5. ANÁLISE COMPARATIVA DA TRAMITAÇÃO PROCESSUAL
Para melhor ilustrar como a informatização altera quase que completamente a dinâmica do processo judicial deve-se fazer uma comparação da tramitação do processo. Vislumbrando-se as diferenças do processo tradicional e do processo eletrônico percebe-se como este provoca uma revolução na tramitação dos processos judiciais. Assim, narrar-se-á o processamento de uma ação de conhecimento dentro das duas perspectivas.
5.1. Processo Tradicional
Inicialmente será demonstrada a tramitação que ocorre nos dias de hoje em um processo que tramite em uma Vara Cível comum, seja estadual ou federal, que funciona sem o sistema virtual.
O primeiro passo de qualquer ação é o surgimento de uma pretensão resistida ou uma ameaça ao direito de um indivíduo. Ato contínuo, este vai até um escritório de advocacia, procura um causídico e relata todo o ocorrido.
O advogado deverá apresentar proposta de contrato de honorários e a procuração que será assinada pelo cliente. Na mesma ocasião, este fornecerá os documentos suficientes para fazer prova do seu direito.
O causídico fará a análise dos documentos e redigirá a petição inicial. Após a feitura desta, a cópia dos documentos, o contrato e a procuração deverão ser autenticados em cartório. Depois, o advogado deverá juntar a exordial impressa a outros papéis e seguir até o protocolo do Tribunal. Neste momento, já houve perda de tempo autenticando documentos, se deslocando ao fórum e esperando em filas, além dos gastos com papel e transporte.
Quando os documentos chegam ao protocolo serão registrados e encaminhados para a distribuição. Em Tribunais que possuem protocolos unificados ou integrados podem durar alguns dias até que a petição chegue até a Vara. Assim que chega ao cartório da Vara, a inicial aguardará um servidor para promover a autuação: identificar as partes, colocar entre capas, etiquetar e numerar as páginas.
Passada esta fase, o cartório envia processo para assessoria onde será analisado. Caso exista pedido liminar passar-se-á a decisão do mesmo, ou apenas observar-se-á os pressupostos processuais. Depois, o juiz decidirá pela extinção do processo prima face nos termos do novel art. 285-A do CPC [44], pela extinção sem mérito quando indefere a inicial (art. 295 do CPC), pela emenda da inicial (art. 284 do CPC) ou pela citação do réu. Esta que até o advento da Lei 11.419 era feita pelos correios, por oficial de justiça ou por edital.
Com a citação a parte demandada tem conhecimento da lide e caso não responda no prazo de 15 dias operar-se-á os efeitos da revelia (art. 319 do CPC). Contudo, querendo responder a lide o causídico do demandado deverá ir ao cartório da Vara pegar os autos para analisar os documentos. Com isso, como já demonstrado, ocorrerá novamente perda de tempo e dinheiro, igual ao momento do ajuizamento do processo.
Após a resposta o juiz intimará o autor para apresentar réplica ou ambas as partes para se manifestarem sobre as provas que pretendem produzir. Quando os autos voltarem, o magistrado poderá decidir antecipadamente a lide ou determinar a produção das provas.
Depois de toda a instrução o processo ficará concluso para a sentença. Proferida esta, existindo recurso para a segunda instância os autos, muitas vezes em vários volumes, serão encaminhados para o Tribunal. Este procedimento é muito custoso para os cofres públicos e também para a parte sucumbente que tem que pagar o preparo, prejudicando a economia processual e o acesso à justiça. Não havendo recurso dar-se-á o pagamento espontâneo da sentença ou inicia-se a liquidação e o posterior cumprimento de sentença.
O processo tradicional da forma como foi transcrito acima parece bem simples e rápido, contudo, isto não ocorre na verdade. Normalmente, existem diversas digressões desnecessárias e atos processuais de difícil concretização no trâmite referido e a demanda acaba se estendendo por muito tempo. Sem contar o descumprimento dos prazos pelas partes e a morosidade de determinados órgãos julgadores.
5.2. Processo Eletrônico
A sistemática do processo judicial digital é diferente da descrita no item anterior como se perceberá a seguir. Convém advertir que, o procedimento que será apresentado está de acordo com a realidade e possibilidade dos tribunais brasileiros que possuem o sistema de tramitação eletrônica.
