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O encargo de 20% instituído pelo Decreto-Lei nº 1025/69 e as execuções fiscais da União

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01/07/2000 às 00:00

Resumo:


  • O encargo de 20% previsto no Decreto-lei nº 1025/69 é cobrado sobre a dívida ativa da União para custear os serviços despendidos com a arrecadação de créditos.

  • Há divergências na jurisprudência quanto à natureza jurídica desse encargo, sendo algumas decisões entendendo-o como honorários advocatícios.

  • Alguns doutrinadores defendem que o encargo de 20% poderia ser considerado uma penalidade administrativa pelo inadimplemento voluntário da obrigação tributária, sendo ilegal e afrontando a ordem jurídica.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

5. Nosso posicionamento.

Consideramos que o encargo de 20% instituído pelo art. 1º do Decreto-lei nº 1025/69 é penalidade administrativa pelo inadimplemento voluntário da obrigação tributária, com o que não concorda Sacha Calmon Navarro Côelho (18), para quem o contribuinte tem o dever subjetivo de resistir ao pagamento de tributo. Assim, inadimplir uma obrigação tributária não consistiria num ato ilícito, pois não teria tipicidade.

Não concordamos com a inclusão do encargo na categoria das taxas pois não acreditamos que a cobrança administrativa ou judicial da Dívida Ativa se caracterize como serviço público, posto dever este refletir um caráter de prestacionalidade ao contribuinte, o que não ocorre pelo ajuizamento de uma execução fiscal. Ademais, o valor do serviço deve guardar relação eqüitativa com a taxa cobrada, fato este não encontrado no instituto de que tratamos, levando-o a transplantar-se para a categoria dos impostos (19).

Da mesma forma, cremos não assistir razão aos que o vêm como imposto, pois um tributo não pode ter como fato gerador um ato ilícito, mas incidir sobre atos, bens, situações lícitas como prescreve o art. 3º do CTN. Mesmo como imposto melhor sorte não assiste ao indigitado encargo, posto que, à mingua de previsão constitucional para a hipótese fática do encargo com a atribuição de competência tributária à União, deveria o mesmo ser veiculado por lei complementar, posto que assim restaria compreendido na competência residual da União (art. 154, I, da CF).

O encargo de 20% instituído pelo Decreto-lei nº 1025/69 e alterado por vários diplomas normativos consiste, verdadeiramente, em medida punitiva ao devedor recalcitrante (20). Se o devedor satisfaz o débito antes da cobrança judicial, diminui-se o percentual devido a 10%; ajuizada a ação fiscal, eleva-se o encargo a 20% do montante da dívida consolidada (principal, multa e juros). Como multa que é, constatamos o exercício de uma ilegalidade a agravar o quadro tributário no Brasil: a incidência de encargos dos mais variados tipos e gostos a onerar o contribuinte, e entre eles, a burla ao princípio geral de direito da proibição de bis in idem, caraterizado pela cobrança de uma multa (encargo de 20%) sobre uma outra multa (multa de mora), esta que muitas vezes atinge o percentual de 100% sobre o valor do débito.

Portanto, vislumbra-se, a despeito da denominação que lhe der, a ilegalidade do encargo de 20% instituído pelo Decreto-lei nº 1025/69, pois o mesmo grava o patrimônio do executado com uma sanção, já prevista e duplamente cobrada, sob o roupagem de custear a máquina arrecadatória estatal.


NOTAS

  1. O art. 1º da Lei 6830/80 está assim redigido, verbis: "Art. 1º. A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil ".
  2. Cf. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 9. ed. rev. São Paulo: Forense, 1997, p. 4-5.
  3. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio Básico de Língua Portuguesa. 1. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988, p. 244.
  4. " Multa fiscal: toda prestação pecuniária compulsória, instituída em lei, em prol do Estado ou de pessoa sua, que seja sanção de ato ilícito em matéria fiscal, assim entendido o descumprimento da obrigação tributária principal ou acessória (deveres principais secundários numa linguagem mais apurada). Juros: são calculados sobre o principal da dívida (o tributo não pago), a título de compensar o Estado pela não disponibilidade do dinheiro, representado pelo crédito tributário, desde o dia previsto para o seu pagamento " (grifos do autor) ( COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Teoria e Prática das Multas Tributárias. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, pp. 76-77).
  5. O art. 110 do CTN está assim disposto, ipsis litteris: " Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias ".
  6. SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 11. ed.. Rio de Janeiro: Forense, 1994, p. 163).
  7. Passou-se a entender que o encargo de 20%, do art. 1º, do Decreto-lei 1025/69, tratava-se de honorários de advogado com a edição do Decreto-lei 1645/78 que em seu art. 3º dispunha: "Art. 3º. Na cobrança da Dívida Ativa da União, a aplicação do encargo de que tratam o art. 21 da Lei nº 4439, de 27 de outubro de 1964,... o art 1º do Decreto Lei nº 1025/69, de 21 de outubro de 1969, e o art. 3º do Decreto-lei nº 1569, de 8 de agosto de 1977, substitui a condenação do devedor em honorários de advogado e o respectivo produto será, sob esse título, recolhido integralmente ao Tesouro Nacional ".
  8. Revista Dialética de Direito Tributário. nº 56, p. 167
  9. A Súmula nº 168 tem a seguinte dicção, verbis: "O encargo de 20%, do Dec.-lei 1.025, de 1969, é sempre devido nas execuções fiscais da União e substitui, nos embargos, a condenação do devedor em honorários advocatícios".
  10. O referido acórdão tem a seguinte ementa, verbis: "Processo Civil. Execução Fiscal. Encargo Previsto no art. 1º do Decreto-lei 1.025/1969. Precedentes do STJ. Embargos de Divergência acolhidos. I – É legítima a cobrança do encargo de 20% previsto no art. 1º do Decreto-lei 1.025/1969, o qual serve para cobrir todas as despesas (inclusive honorários advocatícios) relativas à arrecadação dos tributos não recolhidos, não sendo mero substituto da verba honorária. II – Embargos de divergência acolhidos". (STJ. 1ª Seção. EREsp nº 124263/DF, rel. Min. Adhemar Maciel, unânime, DJ 10.8.1998, p. 07).
  11. O art. 3º do CTN está desta forma versado, litteris: "Art. 3º. Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção por ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade plenamente vinculada".
  12. Cf. AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 4.ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 1999, pp. 79-86.
  13. Cf. AMARO, Luciano. idem, p. 74-79.
  14. CAHALI, Yussef Said. Apud in BACHO, Renato Lopes. Honorários Advocatícios nos Executivos Fiscais da Fazenda Nacional. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: nº. 43, 1999, p. 117.
  15. Cf. BACHO, Renato Lopes. Honorários Advocatícios nos Executivos Fiscais da Fazenda Nacional. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: nº 43, p. 122; CARDOSO, Alessandro Mendes. Do encargo instituído pelo Decreto-lei nº 1.025/69. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: nº 56., pp.7-18.
  16. "Serviço público, como um capítulo do direito administrativo, diz respeito a atividade realizada no âmbito do das atribuições da Administração, inserida no Executivo. E refere-se à atividade prestacional, em que o poder público propicia algo necessário à vida coletiva, como por exemplo: água, energia elétrica, transporte urbano. As atividades-meio, por exemplo: arrecadação de tributos, serviços de arquivo, limpeza de repartições, vigilância de repartições, não se incluem na acepção técnica de serviço público ". E mais adiante: "Em essência serviço público significa prestações; são atividades que propiciam diretamente benefícios e bens, aos administrados, não se incluindo aí as de preparação de infra-estruturas (arquivo, arrecadação de tributos) ". MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998, pp. 329-330.
  17. "...para o efeito de situar o problema da cobrança de taxas, podemos entender por serviço público toda e qualquer atividade prestacional realizada pelo Estado, ou por quem fizer suas vezes, para satisfazer, de modo concreto e de forma direta, necessidade coletivas." MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 16. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 340.
  18. "Multas é que não podem ser por ausência de tipicidade do ilícito. Tampouco poderão ser tributários, vez que na espécie não há "fato gerador". Ocorre-nos, todavia, que, a título de ressarcir despesas judiciais inclusive honorários advocatícios à conta da Fazenda, pela cobrança do crédito tributário, venha a lei estatuir "acréscimos" à dívida. Nossa posição é radical no particular. O aparato judicial deve estar disponível às partes. É dever do Estado. Nada de acréscimos, portanto" (grifos originais) COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Teoria e Prática das Multas Tributárias. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 80.
  19. "Finalmente, é muito importante, nas taxas, o elemento base de cálculo, dado possuir ele um caráter determinante do quantum devido. Não sendo a base de cálculo bem escolhida, desaparece a figura da taxa para, em seu lugar, surgir a do imposto" BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Financeiro e de Direito Tributário. 4. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 151.
  20. O STJ possui recente pronunciamento neste sentido, verbis: "Processual – Execução Fiscal – Acréscimo Previsto no art. 1º do DL 1.025/69 – Sanção ao Devedor Recalcitrante – Possibilidade. O acréscimo ao valor do débito fiscal determinado pelo DL 1.025/69, constitui sanção, cominada ao devedor recalcitrante, em percentagem legalmente fixada. Não se confunde com os honorários de sucumbência, previstos no art. 20 do Código de Processo Civil. Não é lícito ao Juiz eximir o devedor recalcitrante do pagamento do encargo". (Recurso Especial nº 220.587/SP, julgamento em 02.9.1999, p. 00101). Em nota, o advogado Alessandro Mendes Cardoso observa: "Este entendimento, por enquanto restrito aos julgamentos relatados pelo Ministro Humberto Gomes de Barros, é passível de discussão, haja vista que sobre o valor a ser executado pela União Federal já incide a multa e juros de mora. Ressalte-se, ainda, que incidindo o encargo do Decreto-lei nº 1.025/69 sobre o valor consolidado do débito teríamos a aplicação de uma "sanção" sobre os valores já devidos a título de multa e juros de mora, ou seja, um bis in idem". CARDOSO, Alessandro Mendes. Do encargo instituído pelo Decreto-lei nº 1.025/69. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: nº 56, p.12.

