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Reserva legal.

Questões pontuais do ponto de vista jurídico, especialmente em relação à região da campanha e fronteira oeste do estado do Rio Grande do Sul

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05/03/2010 às 00:00
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2) Questões controvertidas – Bioma Pampa:

Explicada de maneira contextual a área de reserva legal, bem como sua procentagem e necessidade existencial dentro da propriedade, surgem três questões ímpares sobre o tema. A primeira diz respeito à necessidade de cerco no entorno da área de reserva legal. Já o segundo é inerente ao fato da necessidade de averbação da área de reserva legal junto à matrícula do imóvel. Por fim, a terceira diz respeito quanto à necessidade de se recompor (plantar na área de reserva legal). A partir desse momento, passamos ao estudo individual de cada problemática, especificadamente sobre a sua incidência no bioma pampa do Estado do Rio Grande do Sul.

2.1)

O cerco no entorno da área destinada a reserva legal: Nos parece que a área de reserva legal deve ser cercada, pois só assim, as matas, florestas e bosques poderão se regenerar e manter seu equilibrio, salvo no bioma pampa do Rio Grande do Sul, quando esta área for destinada a criação de gado em regime de campo natural. As regiões sul, campanha e fronteira oeste possuem uma vegetação diferente das demais regiões do país, sendo elas que englobam o bioma pampa.

A fim de sustentar a tese de que apenas no bioma pampa a área de reserva legal não necessita ser cercada, nos termos restritos a cima, passamos a compreender determinados conceitos, a começar pela explicação sobre o que é um bioma.

Bioma é um conjunto de vida (animal e vegetal) constituido pelo agrupamento de tipos de vegetação contiguos e identificaveis em escala regional, com condições geoclimáticas similares e história compartilhada de mudanças, o que resulta em uma diversidade biológica própria. Portano, podemos afirmar, de maneira categórica, que no Brasil apenas as regiões supra elencadas são envolvidas pelo bioma pampa, daí que a afirmação de não necessidade de cercamento da área só é vinculado à estas regiões.

Como dito anteriormente, o bioma pampa também é conhecido como campos sulinos, designação que foi adotada pela lei. Segundo o IBGE, este tipo de ecossistema ocupa 2% (dois por cento) do território nacional. Se caracteriza de maneira peculiar em relação aos outros biomas brasileiros por ser composto por gramíneas e plantas rasteiras, sendo encontradas algumas árvores e arbustos perto dos cursos d’água. Possue em sua flora cerca de 400 espécies de gramíneas, enquanto a sua fauna é composta aproximadamente por 385 espécies de aves e 90 espécies de mamiferos terrestres.

A peculiariedade do bioma pampa é traduzida pelo macroclima existente, ou seja, tipo de solo, condição do substrato, tamanho em extensão, barreiras geográficas e outros fatores físicos. Assim que dada as suas caracteristicas, percebe-se que a existência de bovinos , equinos e ovinos criados a campo natural (sem implementação de pastagens) está em perfeita constância com o bioma pampa, não havendo nenhuma necessidade de cercamento da área de reserva legal.

Embora evidente, destaca-se através do presente trabalho, que nas áreas contidas dentro do bioma pampa destinadas à plantação de pastagens e lavoura, deverá sim o proprietário cercar a área de reserva legal.

Acreditamos que em relação às áreas de pastagens o tema ainda esteja obscuro, devendo os biólogos e geógrafos aprofundar os estudos para averiguar até que ponto a inserção artificial de gramíneas pode prejudicar ou alterar o bioma pampa. Outrossim, deverá ser analisado se a pastagem artificial cultivada em parceria com a pecuária se desenvolve de maneira sustentavel e sem agredir o bioma, sendo a resposta positiva não existe óbice legal, neste caso, que obrigue o cercamento da área de reserva legal no imóvel.

Entretanto, não surgem questionamentos em relação às áreas exclusivamente lavoreiras, sendo que estas devem ter sua reserva limitada e protegida com a inauguração de proteção fisica nos seus limites, uma vez que a atividade agricultural modifica o ecossistema.

