Artigo Destaque dos editores

Ignorância jurídica ou típica conduta de má-fé do governo estadual.

A criação de novo imposto e novo sujeito passivo tributário de ICMS no estado de Mato Grosso por ato administrativo (Decreto nº 2.033/2009)

03/02/2010 às 00:00
Leia nesta página:

Da lavra do Governador e do Secretário de Fazenda do Estado de Mato Grosso o Decreto nº 2033/2009 introduziu no Decreto Regulamentar nº 1944/1989, isto é o RICMS, o art. 216-M-1, imprimindo nítidas lesões à ordem jurídica nacional na medida em que impôs obrigações tributárias principais e acessórias com base em mero ato administrativo que, intencionalmente, adota condutas discriminatórias às empresas estabelecidas em outras unidades federadas que destinam mercadorias a consumidores endereçados naquele Estado pela arbitrária cominação da penalidade de apreensão, com liberação dos produtos somente após o pagamento de espúria diferença da alíquota interestadual de ICMS e multa, conforme destaca-se do texto decretado, ipsis literris:

DECRETO Nº 2.033, DE 10 DE JULHO DE 2009.

Introduz alterações no Regulamento do ICMS e dá outras providências.

O GOVERNADOR DO ESTADO DE MATO GROSSO

, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelo artigo 66, inciso III, da Constituição Estadual, e

CONSIDERANDO a necessidade de adequações no Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto n° 1.944, de 6 de outubro de 1988, para o controle e fiscalização das operações e prestações cuja aquisição ocorrer a distância ou de forma não presencial no estabelecimento remetente, ou que destinem mercadorias a pessoa jurídica não-contribuinte do ICMS ou pessoa física domiciliada neste Estado;

D E C R E T A:

Art. 1º Acrescentado o artigo 216-M-1 as disposições permanentes do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto n° 1.944, de 6 de outubro de 1989, com a seguinte redação:

"Art. 216-M-1 Sem prejuízo de outras situações previstas neste regulamento ou das fixadas no artigo precedente, nas hipóteses adiante arroladas, o remetente localizado em outra unidade federada deverá previamente inserir no Sistema de Informações de Notas Fiscais de Saída e de Outros Documentos Fiscais, os dados relativos às respectivas operações ou prestações, bem como atender, no que couber, as demais disposições deste capítulo:

I - em relação às operações e prestações cuja aquisição ocorrer a distância ou de forma não presencial no estabelecimento remetente;

II - que destinem mercadorias a pessoa jurídica não contribuinte do ICMS

ou pessoa física domiciliada neste Estado.

§ 1º Na forma do §2º será exigida na entrada no estado a antecipação do imposto relativo às hipóteses a que se referem os incisos do caput, quando a operação ou prestação

:

I – for irregular ou inidônea;

II - não for previamente registrada no sistema de controle a que se refere o caput

;
III – se referir a remetente ou destinatário que se encontre em situação irregular ou não inscrito perante o cadastro de contribuintes do imposto;

IV – for pertinente a remetente sujeito ao regime administrativo cautelar a que se referem os artigos 444 e 445 das disposições permanentes;

V – aconteça em volume ou habitualidade que caracteriza intuito comercial do destinatário não inscrito no cadastro de contribuintes do imposto;

VI – estiver beneficiada com incentivo ou benefício fiscal não autorizado pelo Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ;

VII – estiver desacompanhada do comprovante a que se refere o artigo 216-N;

VIII – cuja documentação fiscal não for tempestivamente apresentada ao fisco estadual por ocasião da entrada no estado;

XI – quanto for verificado subfaturamento, preço aviltado ou desconto que o avilte.

§ 2º Observado o disposto no §4º, a antecipação a que se refere o §1º será exigida do remetente localizado em outra unidade federada, por ocasião da entrada do Estado, ainda que a operação ou prestação seja destinada a pessoa jurídica não contribuinte do ICMS

ou pessoa física, hipótese em que será determinada mediante aplicação dos percentuais equivalente a:

I – 9% (nove por cento) aplicado sobre o valor da operação constante do respectivo documento fiscal

ou preço no mercado varejista;

II – 18% (dezoito por cento) aplicado sobre o valor da operação constante do respectivo documento fiscal ou preço no mercado varejista, quando em volume ou habitualidade que caracterize intuito comercial do destinatário.

