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Do Estado Liberal ao Estado brasileiro regulador: escatologia em movimento

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11/09/2010 às 14:15
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4. Mundo em Guerra: os limites do liberalismo

Embora não trace um panorama histórico específico, o que se apresenta mais útil ao presente estudo, tendendo mais para um ensaio bem-humorado acerca da economia política, a obra A Riqueza e a Pobreza das Nações, de David S. Landes nos oportuniza uma reflexão deveras pontual acerca do estado de espírito que a tergiversação dos ideais liberais nas mãos de alguns governantes e burgueses tresloucados foi capaz de provocar:

O século XX divide-se nitidamente em dois pontos: 1914 e 1945. A primeira data marcou o início da chamada Grande Guerra – um dos mais absurdos conflitos na história humana. Esses quatro anos de combates deixaram dez milhões de mortos e um número muito maior de mutilados e doentes mentais. Também tornaram uma Europa próspera e em franco progresso e deixaram-na prostrada. A tragédia reside na estupidez de reis, políticos e generais que desejaram e avaliaram erroneamente as proporções que o conflito iria assumir, e a simplória vaidade de pessoas que pensavam que a guerra era uma festa – um caleidoscópio de charmosos uniformes, coragem masculina, admiração feminina, desfiles de modas e a alegre despreocupação da juventude imortal.

[...] Comandantes obtusos calcularam com impecável lógica que venceria o exército que tivesse seus soldados de pé e atirando. Os generais obtiveram promoções, medalhas, e estátuas, usualmente equestres. Seus homens morreram na lama.

É fato que, para se sustentar dentro dos ideais liberais, uma nação deve ter um sistema de mercado forte, com circulação de bens e serviços de forma fluida. Entretanto, não deixa de ser importante a observação cautelosa da balança comercial, em especial se os detentores do poder econômico, a classe burguesa, puder maximizar seu lucro a partir dela. Já ficara provado, ainda no auge histórico do mercantilismo, que a existência de colônias submetidas a uma metrópole favorecia esta sobremaneira, na medida em que aquela era fonte de matérias-primas de custo próximo ao zero e mercado consumidor necessário, posto que dependia do comércio metropolitano pela força das leis, armadas e exércitos. Importar a baixo custo, industrializar e revender a preços exorbitantes configurava um dos pilares do sistema liberal.

Sem incorrer na logística do conflito, conhecida à saciedade, limitamo-nos a relembrar que a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) foi uma guerra de colônias, em que as principais potências da época brigaram pelo controle de terras sob submissão, além de exercitarem ódios antigos. O império austro-húngaro foi esfacelado, a Alemanha foi reduzida a escombros e sua população jogada à miséria pelo conjunto de tratados mais comumente conhecidos como Tratado de Versalhes. A Europa, berço do liberalismo, estava arrasada.

4.1. A ascensão e derrocada dos EUA no interstício das Grandes Guerras

Graças ao desfecho da Primeira Guerra Mundial, os Estados Unidos, força decisiva na vitória, se colocou no centro do capitalismo mundial. Os ideais liberais importados da técnica inglesa e aprimorados pelo espírito de lutas e conquistas da Revolução Francesa encontraram terreno fértil no solo norte-americano, que foi fundado já sob a égide de uma constituição formal. Com o advento de um mercado consumidor de todas as espécies de gêneros de produtos – a Europa destruída – a economia americana parecia absolutamente sólida e em ordem. A classe média e os ricos do país gozavam de um estilo de vida elevado, e o american way of life atingia seu patamar máximo.

Os motivos desta ascensão são vários, e vão desde os elementos de uma contínua política liberal empreendida pelas elites americanas até a virtual ausência de concorrência no âmbito do capitalismo mundial, passando pelo mercado consumidor europeu, que, como já se disse, estava carente de tudo após a Grande Guerra. Em 1929 assumiu a presidência dos Estados Unidos o liberal Herbert Hoover, que encontrou um país de aparência sólida, inabalável. Em um momento especulativo, isto é, em que se fomenta o ganho nas bolsas de valores com base em conjecturas e dados de projeção, os negócios realizados subiam vertiginosamente, e era cada vez maior o número de investidores querendo tomar parte nos lucros exorbitantes daí advindos. Acontece que a especulação elevou sobremaneira o valor real de propriedades e ações negociadas, gerando um estouro da bolha especulativa, uma crise de desconfiança que levou todos a quererem vender seus papéis. Pela lei da oferta e da procura, com papéis demais no mercado, retração do consumo e a consequente perda de riqueza por parte dos investidores, os bens representados pelos documentos negociados passaram a valer muito pouco ou nada.

