Sumário. 1. Introdução. 2. Natureza e titularidade do poder constituinte. Poder constituinte originário e poder constituinte derivado. 2.1. A convocação da Assembléia Nacional Constituinte de 1988. 3. Processo legislativo das emendas à Constituição. Limitações expressas e implícitas. 4. Controle de constitucionalidade das emendas à Constituição. 5. A ausência de previsão expressa da República como cláusula pétrea na Constituição Federal de 1988. 6. Breve análise da monarquia no mundo atual e do governo da Espanha. 7. O regime monárquico no Brasil. 8. Impossibilidade de alteração da forma de governo por via de emenda à Constituição, em face do plebiscito e da revisão constitucional ocorridos em 1993. A República como limite implícito ao poder reformador. 9. A cláusula pétrea do direito ao voto e interpretação histórica da Constituição Federal. 10. Conclusão. Bibliografia.
1. Introdução
As Constituições não são textos imutáveis, eternos ou permanentes, mas sim, textos passíveis de alteração para que se moldem às exigências sociais e permaneçam atualizadas. Ferdinand Lassalle, no século XIX, já ensinava que "a Constituição de um país é a soma dos fatores reais de poder que regem uma nação". [01] Isso significa que a Constituição, como reflexo da sociedade, deve ser alterada de acordo com as mudanças exigidas pela realidade social.
Alterar uma Constituição significa adaptá-la às alterações culturais, políticas e sociais de seu tempo, sem que seja necessário o rompimento de toda a ordem constitucional através da convocação de uma Assembléia Constituinte, ou através de uma revolução.
A Constituição Federal deve ser um sistema normativo aberto e dinâmico, e não um texto imutável, imodificável. Assim é que o legislador constituinte legitima, na própria Constituição, o Congresso Nacional como órgão representativo do povo soberano, a efetuar as mudanças necessárias ao Texto Constitucional. "Se é próprio da vida social o estar em constante mutação, o fenômeno jurídico, que pretende fundamentalmente regular a vida em sociedade, não poderia de deixar de sofrer alteração". [02]
Diante disso, serão aqui analisadas as emendas à Constituição como forma de alteração da Carta Magna decorrente do Poder Reformador, e a ocorrência inédita na história das constituições federais republicanas, da ausência de previsão da república como cláusula pétrea, analisando-se a possibilidade ou não de sua supressão do Texto Constitucional.
2. Natureza e titularidade do poder constituinte. Poder constituinte originário e poder constituinte derivado
Poder constituinte é o poder de elaborar uma nova Constituição, assim como o de reformar a Constituição vigente, seja modificando, suprimindo ou acrescentando normas constitucionais. O primeiro é chamado de poder constituinte originário, por instaurar uma nova ordem jurídica fundamental para o Estado. Já o segundo é chamado de poder constituinte derivado, sendo criado e instituído pelo poder constituinte originário.
Nos Estados democráticos de direito, o titular do poder constituinte é o povo, já que o Estado decorre da soberania popular. Celso Ribeiro Bastos ensina que o titular também poderá ser uma minoria, quando então o Estado terá a forma de aristocracia ou oligarquia. [03] Mas "ninguém jamais pôs em dúvida que, nas democracias, o titular da soberania é um só: o povo, entendido como o conjunto dos cidadãos, isto é, dos sujeitos de direitos cívicos ou políticos". [04]
Já o exercício do poder constituinte será exercido através de representantes do povo, seja por uma Assembléia Nacional Constituinte, no poder originário, ou através do Poder Legislativo, no poder secundário. No entanto, é equivocado entender que os mecanismos de reforma são do Poder Legislativo. As emendas à Constituição "não são obras do Poder Legislativo, mas do poder constituinte de revisão, ainda que este seja deferido, por economia ou simplificação, aos mesmos órgãos investidos do poder de legislar". [05]
O poder constituinte originário apresenta-se como inicial, ilimitado e incondicionado. É um poder de fato, absoluto, uma vez que incondicionado a qualquer forma de limitação jurídica. No entanto, defendem os jusnaturalistas que se trata na verdade de um poder de direito, pois seria preexistente ao próprio Estado. Seja de fato ou de direito, a verdade é que o poder constituinte originário é ilimitado.
