5. Conclusões
1. As sentenças (e as decisões em geral) podem ser classificadas quanto à sua natureza em: declaratórias, constitutivas, condenatórias, executivas e mandamentais.
2. No processo executivo a tutela pretendida geralmente será concedida antecipadamente, o que não desfigura a natureza executiva da sentença de procedência, que irá apenas confirmar os atos já praticados.
3. Para que se forme coisa julgada material é necessário que a sentença possua carga de declaratividade suficiente para afetar o mundo extraprocessual.
4. Há cognição (processo que leva ao conhecimento) sempre que é analisada alguma questão fática.
5. A cognição que resulta na formação da coisa julgada material é aquela que liga a questão de fato com a de direito, provocando um juízo sobre o direito material subjetivo, declarando-no ou alterando-no.
6. A sentença no processo executivo, via de regra, tem eficácia declarativa: declara a extinção da pretensão.
7. Em razão da carga de declaratividade (eficácia imediata ou mediata), também os efeitos da sentença do processo de execução são acobertados pela coisa julgada material, e não só pela formal.
8. Como conseqüência, temos que face eventual ajuizamento de nova execução do mesmo título pode ser argüida objeção de coisa julgada em qualquer fase do processo; posicionamento oposto é o adotado pela doutrina dominante, notadamente o da ‘Escola de Liebman’, de que ao titular do título já executado faltaria interesse de agir.
6. Bibliografia
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Notas
- Pontes de Miranda, Tratado das ações, t. I, p. 167.
- Cf. Pontes de Miranda, Tratado, t. I, p. 167-168.
- Executório, adj., que deve ser posto em execução; que dá poderes para proceder à execução. Daí ser mais apurado dizer título executório, e não título executivo (v. nota 4, infra).
- Executivo, adj., que executa; que procede à execução judicial; que faz cumprir a lei.
- Cf. Araújo Cintra et alii, Teoria geral do processo, n. 193, p. 303; Pontes de Miranda, Tratado, t. I, p. 142, 197-211 e Comentários ao código de processo civil, t. I, art. 4º, nota 10, p. 180. Barbosa Moreira (in: ‘Sentença executiva?’, in: Revista de processo, vol. 114, p. 147-162) incorreu em grave equívoco ao tratar da distinção entre as sentenças executiva e condenatória sem levar em conta a mandamental.
- Cf. Pontes de Miranda, Comentários, t. I, art. 3º, nota 2, p. 142.
- Cf. Pontes de Miranda, Tratado, passim.
- Há críticas autorizadas quanto à necessária presença de todas as eficácias em todas decisões: Barbosa Moreira, ‘Conteúdo e efeitos da sentença’, in: Revista de processo, vol. 40, p. 10.
- Confirmando, neste particular: Barbosa Moreira, op. cit., in: loc. cit., p. 11.
- A sentença que extingue a ação executiva, ao contrário da ação em si, não é satisfativa. Os provimentos satisfativos foram adotados no curso do processo; o que a sentença faz é declarar a extinção do direito subjetivo material, ocorrendo a extinção da pretensão com ou sem a sua satisfação (ressalvada a sentença terminativa).
- Em alemão se chama a coisa julgada material de feststellungswirkung (ao pé da letra, efeito da declaração).
- "Digo pertencer à essência de alguma coisa aquilo que, sendo dado, põe necessariamente a coisa e, sendo suprimido, tira necessariamente a coisa; isto é, aquilo sem o que a coisa não pode ser nem ser concebida e vice-versa, que sem a coisa não pode ser nem ser concebido" (Espinosa, Ética, II, defesa 2 apud CHAUI, Marilena. Política em Espinosa. São Paulo: Cia. das Letras, 2004. p. 131).
- Neves (in: Coisa julgada civil, p. 443-449) ressalta a inexorabilidade da cobertura dos efeitos da sentença declarativa pela coisa julgada material.
