3 SISTEMA PENITENCIÁRIO E SUAS CONDIÇÕES
A pena privativa de liberdade, que retira o indivíduo da sociedade transferindo-o a um local onde sua liberdade de ir é vir é quase que totalmente extirpada, destoa da prisão efetuada em tempos antigos.
Na concepção dos homens da era remota, a prisão era apenas um local onde os infratores permaneciam até ser executada sua sentença. Não havia uma concepção de privação da liberdade como pena, mas sim um local onde os indivíduos eram despachados para que aguardassem a execução da sanção imposta pelo exercente do poder punitivo (penas severas, que geralmente alcançavam o corpo do condenado). (SHECAIRA, 2002, p.33).
Na Grécia, Roma e meados da Idade Média, o instituto da prisão ainda permanecia como custódia, tendo, entretanto, no decorrer desta era histórica, mais precisamente no Direito Canônico, ocorrido os primeiros resquícios de utilizar esta privação de liberdade como meio efetivo de pena. Eram as denominadas prisões eclesiásticas, onde os sacerdotes infratores e hereges eram encaminhados a mosteiros e ficavam enclausurados para que refletissem e se arrependessem do mal praticado. Reclusão como penitência e meditação deu origem a expressão "Penitenciária", utilizada até os dias atuais. (SHECAIRA, 2002, p. 33 – 34).
Com o advento da Revolução Industrial e a introdução do modelo capitalista liberal, emergiu um novo meio do Estado de exercer o controle social através das penas. Era necessário dar uma utilidade a sanção imposta, tendo esta utilidade extrema ligação com o disciplinamento dado ao proletário enormemente explorado nas fábricas, privados quase que totalmente de benefícios pessoais. (ANITUA, 2008, p. 202 – 203).
Jeremy Bentham, um dos idealizadores deste modelo punitivo, expôs a pena privativa de liberdade como um novo modo de "castigar" o indivíduo que infringia o dispositivo penal. (ANITUA, 2008, p. 203).
3.1 DOS SISTEMAS PENITENCIÁRIOS
Pode-se classificar como sendo três os Sistemas Penitenciários existentes: o Sistema Penitenciário Pensilvânico ou Celular, o Sistema Penitenciário Auburniano e o Sistema Penitenciário Progressivo.
3.1.1 Sistema Penitenciário Pensilvânico
O Sistema Pensilvânico, também denominado Filadélfico ou Belga, surge pela iniciativa das sociedades integradas por quacres [08]bem como ilustres cidadãos da Filadélfia, dentre os quais, Benjamin Franklin e William Bradford. (BITENCOURT, 2009, p. 131 – 132).
Referida entidade com sua enorme influência social, conseguiu a proesa de, em 1790, fazer com que autoridades começassem a elaborar uma instituição a qual tinha como fundamento principal recuperar os infratores através do isolamento em uma cela, da oração e da abstinência de bebidas alcoólicas. (BITENCOURT, 2009, p. 132).
É neste diapasão que os representantes do Poder Público, através de uma lei, determinaram a construção em Walnut Street de um local que poderia ser aplicada a solitary confinement aos apenados. Cabe gizar que não foi aplicada propriamente dita a teoria do Sistema Celular, vez que só sofriam o isolamento individual em uma cela os indivíduos que eram classificados como os mais perigosos. Aos demais, era permitido no período diurno o trabalho em conjunto, sendo mantidos em celas comuns. (BITENCOURT, 2009, p. 132).
O Sistema elaborado em Walnut Street em pouco período começou a ruir em virtude da crescente massa carcerária que era encaminhada a referida casa Penitenciária. Ao enfrentarem o fracasso, a Sociedade da Filadélfia e da Pensilvânia solicitaram uma nova oportunidade para formular um sistema baseado na separação. Obtendo êxito nas pressões realizadas, foram criados dois novos Presídios: Western Penitentiary, em Pittsburgh [09] e Eastern Penitentiary [10]. (BITENCOURT, 2009, p. 132 – 133).
A Penitenciária Ocidental tinha como características isolar absolutamente o condenado em uma cela, não permitindo qualquer labor mesmo que dentro do aposento penitenciário. (BITENCOURT, 2009, p. 133).
Ao verificar que o sistema adotado pela Western Penitentiary era impraticável, ao ser inaugurada em 1829, a Penitenciária Eastern tinha como política isolar o apenado em cela individual, não permitindo sua saída do cárcere a não ser para passeio em pátio fechado, esporadicamente e sozinho, bem como autorizava o trabalho individualmente dentro da própria cela. (FERNANDES, 2000, p. 46).
O principal fundamento do Sistema Penitenciário Pensilvânico era manter os transgressores em celas separadas até o cumprimento final de sua pena, de modo que pudessem meditar profundamente pelas atitudes tomadas, orar, ficar obrigatoriamente em silêncio, bem como evitar a promiscuidade entre os reclusos, fator dado à época como principal causa da desordem dentro dos estabelecimentos penitenciários. (ANITUA, 2008, p. 220).
É nesta senda que se buscava confinar individualmente os detentos, permitindo-se que o infrator exercesse um ofício somente dentro do próprio local celular, onde recebia, se necessário, visitas do diretor, do médico, do sacerdote ou pastor e dos funcionários que laboravam na Penitenciária, sendo a única leitura permitida, a Bíblica. (FERNANDES, 2002, p. 663).
Devido a enorme solidão dos indivíduos que cumpriam pena nestes estabelecimentos, era corriqueiro que os reclusos sofressem transtornos psíquicos, sendo o sistema extirpado dos Estados Unidos em 1913, permanecendo, todavia, em alguns países. (FERNANDES, 2002, p. 663).
Além do motivo supracitado, bem como o fato do Sistema Celular ser altamente custoso devido a sua arquitetura e regime, as críticas ao modo filadélfico aumentaram quando as mudanças econômicas tornaram imprescindível o labor produtivo dentro dos estabelecimentos prisionais. (ANITUA, 2008, p. 222).
3.1.2 Sistema Penitenciário Auburniano
O desejo de superar as irregularidades do modelo Pensilvânico, aliado ao fato de haver, à época, um número crescente de delinqüentes, vez que a pena de morte e os castigos corporais foram progressivamente substituídos pela prisão, foram fatores primordiais para a criação do Sistema Auburniano. (BITENCOURT, 2009, p. 134).
Referida corrente teve início quando, em 1816, foi autorizada a construção do presídio de Auburn, sendo os detentos, neste estabelecimento, divididos em três categorias, a saber: isolamento contínuo aos mais velhos e aos reincidentes; isolamento na cela somente três vezes por semana e permissão para trabalhar aos que tinham uma periculosidade reduzida, e, por fim; isolamento noturno e permissão de laborar conjuntamente durante o período diurno ou isolamento somente uma vez a semana, aos que tinham maiores probabilidades de voltarem à sociedade sem cometerem novos delitos. (BITENCOURT, 2009, p. 134).
Devido a grande porcentagem dos reclusos, que, em isolamento contínuo, obtiveram doenças mentais, em 1824, após investigação da Comissão Legislativa, foi proposta o abandono ao enclausuramento solitário, sendo, progressivamente, permitido o trabalho coletivo aos presidiários, todavia, em absoluto silêncio, se destinando o isolamento na cela somente nos períodos noturnos. (BITENCOURT, 2009, p. 134).