A ideia de ser prescindivel o cercamento da área de reserva legal nas propriedades envolvidas pelo bioma pampa que são destinadas exclusivamente para a pecuária em campo nativo é concebida a partir da análise empirica e contextual legal sobre a área de reserva legal.

O contexto dorsal que alicerçou o surgimento da área de reserva legal foi a necessidade de se reservar, dentro da propriedade, uma área onde fosse possível a natureza se reestabelecer por suas próprias forças. Esta área deveria ser reservada para que, no seu interior, o ecossistema preservasse a sua virgindade, a fim de possibilitar a sua regeneração em caso de degradação das demais áreas daquela propriedade.

Ocorre que ao tratarmos sobre o bioma pampa em regime de pastoreio em campo nativo, podemos afirmar de maneira absoluta, que é imprestável a aplicação da norma de reserva legal em relação à limitação (porcentagem) e cercamento da área reservada. Isso porque, no momento em que há perfeita interação, de maneira sustentável, entre a flora (campo) e fauna (gado, equinos e ovinos), tornando um ambiente equilibrado e no seu estado original, está se mantendo a ideia que fundou a reserva legal, não só em parcela da propriedade, mas sim em toda a sua extensão.

Portanto, não se vislumbra necessidade de limitar com divisas a área de reserva legal, pois o imóvel de forma absoluta, está sendo reservado, ou seja, a criação de gado no bioma pama, em campo natural, conserva a propriedade em sua estado primitivo. O cercamento só é necessário para aquelas propriedades onde se vislumbra a alteração do meio ambiente. Como a pecuária neste tipo de bioma não afeta a sua essência, torna-se imprestável o cercamento da reserva. Gize-se que neste caso, o espírito da lei que previu a reserva legal está sendo preservado, pois com a pecuária em campo nativo o ecossistema daquela propriedade está sendo preservado em seu estado primário.

Em última análise, cabe grifar que os índices referentes à reserva legal e sua consequente delimitação, não possuem aplicação para as propriedades que possuam características como as mencionadas a cima, posto que o índice torna-se desprezível, uma vez que a propriedade não está sendo parcialmente destinada a reserva legal, no caso 20% (vinte por cento), mas sim está sendo totalmente destinada à reserva legal.

Igualmente, a construção de limites fisicos é prescindivel pois não tem necessidade de se conservar uma área virgem para que se reestabeleça a natureza, já que a integração da pecuária com o bioma pampa mantém o ecossistema em seu estado original, não sendo necessário, portanto, reservar parcela do imóvel para reserva legal.

Ademais, o cercamento e retirada do gado em áreas de campo nativo não é desejável, pois propiciaria o estabelecimento de plantas arbustivas (como o espinilho, por exemplo) com a conversão de áreas com predominância de campo nativo em áreas de predominância de vegetação arbóreo-arbustiva, causando perda da biodiversidade local devido ao sombreamento do solo e o desaparecimento das espécies herbáceas características dos campos nativos, assim como devido ao abandono destas áreas pela fauna que estavam associadas às áreas de campo "aberto".

Assim que, além de ser perfeitamente possível a integração e equilíbrio do bioma pampa com o desenvolvimento da pecuária em campo nativo, o próprio bioma pampa reclama a presença de bovinos, equinos e ovinos, espécies de mamíferos para o seu perfeito desenvolvimento. Isso porque dentro da fauna que o compõe, existem inúmeras espécies de mamíferos herbívoros. Dessa forma, podemos concluir que os bovinos, equinos e ovinos não são alienígenas ao Bioma e sim fazem parte do sistema ecológico, sendo necessária a sua presença para a manutenção do sistema, fortalecendo-o ainda mais e favorecendo a estabilidade e a biodiversidade do Pampa.

Em síntese, podemos concluir que os imóveis rurais inseridos no bioma pampa, que se utilizam da propriedade de maneira sustentável, através da pecuária em sistema de campo nativo, devem ser consideradas em sua plenitude áreas de reserva legal e, por conseguinte, dispensam o cercamento da área destinada à reserva legal.

