Resumo:
Este trabalho tem a finalidade de convidar o leitor a participar da discussão de temas relacionados com tributos municipais, principalmente das inovações trazidas pela Lei Complementar 116/2003, que buscou pacificar os conflitos trazidos pelo Decreto Lei 406/68, principalmente no que tange à incidência do ISS na prestação de serviço, com particular destaque para o local da prestação.
Palavras – chave: Direito– lei - tributo – fato gerador – obrigação principal – incidência.
A incidência do ISS na cessão de andaimes.
A Lei Complementar 116 de 2003, que deveria por fim aos muitos conflitos por décadas cultivados no viger do Decreto Lei 406/68, ao contrário do que se esperava, continua alimentando a imaginação de muitos juristas, principalmente daqueles para os quais não há lei que não comporte interpretações diversas, diferentes.
E é isso que alimenta o mundo jurídico. É a possibilidade de interpretação diferente que faz com que os operadores do direito montem seus projetos, criem suas teorias e definam as estratégias para essas defesas.
Por um lado, isso é bom. Desde a necessidade na preocupação do legislador originário, que tenta ser o mais racional possível para minimizar esses conflitos, até os julgadores que, pelo menos em tese, precisam afunilar suas decisões para um campo mais claro, indiscutível e irrecorrível. É o que fazem, por exemplo, hoje, quando tentam reduzir as possibilidades de recursos no CPC, que ora passam de cinquenta.
Por outro lado, engessar a justiça a uma lista taxativa de decisões prontas pode significar a injustiça, características de regimes totalitários, onde uns poucos falam e os demais obedecem. A necessidade do questionamento pode aproximar a decisão da verdade, da justiça em si.
No que tange ao ISS, infelizmente, por ser receita do mais despreparado ente da nossa federação, a incerteza do que seja certo sempre resulta na perda de receita para o poder público e no enriquecimento sem causa de tantos inescrupulosos que, aproveitando-se da insegurança, do despreparo e do pouco caso dado pelo administrador municipal com as suas riquezas, usam desse expediente para acumular fortuna, às custas da miséria de tantos outros.
Em certos casos, a vaidade dessa gente é tamanha que eles mesmos esquecem-se de que apenas se aproveitam das facilidades encontradas no município para acreditarem, eles mesmos, na veracidade da mercadoria que vendem (informação falsa e distorcida).
Cessão de andaimes, palcos, coberturas e outras estruturas de uso temporário.
Feitas essas considerações preliminares passamos agora à discussão de assunto muito recorrente, que é o subitem 3.05 da lista de serviço, anexa à Lei Complementar 116 de 31 de julho de 2003.
Num passado ainda recente, grande parte das discussões a respeito do ISS circundava no entorno da lista de serviço, que uns diziam entendê-la apenas exemplificativa, enquanto outros a consideravam absolutamente taxativa, o que queria dizer que só os serviços dela constantes eram fato gerador do ISS. Claro que aqui, também, ninguém acreditava mesmo no que dizia, salvo aqueles papagaios de pirata que sempre estão olhando para onde a câmera aponta, sem saber o real motivo da reportagem.
Os juristas sempre diziam o que lhes interessava no momento, aquilo que era melhor para o seu cliente, e era em cima dessas teorias que fundamentavam suas teses e as levavam muitas vezes aos tribunais superiores. Para cada decisão desses tribunais, montanhas de dinheiro e mais insegurança jurídica para todos os lados.
Hoje, diferentemente do que acontecia àquele tempo, o que estão querendo fazer parecer verdade é que a lista, que já é taxativa, traz agora um outro aleijão: possui serviço que nem é fato gerador do ISS. É o que acontece com a cessão de andaimes, palcos, coberturas e outras estruturas de uso temporário.
Os mais despreparados, em geral oportunistas, continuam com o discurso ultrapassado da "locação de bens móveis". Grande parte desculpada por não ter formação jurídica, o que minimiza a ignorância e por isso mesmo não sabe que a lei nunca usa expressões diversas, diferentes para dizer uma mesma coisa. Entretanto, é sabido que muita gente, como já dissemos, tira proveito financeiro da ignorância dos seus contratantes. Se a lei quisesse dizer locação nunca teria dito cessão. Então, de logo, se pode afirmar que o subitem 3.05 da lista não se refere a locação de bens. Nem móveis e nem imóveis.