A essência do modelo em comento está no fato dos reclusos poderem trabalhar conjuntamente, contudo, em extremo silêncio. O dialogo era permitido apenas com a permissão dos funcionários e em voz baixa. (FERNANDES, 2000, p. 47).
Um dos pilares do silent system foi o trabalho. Nesse sentido pode-se afirmar que o trabalho no projeto auburniano foge, de certa forma, tanto a sua original dimensão ideológica capaz de satisfazer as necessidade do "não proprietário", pedagogicamente como modelo educativo que permitirá ao proletário incorporar-se à força do trabalho. (BITENCOURT, 2009, p. 135).
Outro ponto primordial deste Sistema Penitenciário reside no fato dos detentos se dirigirem isoladamente no período noturno às suas respectivas celas, de modo que pudessem refletir acerca do mal praticado, bem como evitar atos homossexuais. (FERNANDES, 2002, p. 663).
O Sistema Auburniano começou a ter resistência através das associações sindicais, que não concordavam com a realização dos trabalhos nas prisões devido ao baixo custo dos produtos e da mão de obra barata, o que refletia na competição ao trabalho livre. (BITENCOURT, 2009, p. 135).
Outra crítica contundente que se fez ao ideal, está no fato dos integrantes do sistema não conseguirem efetivar o absoluto silêncio proposto pela teoria devido a enorme convivência entre os detentos no horário de trabalho. (FERNANDES, 2002, p. 663).
3.1.3 Sistema Penitenciário Progressivo
O Sistema Progressivo ganhou respaldo no cenário mundial quando Alexandre Maconochie, em 1840, na ilha Norfolk, Austrália, realizou obra a qual estipulava o sistema progressivo inglês ou mark system. (BITENCOURT, 2009, p. 137).
Referida modalidade consiste em medir a duração da pena por um somatório de trabalho e de boa conduta imposta ao apenado. Assim, dependendo do trabalho realizado, era efetuada diariamente depósito de marcas ou vales em favor dos reclusos. Alcançando a quantia necessária, observado é claro a gravidade do delito cometido, o apenado alcançaria uma dita progressão em seu regime. (BITENCOURT, 2009, p. 138).
A política penitenciária aplicada subdividia-se em três etapas: a) Isolamento celular diurno e noturno, onde o detento poderia ser submetido a trabalho duro e obrigatório, com alimentação escassa; b) Trabalho em comum sob regra de silêncio absoluto. Nesta etapa o apenado era encaminhado a um estabelecimento chamado public workhouse onde laborava conjuntamente durante o dia, todavia, em silêncio absoluto, mantendo-se enclausurado no período noturno. Mister destacar que este estágio é divido em classes, sendo que progressivamente o condenado é transferido para classes mais brandas até chegar a última etapa; c) liberdade condicional, onde o condenado obtinha uma liberdade restrita, devendo obedecer às obrigações impostas por período determinado. Se transcorresse o lapso temporal sem qualquer revogação da benesse, a pena seria extinta e o indivíduo obtinha a liberdade definitiva. (BITENCOURT, 2009, p. 138).
Outro inovador que implantou o Sistema Progressivo foi Walter Crofton [11], quando, após visitar alguns estabelecimentos penitenciários dos Estados Unidos, não concordou com as políticas aplicadas, tendo, em 1854, ao ser nomeado diretor de prisões da Irlanda, aplicado o sistema de progressão da pena, também denominado Sistema Progressivo Irlandês. (ANITUA, 2008, p. 233).
O sistema implantado por Crofton prevê que dependendo da quantia de trabalho realizado, bem como o comportamento do preso no cárcere, o transgressor progressivamente ultrapassa quatro etapas até findar sua pena, a saber: a) período inicial ou de prova, com prazo indeterminado, onde o apenado fica rotineiramente dentro da cela; b) reclusão celular noturno combinado com trabalho em conjunto no período diurno; c) trabalho em semiliberdade fora do estabelecimento penitenciário, e; d) liberdade condicional, que após o cumprimento de todas as obrigações impostas o indivíduo vê sua pena extinta. (FERNANDES, 2000, p. 47).
Ademais, cita-se também a figura de George Michael Obermayer, outro precursor deste sistema, que aplicou a modalidade em 1842 quando presidia um estabelecimento de Munique. (ANITUA, 2008, p. 233).
Ainda, destaca-se que com algumas peculiaridades este é o Sistema Penitenciário adotado pelo Brasil.
3.2 Evolução Histórica do Direito Penal Brasileiro
Os primórdios da legislação penal brasileira concernente a aplicação de penas, teve fortes influências das legislações alienígenas que atracaram no território nacional, mais especificamente do sistema português.
Os silvícolas, que há muito ocupavam todo o território brasileiro, nada contribuíram para o ordenamento jurídico penal, estando os portugueses, ao chegarem no solo nacional, em um estágio mais avançado no que tange a imposição de sanções. (SHECAIRA, 2002, p. 38).
Era corriqueiro dentro das tribos indígenas ser encontrado algo semelhante com a que praticada na lei do talião e da vingança do sangue, sendo predominantemente aplicada a pena de morte e as penas corporais. A prisão era utilizada somente como custódia, deixando o infrator a espera até ser executada a reprimenda imposta. (SHECAIRA, 2002, p. 38).
3.2.1 As Ordenações Afonsinas
À época da "descoberta" do Brasil os portugueses tinham seu ordenamento jurídico baseado nas Ordenações Afonsinas promulgadas em 1446, além de textos do Direito Romano, do Direito Canônico e do direito costumeiro. (DOTTI, 1998, p. 42).
Neste estágio, o Direito Penal raramente previa a privação de liberdade como meio efetivo de pena, e, quando a destacava como modo repressivo, impunha, por exemplo, a restrição da liberdade por uma noite aos que presenciassem jogos; por quinze dias para quem jogasse ou fizesse tavolagem; por três dias para quem violasse, pela segunda vez as leis sobre coisas de uso proibido; etc. (DOTTI, 1998, p. 42).
Ainda, em determinadas situações, o tipo penal não previa o lapso temporal que o indivíduo ficaria privado de sua liberdade, ficando à discricionariedade do rei estipular o tempo da detenção. (DOTTI, 1998, p. 42).
Ademais, era corriqueiro o digesto prever a pena de prisão com um caráter meramente preventivo, de modo a manter o acusado sob custódia até o julgamento e execução da reprimenda imposta, bem como utilizar a prisão como método de obrigar o autor a pagar a pena pecuniária devida. (DOTTI, 1998, p. 42).
Em que pese os portugueses utilizarem, à época em que atracaram no território brasileiro as Ordenações Afonsinas, ressalta-se que referida compilação legislativa não teve uma aplicação influente no sistema nacional, uma vez que até 1521 não havia se instalado no território brasileiro nenhum núcleo colonizador. (BIANCHINI, 2009, p. 143).
3.2.2 As Ordenações Manuelinas
No ano de 1505, D. Manuel I, ante o descontentamento com as ordenações Afonsinas, mandou alterar, suprimir ou acrescentar novos ideais à compilação, de modo que incumbiu a Rui Boto (desembargador do Paço e corregedor cível da corte) e Joaquim Cotrim, a nobre tarefa. (ZAFFARONI, 2006, p. 175).
