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A importância dos princípios na interpretação da linguagem jurídica

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28/06/2009 às 00:00
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3. CONCLUSÃO: A IMPORTÂNCIA DOS PRINCÍPIOS NA INTERPRETAÇÃO DA LINGUAGEM JURÍDICA

Se a linguagem é a representação simbólica de um sistema que permite a comunicação entre as pessoas, o entendimento desse sistema passa necessariamente pela interpretação desses símbolos. E a correta interpretação depende da análise de uma série de fatores (gramaticais, contextuais, históricos, etc.), cabendo ao intérprete saber quais utilizar para melhor desenvolver o seu mister.

A linguagem jurídica, assim, é igualmente dependente daqueles fatores. Linguagem jurídica é a forma simbólica de comunicação referente ao sistema jurídico.

Para um correta interpretação do sistema jurídico, cabe, pois, ao cientista do Direito fazer a analise do objeto de seu estudo à luz dos fatores dantes mencionados. A interpretação, nesse caso, é a operação mental com a finalidade de apreender o conteúdo semântico do enunciado lingüístico pelo qual a norma jurídica se manifesta no nível externo [82].

De acordo com Candido Rangel Dinamarco, a experiência jurídica pode ser estudada por três aspectos: norma, valor e fato. Sob o ângulo da norma, constrói-se a epistemologia (ciência do direito positivo), à qual pertence a dogmática jurídica, que estuda o direito como ordem normativa. Os valores éticos do direito são objeto da deontologia jurídica. O fato é estudado pela culturologia [83].

O objeto de estudo do cientista do Direito é a norma jurídica (epistemologia), de forma que a sua função é interpreta-la a partir de determinados fatores. O intérprete tem por função buscar o verdadeiro sentido e alcance da norma jurídica.

Celso Antonio Bandeira de Mello, nesse diapasão, vai definir interpretação como "extrair o significado de um texto", vez que, no patamar da linguagem jurídica (a linguagem natural utilizada na área do Direito), nem sempre os termos empregados são unívocos [84]. A interpretação é, pois, imprescindível quando se trata de norma jurídica.

Assim, a interpretação da linguagem jurídica de uma determinada norma vai estar baseada na análise conjunta de várias outras normas e princípios do sistema jurídico que ela compõe. Estes, por sua vez, se apóiam nos conceitos da realidade exterior para o qual a norma jurídica é direcionada.

A função do intérprete terá sua importância derivada dessa interdependência entre a norma jurídica e o contexto social, político e econômico no qual e para o qual a interpretação se destina [85].

A idéia de sistema jurídico dá suporte à idéia de interpretação por outros fatores referentes à interveniência dos princípios informadores do ordenamento jurídico que têm a função de adequar a interpretação à ordem jurídica sob a qual ele se debruça. Em razão disso, tem-se por inadmissível a realização da interpretação de uma norma jurídica que não esteja em conformidade com os seus princípios informadores.

Decorre daí a principal importância dos princípios na interpretação da linguagem jurídica.

Como já cuidamos de especificar linhas atrás, apoiados na lição de Rizzatto Nunes, nenhuma interpretação será bem feita se for desprezado um princípio. Seguindo a lição do mestre, "cabe ao intérprete equacionar os problemas que encontra no ordenamento, obedecendo à ordem fundamental dos princípios" [86].

Como enfatiza Sérgio Sérvulo da Cunha, "aplicar uma norma contrariamente aos respectivos princípios é o mesmo que aplicar outra norma, inexpressa, ou talvez, inexistente no sistema" [87].

A importância dos princípios se revela quando há a necessidade de contornar a antinomia eventualmente existente entre duas ou mais normas, lembrando que o conflito das normas somente se revela quando o campo de aplicação das leis é o mesmo caso concreto [88].

A solução, apontada por Cláudia Lima Marques, é a convergência dos princípios, que conduz ao cominho para o diálogo entre as fontes: "a convergência de princípios é vista hoje como um fato bastante positivo para a co-habitação (ou diálogo) das leis novas e antigas no mesmo sistema jurídico" [89].

Devemos ter em mente, como já mencionamos alhures, que os princípios não devem ser encarados apenas como elementos supletivos, para omissão ou insuficiência da lei. É claro que eles exerceram um importante papel na solução de problemas relativos às lacunas da lei. Mas não somente isso.

