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Constitucionalismo no Brasil em tempos de pós-positivismo.

Uma abordagem à luz do princípio da dignidade da pessoa humana

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02/07/2010 às 03:00
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4 CONCLUSÃO

Pelo exposto, importa reforçar que na atual quadra do direito constitucional, a dignidade da pessoa humana figura no núcleo dos direitos fundamentais e como fundamento destes, servindo de instrumento hábil para a realização de uma leitura ética das normas (infra)constitucionais, buscando a conformação de todo o ordenamento à Constituição [17].

A inserção do referido princípio no texto constitucional vem a consolidar, conforme se observou, a doutrina pós-positivista, que resgata a conjugação entre o Direito e a ética e, ipso facto, marca a superação da doutrina positivista normativista. O pós-positivismo, então, mostra que a pureza do direito e a neutralidade do intérprete nem sempre atendem às necessidades sociais e prestam-se à concretização dos ideias de justiça.

Deste modo, conclui-se, com arrimo em Piovesan (2010, p. 32) que o valor-guia da dignidade da pessoa humana, bem como o valor dos direitos e garantias fundamentais, vêm a constituir os princípios constitucionais que incorporam as exigências de justiça e valores éticos, conferindo suporte axiológico a todo o sistema jurídico brasileiro.


REFERÊNCIAS

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BARROSO, Luís Roberto. A doutrina brasileira da efetividade. In Temas de direito constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, t. III.

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______. Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional brasileiro: pós-modernidade, teoria crítica e pós-positivismo. In Temas de direito constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, t. II.

______. Interpretação e aplicação da constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

______. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito: o triunfo tardio do direito constitucional no Brasil. Revista de direito Constitucional e Internacional, São Paulo, n. 58, p. 129-173, jan./mar. 2007.

______. O direito constitucional e a efetividade de suas normas: limites e possibilidades da constituição brasileira. 8. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2000.

BONAVIDES, Paulo. Teoria constitucional da democracia participativa: por um direito constitucional de luta e resistência, por uma nova hermenêutica, por uma repolitização da legitimidade. São Paulo: Malheiros, 2001.

COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

GRAU, Eros. Ensaio e discurso sobre a interpretação/aplicação do direito. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998.

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STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do direito. 8. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009.

______. Verdade e consenso: constituição, hermenêutica e teorias discursivas. Da possibilidade à necessidade de respostas corretas em direito. 3. ed. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2009.