O Código Florestal vai reclamar a delimitação física da reserva legal, no nosso entendimento, apenas quando: se tratar de área de floresta ou dentro do bioma pampa quando a atividade desenvolvida na propriedade for exclusivamente a agricultura ou plantação de pastagens. Salienta-se que a propriedade destinada à lavoura poderia instituir a sua área de reserva legal e nela fazer a integração lavoura pecuária, uma vez a possibilidade da criação de animais herbívoros nesta área destinada à reserva legal.

Torna-se evidente, à luz da concepção da teoria que concebeu a doutrina da reserva legal, que em áreas de florestas (leia-se de forma extensiva, posto que deve englobar os demais biomas brasileiros, excluindo-se o pampa) a reserva legal deve ser protegida por meio de contenção física, pois só assim haverá meios propícios para que a vegetação se restabeleça e fique conservada.

Ainda que seja elementar, é importante salientar que não havendo cerco, a agricultura certamente tomará conta da zona que deveria ser destinada à reserva legal na propriedade. Não menos notório é o fato de o gado não deixar a floresta se reerguer retornando ao seu status quo, já que além de mutilar através de pisoteio as novas mudas de árvores, acaba devorando os brotes jovens, impedindo, assim, que a floresta estabeleça o seu ciclo completo, desequilibrando de forma flagrante aquele ecossistema.

Em relação ao bioma pampa, a prescindibilidade se constata apenas quando verificada na propriedade que o modelo de produção é a pecuária desenvolvida exclusivamente em sistema de pasto nativo. Ante a este fato, imperiosa a constatação de que se uma propriedade estiver totalmente dentro do bioma pampa, mas se destinar de forma absoluta à agricultura, a mesma deverá reservar e cercar a área de reserva legal.

Tal premissa deve ser estendida e vinculada, pelo menos até que sejam efetuados estudos mais cuidadosos para aquelas propriedades que são voltadas para a pecuária mas com toda a sua extensão destinada ao cultivo de pastagens.

Surge neste ponto uma zona nebulosa em relação àqueles imóveis que se destinam à atividade agropecuária, ou seja, tem parte da propriedade dispensada à agricultura e outra parte vinculada à pecuária em campo nativo. Neste caso, o proprietário deve se indagar como proceder em relação à área de reserva legal.

A resposta, a nosso ver, surge a partir da hermenêutica jurídica, ou seja, através da interpretação legal do Código Florestal. Contudo, primeiramente cumpre desvendar que não existe tal problema quando a propriedade for intercalada com agricultura e pecuária em pastagens artificiais, pois neste caso, sem sobra de dúvidas, deverá o possuidor do imóvel, além de reservar a área de reserva legal, circundar aquele local com cercas, se abstendo de cultivar neste pedaço, mas podendo criar animais nesta zona.

Em relação à problemática surgida no ementário a cima, temos que a resposta é simples e singela. Ora, se é permitido, ou melhor, se deve ser permitido ao criador utilizar a área de reserva legal de sua propriedade para desenvolver a produção em campo nativo, uma vez que estaria se considerando toda a área como de reserva legal, deve-se também permitir a este produtor que utilize a área de reserva legal para a criação do gado.

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Simplificadamente, para aquele produtor que planta e cria gado, a área de reserva deveria ser demarcada, mas não haveria impedimento para que se criasse gado na sua extensão. Assim que se no interior de um imóvel houvesse áreas destinadas ao cultivo, a área de reserva legal poderia ser aproveitada com a criação de gado. Logo, toda a propriedade seria aproveitada, não haveria limitações, apenas existiria a necessidade de se demarcar a área de reserva legal, para evitar fraudes.

Por derradeiro, ante ao que foi tratado neste tópico, temos como pontos conclusivos:

- as propriedades que se encontram fora do bioma pampa devem ter cercada a área de reserva legal, abstendo-se o proprietário da utilização desta área demarcada.

- as áreas que se encontram inseridas no bioma pampa e que são destinadas exclusivamente para a agricultura devem ter erigidos limites físicos que circundem a área de reserva legal, não podendo o proprietário utilizar esta parcela do solo para plantação.