Na interpretação na linguagem jurídica, o intérprete deve ter como guia os princípios jurídicos que inspiraram o legislador. Qualquer interpretação que se fizer desprezando os princípios, será uma interpretação equivocada.

Daí se dizer que não se basta o sentido literal da norma jurídica: é necessário buscar sempre o seu espírito.


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Notas

  1. Manual de introdução ao estudo do direito, p. 28.
  2. Nesse sentido, ver Rizzatto Nunes, Manual de introdução..., cit., pp. 28-29.
  3. Cf. Rizzatto Nunes, Manual de introdução..., cit, p. 33.
  4. Manual de introdução..., cit., p. 32.
  5. Rizzatto Nunes, Manual de introdução..., cit., p. 34.
  6. Curso de direito civil, vol. 1, p. 05.
  7. Rizzatto Nunes, Manual de introdução..., cit., p. 65.
  8. Cf. Márcia Dominguez Nigro Conceição, Conceitos indeterminados na constituição, p. 19.
  9. Márcia Dominguez Nigro Conceição, op. cit., p. 29.
  10. Manual de introdução..., cit., p. 245.
  11. Comentário contextual à constituição, p. 13.
  12. Rizzatto Nunes, Manual de introdução..., cit., p. 246.
  13. Márcia Dominguez Nigro Conceição, op. cit., p. 29.
  14. Segundo José Afonso da Silva, "normas são preceitos que tutelam situações subjetivas de vantagem ou de vínculo – ou seja, reconhecem, por um lado, a pessoas ou a entidades a faculdade de realizar certos interesses por ato próprio ou exigindo ação ou abstenção de outrem ou, por outro lado, vinculam pessoas ou entidades à obrigação de submeter-se às exigências de realizar uma prestação, ação ou abstenção em favor de outrem." (Comentário contextual à constituição, p. 28).
  15. No mesmo sentido, Márcia Dominguez Nigro Conceição, op. cit., p. 27.
  16. Manual de introdução..., cit., p. 249.
  17. Op. cit., p. 29.
  18. Op. cit., p. 29.
  19. Op. cit., p. 29.
  20. Rizzatto Nunes, Manual de introdução..., cit., p. 249.
  21. apud Márcia Dominguez Nigro Conceição, op. cit., p. 29.
  22. Cf. Márcia Dominguez Nigro Conceição, op. cit., p. 31.
  23. Manual de introdução..., cit., p. 253.
  24. Rizzatto Nunes, Manual de introdução..., cit., p. 254.
  25. Rizzatto Nunes, Manual de introdução..., cit., p. 254.
  26. Cf. Rizzatto Nunes, Manual de introdução..., cit., pp. 258-259.
  27. Manual de introdução..., cit., p. 277.
  28. Rizzatto Nunes, Manual de introdução..., cit., p. 278.
  29. Rizzatto Nunes, Manual de introdução..., cit., p. 279.
  30. Rizzatto Nunes, Manual de introdução..., cit., p. 279.
  31. Manual de introdução..., cit., p. 204.
  32. Manual de introdução..., cit., p. 262.
  33. Cf. Rizzatto Nunes, Manual de filosofia do direito, p. 295.
  34. Cf. Márcia Dominguez Nigro Conceição, op. cit., p. 62.
  35. Manual de introdução..., cit., p. 260.
  36. Apud Sérgio Pinto Martins, Manual de direito do trabalho, p. 73.
  37. Apud Sérgio Pinto Martins, op. cit., p. 73.
  38. Elementos de direito administrativo, pp. 299 e 300.
  39. Cf. Sérgio Sérvulo da Cunha, Princípios constitucionais, cit., p. 65.
  40. Comentário contextual à constituição, p. 28.
  41. Nesse sentido, Sérgio Pinto Martins, Manual de direito do trabalho, p. 73.
  42. Cf. Rizzatto Nunes, Manual de introdução..., cit., p. 178.
  43. Direito ambiental brasileiro, p. 53.
  44. Manual de introdução..., cit., p. 178.
  45. Princípios constitucionais, p. 18.
  46. Apud Fernando F. Santos, Princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, pp. 48-49.
  47. Rizzatto Nunes, O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, p. 05.
  48. Vide, a propósito, Fernando Ferreira dos Santos, op. cit., p. 44.
  49. Op. cit., pp. 62-63.
  50. Nesse sentido, Sérgio Sérvulo da Cunha, Pincípios constitucionais, p. 45.
  51. Ver, a propósito, Instituições de direito civil, p. 17.
  52. Curso de direito civil, vol. 1, p. 69.
  53. Cf. Rizzatto Nunes, O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, p. 19.
  54. Rizzatto Nunes, Manual de introdução ao estudo do direito, p. 178.
  55. Extrai-se da lição do professor Rizzatto Nunes, que "o princípio, em qualquer caso concreto de aplicação das normas jurídicas, da mais simples à mais complexa, desce das altas esferas do sistema ético-jurídico em que se encontra para imediata e concretamente ser implementado no caso real que se está a analisar." (O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, p. 19).
  56. Direito civil – parte geral, p. 50.
  57. Princípios constitucionais, p. 191.
  58. Instituições de direito do trabalho, p. 146.
  59. Cf. Sérgio Sérvulo da Cunha, op. cit., p. 65.
  60. Direito constitucional do trabalho, p. 64.
  61. Manual de introdução ao estudo do direito, p. 180.
  62. Cf. Rizzatto Nunes, O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, p. 20.
  63. Cf. Rizzatto Nunes, O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, p. 20.
  64. Curso de direito constitucional positivo, p. 93.
  65. Princípios constitucionais, p. 54.
  66. Sérgio Sérvulo da Cunha, op. cit. p. 54.
  67. Sérgio Sérvulo da Cunha, op. cit., p. 54.
  68. Sérgio Sérvulo da Cunha, op. cit., p. 55.
  69. Filosofia do direito, p. 57.
  70. Filosofia do direito, p. 60.
  71. Elementos de direito administrativo, pp. 299 e 300.
  72. Manual de introdução ao estudo do direito, p. 185.
  73. Curso de direito constitucional, p. 232.
  74. Curso de direito constitucional, p. 232.
  75. Filosofia do direito, pp. 60-61.
  76. Cf. Rizzatto Nunes, O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, p. 37.
  77. Direito constitucional e teoria da constituição, pp. 1038/1041.
  78. Curso de direito constitucional positivo, p. 98.
  79. Nesse sentido, Rizzatto Nunes, Manual de introdução ao estudo do direito, p. 185.
  80. Rizzato Nunes, Manual de introdução ao estudo do direito, p. 186.
  81. Rizzato Nunes, Manual de introdução ao estudo do direito, p. 186.
  82. No mesmo sentido, ver Márcia Dominguez Nigro Conceição, op. cit., pp. 64-65.
  83. Teoria geral do processo, p. 56.
  84. Apud Márcia Dominguez Nigro Conceição, op. cit. p. 64.
  85. Nesse sentido, Márcia Dominguez Nigro Conceição, op. cit. p. 66.
  86. Rizzatto Nunes, O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, p. 20.
  87. Princípios constitucionais, p. 54.
  88. Cf. Cláudia Lima Marques, Comentários ao código de defesa do consumidor, p. 31.
  89. Comentários ao código de defesa do consumidor, p. 31.
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Sobre o autor
Fernando Augusto Sales