§ 3º Fica dispensado da observância do disposto neste artigo a operação de remetente localizado em outra unidade federada

:

I – inscrito no cadastro mato-grossense de contribuintes do imposto, relativamente a operação cujo trânsito foi acobertado por Nota Fiscal Eletrônica – NF-e emitida pelo estabelecimento localizado neste estado

;

II – que realize transferência de mercadoria ao estabelecimento mato-grossense do mesmo titular, ainda que a transferência seja promovida com o intuito de entregar bem ou mercadoria adquirido na forma do caput;

III - quando a operação se originar de outra unidade federada e se destinar a estabelecimento inscrito no cadastro mato-grossense de contribuintes do imposto que fará a entrega ao adquirente localizado neste Estado;

IV - quando o valor da operação ou o preço total dos bens ou mercadorias no mercado varejista for igual ou inferior a 30 (trinta) UPFMT.

§ 4º A exigência da antecipação a que se referem os §§1º e 2º deste artigo será efetuada em nome do remetente localizado em outra unidade federada

e terá como vencimento:

I - a data fixada no instrumento a que se refere o artigo 467-G das disposições permanentes deste Regulamento, hipótese em que o adquirente mato-grossense será nomeado fiel depositário dos respectivos bens ou mercadorias;

II – a mesma data fixada para o recolhimento do ICMS Garantido Integral, nas demais hipóteses.

§ 5° Para fins do disposto neste artigo:

I - será concedida Inscrição Estadual ao remetente localizado em outra unidade federada, a qual não acarretará ao contribuinte sujeição às demais obrigações acessórias previstas na legislação tributária

, salvo as fixadas neste capítulo ou artigo ou pertinentes a revisão de lançamento ou restituição;

II - a inscrição a que se refere o inciso anterior será utilizada para acesso ao Sistema de Informações de Notas Fiscais de Saída e de Outros Documentos Fiscais, hipótese em que o remetente localizado em outra unidade federada que destinar bem ou mercadoria a adquirente localizado no território mato-grossense deverá solicitar credenciamento e liberação da respectiva senha

, mediante acesso à lista de serviços disponibilizados pela SEFAZ na Internet, no sítio www.sefaz.mt.gov.br, utilizando a pasta ''contribuintes'' e efetuando a opção ''credenciamento'';

III – a inscrição a que se refere o inciso I deste parágrafo poderá ser utilizada pelo remetente para exercício da opção a que se refere o inciso I do §3º deste artigo.

§ 6° A baixa do comprovante relativo ao registro da operação ou prestação na forma do caput será efetuada observando o disposto no artigo 216-N, sem prejuízo do respectivo cruzamento eletrônico de dados em que se efetuará o eventual lançamento pertinente as omissões que apurar em relação ao remetente localizado em outra unidade federada.

§ 7º O cancelamento do comprovante a que se refere o artigo 216-N, relativo ao registro da operação ou prestação na forma do caput, será requerido pelo remetente localizado em outra unidade federada na forma do artigo 216-V.

§ 8º Até o prazo fixado no inciso V do §1º do artigo 467-A poderá o remetente localizado em outra unidade federada promover o saneamento do registro perante o sistema a que se refere o caput, hipótese em que, exclusivamente quanto a operação regular e idônea, poderá mediante o processo previsto no artigo 573, devidamente instruído com decisão favorável proferida nos termos do artigo 570-A, lhe ser restituída a importância antecipada líquida do imposto e acréscimos eventualmente devidos.

§ 9º A restituição da antecipação a que se refere o §8º não implica em devolução ou nulificação das cominações legais decorrentes de infração a legislação tributária."

Art. 2º Fica revogado o artigo 97-A, introduzido pelo Decreto nº 1.949, de 27 de maio de 2009, nas disposições permanentes do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto n° 1.944, de 6 de outubro de 1989.

§ 1º A exigência da antecipação do imposto prevista no revogado artigo a que se refere o caput será mantida em nome do remetente localizado em outra unidade federada, tendo como vencimento a data fixada no instrumento a que se refere o artigo 467-G das disposições permanentes deste Regulamento, hipótese em que o adquirente mato-grossense será nomeado fiel depositário dos respectivos bens ou mercadorias.

§ 2º Aplica-se o disposto nos §§8º e 9º do artigo 216-M-1, na redação fixada neste Decreto, às importâncias antecipadas na vigência do artigo 97-A a que se refere o caput, hipótese em que fica estabelecido o prazo de quarenta e cinco dias, contados da publicação do presente Decreto, para saneamento e registro da respectiva operação na forma prevista no artigo 216-M-1.