A "locação de bens móveis" prevista originalmente no projeto de lei ("3.01 – Locação de bens móveis.") que resultou na LC 116/2003, foi vetado pelo Presidente da República que trouxe como razão do veto decisão do STF, que concluíra julgamento de recurso extraordinário interposto por empresa de locação de guindastes:
"3.01 – Locação de bens móveis.
"Razões do veto
"Verifica-se que alguns itens da relação de serviços sujeitos à incidência do imposto merecem reparo, tendo em vista decisões recentes do Supremo Tribunal Federal. São eles:
O STF concluiu julgamento de recurso extraordinário interposto por empresa de locação de guindastes, em que se discutia a constitucionalidade da cobrança do ISS sobre a locação de bens móveis, decidindo que a expressão "locação de bens móveis" constante do item 79 da lista de serviços a que se refere o Decreto-Lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968, com a redação da Lei Complementar nº 56, de 15 de dezembro de 1987, é inconstitucional (noticiado no Informativo do STF nº 207). O Recurso Extraordinário 116.121/SP, votado unanimemente pelo Tribunal Pleno, em 11 de outubro de 2000, contém linha interpretativa no mesmo sentido, pois a "terminologia constitucional do imposto sobre serviços revela o objeto da tributação. Conflita com a Lei Maior dispositivo que imponha o tributo a contrato de locação de bem móvel. Em direito, os institutos, as expressões e os vocábulos têm sentido próprios, descabendo confundir a locação de serviços com a de móveis, práticas diversas regidas pelo Código Civil, cujas definições são de observância inafastável." Em assim sendo, o item 3.01 da Lista de serviços anexa ao projeto de lei complementar ora analisado, fica prejudicado, pois veicula indevida (porque inconstitucional) incidência do imposto sob locação de bens móveis."
Talvez até sejam oportunas aqui, algumas indagações:
- O que tem a ver "locação de guindaste" com "cessão de andaime", por exemplo?;
- Por que o Presidente da República vetaria "locação de guindaste" e não vetaria cessão de andaime, se as entendesse serem a mesma coisa? Não seria por serem coisas diferentes, distintas?
- Será que o Presidente da República não exerceu o seu direito de voto baseado em parecer de renomados juristas, que o assessoram?
- Se os vetos foram propostos e fundamentados pelo Ministério da Justiça, isso não nos traz a segurança de que opinaram esses renomados juristas a que nos referimos?
A resposta a essas perguntas já nos dá a diretriz de que aqueles que querem associar "locação de bens móveis" a "cessão de andaimes, palcos, coberturas e outras estruturas de uso temporário" não conseguiram entender o significado e o espírito da lei ou se fazem de legados. Que lógica teria no veto do Presidente que excluiu especificamente o subitem que se referia a "locação de bens móveis" e deixou o subitem 3.05 significando a mesma coisa? Sem dúvida que isso não existiu. Cessão de andaime não é locação de bem móvel e, se não fosse tributável pelo ISS, não estaria na lista.
Depois de tanta indagação quanto ao entendimento equivocado de algumas pessoas, que continuam buscando argumentação falsa para fugir à tributação do ISS, pensamos em encontrar um método mais didático para discutir o assunto.
Vamos tomar como modelo a cessão de andaime, que entendida se estenderá para o resto da lista do 3.05.
Dividamos a discussão em duas partes:
Primeiro momento:
Um Contribuinte cede andaime para outro. Vamos entender cessão como sendo o ato de transferir a posse de bem móvel, que não seja pela venda, porque isso implicaria no fato gerador do ICMS, o que, no momento, foge dos limites da nossa análise.
A cessão de andaime é fato gerador do ISS porque está na lista taxativa. (vale relembrar que não mais se discute se a lista é taxativa ou não, porque isso ficou pacificado com a LC 116/2003). Entretanto, também não dá para se aceitar que algum item constante dela não seja tributado pelo ISS.