Em 29 de outubro de 1929, a bolsa de Nova York, em decorrência do volume de ações disponíveis para venda, quebrou, ou seja, não teve em seu interior mais circulação de dinheiro por causa do valor insignificante que as ações atingiram. Era o início da Grande Depressão Americana, a qual levou boa parte da nação à miséria.

O governo Hoover preferiu crer na auto-regulamentação do mercado, o que agravou seriamente a situação. Seu sucessor, o democrata Franklin Delano Roosevelt, por outro lado, com base nas ideias de John Maynard Keynes, iniciou um programa efetivo de intervenção estatal na economia, que significou o marco histórico mais sensível da doutrina do Estado de bem-estar social (welfare state). Em 1935, graças às medidas adotadas, os Estados Unidos começaram a sair da crise econômica que por pouco não o aniquilou.

A hegemonia conquistada com a vitória em 1945, a qual significou não apenas uma demonstração superior de estratégia militar, mas de poderio bélico de destruição em massa, fez com que os Estados Unidos se tornassem o centro de progresso mundial durante o século XX.


5. O Estado de bem-estar social.

A escola keynesiana se baseia no princípio de que o ciclo econômico não é auto-regulador como pensavam os neoclássicos, os liberais de então, mas é determinado pelo que Keynes chamou de "espírito animal" dos empresários. Este fator, aliado à patente incapacidade do capitalismo de ocupar toda a mão-de-obra que se lhe apresenta são os mais importantes elementos de impulso que justificam a intervenção do Estado na economia.

Ao conjunto destas intervenções é que denominamos Estado de bem-estar social, doutrina econômica que perpassou a maior parte do século XX. Nesta orientação, o Estado é o agente regulamentador de toda vida e saúde social, política e econômica do país, em relação íntima com sindicatos e empresas privadas. Segundo Maílson da Nóbrega, podemos sintetizar os fins desta vertente da seguinte forma:

O Estado de bem-estar social cumpre essencialmente o objetivo de minimizar os efeitos negativos da pobreza, de amparar os que são temporariamente atingidos por infortúnios provocados por acidentes no trabalho e pelo desemprego, mas a ideia de que ele pode também redistribuir renda permeia o discurso político, particularmente o da esquerda. Os críticos admitem a existência de redes de proteção social, nos casos em que o crescimento da economia não seja suficiente para reduzir os níveis de pobreza, mas relutam em aceitar a ação direta do Estado para distribuir renda.

Esse é o primeiro grande problema do Estado de bem-estar social. A distribuição de renda por meio da tributação, geralmente onerosa, provoca descontentamento em massa no seio das classes tributadas. É bem verdade que, em alguns países europeus da década de 80 do século antecedente havia alíquotas marginais de até 90% sobre um determinado valor oriundo de um fato gerador, o que, sem dúvida, constituía um inequívoco desestímulo à produção. Contudo, nos parece que a taxação apenas serve de óbice ao lucro desmedido que certos setores produtivos almejam; deve certamente existir a observação à capacidade econômica de cada segmento tributado, outrossim.

Há alguns outros problemas que se encontram muito presentes na logística do bem-estar social. O custo da administração estatal é gigantesco (o que justifica, de certa forma, a elevada tributação), eis que, numa nação envelhecida, por exemplo, a repartição simples de renda entre os idosos que saem da faixa etária de dedicação ao trabalho produtivo gera efeitos devastadores na previdência estatal.

5.1. Críticas ao welfare state e fortalecimento do liberalismo

Afirma Norberto Bobbio, em sua obra Estado, Governo e Sociedade, que "a julgar pelo estado atual do debate, a crítica de esquerda teve por efeito não o início de uma mais profunda transformação do Estado, chamado depreciativamente de ‘assistencial’, num estado com maior conteúdo socialista, mas o despertar de nostalgias e esperanças neo-liberistas". Sabendo que o autor escreveu estas linhas em fins de 1985 e que o termo neo-liberistas, segundo o tradutor da obra, "refere-se ao universo do liberalismo econômico e basicamente à restauração do livre-cambismo", vemos que o Estado de bem-estar social foi duramente cristicado após perfazer seus propósitos, quais sejam, retirar o mundo da derrocada econômica das décadas de 30 e 40 do século XX e estabilizar o progresso das nações.