- os imóveis englobados pelo bioma pampa, aproveitados em sua extensão total para o plantio de pastagens, devem ter reservadas e protegidas através da imposição de obstáculo físico a área de reserva, a fim de impedir a utilização da área.

- os campos pertencentes ao bioma pampa e que são destinados para agricultura e plantação de pastagens devem ter apartada a área de reserva legal, protegendo os seus limites com a construção de barreiras, não devendo o proprietário utilizar a área.

- já para os imóveis pertencentes ao bioma pampa e que são destinados parte para a agricultura e parte para pecuária em campo nativo, existe a necessidade de demarcação e limitação através de cerca da área, mas esta área pode ser usada para a criação.

- por fim, as propriedades que se encontram dentro do bioma pampa e que desenvolvem a pecuária em campo nativo, não necessitam ter cercada e nem delimitada a área.

2.2)

Da necessidade de averbação da área de reserva legal junto à matricula do imóvel: No nosso entender, não há discussões possíveis a se erigir quanto à legalidade da obrigatoriedade de destinar área à reserva legal, pois pode sim o ente administrativo exigir do particular esta limitação proprietária, em consonância com os principios constitucionais de proteção ao meio ambiente e função social da propriedade.

Entretanto, a imposição da obrigação de averbar esta área junto a matrícula do imóvel, bem como a aplicação da infração administrativa para aqueles que deixarem de averbar, tem-se que tal restrição se mostra, no nosso sentir, totalmente descabida, desproporcinal e irrazoável e, portanto, poderia ser banida do meio jurídico.

A previsão legal que referencia a necessidade de averbação junto à matrícula do imóvel da área de reserva legal vem disposta no artigo 16, parágrafo 8º do Código Florestal,. Reza tal preceito que "A área de reserva legal deve ser averbada à margem da inscrição de matrícula do imóvel, no registro de imóveis competente, sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, de desmembramento ou de retificação da área".

Honrando a hermenêutica, podemos afirmar que o preceito acima comporta dois entendimentos, a saber: primeiro, que a área de reserva legal só deve ser averbada na matrícula do imóvel em caso de transmissão, de desmembramento ou de retificação da área; segundo: é obrigação do proprietário, independente de ocorrer os eventos descritos anteriormente, a averbação de área de reserva legal na matrícula do imóvel. Chega-se a esta conclusão quando interpretado o artigo 16 do Código Florestal de forma sistemática com o artigo 55 do Decreto 6514 de 2008.

A seguir, serão tratadas as duas correntes, mas desde já informa-se que este autor comunga da primeira doutrina, pelos fatos e fundamentos que serão expostos.

2.2.1) É obrigatória a averbação somente nos casos previstos em lei:

A obrigatoriedade de averbação da área de reserva legal na matrícula do imóvel, sem dúvidas, empurra qualquer tipo de análise a ser feita para ótica do direito registral. Em sua essência, o registro de imóveis surgiu para dar publicidade da coisa ao meio social, ou seja, tornar público aos olhos da sociedade quem é o real proprietário de um imóvel.

Nessa esteira, entendemos que não é necessária a averbação da área de reserva legal, salvo nos casos de transmissão, desmembramento ou retificação da área, haja vista que não é necessário que toda a sociedade tenha conhecimento onde reside a área de reserva legal de uma propriedade, bastando que o ente público o saiba.

No nosso entender a necessidade legal de averbação da área de reserva justamente se dá para que o novo proprietário ou sucessores saibam onde se encontra esta área, uma vez que a mesma não pode ser alterada ou mexida depois de instituída.

Fora destes casos, fica sem sentido exigir-se a averbação da área de reserva legal na matrícula do imóvel, isso porque aos interessados, no caso órgão ambiental e proprietário, o importante é a instituição da área e sua conservação na prática.

É evidente que no dia a dia pouco importa para a fauna e a flora de uma área de reserva legal se ela está averbada ou não. Também foge ao interesse do órgão ambiental fiscalizador qualquer registro burocrático, pois a este ente administrativo o necessário é que a área que foi escolhida como de reserva esteja demarcada (quem escolhe a área dentro da propriedade é o ente público) e conservada.