- Na classificação de Pontes de Miranda: "O peso de eficácia declarativa não precisa ser preponderante (5) para haver coisa julgada material: basta que seja de eficácia declarativa imediata (4), ou mediata" (in: Comentários, t. V, art. 467, nota 2, p. 144). Mais adiante: "Se a sentença tem 3 ou 4 de declaratividade, tem eficácia de coisa julgada material" (in: op. cit., art. 469, nota 14, p. 186).
- Pontes de Miranda, Tratado, t. VII, p. 54.
- Araújo Cintra et alii, Teoria geral do processo, n. 198, p. 306.
- Dinamarco, Instituições de direito processual civil, vol. III, n. 953, p. 297.
- "A coisa julgada material consiste em vincular as partes à declaração" (Hellwig apud Pontes de Miranda, Tratado, t. II, p. 66).
- A declaração poderá ser tanto positiva como negativa.
- Cf. Dinamarco, Instituições, vol. III, n. 955, p. 301-302.
- Cf. Pontes de Miranda, Tratado, t. I, p. 198.
- Dinamarco, Instituições, vol. III, n. 955, p. 302.
- Dinamarco, Instituições, vol. III, n. 903, p. 271.
- Dinamarco, Instituições, vol. III, n. 955, p. 303.
- Watanabe, Da cognição no processo civil, p. 41.
- Cf. Arruda Alvim, ‘Sentença no processo civil’, in: Revista de processo, vol. 2, p. 29.
- Pontes de Miranda, Comentários, t. I, p. 94-95.
- Pontes de Miranda, Tratado, t. VII, p. 35-36.
- P.ex.: Neves, Coisa julgada civil, p. 453; Watanabe, Da cognição, p. 26-36.
- "Ora, nos nossos dias, há procedimentos especiais às ações declaratórias, condenatórias e constitutivas, procedimentos especiais às ações mandamentais e procedimentos especiais às execuções. Mas ilusão seria estabelecer-se classificação que correspondesse à classificação das ações. O valor da dicotomia ‘procedimento de cognição, procedimento de execução’, no plano teórico e no plano prático, é quase nenhum. Pode-se tratar, a fundo, o processo civil sem qualquer alusão a ela. (...). Demais, ¿que seria cognição, em sentido tão largo e ao mesmo tempo tão estreito? Dar-se-á que não haja cognição em tantos despachos durante a execução? ¿Dar-se-á que o conhecer para executar seja diferente do conhecer para que depois se execute? Em verdade, chamou-se processo de execução ao processo das execuções de sentenças. A cognição teria ficado atrás, exaurida na sentença. Ao procedimento em cujo remate ficou a sentença – dito, então, procedimento de execução – sucede o procedimento de execução. Com isso, só se via a ação iudicati (cuja força é executiva, portanto de eficácia executiva 5), estabelecida, mediatamente, pela carga eficacial 3 da sentença condenatória, e deixavam-se de ver as ações executivas em que se pede a condenação (= com força de executividade e 4 de condenatoriedade)" (Pontes de Miranda, Comentários, t. I, p. 93-94). Adiante: "A distinção de classes de sentenças que produzem coisa julgada material e classes de sentenças que a não produzem é lenda de juristas" (Pontes de Miranda, op. cit., t. I, art. 3º, nota 2, p. 147).
- Neves apud Watanabe, Da cognição, p. 33.
- ‘Compatibilidade’ não deve ser confundida com ‘identidade’. Mesmo que os ritos não sejam idênticos, podem ser compatíveis.
- Pontes de Miranda, Comentários, t. I, p. 93.
- Cf. Liebman, Processo de execução, p. 59.
- Cf. Theodoro Júnior, Curso de direito processual civil, vol. II, n. 958, p. 348.
- Dinamarco, Execução civil, n. 93, p. 165.
- Pontes de Miranda defende que estando sujeito às mesmas regras jurídicas sobre o processo de conhecimento (CPC 598), a extinção no processo executivo também se dará com ou sem julgamento do mérito. Após elencar diversas hipóteses em que, também no processo executivo, se dá a extinção do processo sem julgamento do mérito, o mestre conclui que todas as hipóteses do art. 794 são efetivamente de julgamento de mérito; aliás, tal fato lhe parece tão óbvio que nem mesmo se preocupa em tecer maiores comentários sobre o tema (in: Comentários, t. XI, p. 565).