O neoliberalismo seguiu como cartilha econômica dos principais governos da direita internacional, embora o seu principal triunfo tenha vindo por meios indiretos, menos por seus próprios méritos do que pelas consequências do colapso das economias burocráticas na virada dos anos 1980 e 1990. Produzido numa época em que o retorno ao classicismo liberal era a política oficial e a ideologia dos principais governos ocidentais (Reagan nos EUA e Margaret Tatcher na Grã-Bretanha), o colapso da antiga URSS e seu bloco oriental pareceu confirmar a inviabilidade das economias com forte participação do Estado, em que os mecanismos de mercado não podem se expressar de forma livre e direta, sem as mediações postas pelas formas do planejamento econômico.

O que se viu então a partir daí foi a aceleração dos projetos privatistas e a financeirização da economia, num contexto de rápida transformação da tecnologia produtiva poupadora de mão de obra e geradora de altas taxas de desemprego, e de globalização acelerada dos mercados pela ação de gigantescas empresas transnacionais e de agentes financiadores institucionais e privados.

Nada obstava o retorno aos matizes mais clássicos do liberalismo, permeado pelo "espírito animal" a que Keynes se referia com relação aos capitalistas, mesmo que se tivesse de lidar com a – ainda – presente atuação do Estado na sociedade, da qual a maioria da população das democracias ao redor do mundo não estava disposta a abrir mão (e eliminaria do jogo político qualquer indivíduo que pretendesse fazê-lo). No entanto, mais uma vez, nos Estados Unidos, ocorreu o evento capaz de refrear o liberalismo.

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5.2. A crise econômica mundial

Em meados de 2008, em decorrência de mais uma crise especulativa de capital, oriunda, desta feita, da desvalorização das hipotecas imobiliárias da classe média e pobre superior, feitas às milhares nos Estados Unidos, por investidores atraídos por promessas de crédito fácil, ganho financeiro astronômico e possibilidade de ascensão social, a Bolsa de Nova York passou pela maior queda desde a quebra de 1929. Um estado de pânico se generalizou na nação, ao passo em que grandes especuladores e membros diretores de instituições financeiras voltaram seus olhos ao Estado, até aquele exato momento visto como um ente de crucial e necessário distanciamento, e solicitaram ajuda para recuperação.

O governo de George W. Bush, alimentado pela crença de que a injeção de mais de 100 bilhões de dólares do tesouro público na economia seria a chave para contornar a recessão, ainda que não este capital não fosse revertido, sob nenhuma forma, para recuperação dos pequenos investidores que perderam suas casas, mas revertido para as instituições financeiras responsáveis pelas atitudes especulativas que geraram os eventos de recessão de 2008, foi derrotado pelo democrata Barack Obama, que, juntamente com o primeiro-ministro inglês Gordon Brown, fundamentam planos de governo que repercutirão em escala global com base nos modelos keynesianos. O futuro nos dirá acerca de seus acertos ou insucessos.

A crise econômica atingiu o planeta e gerou a maior onda de desempregos da história humana. Só o colapso da bolha imobiliária deslocou 34 milhões de pessoas de seus postos de emprego. A recessão dela decorrente ajudou a gerar a incrível marca de 212 milhões de pessoas na Terra sem emprego, o que representa ociosidade de 6,6% da força produtiva global. Os dados são da Organização Internacional do Trabalho (OIT) em fins de 2009. seu diretor-geral, Joan Somavia, afirma que "assim como se tomaram decisões para salvar os bancos, necessitamos da mesma vontade para salvar e criar postos de trabalho e ajudar as pessoas".

5.3. Estado de bem-estar social no Brasil

No Brasil, o welfare state sofre distorções derivadas da ação de grupos e políticos comprometidos em clamar para si a gratidão e subserviência das camadas favorecidas pelas ações positivas do Estado. Entre nós, sob máscaras de auxílio real aos necessitados, é a classe média que se vê privilegiada. Exemplo dessa realidade é a proposta de destinação, pelo governo Lula, de 75% do orçamento federal de educação para as universidades federais, que não são ocupadas pelas classes pobres da nação.