Terminado o novo dispositivo, o rei, em virtude de sua insatisfação, mandou inutilizar o novo diploma legal, nomeando novas pessoas para elaborar um novo ordenamento. Delegou a função a pensadores ativos da sociedade, dentre os quais os desembargadores, Cristóvão Esteves, João Cotrim e João de Faria, tendo a versão definitiva das ordenações sido publicada em 1521, impressa por Jacobo Cromberger, o Alemão, com vigência até 1603. (ZAFFARONI, 2006, p. 175).
As Ordenações Manuelinas foram dividas em cinco livros. A matéria de Direito Penal e Processual Penal estavam especificadas no último deles, o qual mantinha o instituto da prisão, na grande parte dos casos, como "prisão-custódia", sendo menor utilizado a detenção por dívida. (GOMES, 2007, p. 154-155).
Apesar das ordenações Manuelinas estarem, em tese, vigorando à época das capitanias hereditárias, os donatários é quem detinham o poder punitivo, de modo que exerciam o direito cada qual com seu critério, o que tornou o sistema jurídico da época instável. (PRADO, 2010, p. 123).
3.2.3 As Leis Extravagantes: Compilação de D. Duarte Nunes Leão
Criada para vigorar ao lado das Ordenação Manuelinas, referida compilação, publicada em 1569, teve como premissa ordenar o digesto que à época regia em Portugal, divulgando várias leis, provisões, regimentos, estatutos, etc. (GOMES, 2007, p. 155).
D. Henrique, regente do reino [12], incumbiu à Duarte Nunes Leão executar a tarefa pretendida. Após algumas revisões, o ordenamento foi aprovado em 1569, mediante alvará legal. (GOMES, 2007, p. 155).
É de se destacar que o texto legislativo não alterou significativamente a legislação anterior, permanecendo o instituto da prisão como meio de assegurar o pagamento da dívida e como modo retributivo. Ademais, convém frisar que a matéria de execução penal continha muitas regras acerca do cumprimento da pena privativa de liberdade. (GOMES, 2007, p. 155).
3.2.4 As Ordenações Filipinas
Com a posse da coroa portuguesa à Filipe II da Espanha (que posteriormente, após sua consagração como rei de Portugal, foi intitulado como Filipe I) houve a determinação da reunião das legislações vigentes. A empreitado foi concluída em 1595, sendo promulgada uma lei no mesmo ano determinando sua observância, entretanto, por motivos que até hoje são inexplicáveis, a ordenação elaborada não foi aplicada. (ZAFFARONI, 2006, p. 177 – 178).
Com a morte do rei e a ascensão de seu herdeiro ao trono (Filipe II), houve uma nova revisão do ordenamento anteriormente elaborado por uma comissão designada, da qual faziam parte, Melchior do Amaral, Damião de Aguiar, Diogo da Fonseca, Jorge Cabedo e Henrique de Souza, sendo que, após sua conclusão, a ordenação foi promulgada e entrou definitivamente em vigor em 1603. (ZAFFARONI, 2006, p. 178).
Com o maior tempo de existência, as Ordenações Filipinas caracterizavam-se pela desproporcionalidade das penas aplicadas, de modo que ampliava e generalizava a criminalização, aplicando penas severas, com predominância da pena de morte. (PRADO, 2010, p. 124)
Outras espécies de penas eram previstas no digesto, dentre as quais, penas vis (açoite, corte de membro, galés); degredo; multa; discricionariedade do detentor do poder punitivo, que em determinados casos, aplicava à seu modo a sanção ao caso concreto, inexistindo princípio da legalidade. (PRADO, 2010, p.124).
Ainda, destaca-se que o crime neste período se confundia com o pecado e a ofensa moral, de modo que os hereges é quem sofriam uma maior perseguição, tendo a pena, neste período, o objetivo de castigar o ofensor e intimidar a população. (GOMES, 2007, p. 156).
Referida espécie de compilação legislativa vigorou no território nacional mesmo após a independência do país lusitano da Espanha, permanecendo com eficácia jurídica até a promulgação do Código Criminal do Império em 1830. (GOMES, 2007, p. 156).
3.2.5 Período Imperial e o Código Criminal de 1830
Com a Proclamação da Independência em 1823, o Imperador, através de Carta de Lei, outorgou, na data de 25 de março de 1824, a Constituição Brasileira que vigorou durante todo o Período Imperial. (PIERANGELI, 2004, p. 65-68).
Promulgada a nova Carta, com forte influencia liberal, houve uma enorme mudança no Direito Penal pátrio, mormente no que tange ao disposto no art. 179 do mencionado ordenamento, o qual estabelecia, dentre outros, o princípio da irretroatividade da lei penal; o princípio da individualização da pena; a abolição dos açoites, da tortura, da marca de ferro quente, e todas as penas cruéis; a higienização e segurança das cadeias públicas, dividindo os acusados pelo tipo de crime que haviam cometido, dentre outras medidas que foram indispensáveis para a imposição de uma pena mais humanizada. (PIERANGELI, 2004, p. 65-68).
É neste ideal iluminista que D. Pedro I clamava pela necessidade de se criar um dispositivo que versasse acerca da matéria penal. Assim, em maio de 1827, Bernardo Clemente de Vasconcellos e o Deputado Clemente Pereira, apresentaram projetos distintos de codificação penal, sendo o trabalho de Bernardo aprovado pela Comissão da Câmara como ponto de partida para elaboração do novo ordenamento, sem deixar de considerar o projeto do Deputado Clemente. (NORONHA, 2004, p. 56-57).
Após aditar o projeto com algumas emendas, a Comissão Mista aprovou-o em 20.10.1830, tendo D. Pedro I sancionado e criado, deste modo, o Código Criminal do Império Brasileiro. (DOTTI, 2010, p. 266-167).
Dentre as características que o novo dispositivo trouxe, pode-se citar a exclusão da pena de morte para crimes políticos; imprescritibilidade das penas; reparação do dano causado pelo delito, estabelecida pelo próprio juiz criminal; a caracterização de agravante entre o ajuste prévio de duas ou mais pessoas para a prática do crime; atenuante da menoridade; a imposição do sistema dias-multa na pena patrimonial. (FRAGOSO, 2003, p. 72-73).
Ainda, o codex previa onze tipos de penalidade diferentes, quais sejam: morte; galés; prisão com trabalho; prisão simples; banimento; degredo; desterro; multa; suspensão de emprego; perda de emprego e açoites. (DOTTI, 2010, p. 268).
Imperioso enaltecer as penas que privavam a liberdade do infrator. Com o objetivo de substituir a pena de morte, a prisão com trabalho obrigava os apenados a laborarem diariamente dentro do ergástulo público, podendo o exercente do poder punitivo cominar a modalidade em caráter perpétuo (o que dificilmente era aplicado), bem como impor pena não superior a vinte anos. (DOTTI, 2010, p. 268).
Já a prisão simples obrigava os indivíduos que infringiam a norma penal a permanecer nas prisões públicas pelo tempo da pena que era aplicada, cabendo frisar que o sistema criado não admitia a detração penal, de modo que a prisão processual era utilizada para impedir a fuga dos transgressores, não incidindo o tempo em que o apenado ficara recluso nesta modalidade como tempo de pena efetivamente cumprida. (DOTTI, 2010, 269).