O poder constituinte derivado também é denominado poder de segundo grau, secundário, relativo, limitado, instituído ou constituído. Seja como se queira chamar, esse poder caracteriza-se por ser um poder de direito, já que instituído pelo poder constituinte originário. É o poder de revisão, de reformulação do Texto Constitucional ou, de criação de uma Constituição Estadual pelos Estados-Membros ou de uma Lei-Orgânica pelos Municípios. Nesse último caso, é denominado poder derivado decorrente.
No primeiro caso, o poder constituinte é chamado de poder derivado de reforma, ou poder reformador, e manifesta-se através das emendas constitucionais e da revisão constitucional. Emenda e revisão são as formas de expressão do poder constituinte derivado, independentemente de qualquer classificação a ser adotada. "O bom senso já previne que quem emenda um texto, o revisa, como quem o revisa, emenda". [06] Paulo Bonavides prefere falar em via permanente de reforma e via extraordinária e transitória de reforma. [07]
Ainda, Manoel Gonçalves Ferreira Filho, sobre o poder de revisão, aponta que, "autores há – e são muitos, v. g., Duguit, Joseph Bathélemy, Laferriére, Duverger, Vedel... – que o consideram ilimitado". [08] Porém, conclui que a razão está com aqueles que entendem o poder de revisão como sendo limitado, tendo como limitador o próprio poder constituinte originário. E é este o entendimento amplamente majoritário na doutrina nacional, pela limitabilidade do poder constituinte derivado.
2.1. A convocação da Assembléia Nacional Constituinte de 1988
Importante se faz lembrar que a atual Constituição Federal é fruto de uma Assembléia Nacional Constituinte convocada por uma emenda à Constituição de 1967, a Emenda Constitucional nº 26, de 27 de novembro de 1985. Com base nisso, parte dos doutrinadores constitucionalistas sustentam que a Constituição de 1988 é obra do poder constituinte derivado, tratando-se de uma reforma à Constituição anterior, porque foi convocada por emenda à Constituição de 1967. Seria, ao invés de uma Assembléia Nacional Constituinte, um "Congresso Constituinte, ou uma Constituinte Congressual". [09]
Art. 1º. Os membros da Câmara Nacional dos Deputados e do Senado Federal reunir-se-ão, unicameralmente, em Assembléia Nacional Constituinte, livre e soberana, no dia 1º de fevereiro de 1987, na sede do Congresso Nacional. Art. 2º. O Presidente do Supremo Tribunal Federal instalará a Assembléia Nacional Constituinte e dirigirá a sessão de eleição do seu Presidente. Art. 3º. A Constituição será promulgada depois da aprovação de seu texto, em dois turnos de discussão e votação, pela maioria absoluta dos Membros da Assembléia Nacional Constituinte. [10]
Apesar da lógica argumentada pela doutrina, não é possível falar-se que a atual Constituição Federal não foi fruto do poder constituinte originário por ter sido a Assembléia Nacional Constituinte convocada por órgãos do poder constituído anterior.
"Mais do que em qualquer outro momento na história brasileira, a Constituição Federal de 1988 é produto legítimo do exercício da soberania popular, com as virtudes e vícios que daí advêm, sobretudo quanto às imperfeições do sistema representativo". [11]
José Afonso da Silva diz que "a Emenda Constitucional 26/85 só tem o nome de emenda constitucional, porque nem sua função, nem seu conteúdo nem as conseqüências de sua aplicação são de emenda constitucional". [12]
Portanto, não há que se falar em ter sido a atual Constituição obra do poder constituinte derivado, mas sim, fruto legítimo do poder constituinte originário manifestado através da Assembléia Nacional Constituinte.