Desse modo podemos garantir que o Contribuinte que cedeu os andaimes é sujeito passivo da obrigação tributária principal, que é o pagamento do ISS incidente na operação.
Encerramos aqui a primeira parte.
Segundo momento:
Imaginemos, agora, algumas possibilidades com relação à empresa que recebeu os andaimes, por cessão.
Ela pode ficar com os andaimes na sua sede pelo tempo contratado e não fazer nada com eles. Isso não é fato gerador do ISS. Vencido o prazo do contrato, os andaimes serão devolvidos ao verdadeiro dono que os receberá e devolverá ao seu estoque, para operação futura.
Mas, numa outra possibilidade, o tomador dos andaimes, por cessão, é contratado por um terceiro para instalar esses andaimes num lugar qualquer, para um serviço qualquer.
Nessa última hipótese, a empresa que havia tomado os andaimes, por cessão, vai realizar uma outra atividade tributada pelo ISS, que é a montagem de andaime, e cujo tributo, por força expressa da lei passa a ser devido no local da instalação. É outro fato gerador do ISS que não guarda qualquer relação com o da cessão. O que a lei está dizendo é que a instalação de andaime é uma prestação de serviço, como outra qualquer. E neste caso, também tributada pelo ISS. A única diferença é que na cessão o imposto é devido no local do estabelecimento do Cedente, conforme caput do artigo terceiro, primeira parte: "Art. 3º O serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador (...)". Já no segundo caso o ISS é devido no local da prestação, conforme caput do artigo terceiro, parte final, II:
"O serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador (...), exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXII, quando o imposto será devido no local:
I – ..............................................................................................................;
II – da instalação dos andaimes, palcos, coberturas e outras estruturas, no caso dos serviços descritos no subitem 3.05 da lista anexa;"
É só isso. O que ocorreu, como no nosso exemplo, foi a ocorrência de dois fatos geradores do ISS: a cessão e a instalação. Esta última poderia até não ter acontecido, caso o tomador não fosse instalá-los em lugar nenhum, como na hipótese de querer esses andaimes para seu próprio uso, numa ação que não fosse tributada, como por exemplo, enfeitar a sala da diretoria com aquela estrutura metálica e moderna.
O ISS é devido no local da instalação porque aí há uma outra prestação de serviço. Não significa, em hipótese nenhuma, que a cessão do andaime não seja também tributada (ou não constaria da lista), já que locação de bem móvel não é fato gerador do ISS por conta do veto do Presidente da República.
Da especificidade do serviço de instalação.
O serviço de instalação de andaimes é tão especial, que a Associação Brasileira de Normas Técnicas editou a norma NBR 6494, de agosto de 1990, estabelecendo procedimentos a serem rigorosamente seguidos, além da obrigatoriedade de utilização de pessoal especializado, tudo isso para garantir a segurança das pessoas que irão instalar, trabalhar, utilizar ou mesmo se movimentar nas imediações dos locais objeto da instalação. E essa preocupação não surgiu só em 1990. A NBR 6494 veio substituir a NB – 56 de 1972. Os outros serviços previstos no subitem 3.05 (... palcos, coberturas e outras estruturas de uso temporário"), são igualmente particulares e especialíssimos, razão talvez da sua aglutinação num mesmo grupo. Imaginar que eles constam da lista como enfeite, que não estão sujeitos a tributação é um entendimento, primário, rudimentar.
É por tudo isso que é outra prestação de serviço e, por consequência, outro fato gerador do mesmo tributo. Não é que a instalação seja tributada e a cessão não. São ambas tributadas por serem distintas. A tributação da segunda não significa isenção para a primeira até porque isenção só existe por lei específica nos termos do artigo 176 do Código Tributário Nacional.
Por fim, isso nos parece uma coisa muito simples e muito clara, mas, vez por outra, alguém levanta essa discussão que, pelo que imagino, ou é entendimento de quem não tem formação jurídica e fala sem saber ao certo do que fala, ou de quem tem interesse particular em suscitar as velhas polêmicas do caduco Decreto LEI 406/68.