Art. 3º Alterado o artigo 2º do Decreto nº 2.013, de 24 de junho de 2009, que passa a viger com a redação adiante assinalada:

"Art. 2º Este decreto entra em vigor na data da sua publicação, exceto em relação ao inciso I do seu artigo 1º que passa a vigorar a partir de 1º de agosto de 2009."

Art. 4º Este decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Palácio Paiaguás, em Cuiabá – MT, 10 de julho de 2009, 188° da Independência e 121° da República. (grifam-se).

As disposições do texto decretado repercutem negativamente sobre o direito líquido e certo à legalidade tributária conferida pela ordem da Constituição Federal e pelo Código Tributário Nacional.

O ato administrativo enfocado determina que as pessoas jurídicas estabelecidas em outras unidades da federação, ao remeterem mercadorias a consumidores endereçados no Estado de Mato Grosso e que não sejam contribuintes do imposto, no momento da entrada das mercadorias naquele Estado submetem-se ao pagamento de ICMS equivalente a 9% (nove por cento), referente à diferença entre a alíquota da operação interestadual e da operação interna, como está consignado no §2º, inciso I, do dispositivo mencionado.

Em ilegal discriminação, como condição para afastar a exigência de recolhimento da diferença de alíquotas do imposto na entrada de mercadorias no Estado de Mato Grosso, força os remetentes a se inscreverem como contribuintes no cadastro estadual ou abrir estabelecimentos filiais para operações de transferências de mercadorias e refaturamento aos consumidores situados naquela unidade federada, conforme reza o §3º da regra acima citada.

O malsinado ato, cuja natureza é de ato administrativo, que repetiu as regras do por ele revogado Decreto nº 1949/2009, insofismavelmente viola os comandos expressos dos art. 37, caput, 150, 152 e 155, VII, "b", da Constituição Federal, bem como o art. 9º, I, III, e art. 11 do Código Tributário Nacional.

Os agentes fiscais da Secretaria de Fazenda do Estado de Mato Grosso atuantes nos postos de fronteiras estaduais, seguindo as ilegais regras fixadas nº 2033/2009, de pronto tem lavrado Autos de Apreensão e Depósito e só liberam as mercadorias destinadas a consumidores estabelecidos no Estado de Mato Grosso mediante a coação pelo pagamento da diferença de ICMS de 9% (nove por cento) relativa à operação interestadual, além de multa de 2% (dois por cento).

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Alterações casuísticas e inoportunas em regras tributárias voltadas para a exigência de obrigações principais com o uso de instrumento normativo inadequado (Decreto) são desprovidas de sustentação jurídica válida, como o maculado ato impugnado.

O decreto º 2033/2009 revogou o Decreto nº 1949/2009 e incluiu o art. 216-M-1 no Decreto Regulamentar nº 1944/1988, que dentre diversas ilegalidades no seu §2º, I, exige o pagamento diferença de ICMS na alíquota de 9% (nove por cento) quando o remetente de mercadorias destinadas a consumidor for estabelecido em outra unidade da federação, conforme destaca-se, ip. lit.:

§2º Observado o disposto no §4º, a antecipação a que se refere o §1º será exigida do remetente localizado em outra unidade federada, por ocasião da entrada do Estado, ainda que a operação ou prestação seja destinada a pessoa jurídica não contribuinte do ICMS

ou pessoa física, hipótese em que será determinada mediante aplicação dos percentuais equivalente a:

I – 9% (nove por cento) aplicado sobre o valor da operação constante do respectivo documento fiscal

ou preço no mercado varejista; (grifam-se)

O ato vergastado estabelece discriminação e restrição sobre estabelecimentos comerciais domiciliados em outros Estados da Federação, condição simploriamente elegida como fato gerador de obrigação tributária de natureza principal, isto é, impõe prestação pecuniária sem ser espécie normativa de Lei em sentido formal, que é condição essencial para exigência tributária principal, de acordo com régios princípios de ordem constitucional e infraconstitucional para a imponibilidade tributária.

O comando do caput do art. 37 da Constituição Federal elege, dentre outros princípios, a obediência ao princípio da legalidade como inalienável elemento de validade dos atos administrativos praticados no âmbito de todos os entes políticos federados, ipsis verbis:

Art.

37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (grifam-se).

Resta claro pela ordem constitucional enfocada que a legalidade impõe que a Administração Pública só pode agir nos limites vinculadamente definidos pelo comando normativo, sob pena de nulidade dos atos praticados pelo agente em viés contrário ao expressamente ditado pelo regramento jurídico, ficando o caminho estreito da discricionariedade reservado para excepcionalidades atinentes ao âmbito interno da Administração.