É nesta senda que a pena privativa de liberdade ganhou grande enfoque com a promulgação do Código Penal Imperial, que substituía em grande escala as penas corporais, sendo os modelos de prisão criados utilizados largamente enquanto perdurou a Carta Imperial. (SHECAIRA, 2002, p. 41).
3.2.6 Período Republicano e o Código Penal de 1890
Para se entender os motivos que levaram à elaboração de um novo Código Penal, mister destacar a figura dos escravos no período imperial, mormente levando em consideração que foram eles as grandes vítimas do sistema implantado, vez que contra eles poderiam ser aplicadas penas de açoites e morte. (FRAGOSO, 2003, p. 73).
Com a abolição da escravatura no ano de 1888, o Código vigente sofreu consideráveis alterações em seu texto original, tendo Joaquim Nabuco (à época Deputado) proposto a revisão do ordenamento Criminal. Assim, João Vieira de Araújo (à época também Deputado), em 1889, criou um anteprojeto ao dispositivo vigente, encaminhando-o ao Ministro da Justiça. Criada a comissão para apreciar o feito, João Batista Pereira, o relator, emitiu parecer favorável à modificação total da matéria penal que à época era aplicada, ficando encarregado de elaborar um novo ordenamento. (FRAGOSO, 2003, p. 73).
Proclamada a República, o trabalho que vinha sendo realizado pelo Deputado Batista Pereira foi interrompido. Entretanto, Campos Sales (Ministro da Justiça do Governo Provisório) determinou que a tarefa que vinha sendo realizada pela Deputado continuasse. Foi assim que, após a análise de uma Comissão, o projeto foi aprovado, sendo, em 11.10.1890, através do Decreto 847, sido promulgado definitivamente. (NORONHA, 2004, p.59).
A nova lei aprovada extirpou a pena de morte, adotando como modalidades de pena: a) a prisão celular, que constituía o pilar de todo o sistema implantado, caracterizando-se pelo isolamento do apenado em um aposento penitenciário, obrigando-o a trabalhar (art. 45); b) reclusão, executada em fortalezas, praças de guerra ou em recintos militares (art. 47); c) prisão com trabalho obrigatório, que era imposta ao vadios e capoeiristas, os quais eram destinados a penitenciárias agrícolas ou presídios militares (art. 48); d) prisão disciplinar para os menores de 21 anos a serem executadas em estabelecimentos industriais especiais (art. 49); e) o banimento [13]; f) a interdição, a suspensão e perda de emprego público e; g) multa. (DOTTI, 2010, p. 271).
O artigo 53 do dispositivo trazia a preocupação da individualização da execução penal, de modo que os apenados deveriam, dentro do ergástulo público, obter labor adequado às suas habilidades ou ocupações anteriores. Ainda, era defeso a imposição de penas maiores de 30 anos. (DOTTI, 2010, p. 271).
Acredita-se que pelo fato do novo Código ter sido elaborado as pressas, o dispositivo não agradou completamente, tendo, ao longo de sua existência, sido modificado inúmeras vezes através de leis extravagantes. As críticas elaboradas ao ordenamento, bem como as diversas leis que foram editadas para sanar suas lacunas, fizeram com que, em 1932, fosse criada a Consolidação das Leis Penais, que entrou em vigor através do Decreto n° 22.213, sendo utilizada até o advento do Código Penal de 1940. (PIERANGELI, 2004, p. 76).
3.2.7 O Código Penal de 1940
Após algumas tentativas de criar um projeto para alteração do tão criticado Código de 1890, no ano de 1937, com o golpe de Estado, foi que o governo, através de Francisco Campos, Ministro da Justiça, encarregou à Alcântara Machado o dever de criar um novo projeto para a legislação penal. Com a redação provisória pronta devidamente revisada por Comissão especial [14], no ano de 1940, foi apresentado ao governo um projeto definitivo do novo dispositivo, sendo, em 7 de dezembro do mesmo ano, aprovado o trabalho realizado, entrando em vigor em 1 de janeiro de 1942. (FRAGOSO, 2003, p. 76).
Embora produzido na época em que o país passava por uma ditadura militar, o novo ordenamento modelou-se em um direito punitivo democrático e liberal. (FRAGOSO, 2003, p. 78).
Apresentou um sistema de punição calcado na pena de prisão, introduzindo duas modalidades, reclusão e detenção. Instituiu a pena de multa e algumas disposições acessórias como a publicação da sentença, a interdição temporária de direitos e a perda de função pública. (SHECAIRA, 2002, p. 44).
Estipulou a observância do princípio da reserva legal, excetuado os casos em que a medida de segurança era aplicada; o sistema de duplo binário, prevendo penas e medidas de segurança; no iter criminis previu que para ser configurada a tentativa deveria o agente ter iniciado a execução da ação típica; impôs o sistema progressivo de penas; positivou a suspensão condicional da pena e o livramento condicional. (FRAGOSO, 2003, p. 78-79).
Já na Parte Especial, dividia os delitos em 11 títulos diferentes, iniciando nos crimes contra a pessoa e findando nos crimes contra a Administração, sendo defeso ao exercente do Poder Punitivo impor pena superior a 30 anos. (FRAGOSO, 2003, p. 78-79).
No período de sua vigência, algumas normas foram criadas afim de complementar o que esposado pelo diploma, dentre as quais a Lei de Contravenções Penais; Código Penal Militar; Lei de Imprensa; Lei de Economia Popular; dentre outras que tinham como objetivo implementar o dispositivo em comento. (FRAGOSO, 2003, p. 79).
Algumas modificações podem, também, ser apontadas, dentre as quais, o Decreto n° 4.865, de 23.10.1942 (vedação da concessão da suspensão condicional da pena aos estrangeiros que se encontrassem temporariamente no país); Lei n° 5.467, de 05.07.1968 (reabilitação seria concedida a qualquer pena por sentença passada em julgado, transcorrido 05 anos do dia em que fosse extinta); Lei n° 6.416, de 24.05.1977 (inovou ao prever, dentre outras medidas, a exclusão da reincidência transcorridos 05 anos sem nova condenação, reajustamento dos valores de multas e o sursis foi estendido aos condenados à pena de até dois anos de reclusão). (GOMES, 2007, p.179).
A modificação com maior vultuosidade do dispositivo promulgado em 1940 foi a Reforma Penal de 1984.
Com ânsia de total reformulação do ordenamento penal, o governo federal nomeou, em 1980, uma comissão presidida por Francisco Assis Toledo, visando elaborar um anteprojeto da Parte Geral do Código Penal. (LEAL, 2004, p. 85).
Concluído o trabalho, e após os tramites necessários, o projeto veio a se transformar na Lei n° 7.209, de 11.07.1984, que alterou significativamente o disposto pela Parte Geral do Código de 1940. Dentre as medidas impostas pode-se numerar: arrependimento posterior como causa de diminuição de pena; reconhecimento do erro sobre a ilicitude do fato como causa de excludente da culpabilidade (art. 21, "caput", 2ª hipóteses); adoção das penas restritivas de direitos, como substitutas da privativa de liberdade aos crimes de menor monta (arts. 43 a 48); implantação do sistema dias-multa; extinção do sistema duplo binário no caso de medida de segurança aplicável ao inimputável por doença mental. (LEAL, 2004, p. 85-86).