Desta forma, hipoteticamente imagine-se que o cliente entra em contato com o advogado através do e-mail. O causídico analisa os fatos apresentados e envia cópia do contrato e da procuração pelo correio eletrônico. O interessado aceita a proposta, digitaliza os documentos necessários para a demanda (com o uso de escâner) e os apresenta autenticados eletronicamente. Além disso, assina o contrato e a procuração por meio de certificado digital.
O patrono redige a inicial e sem sair do seu escritório a protocola através do sistema do Tribunal disponibilizado na internet. O sistema automaticamente distribui, autua, numera os anexos e fornece o número do processo. A assessoria da vara já recebe os autos prontos para a análise da liminar, se houver, e dos pressupostos processuais. Sobre estes é importante frisar que os programas, normalmente, contribuem para a percepção da litispendência, da conexão ou da continência.
O assessor do juiz após analise escolherá um despacho mais adequado para o caso e o anexará no processo. O magistrado poderá de qualquer lugar entrar no sistema, observar o despacho e o assinar eletronicamente. Todos estes procedimentos poderão ser realizados em poucas horas. Enquanto que no processo tradicional demandariam alguns dias.
Ato contínuo, o réu será citado por e-mail evitando gastos com cartas, oficial de justiça ou publicação. Além disso, quando receber a comunicação o patrono da parte não precisará se deslocar ao fórum, podendo ter acesso aos atos pela internet em qualquer lugar do planeta, e assim realizar a análise da inicial e de todos os documentos.
Ao iniciar a instrução do processo sempre que houver a juntada de provas não será necessária a realização de carga dos autos para manifestação sobre os mesmos. Todas as partes têm acesso ao processo 24 horas por dia podendo ter vista dos mesmos sempre que quiserem. Da mesma forma, se for designada audiência para coleta de prova oral, esta será gravada podendo ser acessada a qualquer momento, facilitando o contraditório, a ampla defesa e o julgamento da lide.
O sistema informatizado também contribui quando se tem a necessidade de coleta de provas em outras comarcas. Com o processo eletrônico as cartas precatórias podem ser enviadas por correio eletrônico, ou até mesmo seja realizada audiência por vídeo conferência.
Terminada a instrução o juiz poderá julgar a demanda. Novamente a informatização pode contribuir neste momento, principalmente no caso de causas repetitivas, pois o sistema pode conter um depositório de modelos de sentenças que podem ser facilmente adaptadas para cada caso.
Ou ainda, em uma perspectiva mais vanguardista, pode-se perquirir o afirmado por Pedro Madalena e Álvaro Borges de Oliveira na obra "Organização e Informática no Poder Judiciário". Estes estudiosos acreditam que podem ser desenvolvidos programas inteligentes que tenham a habilidade de redigir sentenças. Eles acreditam que um software pode ser capaz de analisar uma série de perguntas e respostas e através do resultado apresentar a decisão cabível, como se vê:
Por meio de um programa ou sistema instalado em computador isso pode acontecer: quando o jurista e o técnico em computação lançam, na base de conhecimento, os suficientes dados coletores de informações e geradores do processamento eletrônico, direcionados à composição da sentença judicial [...]. Para tanto, é preciso dispor de um conjunto Hardware/software completo e que possam funcionar com regularidade nas vias Intranet e Internet. (MADALENA; OLIVEIRA, 2008, p. 140)
Na verdade, os referidos estudiosos afirmam que inicialmente o sistema eletrônico serviria como ferramenta de busca de informações. Isto é, o juiz quando quisesse proferir a sentença escolheria uma opção e o programa começaria a exibir uma série de dados dos próprios autos, como também leis, jurisprudências, textos doutrinários, outras sentenças do juízo etc. a respeito do tema em análise. Assim, o magistrado poderia escolher a sentença apresentada como sugestão pelo sistema ou redigir outra baseada nas informações apresentadas (MADALENA; OLIVEIRA, 2008, p. 141).