Notas

  1. Conforme ensinamento de Dallari (1989, p. 240), "a liberdade, consagrada nas Constituições, não tinha chegado até àqueles que só possuíam sua força de trabalho".
  2. Nesse sentido, Coelho (2010, p. 202) observa que "era evidente que, mais cedo ou mais tarde, esse modelo, porque unilateral, esgotaria as suas possibilidades, o que efetivamente ocorreu, ensejando mudanças profundas no chamado Estado de Direito liberal-burguês, seja de maneira mais ou menos pacífica, na vertente das reformas negociadas, seja de forma violenta, na esteira das revoluções marxistas, como as que ocorreram na Rússia (1917) e na China (1949)".
  3. Em conformidade com o pensamento de Comparato (2010, p.66), "o reconhecimento dos direitos humanos de caráter econômico e social foi o principal benefício que a humanidade recolheu do movimento socialista, iniciado na primeira metade do século XIX. O titular desses direitos, com efeito, não é o ser humano abstrato, com o qual o capitalismo sempre conviveu maravilhosamente. É o conjunto dos grupos sociais esmagados pela miséria, a doença, a fome e a marginalização".
  4. Conforme Silva (1997, p.83), a Constituição de 1934, ao lado da clássica declaração de direitos e garantias individuais, inscreveu um título sobre a ordem econômica e social e outro sobre a família, a educação e a cultura, com normas quase todas programáticas, sob a influência da Constituição alemã de Weimar.
  5. Nas palavras de Barroso (2000, p. 20), a Constituição de 1934, "em uma fórmula de compromisso entre capital e trabalho, delineou o arcabouço formal de uma democracia social, que não se consumou".
  6. O positivismo jurídico operou a importação do positivismo filosófico ao Direito, buscando criar uma ciência jurídica baseada na realidade observável e não na especulação filosófica. Buscou, portanto, a separação entre direito e moral ou a valores transcendentes. Direito passa a ser norma, isto é, ato emanado do Estado com caráter imperativo e força coativa (BARROSO, 2009, p. 239-240).
  7. Para uma melhor compreensão: BARROSO, Luís Roberto. Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional brasileiro: pós-modernidade, teoria crítica e pós-positivismo. In Temas de direito constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, t. II, p. 24-27.
  8. A expressão "neoconstitucionalismo" é de uso corrente na doutrina. Recebe essa denominação, precisamente, em razão do advento das constituições democráticas surgidas no segundo pós-guerra. Pode aparecer ainda sob outras denominações, como, por exemplo, novo direito constitucional, constitucionalismo contemporâneo, dentre outras.
  9. Acerca da compreensão do jusnaturalismo e da inserção nos textos constitucionais de "normas" oriundas do direito natural, Sarlet (1998, p.103) ensina que "da concepção jusnaturalista remanesce, sem dúvida, a constatação de que uma Constituição que – de forma direta ou indireta – consagra a idéia da dignidade da pessoa humana justamente parte do pressuposto de que o homem, em virtude tão-somente de sua condição biológica humana e independentemente de qualquer outra circunstância, é titular de direitos que devem ser reconhecidos e respeitados pelos seus semelhantes e pelo Estado".
  10. Tomando por base uma noção um pouco mais relativa, Barroso (2009, p. 248) sustenta que o pós-positivismo surge como uma terceira via entre as concepções positivista e jusnaturalista, contestando o postulado positivista da separação ente Direito, moral e política
  11. Conferir BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito: o triunfo tardio do direito constitucional no Brasil. Revista de direito constitucional e internacional, São Paulo, n. 58, p. 129/173, jan.-mar. 2007.
  12. A efetividade é a eficácia social da norma, consubstanciada na sua capacidade de aproximar, o quanto possível, o dever-ser normativo e o ser da realidade social (BARROSO, 2009, p. 254). Para uma melhor compreensão, conferir BARROSO, Luís Roberto. A doutrina brasileira da efetividade. In Temas de direito constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, t. III, p. 61-77.
  13. Vale dizer, por oportuno, que a expressão "norma" mencionada neste trabalho baseia-se nas lições de Eros Grau, segundo o qual "a norma encontra-se, em estado de potência, involucrada no texto. Mas ela se encontra assim nele involucrada apenas parcialmente, porque os fatos também a determinam (..) a norma é produzida, pelo intérprete, não apenas a partir de elementos textuais que se desprendem do texto (mundo do dever-ser), mas também a partir de elementos do caso ao qual será aplicada, isto é, a partir de elementos da realidade (mundo do ser). Interpreta-se também o caso, necessariamente, além dos textos e da realidade – no momento histórico no qual se opera a interpretação – em cujo texto serão eles aplicados" (2009, p. 32).
  14. Com o fito de diferenciar as expressões "dignidade da ‘pessoa’ humana" e "dignidade humana", Sarlet (1998, p. 106) leciona que "a dignidade constitui atributo da pessoa humana individualmente considerada, e não de um ser ideal ou abstrato, não sendo lícito confundir as noções de dignidade da pessoa humana e dignidade humana (da humanidade)".
  15. Conforme Piovesan (2010, p. 28) "sob o prisma histórico, a primazia jurídica do valor da dignidade humana é resposta à profunda crise sofrida pelo positivismo jurídico, associada à derrota do fascismo na Itália e do nazismo na Alemanha (...). Nesse contexto, ao final da Segunda Guerra Mundial, emerge a grande crítica e o repúdio à concepção positivista de um ordenamento jurídico indiferente a valores éticos, confinado à ótica meramente formal".
  16. Nesse sentido, conferir: STF, AgR-RE n. 271.286-8, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 12.09.2000.
  17. Barroso (2009, 363) denomina tal fenômeno como "constitucionalização do direito", salientando que, no atual contexto, "a Constituição passa a ser não apenas um sistema em si – com a sua ordem, unidade e harmonia – mas também um modo de olhar e interpretar todos os demais ramos do Direito. Esse fenômeno, identificado por alguns autores como filtragem constitucional, consiste em que toda a ordem jurídica deve ser lida e apreendida sob a lente da Constituição, de modo a realizar os valores nela consagrados". Assim, a "constitucionalização do direito infraconstitucional não tem como sua principal marca a inclusão na Lei Maior de normas próprias de outros domínios, mas, sobretudo, a reinterpretação de seus institutos sob uma ótica constitucional".
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Sobre o autor
Nairo José Borges Lopes

Professor do Curso de Direito da Universidade José do Rosário Vellano (UNIFENAS). Mestre em Gestão Pública e Sociedade pela Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL/MG). Bacharel em Direito pela UNIFENAS. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LOPES, Nairo José Borges. Constitucionalismo no Brasil em tempos de pós-positivismo.: Uma abordagem à luz do princípio da dignidade da pessoa humana. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2557, 2 jul. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/15130. Acesso em: 16 abr. 2024.

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