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O outro lado da unificação das forças policiais

01/05/2000 às 00:00
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A segurança pública é uma preocupação da população, na maioria das vezes mais importante que o desemprego. Não adianta estar empregado e ser assaltado na volta do trabalho, ou ser morto quando se está na fila da padaria da esquina, por meninos que se tornaram assaltantes, e procuraram dinheiro para adquirirem novas pedras de crack.

A realidade das ruas demonstra que o crime vem aumentando, e a resposta do Estado não tem sido eficaz. A população carcerária vem aumentando, mas isso não significa diminuição dos índices de violência. Segundo a Revista Veja, Contas do Cárcere, no Estado de São Paulo, a cada ano o sistema prisional recebe 6.000 novos presos. Em 14 anos, o número de presos no Estado que atualmente é de 84.000 deve dobrar. (Revista Veja, Contas do Cárcere, 08/03/00, p. 20).


Como forma de resolver toda essa problemática, o Governo Federal, juntamente com os Governadores de alguns Estados, entre eles o do Estado de São Paulo, estão defendendo a unificação das Polícias Civil e Militar, para formar a chamada Polícia do Estado.

Em algumas oportunidades já defendemos a unificação dessas duas Corporações, nos artigos A Unificação das Polícias, O Neófito, e A Nova Polícia, Ujgoiás, também publicados em outros conceituados sites jurídicos da internet. Mas, a questão deve ser analisada por um outro prisma, que vem se tornando importante quando se trata desta matéria.

A Polícia Civil e a Polícia Militar possuem competências definidas no Texto Constitucional, cabendo a primeira a realização da função de polícia judiciária, destinada a apuração das infrações penais, executadas as militares, e àquelas que forem de competência da Polícia Federal, art. 144, § 4.º, da C.F. A PM fica reservada a função de policiamento ostensivo e preventivo, o que se denomina de polícia administrativa, art.144, § 5.º, da Constituição Federal.

A divisão dos órgãos policiais junto aos Estados Federados existe desde a vinda da família Real para o Brasil em 1808. A Polícia Militar possui suas origens na Guarda Real, tendo inclusive incorporado a sua estética militar, fundamentada na hierarquia e disciplina. Em 1831, por meio de decreto do então regente Padre Antonio Diogo Feijó foi autorizada a criação dos Corpos Policiais no Estado. Em São Paulo, a Força Policial foi criada em 15 de dezembro de 1831, por ato do Brigadeiro Rafael Tobias de Aguiar.

Percebe-se que tanto a PM como a PC possuem origens centenárias. Mas, cada corporação policial possui uma competência definida no Texto Constitucional, que são diversas, e exigem formação diferenciada de seus integrantes, que encontram-se subordinados ao Governador do Estado, art. 144, § 6.º, da Constituição Federal.

O problema de segurança pública que incomoda a população nos médios e grandes centros urbanos não será resolvido por meio de um decreto, que modifique o nome das Forças Policiais para Polícia do Estado. A violência possui suas origens em questões como o desemprego, a falta de oportunidades, a baixa renda, o analfabetismo, entre outros, sendo o crime o resultado dessas ingerências.

Os órgãos policiais combatem o resultado da violência, mas não a sua causa, e mesmo assim o fazem com limitação de recursos. A falta de uma estrutura que possibilite um melhor preparo dos agentes policiais é um outro problema sério, pois, na sua grande maioria são cidadãos honestos, e cumpridores de seus deveres, sendo que muitos deles colocam suas vidas a serviço da coletividade.

Ao invés de buscarmos a unificação, que não irá resolver a problemática da segurança pública, como demonstram estudos mais aprofundados a respeito do assunto, devemos pensar na reestruturação dos órgãos policiais, para que estes possam oferecer a população um serviço de qualidade, em atendimento ao princípio da eficiência disciplinado no art. 37, caput, da Constituição Federal.

A Polícia do Estado poderá ser criada aos poucos conforme defendemos no artigo A Nova Polícia, ou talvez, nem precise ser criada. O reaparelhamento da Polícia Civil e da Polícia Militar, com a adoção de Comandos Unificados subordinados ao Secretário de Segurança Pública darão uma resposta eficaz a sociedade, que não mais suporta o aumento da criminalidade, que é apenas um conseqüência decorrente de vários outros fatores.

