prestadores de serviços de que trata
esta Lei devem disponibilizar para consulta do juiz, do Ministério Público ou
da autoridade policial, mediante requisição, listagem das ocorrências de
roubos e furtos de aparelhos de telefone celular, contendo nome do assinante,
número de série e código dos telefones."
RODOTÀ, Stefano. A vida na sociedade da vigilância: a privacidade
hoje. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 13.
Idem, p. 105.
MENDES, Gilmar Ferreira et al. Op. cit., p. 371.
SAMPAIO, José Adércio Leite. A Constituição reinventada pela
jurisdição constitucional. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. p. 729.
SAMPAIO, José Adércio Leite. Op. cit., pp. 755-8.
Como, p.ex., privacidade (art. 5º, X) versus segurança (art.
5º, caput); privacidade (art. 5º, X) versus tutela do meio ambiente
(art. 225); privacidade (art. 5º, X) versus defesa coletiva do
consumidor (art. 5º, XXXII, e art. 170, V); entre outros.
Pois a finalidade ilícita (cometer crimes sem ser identificado, p.ex.)
não é passível de tutela.
SAMPAIO, José Adércio Leite. Op. cit., p. 758.
Idem, p. 759.
MENDES, Gilmar Ferreira et al. Op. cit., pp. 375-6.