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Contribuição sindical e servidores públicos estatutários.

Análise da legislação e da jurisprudência

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06/07/2009 às 00:00
Leia nesta página:

III – A Instrução Normativa nº 1 do Ministério do Trabalho e Emprego, de 30 de setembro de 2008

Registre-se, outrossim, que o Ministério do Trabalho e Emprego recentemente editou a Instrução Normativa nº 1, de 30 de setembro de 2008, nos seguintes termos:

CONSIDERANDO a necessidade de uniformizar o procedimento de recolhimento da contribuição sindical, prevista nos artigos 578 e seguintes da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, pela administração pública federal, estadual e municipal;

CONSIDERANDO que a exclusão dos servidores estatutários do recolhimento da contribuição sindical viola o princípio da isonomia tributária, previsto no art. 150, II da Constituição Federal de 1988;

CONSIDERANDO que os acórdãos proferidos nos RMS 217.851 (sic), RE 146.733 e RE 180.745 do Supremo Tribunal Federal determinam que "facultada a formação de sindicatos de servidores públicos (CF, art. 37, VI), não cabe excluí-los do regime da contribuição legal compulsória exigível dos membros da categoria";

CONSIDERANDO que o Superior Tribunal de Justiça, no mesmo sentido do Supremo Tribunal Federal, vem dispondo que "A lei que disciplina a contribuição sindical compulsória (´´´´imposto sindical´´´´) é a CLT, nos arts. 578 e seguintes, a qual é aplicável a todos os trabalhadores de determinada categoria, inclusive aos servidores públicos", conforme os acórdãos dos Resp 612.842 e Resp 442.509;

e

CONSIDERANDO que os Tribunais Regionais Federais também vêm aplicando as normas dos art. 578 e seguintes da CLT aos servidores e empregados públicos, resolve:

Art. 1º Os órgãos da administração pública federal, estadual e municipal, direta e indireta, deverão recolher a contribuição sindical prevista no art. 578, da CLT, de todos os servidores e empregados públicos, observado o disposto nos artigos 580 e seguintes da Consolidação das Leis do Trabalho.

Art. 2º Esta Instrução Normativa entra em vigor na data de sua publicação.

Observe-se, primeiramente, que os Recursos Extraordinários 146.733 e 180.745 não trataram da contribuição sindical de servidores públicos. Com efeito, o primeiro referiu-se à contribuição social sobre o lucro das pessoas jurídicas, e não há menção ao tributo disciplinado pela CLT em qualquer dos votos. Já o segundo limitou-se a debater a recepção, pela Constituição Federal de 1988, da contribuição sindical de não filiados ao sindicato, sem mencionar a situação dos servidores públicos estatutários.

Quanto ao RMS 21.785 e à jurisprudência do STJ, remetemos o leitor para a primeira parte deste artigo.

Em relação à apontada violação à isonomia pela exclusão dos servidores estatutários do recolhimento da contribuição sindical, deve-se ressaltar que a igualdade de tratamento pressupõe a igualdade entre empregados e servidores. Conforme já demonstrado, são categorias que não se confundem. Ademais, após magistral análise jurídica, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 492 (Min. Carlos Velloso, DJ de 12/3/1993), reconheceu que a Constituição Federal não assegurou aos servidores públicos o direito à negociação coletiva e ao ajuizamento de dissídios coletivos, devendo seus direitos e garantias ser fixados obrigatoriamente por lei (em relação aos vencimentos, ver Súmula 679/STF). Essas são diferenças importantes que justificariam o tratamento diferenciado dado aos servidores estatutários - embora nossa tese central, aqui, seja apenas a de que é necessária expressa determinação legal para a cobrança da contribuição sindical de servidores públicos. Nos termos do voto do relator na referida ação direta, citando o parecer da representante do Ministério Público:

[...] [há] muitas e inconciliáveis diferenças entre o regime estatutário e o contratual de Direito Privado, mas especificamente o de Direito do Trabalho. Neste, apesar da franca intervenção do Estado na regulação das relações de trabalho (...), existe amplo espaço para a autonomia da vontade, nascendo os direitos e obrigações não da lei, mas do contrato.