- Teresa Wambier, Nulidades do processo e da sentença, p. 107.
- "A declaração da sentença sobre a composição da lide realizada pelo direito objetivo, tendo por pressuposto os fatos que, na medida de sua transposição para o processo, entram na limitação objetiva do thema decidendum, constitui juízo sobre a relação controvertida que só processualmente tem eficácia, mantendo-se, assim, no plano do direito público. Como tal, no plano do processo em que deixou de existir a controvérsia, vincula as partes e os órgãos jurisdicionais" (Neves, Coisa julgada civil, p. 440).
- "A sentença, quer nas ações executivas, quer nas outras, passa-se no plano do direito processual. O que ela ‘realiza’ tem o seu lugar no direito material, sem que mude o preto em branco, ou o branco em preto, como pretendia a teoria materialística do processo. Não é a sentença que faz ter sido executada, ou executar-se a obrigação: é o fato que daí resulta. Se A diz que pagou a B, e pagou, mas B contesta, e vence, a sentença estabelece aquele novum, que é a declaração pelo juiz, e talvez não possua, sequer, ser rescindida: o plano de direito material lá está, não tendo o juiz do Estado o poder de mudar a realidade, os fatos da vida; o que lhe é dado é declarar, constituir, condenar, executar, mandar, sem ter outro poder que o de decidir, que é algo transcendente à realidade, e com o fundamento de realizar o direito objetivo às vezes passa à frente da outra função que se atribui à Justiça." (Pontes de Miranda, Tratado, t. VII, p. 14).
- Pontes de Miranda, Tratado, t. VII, p. 37.
- Dinamarco, ‘O conceito de mérito em processo civil’, in: Revista de processo, vol. 34, n. 18, p. 45. Diz ainda: "O afastamento, do processo executivo, das questões de mérito, não significa porém que inexista mérito nesse processo. Há o mérito, representado pela pretensão executiva deduzida mediante a demanda inicial. O fato de eventual julgamento a respeito ter outra sede (a dos embargos) não significa que mérito inexista naquele processo." (in: op. cit., n. 11, p. 37).
- No mesmo sentido: Greco, O processo de execução, vol. 1, p. 242. No entanto, o autor não concorda com a conclusão a que chegamos a seguir. Inobstante, mais adiante (p. 251-252) afirma que nos casos de transação e renúncia do direito a sentença da execução teria seus efeitos cobertos pela coisa julgada material.
- Contra: Liebman, Processo de execução, p. 63-64; Dinamarco, Execução civil, n. 90-96 e Instituições, vol. III, n. 771 e 903; Araken de Assis, Manual do processo de execução, n. 62; Theodoro Júnior, Curso, vol. II, n. 963, 964 e 966; Greco, O processo de execução, vol. 1, p. 249 (v. nota anterior); Neves, Coisa julgada civil, passim; Watanabe, Da cognição, p. 83 e passim; Teresa Wambier, Nulidades, p. 100-101; ....
- Araken de Assis (in: Manual, n. 63, p. 298) defende a inaplicabilidade do instituto da coisa julgada no processo executivo, entendendo que à nova ação baseada no mesmo título deve ser invocada a regra do art. 267, V, do CPC (!?).
- P. ex., Lucon, ‘Objeção na execução’, in: Processo de execução, p. 582.
- A sentença tem eficácia ex tunc, retroagindo até o momento da extinção da obrigação (Cf. Greco, O processo de execução, vol. 1, p. 242-243).