Por fim, percebe-se que o processo judicial eletrônico não resolve todos os problemas do judiciário, uma vez que determinadas práticas estão arraigadas a este poder. No entanto, o sistema de tramitação virtual contribui para concentrar os esforços dos operadores no principal, que é o Direito e Justiça. Tanto os funcionários, assessores e juízes quanto os advogados privados, os defensores públicos e os membros do Ministério Público podem despender mais tempo e recursos para a tutela jurisdicional.
5.3. CNJ AS RESOLUÇÕES SOBRE INFORMATIZAÇÃO
Como já comentado no capítulo inicial deste trabalho de conclusão de curso a Emenda Constitucional nº 45/04 foi responsável não só por uma reforma, mas sim por uma revolução na justiça brasileira. Os três Poderes com o objetivo de construir um Judiciário, mais acessível, célere e seguro aprovaram grandes mudanças no ordenamento pátrio. Uma das mudanças mais significativas foi a criação do Conselho Nacional de Justiça que nasceu como tutor e controlador administrativo, financeiro e disciplinar do Poder Judiciário
A atuação deste órgão será fundamental para concretizar as mudanças determinadas pelas novas legislações processuais. Da mesma forma, quando se fala em informatização do processo judicial, o CNJ deve atuar ativamente para manter a organização e uniformização dos tribunais nacionais. Nas palavras de Carlos Henrique Abrão (2009, p. 115):
[...] o Conselho Nacional de Justiça desenvolverá programas, dará orientações, distribuirá subsídios e monitorar a todo o sistema do processo eletrônico, universalmente, devendo dissipar dúvidas, equacionar problemas e resolver os conflitos que possam surgir, dada a lacuna da lei e sua situação particular.
Assim, o Conselho terá que ditar regras gerais para o processo eletrônico e contribuir para solucionar os problemas que venham a surgir nas diversas esferas do Poder Judiciário pátrio. Na verdade, já vem tentando exercer este mister como se percebe nas diversas resoluções que têm sido editadas por seu colegiado. Por conta, crucial se faz observar tais medidas regulatórias.
A primeira resolução importante para a informatização foi a de número 12, de 14 de fevereiro de 2006, que criou o Banco de Soluções do Poder Judiciário e o grupo de interoperabilidade. Estes têm o escopo de divulgar os sistemas de informações implantados ou em desenvolvimento para o aprimoramento da administração da justiça e da prestação jurisdicional. Entre os pontos da competência do grupo estão as definições das regras de estrutura do parque tecnológico, sistemas de informação, conectividade e padronização do Poder Judiciário.
Com o intuito de padronizar os sítios de acesso aos órgãos do judiciário o CNJ editou a resolução nº 41 de 11 de setembro de 2007. Este regulamento instituiu o domínio primário [45] "jus.br" para todos os portais da internet ligados ao Poder Judiciário. Posteriormente, foi apresentada a resolução nº 45 de 17 de dezembro de 2007 que padronizou todos os sítios eletrônicos da Justiça brasileira.
A resolução Nº 46, de 18 de dezembro de 2007, criou as Tabelas Processuais Unificadas do Poder Judiciário. Estas foram desenvolvidas para padronização e uniformização de assuntos e movimentação processuais no âmbito da Justiça. Com isso, há a facilitação da coleta de dados estatísticos que, posteriormente, foi regulamentado pelas resoluções, nº 66, de 27 de janeiro de 2009, nº 76, de 12 de maio de 2009.
Ainda com o objetivo de padronizar o CNJ resolveu padronizar o número dos processos nos órgãos do Poder Judiciário através da resolução nº 65, de 16 de dezembro de 2008.
No entanto, foi a Resolução nº 70, de 18 de março de 2009, aprovada após o II Encontro Nacional do Judiciário que veio para revolucionar o judiciário pátrio. Através desta foram apresentadas 10 metas entre elas o desenvolvimento de planejamentos estratégicos plurianuais (meta 1) e anseio de julgar todos os processos distribuídos até 31/12/2005 (meta 2). Percebe-se claramente que o CNJ aposta com todas as forças na informatização para solucionar a morosidade e a desorganização, como se vê:
3. Informatizar todas as unidades judiciárias e interligá-las ao respectivo tribunal e à rede mundial de computadores (internet);
4. Informatizar e automatizar a distribuição de todos os processos e recursos;
5. Implantar sistema de gestão eletrônica da execução penal e mecanismo de acompanhamento eletrônico das prisões provisórias;
7. Tornar acessíveis as informações processuais nos portais da rede mundial de computadores (internet), com andamento atualizado e conteúdo das decisões de todos os processos, respeitado o segredo de justiça;
8. Cadastrar todos os magistrados nos sistemas eletrônicos de acesso a informações sobre pessoas e bens e de comunicação de ordens judiciais (Bacenjud, Infojud, Renajud);