Outrossim, não alcança os interesses do proprietário o tramite rigoroso dos registros de imóveis, pois a esta pessoa o importante é que no plano fático a lei está sendo cumprida.

De maneira um tanto irônica, impõe-se algumas indagações, tais como, será que as plantas e os animais que vão habitar a área de reserva se indagarão sobre a possibilidade daquela área estar averbada na matrícula do imóvel? Será que o ente administrativo ambiental, quando realizar o seu poder de polícia através da fiscalização, irá apenas conferir teoricamente nos registros de imóveis se existem averbações nas matrículas dos imóveis. Ou melhor, se depois de demarcada a área de reserva legal, pelo próprio ente e verificado o seu fiel cumprimento pelo proprietário, será que o órgão fiscalizador irá se dirigir ao registro de imóveis a fim de verificar a averbação?

Mas cabe mais uma dúvida pertinente. Podemos afirmar que falece interesse tanto ao Estado quanto ao proprietário o fato da averbação, isso porque no caso basta a instituição da área de reserva legal na propriedade. Assim, pergunta-se qual a eficácia da averbação, ou seja, quais os efeitos oriundos desta averbação tanto para o Estado quanto para o particular?

Em resposta às assertivas supra arguidas, podemos chegar de maneira clara e coesa a certas conclusões. Manifesto que a primeira perquirição tem elevado grau irônico e utópico, mas cumpre demonstrar, por oportuno, que apesar do tom jocoso, existe sim um grau de verdade que, consequentemente, torna claro o fato de ser desnecessária a averbação da reserva legal.

Ora, para a fauna e flora basta um local reservado, isso quer dizer que frente ao meio ambiente desimporta, de maneira cabal, a ocorrência de averbação da área. O que se quer dizer com isso é que a necessidade de averbação não da maior ou menor proteção ao ecossistema. A simples averbação não contribui nem para preservação e nem para a proteção da área de reserva legal, isso porque para o meio ambiente o necessário é a reserva fática e não o simples papel.

Portanto, se a averbação não vincula de maneira protetiva o meio ambiente, tendo papel absolutamente desprezível dentro da sistemática social e jurídica, deve ser castrada do direito pátrio, mantendo-se restrita apenas nos casos descritos pela lei. Pois é justamente nos casos descritos em lei pode se ver o papel que desempenha a averbação da reserva legal, mas somente nestes casos.

Nos casos enumerados na lei, se faz imperiosa a averbação da área a fim de dar publicidade ao novel proprietário (a qualquer título) do local onde está encravada a reserva legal, isso porque depois de instituída, ela é imutável.

Bom, nestes casos entende-se a pertinência da lei que obriga a averbação, pois além de publicizar ao novo proprietário a existência e local da reserva legal, impede que o mesmo altere a área de reserva. Ademais, evita discussão sobre o negócio jurídico que se entabulou, já que o adquirente não pode arguir futuramente indenização por existir uma área intocável no imóvel ou mesmo exigir do vendedor indenização caso seja multado pelo órgão ambiental se constatada a inexistência da área de reserva legal.

Após instituída a área de reserva legal, esta é imutável, sendo essa imutabilidade decorrência lógica da essência instituidora da reserva legal, pois se esta área busca preservar um quinhão da propriedade para que na eventualidade de esgotamento daquele solo, esta área apartada germine o restabelecimento ambiental de toda a propriedade, a sua constante troca impediria que esta zona tivesse força para se estender às demais regiões da propriedade. Portanto, andou muito bem o legislador ao proibir mudanças na área de reserva legal depois de instituída. Ademais, a possibilidade de alteração da área de reserva legal permitiria aos proprietários a utilização de toda a propriedade, fazendo um rodízio anual ou até semestral das áreas de preservação, impedindo com isso a aplicação fática e procedimental do espírito engajado na lei que criou esta obrigação, posto que o rodízio de áreas impediria o fortalecimento de uma área de reserva, impedindo assim, que ela tivesse força para se expandir para o resto da propriedade em caso de colapso ambiental.