Não há dúvida de que a melhor combinação de instrumentos de promoção social é aquela constituída de gastos eficientes em educação, redes de proteção social e ações para ampliar o potencial de crescimento da economia, particularmente a geração de incentivos corretos à inovação, ao investimento e, em geral, ao florescimento dos negócios sob uma economia orientada pelo mercado. Em sendo assim, cremos, nem mesmo os críticos do Estado de bem-estar social deixariam de apoiar as ações diretas do Estado focalizadas no combate à pobreza.


6. O Estado Regulador no Brasil

O Estado de bem-estar social, quando analisado em sua vertente de intervenção na economia, é comumente denominado de Estado Regulador. A ação regulatória do Estado pode ser considerada como um conjunto de técnicas administrativas de intervenção sobre a economia. Ao definir o conteúdo da regulação, a Administração pode escolher diferentes técnicas para gerar efeitos sobre a economia. Cada técnica tem uma lógica própria que está relacionada ao tipo de estrutura ou relação econômica a ser regulada e aos objetivos da regulação, considerando os efeitos almejados (política industrial, correção de falhas de mercado, estímulo ao desenvolvimento regional, à concorrência, etc.).

A regulamentação econômica no Brasil se dá através da proibição e punição de práticas anticoncorrenciais (Lei 8.884/94), que podem ser, dentre outras, formação de cartel, venda casada, dumping (venda de um produto importado por um preço mais baixo do que no país de origem sem que isso reflita menores custos), política de preços predatórios (determinada empresa mantém o preço de um bem abaixo do custo de produção por um período, até eliminar seu concorrente), discriminação de preços em mercados diferentes, exigência de exclusividade e fixação de preços de revenda.

Cita-se, ademais, a regulamentação do uso de serviços de caráter público. A partir do governo de Fernando Henrique Cardoso, a prestação de muitos serviços públicos, anteriormente responsabilidade de empresas estatais, passou para o setor público. Entre as privatizações de maior vulto, podemos elencar o setor de transportes, energia elétrica e telecomunicações, sendo que estes dois últimos foram inteiramente repassados à gestão do capital privado. Desse modo, exsurgiu a necessidade, oriunda da permanência da natureza pública de tais prestações, de um controle específico sobre os novéis responsáveis por sua implementação – são as agências reguladoras, órgão públicos destinados à fiscalização do cumprimento dos contratos de concessão, das metas acordadas e da qualidade do serviço prestado.

Entre as principais agências reguladoras no Brasil, podemos apontar a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), a Agência Nacional do Petróleo (ANP), a Agência Nacional da Saúde (ANS) e a Superintendência de Seguros Privados (Susep).

Esses são os exemplos mais evidentes da atividade regulatória estatal. No entanto, o espectro do Estado Regulador é bem mais amplo. Previstas do artigo 172 a 176 da Constituição Federal estão as normas constitucionais da atividade econômica, voltadas à regência da atividade financeira do Estado, o que se afigura, afinal, a nosso ver, a mais cogente forma de intervenção na economia.

Antes de adentramos na sistemática dos artigos amiúde referidos, é necessário esclarecer que a atividade regulatória brasileira não se restringe à direta intervenção na economia. Ao contrário, a regulação também reafirma princípios liberais, cumprindo e cristalizando, em primeiro lugar, a função que o liberalismo alocou para o Estado. Consubstanciados no artigo 170 da Carta Maior se encontram os princípios gerais da atividade econômica, que permeiam o modo pelo qual a economia é guiada no país.

A valorização do trabalho humano e da livre iniciativa (CF, art. 170, caput) assegura o labor do homem como valor constitucional supremo em relação aos demais valores integrantes da economia de mercado; por seu turno, a livre iniciativa é limitada pela dignidade da pessoa humana, posto que se encontram em mesma hierarquia (fundamentos da República, artigo 1º da CF), e, na possibilidade de colisão, deverão ser interpretados de modo a asseverar a prevalência da dignidade, pela defesa do consumidor (art. 170, V), pelo direito de propriedade (art. 5º, XXII) e pela igualdade de todos perante a lei (isonomia legal; art. 5º, caput).

