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Que é dano moral?

Fixação contemporânea do conceito em razão do fenômeno de sua banalização

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20/08/2010 às 15:27
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4. CONCLUSÃO

A questão do problema da responsabilidade civil, como assevera José Antônio Nogueira, citado por Carlos Roberto Gonçalves, é o "próprio problema do direito, visto que todo o direito assenta na idéia da ação, seguida da reação, de restabelecimento de uma harmonia quebrada" (GONÇALVES, 2009, p. 4).

Não obstante algumas correntes reacionárias e decisões que não bem definem o dano moral, é evidente a evolução que vem tendo a questão da reparabilidade dos danos morais no país, mormente em razão do aprimoramento da atividade social e o conseqüente aperfeiçoamento dos meios de reparação e repreensão (nesse sentido: REIS, 1998, 129).

Contudo, essa busca incessante pelo dinheiro torna as ações indenizatórias com pedido de dano moral realmente mal vistas, banais, um tanto pejorativas até, fazendo do ambiente judicial um campo para se perpetuar a "indústria do dano moral", onde qualquer fato que cause aborrecimento se torna um extremo e crônico problema para o requerente. Assim, se o Judiciário e o ordenamento jurídico prestigiar essa indenização por meros aborrecimentos e aflições, então banalizado está o instituto do dano moral.

Na tentativa de melhor solucionar as avenças, confia-se na tarefa do magistrado em interpretar cada caso concreto, mediante observância das peculiaridades envolvendo o fato e cautela (bom senso) em se aferir e quantificar o dano moral, não podendo olvidar, por certo, da utilização das máximas de experiência e do sentimento e exigências da sociedade.

Por fim, sabe-se que definir é sempre perigoso, uma tarefa um tanto difícil. É praticamente impossível buscar um conceito para algo do mundo e apontá-lo como infalível, supremo, livre de qualquer dúvida, e ainda mais no meio jurídico, onde para toda regra existe sua exceção. No entanto, jamais se pode desconsiderar o que ficou assentado como dano moral neste estudo, ou melhor, aquilo que de fato não representa dano moral, e nisso, com louvor, já segue boa parte dos Tribunais pátrios e a maioria doutrinária – embora ainda não se conte com legislação clara e específica acerca da problemática.


NOTAS

1. Mesmo assim, critica Pontes de Miranda que, "sobre o dano moral, nem a lei, nem a jurisprudência bastam: aquela, obscura; variável, essa." (MIRANDA, 2008, p. 276).

2. Vale conferir o que disciplina o art. 1º da Lei 12.190/2010: "Art. 1º. É concedida indenização por dano moral às pessoas com deficiência física decorrente do uso da talidomida, que consistirá no pagamento de valor único igual a R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), multiplicado pelo número dos pontos indicadores da natureza e do grau da dependência resultante da deformidade física".

3. Nesse caso, o entendimento de que o dano moral existe sem depender de prova do prejuízo se explica pelo fato da notoriedade do constrangimento ocasionado à parte pela simples negativação do seu nome em órgãos tais como o SPC e o SERASA. Dessa forma, fica evidenciado que o magistrado, em determinadas situações, deverá utilizar-se de regras (máximas) de experiência, tidas, muitas vezes, como instrumentos de equidade, aptos a realizar a "justiça" do caso concreto, como bem ressalta o professor de Direito Civil Gilberto Fachetti (2009, p. 91-93).

4. EMENTA: CIVIL. SERVIÇO BANCÁRIO. TEMPO DE ESPERA NA FILA DE BANCO. DANO MORAL. INOCORRÊNCIA. Cliente que persegue reparação moral por ter aguardado mais de uma hora em fila de banco para pagamento de contas. Fatos narrados que não passam de meros aborrecimentos normais da vida de relação sem agressão a qualquer direito subjetivo da personalidade do autor. Inocorrência de dano moral. Sentença que nesse sentido apontou, incensurável, recurso manifestamente improcedente a que se nega seguimento na forma do caput, do art. 557, do Código de Processo Civil (TJ/RJ / Apelação Cível nº 2008.001.64293 / Órgão Julgador: 10ª Câmara Cível / Relatora: Desembargadora Marília de Castro Neves Vieira / Data do julgamento: 16/12/2008) (destacou-se).

5. EMENTA: INDENIZAÇÃO - DANOS MORAIS - Travamento de porta giratória de agência bancária (detector de metais) que impediu o acesso (momentâneo) do autor - Fato que, por si só, não reúne o condão de caracterizar dano passível de indenização - Situação corriqueira e normal nos dias atuais - Ausência de prova do alegado excesso dos prepostos do réu, tampouco de situação vexatória perante o público local - Testemunhas que não presenciaram os fatos - Dano moral em casos tais que não é presumido - Desatendimento da regra expressa no artigo 333, 1, do CPC - Improcedência corretamente decretada - Sentença mantida - Recurso improvido (TJ/SP / Apelação Cível 990.10.067678-4 / Órgão Julgador: Oitava Câmara de Direito Privado / Relator: Desembargador Salles Rossi / Data do julgamento: 14/04/2010).


REFERÊNCIAS

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DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: Responsabilidade civil. 17. ed. aumentada e atualizada de acordo com o novo Código Civil (Lei n. 10.406, de 10-1-2002). São Paulo: Saraiva, 2003, vol. 7.

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GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Responsabilidade civil. 4. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009, vol. 4.

MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado. Campinas: Bookseller, 2008, t. LIII.

MONTENEGRO, Antonio Lindbergh C. Ressarcimento de danos – pessoais e materiais. 7. ed., ampliada e atualizada. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001.

REIS, Clayton. Dano moral. Rio de Janeiro: Forense, 1998.

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SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 4. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 103.

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 30. ed. rev. e atual. até a Emenda Constitucional nº 56, de 20.12.2007. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 105.

SILVESTRE, Gilberto Fachetti. Máximas de experiência e verdade processual: a construção da decisão justa para o caso concreto. In: ZAGANELLI, Margareth Vetis (coord.). Processo, verdade e justiça: estudos sobre a prova judicial. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 75-96.

STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial: doutrina e jurisprudência. 4. ed. rev., atualizada e ampl. 2. tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.

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ZANETI JÚNIOR, Hermes. Processo constitucional: o modelo constitucional do processo civil brasileiro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.

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Sobre o autor
Vitor Gonçalves Machado

Mestrando em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Pós-graduado em Ciências Penais pela Universidade Anhanguera/LFG. Pós-graduado em Direito do Estado pela Universidade Anhanguera/LFG. Bacharel em Direito pela UFES. Advogado do Banco do Estado do Espírito Santo. Lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4463439U4.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MACHADO, Vitor Gonçalves. Que é dano moral?: Fixação contemporânea do conceito em razão do fenômeno de sua banalização. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2606, 20 ago. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17234. Acesso em: 18 abr. 2024.

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