Enquanto as relações de Direito Público caracterizam-se pela desigualdade jurídica das partes (Estado e administrado), nas de Direito Privado impõem-se a igualdade jurídica, a despeito de ser comum a desigualdade econômica – caso das relações privadas de trabalho – a forçar a intervenção do Estado, mas sem desnaturar a origem contratual das obrigações.

É certo, assim, que as relações do servidor público com o Estado são diferentes daquelas que se estabelecem entre empregado e patrão. Por isso, não é viável dar-lhes tratamento igual e nem a Constituição o fez.

Tanto isso é verdade que, quando quis conferir ao servidor público alguns dos direitos atribuídos aos trabalhadores em geral, a Carta mandou aplicar-lhes os preceitos correspondentes (...). Se ambas as categorias tivessem o mesmo status, os servidores públicos só por isso gozariam dos mesmos direitos daqueles trabalhadores, não havendo razão para a Carta Maior aplicar-lhes as normas que os prevêem.

Por fim, a mera "necessidade de uniformizar o procedimento de recolhimento da contribuição sindical (...) pela administração pública federal, estadual e municipal" e a existência de alguns precedentes judiciais sem efeitos vinculantes e erga omnes não legitimam a cobrança compulsória do tributo "de todos os servidores e empregados públicos" do país com base em uma instrução normativa, o que viola, pelas razões já expostas, o princípio da estrita legalidade tributária (art. 150, I, da CF/88). Com efeito, apenas a lei pode definir o sujeito passivo dos tributos (art. 97, III, do CTN).

Ademais, não há falar que os arts. 583, § 1º, e 589 da CLT amparam o ato normativo em questão, pois tratam, respectivamente, do recolhimento da contribuição por meio de "sistema de guias, de acordo com as instruções expedidas pelo Ministro do Trabalho", e dos créditos a serem realizados pela Caixa Econômica Federal após a arrecadação do tributo.


Conclusão

A questão da incidência da contribuição sindical sobre os salários dos servidores públicos estatutários ainda não foi objeto de análise aprofundada pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça, apesar de haver um considerável número de precedentes sobre o tema.

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De nossa parte, não vislumbramos a possibilidade de estender a aplicação dos arts. 578 e seguintes da CLT aos servidores públicos estatutários, porquanto (a) o art. 7º da CLT é taxativo ao condicionar à expressa determinação legal a aplicação dos dispositivos previstos na CLT aos servidores públicos estatuários dos entes da Federação e suas autarquias; (b) os servidores públicos não estão previstos como sujeitos passivos da contribuição sindical, sendo vedada a utilização da analogia para a exigência de tributo (art. 108, § 1º, do CTN); (c) da mera previsão do direito à livre associação sindical para os servidores públicos pela CF/88 (art. 37, V) não decorre a autorização para a cobrança de tributo sem que a lei o determine (art. 150, I, da CF/88 e art. 97, III, do CTN); (d) a Instrução Normativa nº 1/2008 do MTE não tem amparo legal nem constitucional e há flagrantes equívocos em suas premissas.


Notas

  1. "Hermentismo", termo inexistente no dicionário, inclusive no jurídico, é empregado ironicamente por Douglas Fischer, Procurador Regional da República na 4ª Região, para quem significa "a hermenêutica das ementas", "nova forma de interpretação jurídica" (FISCHER, Douglas. O STF e o crime de apropriação indébita de INSS. In: Revista Jus Vigilantibus, 11/1/2009. Disponível em: . Acesso em 5 de junho de 2009).
  2. Nem teria como ser diferente, pois à época da elaboração da CLT não havia direito à associação sindical para os servidores públicos.
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Sobre o autor
Daniel Pinheiro de Carvalho

Advogado da União. Assessor de Ministro do STF. Bacharel em Direito pela Universidade de Brasília - UnB. Pós-graduado em Direito Público.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARVALHO, Daniel Pinheiro. Contribuição sindical e servidores públicos estatutários.: Análise da legislação e da jurisprudência. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2196, 6 jul. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13103. Acesso em: 22 dez. 2024.

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