Em relação ao segundo questionamento, podemos chegar a seguinte resposta. O órgão fiscalizador, desempenhando o seu papel de polícia administrativa ambiental, se dirige a certa propriedade e lá constata que este imóvel possui a sua área de reserva legal, dentro dos parâmetros legais e administrativos.

Logo, está estritamente cumprindo o que a lei lhe impôs, bem como está cumprindo a sua função social e ambiental. Portanto, cabe nos perguntar até que ponto tem interesse o órgão ambiental em saber se esta área de reserva esta averbada. Ao nosso ver, basta para o órgão ambiental fiscalizador que a propriedade cumpra o que lhe foi imposto e com isso beneficie o meio ambiente, não havendo interesse para o órgão fiscalizador em saber se aquela área de reserva legal esta averbada, isso porque o simples registro não tem o condão de beneficiar o ecossistema deste imóvel.

Ou seja, o que o órgão ambiental quer é a proteção da natureza e sua função é verificar o que a lei impôs como condição para a proteção do meio ambiente, e se o registro não possui poderes para vincular a proteção na prática, então podemos concluir que para o órgão ambiental a averbação da área de reserva legal é uma obrigação vazia. Logo, não há por que fiscalizar, já que o importante é a conservação e instituição da área de reserva, arredando-se a averbação que não tem razão em si de sua existência, posto ser absolutamente sem eficácia fática para o sistema ambiental fora dos casos descritos em lei.

Assim que a conclusão cogente é que a exigência de averbação da área de reserva legal constitui uma obrigação desprovida de nexo causal com a proteção do meio ambiente e, por conseguinte, é atingida em sua eficácia de maneira vital, não devendo, dessa forma, ser levada a cabo pelos órgãos fiscalizadores ambientais, pois pouco importa a averbação quando a propriedade na pratica possui a sua área de reserva preservada.

Dessa forma, não tem interesse o órgão administrativo em saber se existe averbação ou não, haja vista que a sua função é de fiscalização para proteção do meio ambiente e se a averbação, por si só, não protege o ecossistema, não tem por que fiscalizar esta obrigatoriedade.

Assim, a resposta ao segundo questionamento, a nosso ver, é que o órgão ambiental não irá se dirigir até o registro de imóveis, sendo que na prática irá apenas verificar a existência da área de reserva legal. Assim surge mais um argumento para demonstrar que a obrigatoriedade de averbação da área de reserva legal em qualquer situação é desnecessária, pois ineficaz, em última análise, para o meio ambiente

O terceiro questionamento já foi explorado e respondido quando tratado o segundo tema. Contudo, ressalva-se que para o ente administrativo e para o particular inexiste efeitos, seja de ordem pratica ou jurídica (análise contextual), em relação à averbação da área de reserva.

Podemos afirmar com extrema segurança, que a simples averbação, em qualquer caso, da área de reserva não gera efeitos protetivos para o meio ambiente, e se não gera proteção ao meio ambiente, não tem por que o ente público exigir esta obrigação.

A construção teórica também pode ser estendida ao proprietário, assim que se o registro não possuiu eficácia para proteger o meio ambiente qual a importância de se registrar? Portanto, para o particular a averbação desta área é apenas um ônus (burocrático e com elevados custos). Partindo da premissa que todo o ônus surge para proteção e interesse da sociedade até se aceitaria a imposição da averbação. Entretanto, como este ônus não protege e nem põe a salva guarda os interesses sociais, ele é totalmente imprestável, não possuindo razão de existir.

Ante ao que foi constatado nos parágrafos acima, concluímos e nos filiamos na orientação doutrinária de que a averbação da área de reserva legal na matrícula do imóvel só deve se dar nos casos enumerados taxativamente na lei, e não em qualquer caso, como parte da doutrina afirma. Esta parcela doutrinária que diverge desta conclusão funda seus argumentos na interpretação restritiva e literal do Código Florestal simultaneamente com o Decreto que regulou as sanções administrativas, como no ponto a seguir será visto, as criticas em relação a este entendimento serão discorridas no transcorrer do tópico e, destarte, se demonstrará a tese até aqui defendida.