Advogado em São Paulo. Mestre em Direito. Professor da Universidade Paulista - UNIP, da Faculdade São Bernardo - FASB e do Complexo de Ensino Andreucci Proordem. Autor dos livros: Direito do Trabalho de A a Z, pela Editora Saraiva; Súmulas do TST comentadas, pela Editora LTr; Manual de Processo do trabalho; Novo CPC Comentado; Manual de Direito Processual Civil; Estudo comparativo do CPC de 1973 com o CPC de 2015; Comentários à Lei do Mandado de Segurança e Ética para concursos e OAB, pela Editora Rideel; Direito Ambiental Empresarial; Direito Empresarial Contemporâneo e Súmulas do STJ em Matéria Processual Civil Comentadas em Face do Novo CPC, pela editora Rumo Legal; Manual de Direito do Consumidor, Direito Digital e as relações privadas na internet, Manual da LGPD, Manual de Prática Processual Civil; Desconsideração da Personalidade Jurídica da Sociedade Limitada nas Relações de Consumo, Juizados Especiais Cíveis: comentários à legislação; Manual de Prática Processual Trabalhista e Nova Lei de Falência e Recuperação, pela editora JH Mizuno.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SALES, Fernando Augusto. A importância dos princípios na interpretação da linguagem jurídica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2188, 28 jun. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13049. Acesso em: 24 abr. 2024.

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