O PRINCIPIO DA PROPORCIONALIDADE
A jurisprudência dos tribunais quanto à condenação de policiais por disparos de arma de fogo, sem a observância do princípio da proporcionalidade, é farta. O embasamento dos julgadores, para se conter os excessos do Estado, personificado por seus agentes, está na não aplicação do referido princípio.
Como nos ensina o professor José dos Santos Carvalho Filho:
"O grande fundamento do princípio da proporcionalidade é o excesso de poder, e o fim a que se destina é exatamente o de conter atos, decisões e condutas de agentes públicos que ultrapassem os limites adequados, com vistas ao objetivo colimado pela administração, ou até mesmo pelos Poderes representativos do Estado. Significa que o Poder Público, quando intervém nas atividades sob seu controle, deve atuar porque a situação reclama realmente a intervenção, e esta deve processar-se com equilíbrio, sem excessos e proporcionalmente ao fim a ser atingido. Segundo a doutrina alemã, para que a conduta estatal observe o princípio da proporcionalidade, há de revestir-se de tríplice fundamento: 1) adequação, significando que o meio empregado na atuação deve ser compatível com o fim colimado; 2) exigibilidade, porque a conduta deve ter-se por necessária, não havendo outro meio menos gravoso ou oneroso para alcançar o fim público, ou seja, o meio escolhido é o que causa menor prejuízo possível para os indivíduos; 3) proporcionalidade em sentido estrito, quando as vantagens a serem conquistadas superarem as desvantagens [06]".
Gilmar Ferreira Mendes, ao ser citado por Alexandre de Moraes, afirma que:
"um juízo definitivo sobre a proporcionalidade da medida há de resultar da rigorosa ponderação entre o significado da intervenção. O pressuposto da adequação (Geeignetheit)exige que as medidas interventivas adotadas mostrem-se aptas a atingir os objetivos pretendidos. O requisito da necessidade ou da exigibilidade (Notwendigkeit oder Enforderichkelt) significa que nenhum meio menos gravoso para o indivíduo revelar-se-ia igualmente eficaz na consecução dos objetivos pretendidos. Assim, apenas o que é adequado pode ser necessário, mas o que é necessário não pode ser inadequado [07]".
Na nossa visão deve existir uma relação direta entre a gravidade da conduta e a resposta do agente público. Nos ensinamentos de Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo temos que:
"O postulado da proporcionalidade é importante, sobretudo, no controle dos atos sancionatórios, especialmente nos atos da polícia administrativa. Com efeito, a intensidade e a extensão do ato sancionatório deve corresponder, deve guardar relação de proporcionalidade com a lesividade e gravidade da conduta que se tenciona reprimir ou prevenir. A noção é intuitiva: uma infração leve deve receber uma sanção branda; a uma falta grave deve corresponder uma sanção severa [08]."
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Somos sabedores de que o uso da arma de fogo, o disparo propriamente dito, sempre traz riscos. A chance de se atingir um inocente ou até mesmo um objetivo não pretendido existe. Por óbvio, há situações em que o uso da arma se faz necessário, seja para defender qualquer do povo, seja para proteger o próprio policial. Aí está, em nossa modesta opinião, o raciocínio e a ponderação que o agente policial deve realizar antes de fazer uso de sua arma.
- O uso da arma é adequado para a situação?
- Para atingir o fim que persegue, o policial não dispõe de outro meio menos gravoso que o uso da arma?
- No caso concreto, se utilizar a arma, possivelmente, o agente terá mais vantagens que desvantagens?
Sabemos que esse tipo de raciocínio e decisão, muitas vezes, senão na maioria delas, precisam ser tomados em questão de segundos. E aqui reafirmamos o que foi dito na introdução: a possibilidade de incorrer em erro, e assim vir a ser responsabilizado penalmente pelo crime de disparo de arma de fogo, é bastante provável se o policial agir afoitamente e sem sopesar as circunstâncias do caso concreto.
NOTAS
- NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. 3ª ed., Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, SP, 2008.
- GRECO, Rogério. Código Penal Comentado, 4ª ed. rev. ampl. e atualizada. Editora Impetus, Niterói, RJ, 2010.
- GRECO, Rogério. Atividade Policial: aspectos penais, processuais penais, administrativos e constitucionais. Editora Impetus, Niterói, RJ, 2009.
- JESUS, Damásio E. de, Código Penal Anotado, 12ª ed. rev. e atual, Saraiva, São Paulo, SP, 2002. CAPEZ, Fernando, Stela Prado. Código Penal Comentado. Editora Verbo Jurídico. Porto Alegre, RS. 2007.
- FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de Direito Administrativo. 19ª ed. rev. ampl. e atual. Ed. Lumen Juris, Rio de Janeiro, RJ, 2008
- MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada, 7ª ed, Editora Atlas, São Paulo, 2007.
- ALEXANDRINO, Marcelo e Vicente Paulo. Direito Administrativo Descomplicado. 16ª ed. rev . e atual. Editora Método. São Paulo, SP, 2008.