Em conjugação do disposto no caput do art. 37 com a regra do art. 150, I, da Constituição Federal, extrai-se que a limitação do poder de tributar do Estado é corolário de cidadania que assegura a vedação à instituição de tributo sem lei que estabeleça, conforme o texto constitucional, ip. v.:

Art.

150 - Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; (grifam-se).

Assim, em confronto com este comando, insofismavelmente o Decreto nº 2033/2009, ao exigir obrigação tributária principal, isto é, de natureza pecuniária, viola o princípio da legalidade erigido no art. 150, I, da Carta Magna, já que na hierarquia das normas aquele se constitui mero ato administrativo, que é falecido de aptidão jurídica válida para a imponibilidade de obrigação tributária de cunho principal, condição reservada constitucionalmente para a lei em sentido formal.

Diante do princípio da não diferenciação ou da uniformidade tributária o legislador constituinte tratou de vedar a possibilidade de estabelecimento de diferenças tributárias pelos entes políticos federados em razão da procedência ou destino de mercadorias ou serviços de qualquer natureza, conforme dita o art. 152 da Constituição Federal, ipsis litteris:

Art.

152 - É vedado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer diferença tributária entre bens e serviços, de qualquer natureza, em razão de sua procedência ou destino.(grifam-se).

O malgrado Decreto nº 2033/2009 impõe discriminação ou diferenças tributárias em razão da origem e destino de mercadorias adquiridas em outras unidades federadas estaduais e que tenham como adquirentes destinatários ou consumidores domiciliados no Estado de Mato Grosso, implicando em frontal ofensa ao dispositivo constitucional acima destacado.

Ao admitir as competências tributárias dos Estados Federados e o Distrito Federal, dentre elas a capacidade para instituir imposto sobre operações de circulação de mercadorias destinados a consumidores estabelecidos em outra unidade estadual federada, a Constituição Federal disciplina objetivamente a matéria informando que será adotada a alíquota interna do Estado remetente quando o destinatário não for contribuinte do imposto, como dispõe o art. 155, II e VI, "b", ip. lit.:

Art.

155 - Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

(...)

II

- operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

(

...)

VII - em relação às operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final localizado em outro Estado, adotar-se-á:

(...)

b) a alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte dele;

(...). (grifam-se).

Por isso o Decreto nº 2033/2009 é também lesivo à regra do art. 155, VII, "b", da Constituição Federal, vez que a competência normativa do Estado de Mato Grosso para instituir cobrança de ICMS circunscreve-se tão só aos contribuintes sediados nos seus limites territoriais, já que nas operações relativas a mercadorias destinadas a consumidores não contribuintes endereçados noutros Estados, por vontade do legislador constituinte, é adotada a alíquota interna da unidade federada estadual remetente, ficando vedado ao Estado destinatário impor qualquer meio de cobrança de imposto adicional.

Salienta-se que o Decreto nº 1944/1988, que constitui o RICMS do Estado de Mato Grosso, que foi alterado pelo Decreto nº 2033/2009, como ato normativo regulamentar que é não pode inovar o texto do Código Tributário do Estado de Mato Grosso, que por sua vez deve obediência às normas gerais tributárias da Lei nº 5172/1966, isto é, o Código Tributário Nacional, que foi recepcionado pela Constituição Federal.

Assim, obedecendo ao comando constitucional da legalidade, o Código Tributário Nacional veda aos entes políticos federados a instituição ou majoração de tributos sem que lei em sentido formal estabeleça.

Também é obstruída na ordem infraconstitucional o estabelecimento de limitações ao tráfego de mercadorias no território nacional através de tributos interestaduais, como está expresso nos incisos I e III do art. 9º do Código Tributário Nacional, ipsis verbis:

Art. 9º É vedado

à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - instituir ou majorar tributos sem que a lei o estabeleça, ressalvado, quanto à majoração, o disposto nos artigos 21, 26 e 65;

(...)

III - estabelecer limitações ao tráfego, no território nacional, de pessoas ou mercadorias, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais; (grifam-se).