3. Processo legislativo das emendas à Constituição. Limitações expressas e implícitas
O artigo 60 da Constituição Federal prevê o procedimento legislativo das emendas à Constituição. No seu caput, diz o artigo que a iniciativa para a proposta será: do Presidente da República; de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, ou; de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros. Nesse último caso, trata-se de uma legitimação praticamente inócua, pela impossibilidade fática de se conseguir obter todos esse interessados simultaneamente.
Continua o artigo 60 dizendo que a proposta de emenda à constituição (PEC) será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros. Note-se que no processo legislativo de emenda não se fala em projeto, mas sim em proposta de emenda. A promulgação será feita pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o respectivo número de ordem.
A Constituição Federal estabelece uma série de limitações expressas às emendas, podendo se falar também na existência de limites implícitos ou tácitos. Como se viu, o poder constituinte derivado é sempre limitado pelo poder constituinte originário. Os limites formais ou procedimentais foram vistos acima, sendo os que tratam do procedimento a ser observado para a tramitação de uma proposta de emenda.
Os limites circunstanciais tratam das situações em que a Constituição Federal não poderá ser emendada, tendo-se em vista razões de instabilidade política nacional. A Carta adicionou às tradicionais hipóteses de vedação de emenda na vigência de estado de defesa e estado de sítio, a vedação na vigência de intervenção federal. Trata-se de hipótese que, dependendo do caso, poderá dizer respeito a apenas alguns órgãos de determinado ente-federativo, muito diferente do que acontece nas situações de estados de defesa ou de sítio. [13]
Outro limite circunstancial está no § 5º, estabelecendo que a matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa. A Constituição Federal fixa a legislatura em quatro anos (art. 44, parágrafo único), que é o período legislativo que corresponde ao mandato dos Deputados Federais. Os Senadores são eleitos por duas legislaturas. As legislaturas são divididas em quatro sessões legislativas ordinárias, que por sua vez são subdivididas em dois períodos legislativos. Portanto, no período de um ano de cada sessão legislativa, não poderá ser novamente proposta a emenda rejeitada ou havida por prejudicada.
As limitações materiais referem-se às matérias que não podem ser objeto de emenda, chamadas de cláusulas pétreas, e estão no § 4º do artigo 60: Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes; os direitos e garantias individuais. É o chamado núcleo imodificável, ou núcleo intocável, por ser a parte imutável do Texto Constitucional. A vedação tem alcance maior do que o estabelecido, já que atinge a pretensão de modificar qualquer elemento conceitual das referidas matérias. [14]
Não há na Constituição da República de 1988, como pretendem alguns, os chamados limites temporais. Tais limites impediriam a modificação do Texto Constitucional durante determinado período após sua promulgação, ou somente permitiriam alterações após períodos determinados, espaçadamente. No Brasil, tal se deu somente na Constituição do Império, que vedava qualquer alteração antes de decorridos quatro anos após sua promulgação. [15] Celso Ribeiro de Bastos chama os limites circunstanciais do § 1º do art. 60 de temporais. [16]
Apesar de as emendas à Constituição não possuírem limites temporais, o artigo 3º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias previu a realização da revisão constitucional cinco anos contados da data da promulgação da Constituição Federal. Assim, uma vez findo o prazo estabelecido, esgotaram-se os termos da referida norma, passando ela a viger sem eficácia alguma na Carta Magna, tratando-se de claro limite temporal.