Ainda, acerca da história do Direito Penal Brasileiro, cabe elucidar o projeto elaborado por Nelson Hungria, que chegou a ser tido como Código Penal através do Decreto-lei n° 1.004, de 21.10.1969. Referido diploma, todavia, não vigorou no território nacional, uma vez que foi revogado através da Lei n° 6.578 de 1978, constituindo o maior vacatio legis que se tem registro. (BITENCOURT, 2009, p. 49).
3.3 Sistema Penitenciário Brasileiro
A Legislação Penal atual declarou, através de seu art. 32 [15], três modalidades de penas que poderão ser aplicadas ao indivíduo que infringe o dispositivo, a saber: a) penas restritivas de direito; b) multas e; c) privativa de liberdade.
3.3.1 Das Penas Restritivas de Direito
As penas restritivas de direito surgem com o intuito de diminuir a aplicação da pena privativa de liberdade, restringindo certos direitos dos condenados. São classificadas como autônomas e substitutivas, isto porque são sempre aplicadas na sentença em substituição à pena privativa de liberdade, se cumpridos os requisitos legais. (LEAL, 2004, p. 439-441).
São cinco as penas restritivas de direitos que poderão ser adotadas: a) prestação pecuniária; b) perda de bens e valores; c) prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas; d) interdição temporária de direitos e; e) limitação de final de semana.
Nesta senda, o magistrado, após verificar o quantum de pena privativa de liberdade que será aplicada no caso concreto, substituirá, cumpridos os requisitos legais exigidos pelo art. 44 do Código Penal [16], a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. (LEAL, 2004, p. 441-442).
3.3.2 Da Pena de Multa
Tocante a pena de multa, pode ela ser classificada como uma prestação pecuniária imposta pelo exercente do poder punitivo em resposta ao ilícito penal, destinado ao fundo penitenciário. (NUCCI, 2008, p. 109).
Devidamente recepcionada pela Constituição Federal (art. 5°, XLVI, c [17]), a pena de multa deverá ser cominada no édito condenatório e calculada sob o sistema de dias-multa, limitando a aplicação de, no mínimo 10 (dez) e, no máximo, 360 (trezentos e sessenta) dias-multa, é o que dispõe o art. 49 do CP, in verbis:
Art. 49 – A pena de multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa. Será, no mínimo, de 10 (dez) e, no máximo, de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa.
§1° - O valor do dia-multa será fixado pelo juiz não podendo ser inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato, nem superior a 5 (cinco) vezes esse salário.
§2° - O valor da multa será atualizado, quando da execução, pelos índices de correção monetária. (BRASIL, 2010b).
Após passada em julgado a sentença penal condenatória, o apenado deverá adimplir a obrigação dentro do prazo de 10 dias, podendo o juízo da execução parcelar o valor e estipular que a cobrança seja feita através da folha de pagamento do infrator, vide art. 50 do Código Penal [17]. (FRANCO, 2007, p. 324).
Insta anotar que com a vigência de Lei n° 9.286/96 e a consequente modificação do art. 51, "caput", do CP, a pena de multa, que anteriormente admitia a conversão em pena privativa de liberdade acaso o apenado quedasse inerte acerca do pagamento devido, passou a ser considerara, após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, como divida de valor, sujeitando-se às normas reguladoras da Fazenda Pública (Lei n° 6.830/80). (PRADO, 2006, p. 621-622).
É mister, todavia, antes da remessa do feito à Fazenda Pública, que o apenado seja devidamente notificado para que, dentro do prazo de 10 dias efetue o pagamento, nos moldes dos arts. 168 [18] e 169 [19] da Lei n° 7.210/74. Acaso inerte permanecer, deverá o juízo competente remeter à Fazenda Pública a certidão da sentença condenatória transitada em julgado para os trâmites necessários. (PRADO, 2006, p. 622).
3.3.3 Das Penas Privativas de Liberdade
A pena privativa de liberdade que restringe a liberdade do agente infrator, foi, pelo legislador de 1984, divida em duas modalidades, a saber: reclusão e detenção.
Tocante às modalidades acima especificada, pode-se enumerar algumas distinções entre os dois institutos: a reclusão admite condenação nos regimes fechado, semiaberto ou aberto, ao passo que a detenção só admite a imposição dos regimes semiaberto ou aberto; nos moldes do art. 92, II do CP, a reclusão pode ter como efeito a incapacidade para o exercício do poder familiar, tutela ou curatela, nos crime dolosos, cometidos contra filho, tutelado ou curatelado; a reclusão, nos caso em que determinada medida de segurança comina a internação; já na detenção, é aplicado o tratamento ambulatorial (art. 97 do CP); a reclusão, por ser de natureza mais gravosa, é cumprida primeiramente, ex vi art. 69, "caput", do CP. (NUCCI, 2008, p.309).
Há que se salientar que as diferenças são mínimas, apontando a doutrina que os institutos não encontram uma distinção significativa.
(...) as áreas de significado dos conceitos de reclusão e detenção estão praticamente superpostas e não evidenciam nenhum critério ontológico de distinção. Aliás, para evidenciar a precariedade da classificação, basta que se observe o critério diferenciador de que se valeu o legislador, critério esse que não se firma nem na natureza ou gravidade dos bens jurídicos, que com tais penas se pretende preservar, nem ainda na quantidade punitiva maior o menor de outra. Tudo parece indicar, à primeira vista, que a pena de reclusão não se confunde com a de detenção, porque aquela pode ser cumprida em qualquer dos regimes penitenciários (fechado, semi-abero e aberto) e esta apenas nos regimes semi-aberto e aberto. No entanto, desde que as penas, reclusiva e detentiva, comportem uma forma regressiva de cumprimento, nada obsta que, em razão de seu demérito, o condenado à pena detentiva venha a ser obrigado, em princípio a cumpri-la em regime fechado. (FRANCO, 2007, p. 236).
É assim que o dispositivo vigente, através de seu art 33 [20], implantou duas modalidades de penas privativas de liberdade (reclusão e detenção), de modo que estipulou três regimes diferenciados de cumprimento de pena, o fechado, semiaberto ou aberto.
3.3.3.1 Do Regime Fechado
Consoante preconiza o art. 33, §1°, do Código Penal, considera-se regime fechado "a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média", devendo o magistrado impor o regime quando o apenado for reincidente, a pena cominada for superior a 08 (oito) anos, a infração cometida for classificada como hedionda, ou o magistrado entender (para os crimes em que a pena for igual ou inferior a 8 (oito) anos), sob a analise do art. 59 do CP, que a medida é recomendável. (MIRABETE, 2002, p. 255).
Uma vez estipulado o regime fechado, o transgressor deverá ser deslocado à Penitenciária, local destinado àqueles que cumprem pena nesta modalidade punitiva (art. 87 da Lei de Execução Penal [21]), de modo que, neste momento, será submetido a exame criminológico de classificação para fins de individualização da pena, tudo conforme estabelece o art. 34,"caput" do Código Penal [22]. (NUCCI, 2005, p. 354-356).
Concernente à penitenciária, extrai-se do disposto pela LEP, que o condenado será acolhido em uma cela individual a qual conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório. O art. 88 do mencionado disgesto enumera alguns requisitos básicos que a unidade penitenciária deverá observar: salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana e área mínima de 6 metros quadrados [23].