A liberdade de exercício de atividade econômica (art. 170, § único) permite a todos o exercício de empresa cujo objeto não seja vedado por lei ou, por sua imposição, dependa de autorização do poder público para funcionamento. A existência digna e a justiça social (art. 170, caput) nos remetem para o fato de que a atividade estatal deverá atentar, sempre, pela primazia da dignidade da pessoa humana, muito embora as injustiças oriundas do regime capitalista por várias vezes opressor impeçam a eficácia destes princípios.

A soberania nacional econômica visa garantir a existência de um formato de capitalismo nacional autônomo, sem ingerências externas (art. 170, I); a defesa da propriedade privada (art. 170, II) limitada pela função social que a mesma deve exercer (art. 170, III) se encontram esculpidas no texto constitucional, ainda que sob fortes críticas liberais. A livre concorrência, já exposta, também tem proteção constitucional (art. 170, IV).

O consumidor e o meio-ambiente são fortemente defendidos na ordem econômica constitucional brasileira (art. 170, V e VI), uma vez que são considerados vulneráveis diante da sistemática capitalista, em especial no que se refere às relações de consumo em que figuram grandes corporações e usuários individuais e na prática do modo de produção linear, em que não se contempla a inerente finitude dos recursos naturais.

Num último bloco, temos a visão de redução das desigualdades regionais e sociais por meio da atividade econômica, com vistas ao desenvolvimento, a busca do pleno emprego (talvez a mais inócua exigência constitucional do contexto) e o tratamento diferenciado às empresas de pequeno porte (artigo 170, VII, VIII e IX).

O poder público interfere diretamente na economia através de regulamentação acerca da remessa de lucros (investimentos e reinvestimentos de capital estrangeiro; art. 172), da exploração direta de atividade econômica – empresas públicas e sociedades de economia mista –, se esta não comprometer a soberania brasileira e os interesses da sociedade (art. 173), da normatização de determinados elementos ligados à ação econômica, v.g., o horário de funcionamento de comércio local (art. 174), na exploração de serviços públicos, não limitados aos expostos acima, objeto de regulamentação acirrada do Estado (a estrutura cartorária é exemplo de serviço público remunerado e explorado pelo Estado). A exploração dos recursos minerais e da energia hidráulica também é garantida ao Estado, ressalvada, quanto aos primeiros, a preferência em favor de cooperativas de garimpeiros (art. 176).


7. Conclusões

Do mercantilismo ao liberalismo, perpassando o liberalismo industrial; do liberalismo ao Estado de bem-estar social; deste ao neoliberalismo, qualquer que seja a pluralidade de seus significados; da mescla entre Estado Regulador e tendências liberais para o futuro: temos a sorte de sermos testemunhas, em nosso tempo de vida, da escatologia que se segue à crise mundial de 2008. A história econômica é uma história de superações, de engenho humano aplicado ao progresso. Como não poderia ser diferente num contexto historicista, há a presença de setores que mascaram suas intenções sob o manto do bem comum.

Mas a marcha da humanidade prossegue. Estamos às voltas, no momento, com a virtual falência econômica do berço da cultura ocidental, a Grécia, e, pensamos, não poderia haver ímpeto mais simbólico para um momento de renovação do que este que se nos apresenta com tal episódio. A Europa se retrai sobre si mesma, os Estados Unidos vivem sob o comando de um democrata negro e o Brasil, nossa amada terra, se vê às vésperas da eleição mais plural (convergente em embates econômicos, sociais e políticos) em vinte anos de democracia.

Que o nosso momento de escatologia tenha um epílogo e estejamos aptos a vê-lo é a esperança destas conclusões.


Referências

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NÓBREGA, Maílson da. O futuro chegou: instituições e desenvolvimento no Brasil. São Paulo: Globo, 2005.

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Sobre o autor
Alberto Dias de Souza

Advogado. Especializando em Direito Constitucional pela Universidade Estadual Vale do Acaraú - UVA (CE); Membro do Grupo de Pesquisa em Moral, Direito e Política da mesma instituição.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Alberto Dias. Do Estado Liberal ao Estado brasileiro regulador: escatologia em movimento. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2628, 11 set. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17372. Acesso em: 18 abr. 2024.

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