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A extensão da imunidade recíproca às empresas estatais

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3. Conclusão

Segundo a teoria do contrato social, a soberania financeira, que é do povo, resta transferida ao Estado, no que o ente político recebe o poder de tributar e agir conforme os compromissos assumidos na Constituição. Assim, como o Estado é reconhecido como provedor das necessidades públicas, resultará a necessidade dele obter recursos para se desincumbir das suas obrigações.

No Estado Democrático de Direito, o ente público se torna compromissário do dever de proteger e promover os direitos fundamentais. Assim, é possível afirmar que nesse modelo político, são os direitos fundamentais que autorizam o poder de tributar o Estado, ao mesmo tempo em que o limita sob pena de ofensa ao mínimo existencial dos indivíduos.

A imunidade recíproca é uma das chamadas limitações ao poder de tributar, derivando de dois fundamentos imediatos: a) do vínculo fundado na isonomia entre os entes políticos que compõem o Estado, b) como forma de não vulnerar o sistema de repartição e compartilhamento de competências para a prestação de serviços públicos, os quais são custeados decisivamente pela percepção de valores decorrentes da instituição de impostos.

Com o intento de resguardar a boa prestação do serviço público por intermédio das instrumentalidades administrativas dos entes federados (administração indireta), a Constituição da República estendeu a garantia de imunidade recíproca às autarquias e fundações públicas.

Todavia, a escolha da espécie ente público da administração indireta que irá se desincumbir do ônus estatal de prestar determinado serviço público reside puramente na discricionariedade combinada entre o Chefe do Poder Executivo e o Poder Legislativo no processo legislativo deflagrado com lastro no artigo 61, §1º, II, "b", da Constituição Federal. Significa dizer que a prestação de determinado serviço público desempenhado por uma autarquia ou uma fundação também poderá ser feita mediante empresas estatais, pois não há espécie de serviço público imanente a um tipo ou outro de entidade pública.

A distinção não pode ser tão resumida, contudo. É que existem serviços públicos que podem ser explorados pela iniciativa privada por sua conta e risco e com um viés empresarial, sem que haja a sua descaracterização como serviço público.

Nesta linha, por meio de interpretação sistemática e teleológica, o Supremo Tribunal Federal passou a estender a imunidade recíproca concedida às autarquias e fundações pública às empresas estatais prestadoras de atividade submetida ao regime de monopólio estatal.

Atualmente, no entanto, a questão vem evoluindo e se encontra novamente em discussão na Suprema Corte, no que é possível afirmar a formação de uma nova corrente jurisprudencial que, a par da atuação em monopólio, exige que a empresa estatal a ser beneficiada não possua intuito lucrativo, sob pena de desequilibrar os mercados.


4. Referências

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2005.

COSTA, Regina Helena. Imunidades tributárias: teoria e análise da jurisprudência do STF. São Paulo: Malheiros, 2001.

CRUZ, Paulo Márcio. Fundamentos do direito constitucional. Curitiba: Juruá, 2002.

FURTADO, Lucas Rocha. Curso de direito administrativo. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2010.

HARADA, Kiyoshi. Imunidade Recíproca das Empresas Públicas. Disponível em: http://universotributario.com.br/index2.php?option=com_content&do_pdf=1&id=346. Acesso em 12 de out. 2010.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

SALGADO, Joaquim Carlos. Princípios hermenêuticos dos direitos fundamentais. São Paulo: Landy, 2003

TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito financeiro tributário. 12. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005.


Notas

  1. Curso de direito tributário. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 283-285.
  2. Curso de direito tributário. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 185.
  3. De maneira exemplificativa, pode-se também citar como mecanismo de proteção ao pacto federativo o poder de intervenção federal sobre o Estado-membro que desrespeitar a autonomia de um ente municipal (art. 34, VI, "a", da Constituição Federal).
  4. Na teoria clássica do federalismo, apenas a União e Estados-membros são autônomos.
  5. Imunidade Recíproca das Empresas Públicas. Disponível em: <http://universotributario.com.br/index2.php? option=com_content&do_pdf=1&id=346>. Acesso em 12 de out. 2010.
  6. Imunidades tributárias: teoria e análise da jurisprudência do STF. São Paulo: Malheiros, 2001, pp. 144-145.
  7. Curso de direito administrativo. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 216.
  8. FURTADO, Lucas Rocha. Ob. cit., p. 215.
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Sobre a autora
Tarsila Ribeiro Marques Fernandes

Procuradora Federal. Pós-Graduada em direito público. Graduada pela UFPE.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERNANDES, Tarsila Ribeiro Marques. A extensão da imunidade recíproca às empresas estatais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2729, 21 dez. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18063. Acesso em: 24 abr. 2024.

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