CONSIDERAÇÕES FINAIS
Antes as considerações explicitadas, respondemos aos questionamentos por nós propostos nos termos seguintes:
a) às ações penais privadas em curso ante da vigência das leis nos. 12.015/09 e 12.033/09, não se aplicam as regras atuais de titularidade de ação penal, pois lex gravior é irretroativa, porque excluiu benefícios da extinção da punibilidade decorrentes da perempção, e em alguns casos até mesmo de decadência, renúncia e perdão do ofendido. Trata-se de lei de feitos material. Deve-se dar ultratividade às normas revogadas dos artigos 145 e 225 do Código Penal aos casos que ocorreram sob sua vigência.
b) o Ministério Público, em relação a fatos ocorridos antes da vigência das leis nos. 12.015/09 (10.08.09) e 12.033/09 (30.09.09), não deve assumir a ação penal privada em curso, porque submisso ao princípio da legalidade a que está sujeito a administração pública (Art. 37, CF). O querelante não está desincumbido, portanto, do ônus de comparecer a todos os atos processuais que exige a sua presença, sob pena de ser declarada perempta sua ação penal privada.
c) quanto a sumula nº. 608 STF, entendemos que ela continua aplicável, posto que ao que parece é inconstitucional a exigência de representação nos crimes de dignidade sexual quando ocorre morte ou lesão grave. Convém ressaltar que o STF não concedeu liminar na ADI 4301, o que confirma, ainda, a vigência do artigo 225 com nova redação pela lei nº. 12.015/09, cabendo, difusamente, a cada magistrado exercer tal controle, até final decisão e modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade. Entretanto, nos casos de violência real consistente em lesão leve, deve-se manter a regra atual do artigo 225 do Código Penal, posto ser regra mais benéfica, proporcional e razoável. É de se lembrar que a ADI 4301, DE 17/09/09, corrobora nosso pensamento quanto à mesma aplicação da regra do art. 88 da Lei nº. 9.099/95 a esses casos, devendo-se extinguir todas as ações penais iniciadas pelo Ministério Público com resultado de lesão leve, salvo pretérita representação (seja formal ou não), posto que inaplicável a intimação do ofendido para, querendo, dê prosseguimento à ação penal já iniciada, à míngua de falta de dispositivo legal.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:
BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. DIREITO PENAL: parte geral. São Paulo: Saraiva, 1999.
BONFIM, Edílson Mougenot. CURSO DE PROCESSO PENAL. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
CAPEZ, Fernando. CURSO DE DIREITO PENAL. 1. V. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
CAPEZ, Fernando. CURSO DE DIREITO PENAL. 1. V. 12. ed. São Paulo: Saraiva: 2008.
GOMES, Luiz Flávio. CRIME ORGANIZADO. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995.
MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL. 4. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009.
MIRABETE, Júlio Fabrini. CÓDIGO PENAL INTERPRETADO JURISPRUDENCIALMENTE. São Paulo: Atlas, 1988.
MORAES, Alexandre de. DIREITO CONSTITUCIONAL. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2008.
NUCCI, Guilherme de Souza. CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL: comentários à Lei 12.015, de 7 de agosto de 2009. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.
Notas
- "Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: (...) § 3º Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência: (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)".
- "Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia. Parágrafo único. Verificar-se-á a decadência do direito de queixa ou representação, dentro do mesmo prazo, nos casos dos arts. 24, parágrafo único, e 31".
- "Art. 49. A renúncia ao exercício do direito de queixa, em relação a um dos autores do crime, a todos se estenderá".
- "Art. 107 - Extingue-se a punibilidade: (...) IX - pelo perdão judicial, nos casos previstos em lei".
- "PENAL. CRIME CONTRA OS COSTUMES. ESTUPRO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. É admitido o perdão da vítima em ação penal pública condicionada à representação, por força do disposto nos artigos 105, 107, V, e 225, §§ 1.º e 2.º, todos do Código Penal. O casamento da ofendida com terceiro, em não tendo o crime sido cometido com violência real ou grave ameaça e não havendo pedido de prosseguimento da ação penal, constitui causa extintiva da punibilidade. Inaplicável as disposições da Lei nº. 11.106/2005, que revogou o artigo 107, inciso VIII, do Código Penal, já que vigente lei mais benéfica ao tempo do fato. Decretaram extinta a punibilidade. Unânime". (TJRS: Apelação Crime Nº 70013371620, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luís Gonzaga da Silva Moura, Julgado em 19/07/2006).
- "Art. 107 - Extingue-se a punibilidade: (...)V - pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes de ação privada".
- CAPEZ, Fernando. CURSO DE DIREITO PENAL. 1. V. 12. ed. São Paulo: Saraiva: 2008, p. 48 e 49.