Como observa o professor Álvaro Lazzarini em sua obra Temas de Direito Administrativo, no capítulo sobre A Unificação das Polícias é preciso regulamentar o art. 144, § 7.º, da Constituição Federal, que trata da organização e funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública.

A Polícia em nosso país possui suas deficiências, mas essa realidade não é uma prerrogativa apenas do Brasil. A edição de 8 de março de 2000, da Revista Veja, traz uma reportagem denominada Gangue fardada, que trata do problema de corrupção na Polícia de Los Angeles, a 2.ª maior cidade dos Estados Unidos. (Revista Veja, 08/03/2000, p. 46-7).

Segundo o artigo, alguns integrantes da Força Policial de Los Angeles (LAYDP) forjavam provas e depoimentos para incriminarem supostos infratores. As denúncias conforme consta do artigo são em quantidade assombrosa e podem envolver mais de 70 policiais. Não podemos esquecer ainda, que a mesma polícia acusada de corrupção em 1991 espancou um motorista negro. Com a absolvição dos policiais, a cidade viveu uma comoção social, que exigiu inclusive a presença da Guarda Nacional.

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A Polícia de Los Angeles que é uma força municipal em decorrência do federalismo americano, diverso do adotado pelo Brasil, é uma polícia unificada, com um corpo uniformizado, e organizado hierarquicamente, e outro destinado a função de polícia judiciária. Com base nos fatos ocorridos, o que devem fazer os cidadãos de Los Angeles, criarem uma Nova Polícia ?

Percebe-se que a questão da violência policial não é uma exclusividade do Brasil, ou dos chamados países de terceiro mundo, mas uma exceção restrita a alguns integrantes das Forças Policiais. O problema da segurança pública não pode e não deve ser resolvidos por meio de decreto ou projeto de Lei.

Em nosso país, a questão deve ser tratada com um certa reserva. A unificação até pode tornar-se uma realidade, mas no decorrer do tempo. Devemos em um primeiro momento investir na Polícia Militar e na Polícia Civil, para que estas tenham condições materiais e financeiras para desenvolverem um serviço de qualidade.

A busca de uma integração entre os órgãos policiais deve ser o segundo passo, por meio das escolas de formação, que devem ser únicas. A criação das UP - Unidades de Polícias, com uma Delegacia de Polícia e uma Companhia de Polícia Militar no mesmo prédio, é um outro passo importante, juntamente com as URP - Unidades Regionais de Polícias, que serão as sedes dos Comandos Unificados subordinados ao Secretário de Segurança Pública e ao Governador do Estado.

Caso se entenda necessário, as modificações nos órgãos policiais devem ser feitas de forma gradual, e talvez a unificação não seja a verdadeira opção para o sistema de segurança pública brasileiro, por força de sua origem histórica. O melhor caminho está no reaparelhamento dos órgãos policiais, e no desenvolvimento de atividades conjuntas, por meio de comandos unificados.

A Polícia é atividade essencial para a existência do Estado de Direito e o desenvolvimento da sociedade. As mudanças pretendidas devem ser realizadas com reservas, para se evitar o caos e a anomia das Leis. A desorganização da segurança pública interessa apenas as organizações criminosas. O império da Lei se constrói com instituições fortes, que estejam voltadas para a realização de suas funções, como tem sido exemplo no decorrer dos anos a Polícia Militar e a Polícia Civil.

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Sobre o autor
Paulo Tadeu Rodrigues Rosa

PAULO TADEU RODRIGUES ROSA é Juiz de Direito. Mestre em Direito pela UNESP, Campus de Franca, e Especialista em Direito Administrativo e Administração Pública Municipal pela UNIP. Autor do Livro Código Penal Militar Comentado Artigo por Artigo. 4ª ed. Editora Líder, Belo Horizonte, 2014.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROSA, Paulo Tadeu Rodrigues. O outro lado da unificação das forças policiais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 41, 1 mai. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1575. Acesso em: 22 nov. 2024.

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