Seguindo a diretriz do art. 152 da Constituição Federal o texto do art. 11 do Código Tributário Nacional reforça a impossibilidade dos entes políticos da federação ditarem diferenças tributárias motivadas pela origem ou destino dos bens envolvidos na operação comercial, ipsis litteris:

Art. 11

. É vedado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer diferença tributária entre bens de qualquer natureza, em razão da sua procedência ou do seu destino. (grifam-se)

Então, o ato em questão é também atentatório a esta regra na medida em que dita preferências desarrazoadas a mercadorias vendidas a consumidores endereçados no Estado de Mato Grosso por empresas sediadas nos limites territoriais daquele ente federado estadual, causando ofensa ao pacto federativo.

No tocante à função e alcance do Decreto como espécie normativa integrante da legislação tributária, o art. 99 do Código Tributário Nacional dispõe:

Art. 99

 - O conteúdo e o alcance dos decretos restringem-se aos das leis em função das quais sejam expedidos, determinados com observância das regras de interpretação estabelecidas nesta Lei. (grifam-se).

Isto é, claramente o decreto tem a finalidade de explicitar, regulamentar e materializar a execução da lei à qual se vincula umbilicalmente, jamais tem aptidão para inovar a lei que regulamenta e muito menos criar obrigações tributárias principais que impliquem no surgimento de novo sujeito passivo e de nova prestação pecuniária, como escancarada e ilegalmente impõe o Decreto nº 2033/2009.

No âmbito da ordem constitucional do Estado de Mato Grosso o Decreto nº 2033/2009, que acrescentou o art. 216-M-1 ao RICMS e, pois, criou novo sujeito passivo tributário e novo fato gerador, usurpa a competência do Poder Legislativo Estadual ditada pelo art. 25 e 45 da Constituição Estadual na medida em que referidos dispositivos reservam para Lei Complementar todas as matérias relativas ao sistema tributário, arrecadação e distribuição de rendas estaduais.

O Órgão Especial do Tribunal de Justiça de Mato Grosso em recente enfrentamento de questão decorrente do Decreto nº 1949/2009 - maliciosamente revogado pelo decreto nº 2033/2009 com a manutenção do mesmo objeto, em suposta conduta de má fé das autoridades do Governador do Estado e Secretário de Estado da Fazenda - no processo da Ação de Mandado de Segurança impetrado por B2W Companhia Global de Varejo sob protocolo nº 065326/2009, teve decisão liminar suspensiva dos efeitos daquele ato deferida pelo eminente Relator Des. Rubens de Oliveira Santos Filho.

No referido processo mandamental a Procuradoria de Justiça do Estado de Mato Grosso, pelo insigne Procurador de Justiça Wilson Vicente Leon, emitiu parecer acolhendo a arguição de inconstitucionalidade daquele malgrado Decreto nº 1949/2009 - cujo texto revogado pelo ato ora fustigado tem conteúdo e objeto igual – opinando pela concessão da ordem de segurança.

Como não poderia ser diferente, nos autos do processo da Ação Mandamental de protocolo nº 096683/2009, sob o patrocínio do autor deste texto, foi deferida em 19-11-2009, pelo insigne Des. Sebastião de Moraes Filho, medida liminar que suspendeu os efeitos do Decreto nº 2033/2009 no tocante à apreensão de mercadorias destinadas a consumidores endereçados no Estado de Mato Grosso que tenham como remetente empresa sediada em outra unidade federada que, comprovadamente, tenha recolhido o ICMS relativo no Estado de origem.

Portanto, não há sofisma de que o ato impugnado, da lavra e execução das autoridades impetradas, é expressamente violador dos dispositivos constitucionais e infraconstitucionais faceados, sendo absolutamente inconsistente e inapto a produzir efeitos jurídicos válidos, sendo exigível, pois, a sua extirpação do mundo fenomênico pela necessária declaração de inconstitucionalidade incidenter tantum pela inaugurada provocação do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso.

Também é necessária a vedação judicial da prática de atos similares ou com o mesmo conteúdo pelas acoimadas autoridades, que em visão distorcida de suas funções e responsabilidades institucionais arvoram-se caudilhescamente em condutas ilícitas no afã de aumentar a arrecadação a qualquer preço, especialmente em sacrifício dos caros princípios da legalidade e da moralidade, que heroicamente foram erigidos pela ordem constitucional vigente.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
João Bosco Peres

advogado e professor em Goiânia (GO)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PERES, João Bosco. Ignorância jurídica ou típica conduta de má-fé do governo estadual.: A criação de novo imposto e novo sujeito passivo tributário de ICMS no estado de Mato Grosso por ato administrativo (Decreto nº 2.033/2009). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2408, 3 fev. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14295. Acesso em: 23 dez. 2024.

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos