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Questões sobre a hierarquia entre as normas constitucionais na CF/88

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01/07/1999 às 00:00
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6. Conclusão

A Constituição, como norma fundamental e legitimadora do ordenamento jurídico, deve guardar um mínimo de unidade, univocidade e coerência, a fim de que sua concretização normativa seja estável.

Através da Constituição, os padrões axiológicos e teleológicos a serem seguidos na produção e concretização da norma são predeterminados, vinculando toda a atividade estatal à obediência dos fundamentos e diretrizes consagrados constitucionalmente. Destes, a Constituição de 1988 destaca em seus arts. 1º e 3º, os fundamentos e diretrizes constitucionais fundamentais, as opções político-ideológicas que devem orientar o ordenamento jurídico-constitucional e infraconstitucional.

Contudo, os fundamentos e diretrizes constitucionais fundamentais somente encontram positividade quando sistematizados e ordenados em normas constitucionais, tornando possível sua individualização no caso concreto. As normas constitucionais podem ser princípios ou regras constitucionais.

As normas constitucionais se encontram hierarquizadas na Constituição, para que sua aplicação não seja desordenada e incerta.

A hierarquia entre as normas constitucionais ocorre da seguinte maneira:

a) Em primeiro lugar, os princípios constitucionais fundamentais, expressos ou não no texto constitucional, assim qualificados por compor parte do núcleo de limites materiais ao Poder de Reforma, que incidem sobre todo o ordenamento jurídico, e aos quais se encontram subordinados os demais princípios constitucionais e as regras constitucionais;

b) Em segundo lugar, os princípios constitucionais gerais, que são decorrentes e/ou subordinados aos princípios fundamentais, com incidência limitada a um determinado subsistema constitucional;

c) Por fim, as regras constitucionais, subordinadas aos anteriores.

Como não há hierarquia entre as regras constitucionais, na antinomia entre elas, uma terá que necessariamente excluir a outra. As regras jurídicas são ou não são constitucionais, mesmo que elas estejam formalmente na Constituição.

Os princípios constitucionais guardam um hierarquia entre si, ao sobrepor os princípios constitucionais fundamentais aos princípios constitucionais gerais. Entretanto, inexiste uma antinomia entre princípios, mas sim uma concretização proporcional dos princípios nas situações jurídicas individuais. Inexiste um princípio constitucional inconstitucional, pois ao se dar maior relevância a um em aparente detrimento de outro, não se está excluindo este do ordenamento jurídico-constitucional. Temos sim a presença mais forte de um princípio constitucional de grau hierárquico maior, sem invalidar o de grau inferior.

Se há um aparente conflito entre princípios de mesma hierarquia, deve-se aplicar o princípio constitucional fundamental da proporcionalidade, que concederá ao caso concreto uma aplicação coerente e segura da norma constitucional, pesando a incidência que cada um deve ter, e, preservando-se assim, o máximo dos direitos e garantias consagrados constitucionalmente.

A Constituição pressupõe uma hierarquia entre suas normas, pois do contrário, sua concretização se torna desarrazoada e insegura.


NOTA

(*) Inexiste unanimidade na doutrina quanto ao estabelecimento de um gênero "norma constitucional", que abrange por sua vez, duas espécies, a "regra constitucional" e o "princípio constitucional". A favor de critério similar, ver Grau, 1990: pp. 92-134; Guerra Filho, 1991: pp. 106-107. Contra: Canotilho & Moreira, 1991: p. 49; Dantas, 1995.1: p. 59; Borges, 1993: p. 143; Saraiva, 1993: p. 19.


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Sobre o autor
Vladimir da Rocha França

advogado em Natal (RN), professor da UFRN e da Universidade Potiguar, mestre em Direito Público pela Faculdade de Direito do Recife (UFPE), doutor em Direito do Estado pela PUC/SP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FRANÇA, Vladimir Rocha. Questões sobre a hierarquia entre as normas constitucionais na CF/88. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 33, 1 jul. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/135. Acesso em: 19 abr. 2024.

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