- Teresa Wambier discorda (in: Nulidades, p. 101-102 e nota 163), apresentando contraponto às posições de Lucon e Barbosa Moreira, que cita. A jurista diz que o mérito da execução é a satisfação do crédito constante do título, e não a relação jurídica de direito material da qual decorre o título; não haveria na sentença que extingue o processo de execução declaração de extinção da relação jurídica de direito material entre as partes. Adotar tal entendimento é o mesmo que defender que, uma vez decretada a nulidade de uma cláusula contratual as partes continuam vinculadas àquela obrigação; extinta a causa da obrigação, extinta está a obrigação (v. Barbosa Moreira, ‘Conteúdo e efeito da sentença’, in: Revista de processo, vol. 40, p. 9). Pontes de Miranda (in: Tratado, t. VII, p. 97) diz: "É preciso, em tudo isso, não se esquecer que o processo tem por fim obter a realização do direito, de jeito que o direito material é que se ‘satisfaz’ com a execução. Se se executa forçadamente, é porque o direito material supõe que se execute a obrigação".
- Dinamarco, Execução civil, n. 92, p. 163.
- Dinamarco (in: Instituições, vol. III, n. 928-939, p. 258-272) chama de ‘falsas sentenças de mérito’ aquelas que põem fim ao processo por decadência ou que homologam atos de autocomposição (reconhecimento do pedido, transação, renúncia do direito). O mestre entende, de maneira excessivamente restritiva ao nosso ver, que de mérito somente é a sentença que analisa se o autor tem ou não o direito invocado. No entanto, é de se entender que não só a existência do direito está acobertada pelo julgamento de mérito, mas também sua validade e eficácia, daí se concluir que também o julgamento que declara caduco o direito de ação também ser de mérito, pois estaria afirmando a inexigibilidade do direito (plano de eficácia do fato jurídico). Da mesma forma, Dinamarco entende que no caso de autocomposição o magistrado se limita a verificar a possibilidade de se dispor sobre o direito, não julgando a procedência ou não do pedido do autor. Oras, se se trata de um provimento alterando o direito substancial – pretensão antecedente ao processo – e que gera efeitos que se projetam para fora do processo, há sim julgamento de mérito. E ainda que se considere tal sentença como meramente homologatória do ato negocial realizado entre as partes, nos dizeres de Pontes de Miranda, citado pelo próprio Dinamarco, temos que ao homologar o ato, a autoridade judicial agrega a ele a sua autoridade, jurisdicionalizando-os, outorgando-lhes a eficácia dos que ele próprio teria realizado, i.e., como se julgado o mérito tivesse (v. Dinamarco, op. cit., vol. III, n. 937, p. 269).
- Dinamarco, Execução civil, n. 297, p. 475.
- V. Dinamarco, Execução civil, n. 93, p. 163-164.
- No mesmo ato.
- Reportamo-nos aqui ao art. 267, do CPC, aplicável também no processo executivo (Cf. Dinamarco, Execução civil, n. 93, p. 165-166).
- "(...) não há por onde ver-se no título extrajudicial, por lhe ter sido atribuída executividade, qualquer decisão sobre prova" (Pontes de Miranda, Tratado, t. VII, p. 97).
- Salvo os casos em que se declare decadência, ou se admita a interposição de exceção na própria execução.
- Desde que, por óbvio, tal questão já não tenha sido objeto de outra ação, como, p. ex., ajuizamento de ação incidental de embargos à execução, fazendo coisa julgada material sobre o lá decidido.
- Contra, entendendo que a coisa julgada obstaria pronúncia sobre qualquer aspecto do título (para em seguida afirmar que, como ato anterior à sentença, a extinção do título pode ser atacada por via de ação anulatória): Theodoro Júnior, Curso, vol. I, n. 521, p. 543.
- "Nas execuções forçadas, o Estado executa pelo que devia executar: o Estado diz que alguém deve, decisão no plano processual, e entrega, dizendo que entregou pelo executado – o que talvez não coincida com a realidade no plano do direito material, ou porque o réu não devesse, ou porque o objeto da entrega seja diferente, ou não exista, ou não tivesse sido realmente entregue. A rescindibilidade de algumas sentenças tem por fim atenuar, em certos casos, essa discordância entre o fático e o sentencial" (Pontes de Miranda, Tratado, t. VII, p. 14-15).
- Contra: Teresa Wambier, Nulidades, p. 106.