Outro ponto essencial tocante ao regime fechado, consiste no fato do apenado, durante o período matutino, exercer função laborativa de acordo com as suas aptidões e ocupações anteriores, respeitado, é claro, os limites da execução penal. No período noturno o recluso se encaminhará ao seu aposento penitenciário. (JESUS, 2005, p. 524).
Poderá, ainda, se cumpridos um sexto da pena e desde que realizados com as cautelas necessárias para evitar-se fugas, ser autorizado o trabalho extra muros em serviço ou obras públicas realizadas por órgãos da administração direta ou indireta, ou entidades privadas desde que com extrema vigilância, é o que prevê os artigos 36 [24] e 37 [25] da Lei n° 7.210/84.
Outra característica marcante que integra o regime em comento, reside no fato de haver uma limitação das atividades em comum com os demais reclusos, bem como existir intenso controle e vigilância sobre a pessoa do condenado. (MIRABETE, 2002, p. 254).
3.3.3.2 Do Regime Semiaberto
Introduzido pelo art. 33, §1°, "b", a execução da pena no regime semiaberto se da em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar e é imposta aos condenados não reincidentes cuja pena seja superior a 04 (quatro) anos e não exceda a 08 (oito), observados, é claro, o art. 59 do CP.
Acerca do colônia agrícola, industrial ou similar, depreende-se da norma vigente (art. 92 da LEP) que "o condenado poderá ser alojado em compartimento coletivo" devendo ser observada a salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana (vide art. 92 c;c art. 88, parágrafo único, "a", da LEP).
No que tange ao exame criminológico, estabelece o parágrafo único do art. 8 da LEP [26], que será facultado ao magistrado a designação do mesmo para fins de individualização da pena. Em que pese o art. 35 do CP impor a obrigatoriedade do exame, tem-se que os dois dispositivos entraram em vigor na mesma época, devendo ser preferido aquele que traz um maior beneficio ao apenado, qual seja, o ditado pela Lei de Execução Penal. (JESUS, 2005, p. 524-525).
Quando imposto este regime, o condenado ficará sujeito ao trabalho em comum durante o período matutino em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar. Será permitido ainda a frequência a cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou superior, bem como o trabalho externo (inclusive em entidades privadas), respeitadas as medidas de cautela em favor da disciplina e para evitar fuga. (BITENCOURT, 2009, p. 483).
Outra característica consiste na concessão das denominadas saídas temporárias, as quais permitem a saída extra muros do apenado, sem vigilância direta, para fins de visita à familiares, freqüência de cursos supletivos profissionalizantes, bem como de instrução do segundo grau ou superior, na comarca do Juízo de Execução e para participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social, tudo conforme dita o art. 122 da LEP [27].
Contudo, para a concessão da benesse, é necessário o adimplemento de alguns requisitos exigidos pelo art. 123 da LEP, a saber:
Art. 123 – A autorização será concedida por ato motivado do juiz da execução, ouvidos o Ministério Público e a administração penitenciária, e dependerá da satisfação dos seguintes requisitos:
I – comportamento adequado;
II – cumprimento mínimo de um sexto da pena, se o condenado for primário, e um quarto, se reincidente;
III – compatibilidade do beneficio com os objetivos da pena. (BRASIL, 2010c).
É de se ressaltar que a saída temporária será concedida por, no máximo, cinco vezes ao ano, por um período não superior a 07 dias, podendo ser revogada quando o apenado praticar fato definido como crime doloso, for punido por falta grave, desatender as condições impostas na autorização ou revelar baixo grau de aproveitamento do curso (art. 125 da Lei 7.210/84 [28]).
3.3.3.3 Do Regime Aberto
O regime aberto, consoante preconiza o art. 33, §1°, "c" [29] do Código Penal, consiste no encaminhamento do apenado à casa de albergado ou estabelecimento similar.
A Casa de Albergado deve situar-se no centro urbano e não oferecer qualquer empecilho acaso o apenado queira empreender fuga do local [30]. Cada região terá, ao menos, uma Casa de Albergado, que deverá conter aposentos para acomodação dos internos e local adequado para realização de cursos e palestras. (MARCÃO, 2008, p. 99-100).
Tocante a imposição do regime aberto, será ele aplicado quando o transgressor, não reincidente, é condenado à pena igual ou inferior a 4 (quatro) anos [31] (deve o exercente do poder punitivo analisar o disposto pelo art. 59 do Código Penal), bem como se concedida a progressão de regime.
É imprescindível nesta etapa, que o apenado mantenha senso de responsabilidade e autodisciplina, devendo, fora do estabelecimento prisional e sem vigilância, freqüentar curso ou exercer outra atividade autorizada e ser recolhido no período noturno e nos dias de folga. (FERNANDES, 2000, p. 331).
A Lei de Execuções Penais imprime ainda que somente poderão usufruir desta modalidade os apenados que estiverem trabalhando ou comprovar a necessidade de fazê-lo imediatamente, bem como apresentar, pelos seus antecedentes ou pelo resultado dos exames a que foi submetido, fundados indícios de que irá ajustar-se, com autodisciplina e senso de responsabilidade, ao novo regime (art. 114, I e II da LEP). (COSTA Jr., 2003, p. 135).
O magistrado poderá estipular condições especiais para o regime aberto, sem prejuízo daquelas obrigatórias disposta pela art. 115 da LEP [32], podendo, de ofício, ou a requerimento do Ministério Público, da autoridade administrativa ou do condenado, modificar as condições antes estabelecidas desde que as circunstâncias assim o recomendem (vide art. 116 da LEP [33]).
Ademais, destaca-se que o apenado estará sujeito, se descumpridas as condições impostas no regime aberto, a regressão de regime, se vier a praticar fato definido como crime doloso, frustrar os fins da execução ou, se podendo, não pagar a multa cumulativa aplicada, ex vi do art. 36, §2 do Código Penal.
3.4 Do Sistema Progressivo
Introduzido pela legislação vigente, o sistema progressivo de penas determina a mudança do regime o qual o apenado se encontra, se cumpridos os requisitos exigidos, para um regime menos gravoso. Cezar Roberto Bittencourt discorre sobre o tema:
Os regimes de cumprimento da pena direcionam-se para maior ou menor intensidade de restrição da liberdade do condenado, sempre produto de uma sentença penal condenatória, A sanção aplicada possibilita ao apenado progredir ou regredir nos regimes, ampliando ou diminuindo o seu status libertatis (...). A Reforma Penal adotou, com se constata, um sistema progressivo de cumprimento da pena, que possibilita ao próprio condenado, através de seu procedimento, da sua conduta carcerária, direcionar o ritmo de cumprimento de sua sentença, com mais ou menos rigor. Possibilita ao condenado ir conquistando paulatinamente a sua liberdade, ainda durante o cumprimento da pena, de tal maneira que a pena a ser cumprida não será sempre e necessariamente a pena aplicada. (BITENCOURT, 2009, p. 489).
O art. 33, §2°, do Código Penal, bem como o art. 112 da Lei 7.210/84, dispõem acerca das regras do sistema progressivo:
Art. 33, §2 – As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvados as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso (...). (BRASIL, 2010b).
Art. 112 – A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão.
§1 – A decisão será sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e do defensor.
§2 – Idêntico procedimento será adotado na concessão de livramento condicional, indulto e comutação de penas, respeitados os prazos previstos nas normas vigentes. (BRASIL, 2010c).