2.2.2) É obrigatória a averbação da área de reserva legal na matricula do imóvel, independente de qualquer circunstância:

Recapitulando: a reserva legal, como limitação administrativa à propriedade, independe de averbação no Registro de Imóveis, uma vez que a sua publicidade é conferida pela Lei. Como limitação administrativa, o Código Florestal incide de forma geral, gratuita, unilateral condicionando e limitando o uso, de parte certa e localizada, de toda propriedade rural.

A finalidade da averbação da Reserva Legal na matrícula do imóvel é a de dar publicidade à mesma, para que futuros adquirentes saibam onde está localizada e conheçam seus limites e confrontações, uma vez que podem ser demarcadas em qualquer lugar da propriedade, já que a lei determina que, uma vez demarcada, fica vedada a alteração de sua destinação, inclusive nos casos de transmissão, a qualquer título, nos casos de desmembramento ou de retificação de área.

O entendimento expressado acima, não é coadunado por parte da doutrina, isso porque no entender deles, a área de reserva legal deve ser averbada em todas as propriedades, independente de venda, transmissão, desmembramento ou retificação da área. Essa posição é tomada a partir da interpretação sistemática do artigo 16 do Código Florestal com o artigo 55 do Decreto 6514/2008.

Cumpre mencionar que o referido Decreto está sofrendo forte crítica por parte da bancada ruralista no Congresso, e teve prorrogada a sua entrada em vigor pelo prazo de três anos, postergando a sua vigência que se daria no mês de Dezembro de 2009, para o ano de 2012.

A interpretação dada pelos que entendem diversamente deste autor é fundada na interpretação literal, restritiva e sistemática do Código com o Decreto, senão vejamos. O artigo 16 do Código Florestal leciona que: "Art. 16. As florestas e outras formas de vegetação nativa, ressalvadas as situadas em área de preservação permanente, assim como aquelas não sujeitas ao regime de utilização limitada ou objeto de legislação específica, são suscetíveis de supressão, desde que sejam mantidas, a título de reserva legal..." parágrafo 8º : "A área de reserva legal deve ser averbada à margem da inscrição de matrícula do imóvel, no registro de imóveis competente, sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, de desmembramento ou de retificação da área".

Já o artigo 55 do Decreto dispõe que: "Art. 55. Deixar de averbar a reserva legal: Penalidade de advertência e multa diária de R$ 50,00 (cinqüenta reais) a R$ 500,00 (quinhentos reais) por hectare ou fração da área de reserva legal."

A interpretação restritiva legal é limitada e despreza a essência e o espírito da norma, levando os positivistas a crer que no momento que o Decreto entrar em vigor será obrigatória a averbação da área de reserva legal, posto que aqueles que não tiverem averbado serão punidos através de multa pecuniária.

Ao nosso sentir, esta punição deverá ser imposta ao proprietário quando este realizar alguma das condutas anteriormente citadas e não averbar a área de reserva legal. Esse entendimento é sistemático, analisando o conjunto jurídico pátrio, em consonância com o espírito das leis que criaram esta obrigação. Portanto, a punição concebida pelo decreto veio para punir aquele proprietário que, por exemplo, ao vender a sua propriedade não havia anteriormente averbado a área de reserva legal e não para punir de forma geral todos os proprietários de imóveis rurais no Brasil, que não tem averbada a área de reserva legal na matrícula do imóvel.

Ademais, o próprio artigo 16, parágrafo 8º permite interpretação no sentido de não ser necessária a averbação em qualquer caso, segundo a lei "A área de reserva legal deve ser averbada à margem da inscrição de matrícula do imóvel, no registro de imóveis competente, sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, de desmembramento ou de retificação da área".

Após a leitura fica de fácil compreensão o texto do parágrafo oitavo, pensamos que ele está a dizer que a área de reserva deve ser averbada nos casos de transmissão, de desmembramento e de retificação e que a sua alteração é vedada. Entretanto se não foi isso que o legislador quis propagar, então concluímos que este parágrafo foi mal escrito e enquanto não for retificado não pode ter aplicação no sentido de coagir a averbação de todas as áreas de reserva legal e em qualquer caso, pelo menos até que o poder judiciário clarifique através de remansosa jurisprudência qual o real sentido deste texto legal.

