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Questões polêmicas na aplicação do regime especial dos precatórios judiciais

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6.A Retenção dos Fundos de Participação dos Estados e dos Municípios.

Até então, debateu-se as polêmicas ensejadas pela Resolução CNJ nº 115, de 2010.

A partir daqui se falará das controvérsias vindas da própria Emenda 62.

É da União a competência para arrecadar o Imposto de Renda (IR) e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Desse agregado, 21,5% são entregues aos Estados e Distrito Federal; 22,5% vão para os Municípios. Nesse arranjo comparecem os fundos de participação daqueles entes federados – FPE e FPM (art. 159, I, "a" e "b" da CF).

Pois bem, a nova redação constitucional determina que o governo faltoso, entre outras punições, sofra retenção em sua quota junto ao Fundo de Participação (§ 10, V do art. 97 do ADCT).

De outra parte, assim prescreve a Carta Política, na seção alusiva à repartição de receitas tributárias:

"Art. 160 - É vedada a retenção ou qualquer restrição à entrega e ao emprego de recursos atribuídos, nesta seção, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, neles compreendidos adicionais e acréscimos relativos a impostos".

Parágrafo único – A vedação prevista neste artigo não impede a União e os Estados de condicionarem a entrega de recursos:

I – ao pagamento de seus créditos, inclusive de suas autarquias;

II- ao cumprimento do disposto no art. 198, § 2º, incisos II e III.".

Nesse contexto, não é possível, em regra, limitar o repasse constitucional de impostos, disso excepcionados a quitação de débitos junto ao ente repassador (ex: confissão de dívida junto ao INSS) e a vinculação para a despesa mínima na Saúde.

Essas duas exceções garantem outras despesas públicas, que não as voltadas à satisfação de credores judiciais. Vai daí que a retenção do FPE/FPM está em desacordo com outra norma constitucional. Em suma, aqui a Constituição contraria a si própria.


7.O conflito com a Lei de Responsabilidade Fiscal

Sob a nova redação constitucional, poderá a União assumir precatórios dos Estados, Distrito Federal e Municípios (§ 16 do art. 100).

Enquanto isso, o art. 35 da Lei Complementar nº 101, de 2000, enuncia uma das pilastras de responsabilidade fiscal: a proibição de o Governo Federal encampar dívida de Estados e Municípios, vez que isso, no passado, era uma das grandes causas do desajuste fiscal:

"Art. 35 – É vedada a realização de operação de crédito entre um ente da Federação, diretamente ou por intermédio de fundo, autarquia ou empresa dependente, e outro, inclusive suas entidades da administração indireta, ainda que sob a forma de novação, refinanciamento ou postergação de dívida contraída anteriormente".

Como se isso não bastasse, é crime de responsabilidade contra o orçamento "ordenar ou autorizar, em desacordo com a lei, a realização de operação de crédito com qualquer um dos demais entes da Federação, inclusive suas entidades da administração indireta, ainda que na forma de novação, refinanciamento ou postergação de dívida contraída anteriormente" (art. 3º da Lei de Crimes Fiscais, de 2000, inserido no item 9, art. 10 da Lei nº 1.079, de 1950).

Disso decorrente, a assunção, pelo Governo Federal, da dívida judicial de outros entes estatais é comando que afronta norma basilar da Lei de Responsabilidade Fiscal.


8.O requisitório de baixa monta

Desde que, até 10 de junho de 2010, não tenha Estado ou Município promulgado lei sobre quanto é, localmente, a baixa monta, passa a valer o piso geral, dito no art. 97, § 12 do ADCT (40 salários mínimos para os Estados; 30 salários mínimos para os Municípios).

Conforme a Lei nº. 10.259, de 2001 (art. 17), as pendências de baixo vulto dispensam formalização do precatório, devendo, sob pena de seqüestro, estarem quitadas em 60 (sessenta) dias.

Para todos os efeitos, esse "precatório informal", de pequeno valor, advém de expressa determinação judicial; é gasto sempre empenhado contra o elemento "Sentenças Judiciais", o mesmo que ampara todos os demais precatórios, formais.

Malgrado alguns entenderem que sobredita lei federal não se aplica a Estados e Municípios, os juízes de execução têm-na usado com freqüente habitualidade (vide, por exemplo, Portaria GP nº. 42/2004 do TRT – 2ª. Região e Portaria GP-CR nº. 33/2002 do TRT – 15ª. Região).

Confirma essa dicção a Resolução 122/2010 do Conselho de Justiça Federal: "No caso de créditos de pequeno valor de responsabilidade da Fazenda estadual, da distrital, da municipal e de suas autarquias e fundações, ........., as requisições serão encaminhadas pelo juízo da execução ao próprio devedor, fixando-se o prazo de 60 dias para o respectivo depósito diretamente na vara de origem, respeitados os limites previstos nos incisos II e III deste artigo" (art. 2º, § 2º, grifamos).

Todavia, o Sistema de Gestão de Precatórios do CNJ não se aplica às obrigações de pequeno valor (art. 1º, § 5º da Resolução 115), donde se depreende que os pagamentos de baixa monta serão feitos pelo próprio ente devedor, não onerando os depósitos realizados nas contas especiais do Judiciário.

Em suma, as obrigações de pequeno valor escapam do regime especial da Emenda 62.


9.A contabilização dos depósitos

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Entendem alguns que os depósitos nas contas especiais só devem ser empenhados quando o Tribunal de Justiça paga o credor; nesse ínterim, permanece o valor no balanço do ente devedor; como disponibilidade de caixa.

Diferente, pensamos que o ente da Federação deva empenhar, de pronto, contra as dotações de Sentenças Judiciárias, havendo, em seguida, a baixa da dívida, quer em Restos a Pagar, quer no passivo de longo prazo. Depois que a Justiça informa o credor beneficiado, seu nome é afastado do Passivo Compensando e, via de conseqüência, há de haver a correspondente baixa no Ativo Compensado.

Deve ser assim, posto que:

a)Os recursos financeiros já não mais existem no ente estatal.

b)De acordo com o art. 97, § 5º do ADCT, não mais retornam às entidades devedoras os valores depositados nas contas especiais da Justiça.

c)Segundo a norma básica da matéria, o art. 100, § 5º da CF, há de haver, de plano, comprometimento orçamentário antes do efetivo pagamento e, não somente financeiro.

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Sobre o autor
Flavio Corrêa de Toledo Junior

Professor de orçamento público e responsabilidade fiscal. Autor de livros e artigos técnicos. Ex-Assessor Técnico do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TOLEDO JUNIOR, Flavio Corrêa. Questões polêmicas na aplicação do regime especial dos precatórios judiciais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2718, 10 dez. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18009. Acesso em: 28 mar. 2024.

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