Ora, dos artigos acima colacionados, denota-se que para a concessão da benesse, deverá o apenado ter cumprido requisitos de ordem objetiva e subjetiva. O primeiro consiste no cumprimento de, no mínimo, um sexto da pena imposta, observado a detração prevista no art. 42 do Código Penal, ao passo que o requisito subjetivo abrange o mérito do apenado, de modo que é imprescindível sua boa conduta carcerária que será comprovada pelo diretor do estabelecimento prisional ou, se necessário, a realização de exame criminológico, que poderá ser requerido pelo juiz competente mediante decisão motivada. (MARCÃO, 2008, p. 116).
Tocante ao requisito objetivo, necessário grifar a hipótese dos condenados por crimes de natureza hedionda. Com advento da Lei 11.464/07 que alterou o art. 2°, §2° da Lei 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos), o legislador passou a permitir a concessão da progressão de regime, que anteriormente era vedada, se o apenado, primário, cumprir dois quintos da pena imposta e, se reincidente, cumprir três quintos da reprimenda, sem prejudicar, é claro, a análise do requisito subjetivo.
Ressalta-se, ainda, que o art. 112 da Lei de Execuções Penais ao utilizar o vocábulo "regime anterior", vedou a progressão de regime por salto, não podendo o apenado ser transferido do regime fechado para o aberto. (BITENCOURT, 2009, p. 489).
Noutro norte, a sentença ainda não transitada em julgado não gera óbice a análise do benefício pleiteado, consoante dispõe a súmula 710 do STF: "Não impede a progressão de regime de execução da pena, fixada em sentença não transitada em julgado, o fato de o réu se encontrar em prisão especial".
3.5 Dos Direitos dos Presos
Ao ser retirado da sociedade e encaminhado ao ergástulo público, o indivíduo que infringe o diploma legal conserva todos os direitos que não atingidos pela perda da liberdade, devendo as autoridades que mantém contato com o infrator respeitar sua integridade física e moral [34].
A aplicação do princípio constitucional da legalidade, como garantia executiva, implica assim o reconhecimento de que o preso não pode ser manipulado pela administração prisional, como se fosse um objeto; de que, não obstante a perda de sua liberdade, é ainda sujeito de direitos, mantendo por isso com a administração penitenciária relações jurídicas das quais emergem direitos e deveres; e de que a jurisdição deve fazer-se presente não apenas nos incidentes próprios da fase executória da pena, como também nos conflitos que possam eventualmente resultar da relação tensional preso-administração. (FRANCO, 2007, p. 262).
O art. 41 da LEP enumera em um rol exemplificativo acerca dos direitos dos presos:
Art. 41 – Constituem direitos dos presos:
I – Alimentação suficiente e vestuário;
II – Atribuição de trabalho e sua remuneração;
III – previdência social;
IV – constituição de pecúlio;
V – proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação;
VI – exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena;
VII – assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa;
VIII – proteção contra qualquer forma de sensacionalismo;
IX – entrevista pessoal e reservada com o advogado;
X – visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados;
XI – chamamento nominal;
XII – igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da individualização da pena;
XIII – Audiência especial com o diretor do estabelecimento;
XIV – representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito;
XV – contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometem a moral e os bons costumes;
XVI – atestado da pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da responsabilidade da autoridade judiciária competente.
Parágrafo único – Os direitos previstos nos incisos V, X e XV poderão ser suspensos ou restringidos mediante ato motivado do diretor do estabelecimento. (BRASIL, 2010c).
Os direitos previstos no artigo acima transcrito não oferece um rol taxativo, sendo ainda assegurados, dentre outros, direitos individuais e sociais arrolados por outros dispositivos, desde que a situação assim permita. (SCHMIDT, 2002, p. 267).
A inviolabilidade do sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas (art. 5°, XII, CF/88), a liberdade de associação para fins lícitos (art. 5°, XVII, CF/88), a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas (art. 5°, X, CF/88), o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada (art. 5°, XXXVI, CF/88), o direito a educação, saúde, trabalho, lazer, segurança, à previdência social, à proteção à maternidade e à infância e à assistência aos desamparados (art. 6°, da CF/88), são exemplos de direitos assegurados em favor do preso que não estão incluídos no rol do art. 41 da LEP e que deverão ser observados na execução penal. (SCHMIDT, 2002, p. 268-275).
É dever do Estado Democrático de Direito criar mecanismos para garantia dos direitos previstos aos indivíduos que tem sua liberdade quase que totalmente extirpada, excetuados, como já mencionado, os que abrangem a restrição da liberdade.
Ainda, concernente ao tema, mister destacar que, no que for compatível, serão aplicados tais direitos aos presos provisórios e aos submetidos à medida de segurança. (MARCÃO, 2008, p. 32).
3.6 Deficiências do Sistema Penitenciário
A Lei de Execuções Penais organiza todo sistema penitenciário, instituindo direitos e deveres aos apenados e aos órgãos vinculados ao sistema prisional. Seu escopo principal é proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado (ex vi do artigo 1° da Lei de Execuções Penais - LEP), respeitando, dentro do ergástulo público, a integridade física e moral dos internos. (BRASIL, 2010c).
Em que pese o objetivo proposto pelo legislador, sabe-se que as condições do sistema penitenciário brasileiro estão longe de alcançar o que imprime a Lei de Execução Penal (ressocialização do apenado). O que se vê, são presos vivendo em condições indignas para qualquer cidadão, abarrotados em celas minúsculas, sem a devida assistência, tornando a prisão, pode-se dizer, uma "faculdade para o crime".
Ademais, os direitos garantidos aos reclusos são quase que totalmente inobservados. Dentro do sistema penitenciário o interno vive rotineiramente situações que desrespeitam sua integridade física e moral, atitudes que infringem, inclusive, o que disposto pelo Princípio da Humanidade das penas.
Marcos Rolim elucida alguns pontos da realidade vivida pelos apenados:
Ao mesmo tempo, a descrição empírica da realidade vivida nas instituições prisionais do país poderia ser sintetizada a partir das seguintes características principais:
1) Inexistência de um processo de individualização das penas, condicionada, em larga medida, pela circunstância objetiva da superlotação das casas prisionais.
2) Ausência de procedimentos padronizados de administração prisional, tratamento dos presos e gerenciamento de crises.
3) Condições degradantes de carceragem em todo o país, destacadamente no que se refere à habitabilidade, higiene, alimentação e saúde.
4) Ociosidade geral dos encarcerados constrastada por projetos marginais e precários de educação e de trabalho não profissionalizante.
5) Inexistência de garantias mínimas e exposição sistemática dos condenados às mais variadas possibilidades de violência por parte dos demais presos e por parte de funcionários do sistema.
6) Omissões sistemáticas por parte do Poder Judiciário e do Ministério Público no enfrentamento da crise penitenciária e na montagem de estruturas efetivas de fiscalização.
7) Condições irrazoáveis e inseguras de trabalho para os próprios funcionários do sistema, em geral despreparados e mal pagos (...). (ROLIM, 2007, p. 78/79).
Complementa ainda:
8) Corrupção disseminada nos sistema a partir da verba de direitos, tráfico de drogas, introdução ilegal de vantagens e privilégios, desvio de alimentos e de outros recursos e co-produção e agenciamento do crime.