BIBLIOGRAFIA

Livros

  1. ALVÁRES, Manoel. VITTA, Heraldo Garcia. SOUZA, Maria Helena de. CÂMERA, Miriam Costa Rebollo. SAKAKIHARA, Zuudi. Execução Fiscal – Doutrina e Jurisprudência. FREITAS, Vladimir Passos de. (coord). São Paulo: Saraiva. 1998.
  2. AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 4.ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva. 1999.
  3. BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Financeiro e de Direito Tributário. 4.ed. atual. São Paulo: Saraiva. 1995.
  4. COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Teoria e Prática das Multas Tributárias. 2.ed. Rio de Janeiro: Forense.1998.
  5. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio Básico. 1.ed. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira. 1988.
  6. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 16.ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Malheiros. 1999.
  7. MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 2.ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 1998.
  8. SILVA, De Plácido. Vocabulário Jurídico. v.I. 4.ed. Rio de Janeiro: Forense. 1994.
  9. THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. v.I. 18.ed. Rio de Janeiro: Forense. 1996.

          Artigos:

  1. BACHO, Renato Lopes. Honorários Advocatícios nos Executivos Fiscais da Fazenda Nacional. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: nº 43, abril 1999.
  2. CARDOSO, Alessandro Mendes. Do encargo instituído pelo Decreto-lei nº 1.025/69. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: nº 56, maio 2000.
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Sobre o autor
Henrique Tróccoli Júnior

acadêmico da Faculdade de Direito do Recife (UFPE), técnico judiciário na Justiça Federal – Seção Judiciária de Pernambuco

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TRÓCCOLI JÚNIOR, Henrique. O encargo de 20% instituído pelo Decreto-Lei nº 1025/69 e as execuções fiscais da União. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 43, 1 jul. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1326. Acesso em: 23 dez. 2024.

Mais informações

Texto elaborado para o concurso promovido pelo Caderno Acadêmico dos estudantes de direito da Faculdade de Direito do Recife – FDR.

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