A doutrina brasileira, conforme ensina Nelson de Souza Sampaio, admite majoritariamente as chamadas limitações materiais implícitas. São também chamados de limites inerentes, tácitos ou lógicos, porque, apesar de não estarem expressos, decorrem dos próprios princípios adotados pela Constituição Federal. São elas: 1ª) as relativas aos direitos fundamentais; 2ª) as concernentes ao titular do poder constituinte; 3ª) as referentes ao titular do poder reformador; 4ª) as relativas ao processo da própria emenda ou revisão constitucional. [17]
4. Controle de constitucionalidade das emendas à Constituição
Pelo princípio da supremacia constitucional todas as normas que ingressam no ordenamento jurídico devem estar em conformidade com os princípios e preceitos trazidos pela Constituição. Assim, as normas contrárias ao Texto Constitucional que desobedeçam aos seus ditames devem ser retiradas do ordenamento. Esse controle abrange também a possibilidade de impedir o ingresso no ordenamento de uma norma inconstitucional.
Assim como os demais atos normativos, as emendas à Constituição também são submetidas ao controle de constitucionalidade, mesmo tratando-se de normas que introduzem no ordenamento jurídico outras de caráter constitucional. E assim deve ser, já que as emendas são manifestações do poder constituinte derivado que, como visto, é delimitado pelo poder constituinte originário e, portanto, deve obediência aos parâmetros impostos por este. Caso desobedeça a esses limites, será a emenda passível de controle para que seja declarada sua inconstitucionalidade, com a conseqüente retirada do ordenamento jurídico. [18]
O sistema brasileiro de controle de constitucionalidade admite o controle preventivo realizado antes do ingresso da norma no ordenamento jurídico e o repressivo, efetuado após a elaboração da norma, visando retirá-la do ordenamento. O controle repressivo permite a verificação de constitucionalidade através da via de ação (controle concentrado) e da via de defesa (controle difuso).
O Supremo Tribunal Federal admite o controle de constitucionalidade do processo legislativo das emendas somente por parte de parlamentares, por possuírem direito público subjetivo à correta elaboração das leis e das emendas à Constituição. Terceiros não dispõem do direito público subjetivo de supervisionar a elaboração dos atos legislativos, sob pena de o processo mandamental converter-se em inadmissível sucedâneo da ação direta de inconstitucionalidade. [19]
Conforme ensina Alexandre de Moraes, citado pelo Supremo Tribunal Federal:
Importante, porém, analisar-se a possibilidade do controle jurisdicional incidir sobre o processo legislativo em trâmite, uma vez que ainda não existiria lei ou ato normativo passível de controle concentrado de constitucionalidade. Assim sendo, o controle jurisdicional sobre a elaboração legiferante, inclusive sobre propostas de emendas constitucionais, sempre se dará de forma difusa, por meio do ajuizamento de mandado de segurança, por parte de parlamentares que se sentirem prejudicados durante o processo legislativo. Reitere-se que os únicos legitimados à propositura de mandado de segurança, para defesa do direito líquido e certo de somente participarem de um processo legislativo conforme as normas constitucionais e legais, são os próprios parlamentares. [20]
Da mesma forma, admite-se o controle efetuado através de ação direta de inconstitucionalidade, que tenha por objeto uma emenda à constituição que seja inconstitucional, ou através de ação autônoma, que tenha como pedido incidente a declaração de inconstitucionalidade da mesma.
O Ministro Celso de Mello, como Relator na ADIn nº 466, assim esclareceu em seu voto: "Emendas à Constituição - que não são normas constitucionais originárias - podem, assim, incidir, elas próprias, no vício da inconstitucionalidade, configurado pela inobservância de limitações jurídicas superiormente estabelecidas no texto constitucional por deliberação do órgão exercente das funções constituintes primárias ou originárias".
Em matéria de alteração constitucional superveniente entende o Supremo Tribunal Federal que, caso haja ação direta de inconstitucionalidade alegando violação de dispositivos constitucionais e, posteriormente, tais dispositivos sejam alterados através de emenda, de forma a tornar a norma impugnada compatível com a Constituição, restará prejudicada a ação direta, por falta de objeto. [21] Trata-se, na verdade, de carência superveniente, e não de perda de objeto.