9) Regimes disciplinares rigorosos e ineficientes que agravam arbitrariamente a execução penal e promovem tensionamentos desnecessários nas instituições.
10) Inexistência de mecanismos de queixa e processamento de denúncias realizadas por internos e familiares.
11) Inexistência de mecanismos de fiscalização independentes e sistemáticos das instituições prisionais.
12) Inexistência de recursos elementares de segurança como, por exemplo, detectores de metais, na grande maioria das casas prisionais.
13) Tratamento inadequado e normalmente ilegal e abusivo na revista de familiares de apenados quando das visitas às instituições.
14) Inexistência de assessoria jurídica aos condenados e dificuldades extraordinárias para a obtenção de benefícios legais na execução agravadas pela inexistência ou precariedade da Defensoria Pública nos Estados.
15) Assistência médica e odontológica praticamente inexistentes ou oferecidas de forma rudimentar, precária e assistemática.
16) Elevado índice de morbidade nas prisões; indicadores elevados de contaminação por doenças sexualmente transmissíveis (HIV-AIDS) e de casos de tuberculose, entre inúmeras outras doenças. (ROLIM, 2007, p. 79).
Destarte, denota-se que há uma grave crise no sistema penitenciário no que tange, dentre outros, a vida nos estabelecimentos carcerários. Presencia-se a crescente massa da população carcerária, superlotando os estabelecimentos; a violência crescente entre os internos; as práticas de abusos, maus tratos e torturas; a ociosidade dos condenados; a inexistência de garantias mínimas; a humilhação que passam (uso de algemas, caminhar sob miras de armas, uniformizados) ante seus familiares quando se encaminham aos fóruns para realização de audiências; o desrespeito às legislações ordinárias vigentes e aos princípios de Direitos Humanos (ROLIM, 2007, p. 77).
Podem ser enumerados alguns fatos geradores para explicar as deficiências existentes no Sistema Penitenciário Brasileiro, tais quais:
a)O aumento da criminalidade e violência, o que, conseqüentemente gera um agravamento do problema;
b)A preferência pela imposição de penas privativas de liberdade;
c)A produção de um enorme sentimento de insegurança por parte dos populares, que, com ajuda da mídia sensacionalista, acabam por envolver preconceitos e emoções no que tange aos assuntos de segurança pública;
d)Discurso ultrapassado, de cunho político (decorrente do ponto anteriormente elencado), de imposição de leis conservadoras que abarcam uma noção de "tolerância zero" e que afasta os princípios humanísticos;
e)As soluções decorrentes deste pensamento, que, ao invés de reduzir os problemas já existentes, acabam por aumentar o número de encarcerados. (ROLIM, 2007, p. 78).
Dentre os problemas existentes, a superlotação carcerária ganha enorme enfoque na orla do direito penal e de toda a mídia do território nacional. Pode ela ser classificada como uma deficiência crônica que assola a vida nas prisões e que acaba por desencadear diversos outros problemas.
A capacidade real de uma prisão é difícil de ser objetivamente estimada e como resultado disso, é fácil de ser manipulada. Mas não resta dúvida que quase todos os estabelecimentos prisionais brasileiros estão superlotados. Como todos os administradores prisionais sabem, prisões superlotadas são extremamente perigosas: aumentam as tensões elevando a violência entre os presos, tentativas de fuga e ataques aos guardas. Não é surpresa que uma parcela significativa dos incidentes de rebeliões, greves de fome e outras formas de protestos nos estabelecimentos prisionais do país sejam diretamente atribuídos à superlotação. (FERNANDES, 2000, p. 163-164).
Para se ter idéia da problemática existente, conforme dados estatísticos do Departamento Penitenciário Federal (DEPEN) referente ao período de junho de 2009 (tabela abaixo colacionada), o indicador quantitativo tocante à população carcerária alcançava 409.287 (quatrocentos e nove mil e duzentos e oitenta e sete) internos, ao passo que a quantidade de vagas existentes em todo o território nacional representava 299.392 (duzentos e noventa e nove mil e trezentos e noventa e dois), ou seja, há um número significativamente maior de presos do que o número real de vagas existentes.
No Estado de Santa Catarina a situação é semelhante, segunda dados do DEPEN referente ao primeiro semestre do ano de 2009 (conforme extrai-se da planilha abaixo), das 7.417 (sete mil quatrocentos e dezessete) vagas fornecidas pelo Estado, existem 12.654 (doze mil seiscentos e cinquenta e quatro) presos. O déficit alcança lastimáveis 5.237 (cinco mil duzentos e trinta e sete) presos a mais no sistema.
Neste prisma, o então Juiz de Direito da Primeira Vara das Execuções Criminais e Corregedor dos Presídios de São Paulo, Cláudio do Prado Amaral, em decisão determinando a redução da população carcerária da unidade prisional CDP II de Pinheiros, ilustrou a realidade vivida pelo sistema penitenciário:
A situação na unidade prisional conhecida como CDP II de Pinheiros, sujeita a essa Corregedoria dos Presídios, é grave e exige medida urgente, a fim de assegurar: 1) a integridade física e moral dos detentos e; 2) o correto cumprimento da pena.
Conforme consta dos autos, a unidade prisional em referência possui capacidade para 512 presos. Por ocasião da última visita correcional, em 29.11.2007, contava com 1.599 presos, ou seja, mais de 03 vezes a sua capacidade.
É tranqüilo concluir que a situação é absurda e intolerável.
As celas inspecionadas na última visita correcional têm área bruta de 28,71 m² . Subtraídos os espaços ocupados pelas cinco fileiras de "camas" fixadas às paredes e a área do "banheiro", resta uma área útil (chão da cela) de 21,45 m². Nestas condições acomodam-se até 40 presos, alguns dormindo suspensos (sobre os demais presos), em tecidos presos às paredes de modo a imitar uma "rede" de descanso.
As fotografias consubstanciam-se em veementes elementos de convicção. Os presos dormem amontoados, em condições muito favoráveis à desenvolver e disseminar doenças, as mais variadas, como por exemplo, enfermidades ortopédicas, e doenças infecto-contagiosas, além de psiquiátricas por ausência de repouso. Nesse tema, à propósito, conforme consta da visita correcional realizada em 26.10.2007, a unidade prisional registrou epidemia de tuberculose em agosto.
Não se consegue imaginar como faz um preso quando precisa locomover-se durante o repouso noturno para ir ao "banheiro". (AMARAL, 2008, p. 327/343).
É mister, pois, diante da terrível situação que assola a realidade, criar alternativas às penas privativas de liberdade. Heleno Fragoso, apud Jorge Henrique Schaefer Martins discorre acerca do tema:
A tendência atual é no sentido de ampliar o catálogo das principais. Não só permitindo substituir a pena privativa de liberdade, para a exclusiva aplicação de multa, como também para a imposição de outras sanções não privativas ou meramente restritivas da liberdade. Essas penas têm a vantagem de manter o condenado na comunidade, realizando as atividades laborativas normais. Aparecem como substitutivos das penas curtas privativas de liberdade. (MARTINS, 1999, p. 36-37).
Dentre as penas que se podem aplicar em substituição à pena de prisão, pode-se destacar, atualmente, às restritivas de direitos e multa. Além das citadas, é necessária a criação de outras alternativas que visem desafogar o Sistema Penitenciário e sanar algumas de suas deficiências, dentre as quais, o monitoramento eletrônico de presos.