- GOMES, Luiz Flávio. CRIME ORGANIZADO. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 86-87.
- .. . CRIMES... São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 68 a 71.
- "PROCESSO PENAL. AUSENCIA DO QUERELANTE A ATO DE INTERESSE DA DEFESA. PEREMPÇÃO. - HABEAS CORPUS. ORDEM ACERTADAMENTE INDEFERIDA, NA ORIGEM, EM FACE DA JUSTIFICADA AUSENCIA DO QUERELANTE - CPP, ART. 60, INC. III". (STJ, RHC 3976 / RJ, Rel. Ministro JOSÉ DANTAS, QUINTA TURMA, J. 07/11/1994, DJ 28/11/1994 p. 32623).
- Súmula nº. 608 do STF: "no crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada".
- .. . CRIMES... São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 69.
- "Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia".
- "Art. 88. Além das hipóteses do Código Penal e da legislação especial, dependerá de representação a ação penal relativa aos crimes de lesões corporais leves e lesões culposas".
- "Art. 91. Nos casos em que esta Lei passa a exigir representação para a propositura da ação penal pública, o ofendido ou seu representante legal será intimado para oferecê-la no prazo de trinta dias, sob pena de decadência".
- "HABEAS CORPUS HC 93535 (STF). PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. VIOLÊNCIA PRESUMIDA. REPRESENTAÇÃO. EMBRIAGUEZ DA REPRESENTANTE. ART. 39 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ART. 227, CAPUT, E § 4º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. FATOS E PROVAS. VIA ELEITA INAPROPRIADA. ORDEM DENEGADA NA PARTE CONHECIDA. I - Os princípios constitucionais constantes do art. 227 da Constituição Federal justificam a desnecessidade de rigor formal para a representação para fins penais, no caso de atentado violento ao pudor. II - O habeas corpus não constitui a via adequada para a apreciação de fatos e provas, no caso, a eventual embriaguez completa da representante da vítima. III - Impetração conhecida em parte, denegando-se a ordem na parte conhecida".
- Leia-se com esteio na súmula nº. 608-STF.
- Leia-se ato que constitua manifestação inequívoca do ofendido de promover a persecução penal – representação.
- "Art. 101 - Quando a lei considera como elemento ou circunstâncias do tipo legal fatos que, por si mesmos, constituem crimes, cabe ação pública em relação àquele, desde que, em relação a qualquer destes, se deva proceder por iniciativa do Ministério Público".
- MIRABETE, Júlio Fabrini. CÓDIGO PENAL INTERPRETADO JURISPRUDENCIALMENTE. São Paulo: Atlas, 1988, p. 165 e 531.
- Leia-se: quando do estupro resultar lesão corporal grave ou morte.
- "Art. 2º. A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior".
"Art. 145 - Nos crimes previstos neste Capítulo somente
se procede mediante queixa, salvo quando, no caso do art. 140, § 2º, da
violência resulta lesão corporal. Parágrafo único - Procede-se
mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso do n.º I do art. 141, e
mediante representação do ofendido, no caso do n.º II do mesmo artigo.Parágrafo
único. Procede-se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso do
inciso I do caput do art. 141 deste Código, e mediante representação do
ofendido, no caso do inciso II do mesmo artigo, bem como no caso do § 3º
do art. 140 deste Código. (Redação
dada pela Lei nº 12.033 de 2009)".
"Art. 50. A renúncia expressa constará de declaração assinada pelo ofendido, por seu representante legal ou procurador com poderes especiais. Parágrafo único. A renúncia do representante legal do menor que houver completado 18 (dezoito) anos não privará este do direito de queixa, nem a renúncia do último excluirá o direito do primeiro".
"PROCESSUAL PENAL. PENAL. QUEIXA CRIME. AUDIENCIA DE INTERROGATORIO DE TESTEMUNHAS DE ACUSAÇÃO. OBRIGATORIEDADE DO COMPARECIMENTO DO QUERELANTE OU SEU ADVOGADO. I - A FALTA NÃO JUSTIFICADA DO QUERELANTE OU DE SEU PATRONO, A AUDIENCIA DE INQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHAS, ENSEJA A PEREMPÇÃO DA AÇÃO PENAL. II - INTELIGENCIA DO ART. 60, INC. III, DO CODIGO DE PROCESSO PENAL, C/C ART. 107, INC. IV DO CODIGO PENAL". (STJ, REsp 45743 / RJ, Rel. Ministro PEDRO ACIOLI, SEXTA TURMA, J. 23/08/1994, DJ 19/09/1994).
BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. DIREITO PENAL, PARTE GERAL. São Paulo: Editora Saraiva, 1999.