Cabe ressalvar que defendemos a tese de que é prescindível a averbação junto à matrícula do imóvel da área de reserva legal. Contudo, cremos que a instituição da área de reserva legal na propriedade é cogente e deve ser instituída o quanto antes pelos proprietários de imóveis rurais no Brasil.

2.3)

Recomposição da área de reserva legal:O artigo 44 do Código Florestal disciplina a matéria referente ao tema. A compensação nada mais é que o procedimento que um proprietário de um imóvel rural deverá tomar caso a parcela de área de reserva legal do seu imóvel estiver desmatada, ou seja, num imóvel desmatado, onde a reserva legal foi instituída numa área sem cobertura florestal, deverá o instituidor, no caso o proprietário, fazer a recomposição desta área de acordo com o disciplinado na lei.

Reza o artigo 44 do Código Florestal: "O proprietário ou possuidor de imóvel rural com área de floresta nativa, natural, primitiva ou regenerada ou outra forma de vegetação nativa em extensão inferior ao estabelecido nos incisos I, II, III e IV do art. 16, ressalvado o disposto nos seus §§ 5º e 6º, deve adotar as seguintes alternativas, isoladas ou conjuntamente". O próprio artigo traz em seu inciso primeiro a forma de recompor a área desmatada, segundo tal inciso cabe ao proprietário e ao possuidor "recompor a reserva legal de sua propriedade mediante o plantio, a cada três anos, de no mínimo 1/10 da área total necessária à sua complementação, com espécies nativas, de acordo com critérios estabelecidos pelo órgão ambiental estadual competente"

Portanto, se abstrai da lei a forma de como afetar a recomposição da área de reserva legal, bem como o prazo que deve ser feito.

Destaca-se que na região do bioma pampa esta recomposição com o plantio de espécies nativas se mostra, em principio, desnecessária, posto que o pampa se caracteriza por predominância de vegetação rasteira.


Conclusão

Ao fim do presente estudo, podemos afirmar, salvo melhor juízo, que a área de reserva legal é uma restrição administrativa necessária. Oportuno também destacar que a lei deveria sofrer algumas mudanças a fim de se tornar maleável, principalmente para permitir a instituição da reserva legal dentro de uma área de preservação permanente.

Também importa grifar que deveria ocorrer um estudo mais aprofundado em relação à integração bioma pampa e reserva legal, principalmente quando há interação da pecuária com o campo nativo. Outrossim, as autoridades deveriam elucidar melhor a questão sobre a necessidade de cercamento das áreas de reserva, bem como dos mecanismos de compensação, principalmente em relação aos créditos de reserva florestal.

Por fim torna-se necessário mencionar a necessidade de pacificação da matéria referente à obrigatoriedade indiscriminada de averbação da área de reserva legal na matrícula do imóvel, que enquanto não levada ao Judiciário, com certeza deve prevalecer a interpretação de que só é necessário o registro nos três casos descritos em lei.

Assim, entendemos que ainda existem muitas lacunas referentes à área de reserva legal e que a edição de um novo decreto ou medida provisória a fim de alterar o Código Florestal se faz necessário, com um estudo mais aprofundado, com regras mais claras, sem interpretações ambíguas, e que contenham toda a procedimentalidade para que se possa instituir de forma plena a área de reserva, mas principalmente que esta nova lei respeite, individualize e absorva as características de cada bioma contido no nosso país.


Notas

  1. Sitio da Central Jurídica, visitado em 23/09/2009 em www.centraljuridica.com/materia/2355/direito_ambiental/uso_de_cotas_de_reserva_florestal_pode_ser_regulamentado.html
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Sobre o autor
Luis Felipe Canto Barros

Advogado. Pós Graduado em Direito Ambiental pela PUCRS

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARROS, Luis Felipe Canto. Reserva legal.: Questões pontuais do ponto de vista jurídico, especialmente em relação à região da campanha e fronteira oeste do estado do Rio Grande do Sul. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2438, 5 mar. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14454. Acesso em: 17 nov. 2024.

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