10. Implantar o processo eletrônico em parcela de suas unidades judiciárias.
Com intuito viabilizar e regularizar tais metas, recentemente, o Conselho Nacional de Justiça editou as resoluções nº 90, 92 e 100. Esta que, respectivamente, dispõe sobre: o nivelamento de tecnologia da informação, o Modelo de Requisitos para Sistemas Informatizados de Gestão de Processos e Documentos e a comunicação oficial, por meio eletrônico, no âmbito do Poder Judiciário.
Diante de tudo isso, percebe-se que o CNJ tem desenvolvido papel fundamental no processo de informatização e organização do Poder Judiciário. Deixando claro, que a sua criação com a Emenda Constitucional nº 45 operou o objetivo de revolucionar o ordenamento jurídico pátrio.
CONCLUSÃO
O presente trabalho constatou que o processo judicial é um método de resolução de conflitos que ao longo da história sofreu grandes modificações com o intuito de melhor atender os anseios de sociedade. Prova disso, é a teoria do acesso à justiça que têm o escopo de melhorar a prestação da tutela jurisdicional e, conseqüentemente, promover a paz social.
Como ocorreu em Roma, no período do processo formulário (149 a.C até 209 d.C.), a criação de uma base escrita para aplicar as legis actiones nos locais mais longínquos do império por conta da expansão na península italiana. Nos novos tempos de globalização, desenvolver-se um sistema informatizado de tutela jurisdicional é essencial para promover a adequada tutela jurisdicional.
Nesta toada, o Estado brasileiro visando aprimorar o judiciário nacional realizou uma série de modificações legislativas, derivadas de acordos realizados entre os três poderes federativos. Estas reformas objetivam a criação de um judiciário mais rápido, efetivo, seguro e acessível a todos.
Um dos principais instrumentos apresentado como meio de aprimoramento do Poder Judiciário foi o uso da informatização. Neste campo, foram propostas diversas inovações no Processo Judicial.
O que se observa, é que estas modificações devem ser postas de forma adequada para que não afetem os princípios fundamentais e as instituições jurisdicionais existentes, evitando prejuízos à própria Justiça. Com as inovações tecnológicas, muitos problemas são resolvidos, contudo, inegavelmente, surgem novas dificuldades.
A informatização do Judiciário se apresenta como um dos mais profícuos caminhos para uma Justiça mais célere e eficiente. Entretanto, a informatização, por si só, não pode trazer necessariamente a melhoria plena do sistema. Para dar bons resultados, deve ser bem planejada e implementada, tendo em vista tanto a eficiência como a segurança. E este segundo aspecto, até por falta de suficiente informação, às vezes é negligenciado.
Constata-se que as alterações são positivas, porém, existem modificações que podem, a médio e a longo prazo, causar prejuízos à sociedade. Não se pode deixar a razão de lado e achar que o processo digital é a solução de todos os problemas da Justiça. Nem mesmo, pensar que este procedimento está imune a falhas.
O processo não pode se modernizar apenas nas leis ou nas atitudes dos seus operadores, é preciso materializar de forma física e palpável o seu desenvolvimento. No mundo globalizado e dinâmico as novas tecnologias das informações são essenciais. Por isso, o processo eletrônico veio para ficar e contribuir com o acesso de todos a uma ordem jurídica justa.
A conclusão que se chega é que a informatização do judiciário chegou para ficar e que os Tribunais e os operadores do Direito terão de se adaptar, mesmo que com dificuldades, a esta nova ordem. Percebe-se que o processo de informatização possui falhas e qualidades. Contudo, os problemas, que a princípio surgem, são facilmente contornados enquanto as soluções que se apresentam são inestimáveis.