No caso das emendas de revisão, muito se debateu sobre quais seriam seus limites. Prevaleceu, de forma acertada, o entendimento de que as emendas de revisão, como decorrência do poder reformador, também deviam obediência aos limites materiais estabelecidos no art. 60 da Constituição. Para Michel Temer, os limites da revisão constitucional eram os mesmos impostos às emendas à Constituição. Atenta o autor para o detalhe de que na revisão, os votos dos senadores e deputados tinham o mesmo peso, tendo em vista a realização de sessão unicameral, o que não ocorre no caso de Emenda à Constituição, onde a sessão é bicameral. [22]
O Supremo Tribunal Federal entende ser titular de competência em relação à revisão constitucional, já que emenda e revisão constituiriam modos distintos de manifestação do Poder Constituinte de reforma: "As mudanças na Constituição, decorrentes da revisão do art. 3º do ADCT, estão sujeitas ao controle judicial, diante das ‘cláusulas pétreas’ consignadas no art. 60, § 4º e seus incisos, da Lei Magna de 1988" (Adin 981-PR, Rel. Min. Néri da Silveira, j. 17.12.1993). [23]
5. A ausência de previsão expressa da República como cláusula pétrea na Constituição Federal de 1988
A Constituição Federal de 1988 não trouxe dentre suas limitações materiais a República, optando o legislador constituinte em preservar expressamente somente a Federação. As constituições brasileiras republicanas sempre trouxeram proteção tanto à Federação, como à República. A princípio, portanto, não se pode falar que a República é uma das cláusulas pétreas do Texto Constitucional.
No artigo 2º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, estabeleceu-se que no dia 7 de setembro de 1993 o eleitorado definirá, através de plebiscito, a forma (república ou monarquia constitucional) e o sistema de governo (parlamentarismo ou presidencialismo) que devem vigorar no País. A data do plebiscito foi alterada para o dia 21 de abril de 1993, pela Emenda Constitucional nº 2, de 25 de agosto de 1992, de constitucionalidade duvidosa [24], tendo sido objeto das ações declaratórias de inconstitucionalidade 829, 830, 833 [25] e 981.
A doutrina brasileira pouco se manifesta sobre a possibilidade, ou impossibilidade, de ser a República objeto de emenda à Constituição. Muitos argumentam simplesmente que, na ausência de vedação expressa, quis o legislador constituinte permitir que fosse alterada a forma de Estado por meio de poder constitucional derivado, e tanto é assim que permitiu fosse realizado um plebiscito possibilitando ao povo escolher a forma desejada. Outros, também alegam a impossibilidade de alteração via emenda constitucional, uma vez que o único momento em que seria possível a alteração teria sido o plebiscito de 1993.
Para Manoel Gonçalves Ferreira Filho, "vemos assim que a República deixa de constituir dogma constitucional, tendo havido mesmo a previsão de plebiscito para definição popular sobre a forma de governo (art, 2º ADCT)". [26] Ainda, continua o renomado autor dizendo que "não se deve admitir limitações implícitas sempre que houver uma decisão inequívoca do constituinte sobre o que é imutável. De fato, a lógica manda entender que, nesse caso, o que não foi enunciado, foi posto de lado como não essencial". [27]
Já Paulo Bonavides diz que "o constituinte de 1988, mais indulgente em seus escrúpulos republicanos, foi tão longe que fez inserir no texto magno uma disposição transitória – a do artigo 2º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a qual entrega ao eleitor soberano, mediante plebiscito, a decisão definitiva sobre a forma de governo". [28] Entende o autor que não poderá mais ser abolida a República, pelo fato de que a oportunidade para tal alteração fora o plebiscito de 1993, previsto no referido artigo.
No entanto, justificar a possibilidade ou impossibilidade de alteração da forma de governo, de república para monarquia, exige um exercício de interpretação muito mais complexo. É preciso verificar a compatibilidade da monarquia com a forma federativa de Estado adotada no Brasil, o processo da revisão constitucional e o plebiscito previstos no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, as conseqüências de uma eventual alteração em relação ao direito constitucional ao voto e a interpretação histórica da Constituição Federal.