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Os efeitos da sentença no processo coletivo

26/12/2010 às 10:37
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O modelo participativo adequa-se melhor ao Estado Democrático de Direito, por permitir a participação dos interessados, sendo ultrapassado e ineficaz o modelo representativo atualmente adotado.

Sumário: 1 Introdução; 2 Direitos difusos, coletivos e homogêneos induviduais; 3 O Sistema Representativo do Processo Coletivo; 3.1 Os modelos da common law; 3.2 Os modelos da civil law; 4 O Sistema Participativo do Processo Coletivo; 5 Efeitos da Sentença Coletiva; 6 Considerações Finais; Referências.


1 INTRODUÇÃO

No Estado Democrático de Direito, tem-se tornado cada vez mais relevante o estudo acerca do Direito Processual Coletivo em razão da busca pela efetividade dos direitos fundamentais e os meios adequados para concretizá-los e tutelá-los.

Assim, revela-se a importância do Processo Coletivo diante da possibilidade de debater, em um único feito, direito que abrange diversos interessados, evitando, por consequência, decisões contraditórias acerca de situações fáticas idênticas.

Apesar de já existir legislação abordando a problemática do processo coletivo, tais como a Lei nº 4.171/85, que dispõe acerca da Ação Popular, a Lei nº 7.347/85 – Lei de Ação Civil Pública, o Código de Defesa do Consumidor e a Lei nº 12.016/2009, que abrange o Mandado de Segurança coletivo, a doutrina brasileira ainda é escassa sobre tal questão, o que torna a positivação do direito ainda superficial e insuficiente para abordar adequadamente o tema.

Dois posicionamentos doutrinários se destacam no tocante à construção do modelo de processo coletivo no direito brasileiro: o sistema representativo defendido por Ada Pelegrini Grinover entre outros e positivado no direito brasileiro, em contraponto com o sistema participativo, na perspectiva das ações coletivas como ações temáticas, estudado por Vicente de Paula Maciel Junior.

Por tais motivos, evidencia-se a relevância do presente estudo acerca do direito processual coletivo, pretendendo-se analisar os efeitos da sentença coletiva nos já referidos principais modelos doutrinários propostos, bem como buscar aquele mais adequado à efetiva tutela dos direitos difusos, tendo em vista que o processo coletivo necessita de institutos diversos daqueles já estabelecidos no processo para tutela de direitos individuais.


2 DIREITOS DIFUSOS, COLETIVOS E HOMOGÊNEOS INDIVIDUAIS

Entende-se por Processo Coletivo aquele que visa tutelar os direitos coletivos, dentre os quais tem-se os coletivos em sentido estrito e os difusos e ainda os individuais homogêneos, sendo necessário, portanto, defini-los para uma melhor compreensão do tema proposto.

O Código de Defesa do Consumidor adota, em seu art. 81, os seguintes conceitos:

Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.

Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:

I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;

II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;

III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.

Vale ressaltar, na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei nº 5.139/2009, disciplinando a Ação Civil Pública para tutela de "interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos", repetindo os conceitos já referidos, em seu art. 2º:

Art. 2º  A tutela coletiva abrange os interesses ou direitos:

I - difusos, assim entendidos os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas, ligadas por circunstâncias de fato;

II - coletivos em sentido estrito, assim entendidos os transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base; e

III - individuais homogêneos, assim entendidos aqueles decorrentes de origem comum, de fato ou de direito, que recomendem tutela conjunta a ser aferida por critérios como facilitação do acesso à Justiça, economia processual, preservação da isonomia processual, segurança jurídica ou dificuldade na formação do litisconsórcio.

A legislação e o referido projeto de lei, não cuidaram de realizar qualquer distinção entre direito e interesse, o que seria incorreto, conforme entendimento esposado por Vicente de Paula Maciel Junior, vez que o interesse, entendido como manifestação de vontade em face de um bem, "é sempre individual, porque pertence à esfera psíquica que liga um sujeito a um bem" (MACIEL JUNIOR, 2006, p. 54).

Desse modo, tendo em vista o supramencionado conceito de interesse, como algo existente somente na esfera individual, inviável falar em interesses na esfera coletiva, revelando-se mais correta a adoção das expressões direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos.

Da leitura do supracitado artigo 81, do CDC, verifica-se que o legislador utilizou três critérios para definir direitos ou interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos: a divisibilidade ou não do direito objetivo pretendido, a titularidade do direito e a sua origem.

Tem-se, portanto, que direitos coletivos lato senso abrangem duas modalidades de direitos transindividuais: os direitos difusos e os coletivos strictu senso.

No que se refere aos direitos individuais homogêneos, estes consistem em "um conjunto de direitos subjetivos individuais ligados entre si por uma relação de afinidade, de semelhança, de homogeneidade, o que permite a defesa coletiva de todos eles" (ZAVASCKI, 2007, p. 43). Ou seja, os interessados compartilham prejuízos divisíveis de mesma origem.

Segundo José dos Santos Carvalho Filho, o "adjetivo ‘homogêneos’ só indica que o fato gerador é único, já que a dimensão qualitativa ou quantitativa do direito pode variar em razão do indivíduo" (CARVALHO FILHO, 2007, p. 30), e prossegue fazendo a seguinte distinção entre os direitos tutelados pelo processo coletivo:

A categoria dos interesses individuais homogêneos guarda distinção fundamental em relação aos interesses coletivos e difusos: enquanto estes são transindividuais, porque o aspecto de relevo é o grupo, e não seus componentes, aqueles se situam dentro da órbita jurídica de cada indivíduo. Por outro lado, os direitos transindividuais são indivisíveis e seus titulares são indeterminados ou apenas determináveis, ao passo que os individuais homogêneos são divisíveis e seus titulares são determinados. (CARVALHO FILHO, 2007, p. 30).

Tem-se, portanto, que, em se tratando de direitos coletivos, em conformidade com as definições supracitadas, revela-se necessário a adoção de um procedimento adequado para sua tutela, tendo em vista que os institutos existentes para a defesa dos direitos individuais não se apresentam suficientes para sua tutela e efetivação.


3 O SISTEMA REPRESENTATIVO DO PROCESSO COLETIVO

Atualmente, a tutela dos direitos coletivos, no ordenamento jurídico brasileiro, observa o modelo representativo, com forte influência do modelo norte-americano das class actions, no qual somente um representante adequado possui legitimidade para a propositura de uma ação coletiva.

No entanto, entre os modelos da civil law, dentre os quais inclui-se o direito processual coletivo brasileiro, e os da common law, com destaque para as class actions, verifica-se algumas diferenças no que se refere à legitimação para agir e aos efeitos da sentença.

3.1 Os modelos da common law

Nos países de common law, tais como Estados Unidos, Canadá e Austrália, adota-se a class action como sistema adequado para a tutela de direitos coletivos, "exigindo-se um número bastante elevado de pessoas que possa vir a se beneficiar da ação coletiva, para permitir ao juiz se convencer de que seja a forma mais adequada, ao invés de uma forma individual." (AFONSO, 2010, p. 303).

Apesar de ter tido grande influência na positivação do direito processual coletivo brasileiro, as class actions possuem diferenças principalmente no tocante à legitimação para agir e à coisa julgada.

Sobre as class actions, leciona Vicente de Paula Maciel Junior:

Nesse sistema há um alargamento do juízo para a discussão de um problema referente a uma classe ou categoria de pessoas. Aquele que propõe a ação (chamado de class actor) não precisa de prévia autorização através de lei específica. Normalmente é uma associação que se apresenta em juízo como representante de uma classe. O ressarcimento do dano não fica limitado ao indivíduo prejudicado, alcançando toda a extensão do ato violador. O juiz deve exercer um importante papel de controle da admissibilidade da representação. (MACIEL JUNIOR, 2006, p. 139-140).

É também lição de Suzana Rocha Savoi Diniz:

Salienta-se, portanto, que a class action é uma ação representativa – representative action, em que o autor representa em juízo os interesses dos demais membros – ausentes – do grupo. Este representante propõe a ação coletiva em nome próprio e em nome de todos os demais que se enquadram em uma situação semelhante à sua, o que gera dois pedidos independentes: o pedido individual, em benefício do representante, e o pedido coletivo, em benefício do grupo. (DINIZ, 2008, p. 123).

No sistema em questão, cabe ao magistrado apreciar a adequação da representatividade, inexistindo limites legais para definir quem seria o representante adequado para atuar em juízo, com legitimação extraordinária, na busca pela tutela dos direitos coletivos.

Destaque também para a Regra 23 das Federal Rules of Civil Procedure, que aborda uma série de questões e exigências para que a demanda seja tratada como uma ação coletiva, tais como controle da representatividade, identificação da classe, objeto da demanda, eficácia do provimento jurisdicional, assistência técnica, tratando também dos pressupostos para seu regular prosseguimento.

No que se refere à legitimação para agir, no modelo das class actions, necessário que o representante considerado adequado integre à classe interessada na demanda, devendo estar claramente definida, de modo a permitir o "alcance e os limites subjetivos do julgado, embora não se exija, a priori, desde o limiar do processo, a indicação exata das pessoas ou mesmo do número certo de interessados" (MENDES, 2002, p. 74).

Ressalte-se que, para que se entenda cabível e adequada a ação coletiva, necessário apreciar o "binômio da prevalência das questões comuns sobre as individuais e da superioridade da ação coletiva em relação a individual" (AFONSO, 2010, p. 304). Necessário, ainda, sejam notificados dos interessados para que exerçam o direito à regra do opt-out, ou seja, é possível que os interessados optem por não se submeterem aos efeitos da sentença.

3.2 Os modelos da civil law

O modelo adotado pela legislação brasileira, conforme previsto na Lei de Ação Civil Pública e no Código de Defesa do Consumidor, adota também o sistema representativo, com grande influência das class actions, porém com a representatividade definida por lei.

Segundo Ada Pellegrini Grinover, o representante adequado, repudiando a legitimação processual conforme proposta no art. 6º, do Código de Processo Civil, é o portador em juízo dos direitos coletivos, difusos e individuais homogêneos, possuindo condições de seriedade e idoneidade, já que não participam os diretamente os membros do grupo, categoria ou classes de pessoas.

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A Lei de Ação Civil Pública prevê em seu art. 5º, quem são os representantes adequados:

Art. 5º  Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar:

I - o Ministério Público;

II - a Defensoria Pública;

III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista;

V - a associação que, concomitantemente:

a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil;

b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.

Desse modo, tem-se que, no sistema brasileiro, a representação adequada é definida pela legislação; ao contrário do sistema norte-americano, no qual cabe ao magistrado apreciar a adequação da representatividade.

Sobre a legitimação para propositura de ações coletivas no direito brasileiro, leciona Hugo Nigro Mazzilli:

Em se tratando de defesa de interesses individuais homogêneos ou interesses coletivos, o lesado, individualmente considerado, não poderá ser autor de pedido coletivo: só poderá, por legitimação ordinária, pedir a defesa de seu próprio interesse em ação individual, quer nesta compareça sozinho ou em litisconsórcio com outros lesados individuais. Mas, em ação civil pública ou coletiva já regularmente ajuizada por um dos co-legitimados do art. 5º da LACP ou do art. 82 do CDC, o indivíduo que compartilhe lesão individual homogênea ou coletiva apenas pode habilitar-se como assistente litisconsorcial, desde que, tendo processo individual em andamento, a tempo tenha requerido sua suspensão. (MAZZILLI, 2005, p. 301).

Sobre a mesma questão, é ensinamento de Pedro Lenza:

Não se pode deixar de reconhecer, contudo, que, em se tratando de tutela coletiva, sempre e necessariamente, haverá defesa, em nome próprio, de um direito alheio da coletividade, sejam interesses ou direitos difusos, de que sejam titulares pessoas indeterminadas, ou interesses ou direitos coletivos stricto sensu, de um grupo, categoria ou classe de pessoas, ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica-base ou, ainda, de interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum, conforme já tratados neste trabalho. Em todas as situações, o representante adequado da coletividade age em nome próprio e, pouco importando se, também, na defesa de seus interesses institucionais, necessariamente, na defesa de um direito alheio, de uma coletividade, mais ou menos organizada, substituindo-a. (LENZA, 2005, p. 191).

Em assim sendo, no sistema representativo adotado pelo direito brasileiro, somente os representantes adequados, com autorização legal, podem propor e participar da ação coletiva, sem a participação direta dos interessados, que serão diretamente afetados pela decisão proferida.


4 O MODELO PARTICIPATIVO DO PROCESSO COLETIVO

Vicente de Paula Maciel Junior apresenta, em sua obra "Teoria das Ações Coletivas: As ações coletivas como ações temáticas", visão diversa acerca do Direito Processual Coletivo, apresentando uma proposta de estudo das ações coletivas como ações temáticas, resgatando aos interessados difusos a "legitimação que lhes foi roubada pelo modelo de processo coletivo centrado no individualismo" (MACIEL JUNIOR, 2006, p. 189).

Desse modo, em contraposição com o modelo representativo adotado pelo legislador brasileiro, o foco na ação coletiva deveria ser o objeto, e não o sujeito, permitindo uma ampla e irrestrita participação dos interessados, e passando a abordar as ações coletivas como ações temáticas, definindo a participação a partir da delimitação do tema debatido.

Vale ressaltar que tal modelo apresenta maior conformidade com as diretrizes do Estado Democrático de Direito, permitindo a formação participada do mérito do provimento jurisdicional, diante da legitimação de todos os interessados difusos.

Em assim sendo, no Processo Coletivo, "a legitimação do provimento decorrente de uma ação coletiva se dá pelo procedimento que permita a inclusão dos legitimados para a participação na construção da decisão." (MACIEL JUNIOR, 2006, p. 178).

Desse modo, diante da ampla participação dos interessados na construção do provimento jurisdicional coletivo, os efeitos da sentença deverão ser diversos daqueles considerados no sistema representativo.


5 EFEITOS DA SENTENÇA COLETIVA

Diante de tais considerações, induvidoso que os efeitos da sentença proferida em processo coletivo devem ser analisados em conformidade com o modelo processual adotado.

No modelo representativo, por inocorrer ampla participação de todos os interessados difusos na construção do provimento jurisdicional, mas tão-somente a representação destes por um legitimado, os efeitos da sentença são limitados, como previsto no art. 16, da Lei nº 7.347/85.

Art. 16. A sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da competência territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova.

Ressalte-se que a atual redação do supracitado dispositivo legal decorre de alteração trazida pelo art. 2º, da Lei nº 9.494/97, decorrente da conversão em lei da Medida Provisória nº 1.570/ 97, passando a restringir a coisa julgada coletiva aos limites territoriais da competência do órgão prolator do provimento.

Hugo Nigro Mazzili critica tal alteração, sob o argumento de que a imutabilidade da sentença deve ser apreciada não de acordo com a competência jurisdicional, mas quanto às pessoas que serão atingidas pela decisão, em conformidade com o direito tutelado.

Assim, segundo o autor, a sentença produziria coisa julgada erga omnes, exceto em caso de improcedência por insuficiência probatória, caso se discutisse direito difusos. Em se tratando de direito coletivo em sentido estrito, a sentença seria imutável ultra partes, limitada ao grupo, categoria ou classe de interessados. Já nos casos em que se pretende a tutela de direito individual homogêneo, a sentença seria imutável com efeitos erga omnes somente nos casos de procedência do pedido inicial.

Pela redação do art. 13, §4º, do Projeto de Lei nº 5.139/2009, afasta-se expressamente a limitação territorial da competência do órgão julgador para a coisa julgada erga omnes.

Nesse sentido, é também o entendimento de Suzana Rocha Savoi Diniz:

Ao instituir limites territoriais à extensão subjetiva da coisa julgada, o legislador foi de encontro a todo o regramento já existente acerca da tutela de direitos metaindividuais, bem como desconsiderou todo o objetivo da defesa desses direitos, que é proteção aos direitos de toda uma coletividade lesada. (DINIZ, 2008, p. 118).

Acerca dos efeitos da coisa julgada na sentença coletiva, existe previsão legal também nos arts. 103 e 104, do Código de Defesa do Consumidor.

Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa julgada:

I - erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do parágrafo único do art. 81;

II - ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo improcedência por insuficiência de provas, nos termos do inciso anterior, quando se tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do art. 81;

III - erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81.

§ 1° Os efeitos da coisa julgada previstos nos incisos I e II não prejudicarão interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade, do grupo, categoria ou classe.

§ 2° Na hipótese prevista no inciso III, em caso de improcedência do pedido, os interessados que não tiverem intervindo no processo como litisconsortes poderão propor ação de indenização a título individual.

§ 3° Os efeitos da coisa julgada de que cuida o art. 16, combinado com o art. 13 da Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, não prejudicarão as ações de indenização por danos pessoalmente sofridos, propostas individualmente ou na forma prevista neste código, mas, se procedente o pedido, beneficiarão as vítimas e seus sucessores, que poderão proceder à liquidação e à execução, nos termos dos arts. 96 a 99.

§ 4º Aplica-se o disposto no parágrafo anterior à sentença penal condenatória.

Art. 104. As ações coletivas, previstas nos incisos I e II e do parágrafo único do art. 81, não induzem litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a que aludem os incisos II e III do artigo anterior não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua suspensão no prazo de trinta dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva.

Sobre o supracitado dispositivo legal, é o ensinamento de Antônio Gidi:

O inciso III do artigo 103 do Código de Defesa do Consumidor prevê que a sentença fará coisa julgada somente no caso de procedência do pedido. Surge, então, a perplexidade de se saber o que aconteceria no caso de improcedência. Não haveria formação de coisa julgada material nesse caso? A coisa julgada seria apenas inter partes? Resolve-se o problema com uma interpretação conjugada com o § 2º do mesmo artigo. Se esse dispositivo ressalva aos ‘aos interessados que não tiverem intervindo no processo como litisconsortes’, a possibilidade de propor a sua ação individual é porque, contrario sensu, aqueles interessados que intervieram, aceitando a convocação do edital a que se refere o art. 94, são atingidos pela coisa julgada inter partes. (GIDI, 1995, p. 139).

Conclui-se, portanto, que a extensão dos efeitos foi estabelecida, secundum eventum litis, ou seja, dependendo do resultado do julgamento. Desse modo, diante da procedência do pedido inicial, haverá sempre a ampliação subjetiva da eficácia do julgado. Mas, do contrário, quando a pretensão for negada, o pedido julgado improcedente não será vinculativo para todos os interessados e legitimados, caso a improcedência decorrer da insuficiência probatória.

Sobre a coisa julgada no modelo representativo brasileiro, é o ensinamento de Fabiano Afonso:

Os limites objetivos da coisa julgada nas ações coletivas se operam para beneficiar todos os titulares de direitos ou interesses discutidos na ação coletiva em caso de procedência, havendo, assim, a coisa julgada secundum eventum litis para se ter eficácia erga omnes.

Nos casos de improcedência da ação, não se transmitem os efeitos erga omnes, conforme dispõe o art. 103 do CDC. Isso deriva de que os legitimados individuais possuem o direito ao devido processo legal, ampla defesa, contraditório e isonomia, com a finalidade de reverterem em juízo a demanda que lhes for desfavorável de forma individual. (AFONSO, 2010, p. 324).

Existe também previsão legal, em sentido semelhante aos já mencionados, no art. 18, da Lei nº 4.717/65, segundo o qual "a sentença terá eficácia de coisa julgada oponível erga omnes, exceto no caso de haver sido a ação julgada improcedente por deficiência de prova".

Nesse sentido, leciona Ricardo de Barros Leonel:

A necessidade de reconhecimento de maior extensão aos efeitos da sentença coletiva é conseqüência da indivisibilidade dos interesses tutelados (material ou processual), tornando impossível cindir os efeitos da decisão judicial, pois a lesão a um interessado implica a lesão a todos, e o proveito a todos beneficia. É a indivisibilidade do objeto que determina a extensão dos efeitos do julgado a quem não foi parte no sentido processual, mas figura como titular dos interesses em conflito. (LEONEL, 2002, p. 259).

No sistema das class actions, os interessados, ainda que não tenham participado da construção do provimento jurisdicional, estes ficam sujeitos aos efeitos da sentença, exceto se exercido o opt-out, o direito de exclusão, conforme leciona Antonio Gidi:

Ao contrário do que acontece no direito processual civil brasileiro, porém o efeito vinculante da sentença coletiva em face das pretensões individuais dos membros do grupo independe do resultado da demanda ou da suficiência do material probatório disponível ao grupo. Seja a sentença favorável ou contrária aos interesses do grupo (whether favorable or adverse), ela está revestida pelo manto da imutabilidade do seu comando em face dos direitos individuais e coletivos de todos os membros ausentes do grupo. (GIDI, 2007, p. 272).

Lado outro, no modelo participativo proposto por Vicente de Paula Maciel Junior, desnecessária e inviável impor quaisquer limitações aos efeitos da sentença, tendo em vista a ampla participação dos interessados na construção do provimento jurisdicional.

Quanto maior a participação dos interessados na formação do mérito maior será a possibilidade de que esse processo represente o conflito coletivo de forma ampla. Isso é de extrema importância porque terá repercussões nos efeitos da sentença coletiva e na extensão da coisa julgada. (MACIEL JUNIOR, 2006, p. 179).

Nesse sentido, conclui Vicente de Paula Maciel Junior:

As ações coletivas não devem ser rígidas quanto à formação do mérito, porque se o fato abrange um número indeterminado de interessados, é natural que dentre eles existam manifestação de vontades em sentidos diferentes e muitas vezes contraditórios. A ação dos diversos interessados difusos deve conduzir a uma possibilidade de ‘ampliação flexível do mérito no processo coletivo’. Se assim não for, corre-se o risco de se transformar a decisão judicial do processo coletivo em uma visão unilateral e representativa apenas de uma parcela dos interessados difusos na questão religiosa. (MACIEL JUNIOR, 2006, p. 180).

Desse modo, o referido modelo participativo revela-se mais adequado ao Estado Democrático de Direito, tendo em vista que o provimento jurisdicional "deverá ser o resultado lógico da atividade procedimental desenvolvida em torno das questões discutidas e dos argumentos produzidos em contraditório pelas partes" (DIAS, 2010, p. 131), construído de forma participada, permitindo que as partes manifestem-se sobre os termos do processo, conforme é lição de Ronaldo Brêtas de Carvalho Dias:

[...] a função jurisdicional somente se concretiza dentro da moderna e inafastável estrutura constitucionalizada do processo e a declaração final do Estado, decorrente do poder de cumprir o dever de prestá-la, quando e se provocado por qualquer um do povo ou mesmo por qualquer órgão estatal, inserida na decisão, sentença ou provimento ali prolatados, jamais será um ato isolado ou onipotente do órgão jurisdicional, ditando ou criando direitos a seu talante, máxime se fundados na fórmula ilógica, inconstitucional e antidemocrática do ‘livre (ou prudente) arbítrio’ do juiz, mas resultado lógico de uma atividade jurídica realizada com a obrigatória participação em contraditório daqueles interessados que suportarão seus efeitos. (DIAS, 2004, p. 88).

Nesse sentido, também lecionam Sérgio Henriques Zandona Freitas e Carla R. C. C. Z. Freitas:

A partir de tais considerações, pode-se dizer que também nas decisões jurisdicionais, há necessidade da atividade preparatória do pronunciamento com a participação dos afetados em simétrica paridade, permitindo-se a consideração de argumentos de todos (inclusive minorias), em respeito aos direitos e garantias fundamentais, principalmente os elencados explicita e implicitamente na Constituição de 1988, tudo em respeito ao Estado Democrático de Direito. (FREITAS; FREITAS, 2008, p. 276).

Sobre o processo no Estado Democrático de Direito, é o ensinamento de Ronaldo Brêtas de Carvalho Dias:

[...] o devido processo legal, principal alicerce do processo constitucional ou modelo constitucional do processo, considerado este a principiologia metodológica constitucional de garantia dos direitos fundamentais, deve ser entendido como um bloco aglutinante e compacto de vários direitos e garantias fundamentais inafastáveis, ostentados pelas pessoas do povo (partes), quando deduzem pretensão à tutela jurídica nos processos, perante os órgãos jurisdicionais: a)- direito de amplo acesso à jurisdição, prestada dentro de um tempo útil ou lapso temporal razoável; b)- garantia do juízo natural; c)- garantia do contraditório; d)- garantia de ampla defesa, com todos os meios e recursos a ela (defesa) inerentes, aí incluído o direito à presença de advogado ou de defensor público; e)- garantia da fundamentação racional das decisões jurisdicionais, com base no ordenamento jurídico vigente (reserva legal); f)- garantia de um processo sem dilações indevidas. [...](BRÊTAS DE CARVALHO DIAS, 2010, p. 125).

Assim, acerca da eficácia da sentença proferida em ação coletiva no modelo participativo, é o entendimento de Suzana Rocha Savoi Diniz:

Nas ações temáticas os limites subjetivos da coisa julgada alcançam a todos os interessados coletivos (em sentido lato) que podem participar e influir na decisão, uma vez que o provimento é o referencial para se identificar os legitimados na ação coletiva e estes é que sofrerão os efeitos da sentença proferida e a mudança em sua situação jurídica, bem como os efeitos da coisa julgada. (DINIZ, 2008, p. 139).

Sobre os efeitos da sentença nas ações coletivas temáticas, prevê o art. 26, do Projeto de Código de Processo Coletivo Brasileiro, elaborado no programa de Pós Graduação em Direito Processual da PUC Minas:

Art. 26. Nas ações temáticas de que trata este Código, a sentença fará coisa julgada erga omnes e haverá a preclusão máxima das questões objeto da ação temática, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer interessado poderá intentar outra ação, com mesmo tema, valendo-se de nova prova.

Assim, em se tratando de ações coletivas, somente poderá ser considerado legítimo o provimento jurisdicional construído pela ampla participação dos interessados, hipótese em que inviável estabelecer limitações territoriais aos efeitos da sentença, como também limitar os interessados que sofrerão seus efeitos.


6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Frente ao exposto, verifica-se que somente é possível analisar os efeitos produzidos pelo provimento jurisdicional proferido em ação coletiva, diante de cada modelo adotado no processo coletivo, vez que o modelo representativo impõe a limitação de tais efeitos, enquanto o modelo participativo não comporta tais limites.

Revela-se induvidoso que o modelo participativo, com a extensão dos efeitos da sentença adequa-se melhor ao Estado Democrático de Direito, permitindo a ampla participação das partes interessadas na construção do provimento, sendo possível considerar ultrapassado e ineficaz o modelo representativo atualmente adotado pela legislação brasileira, bem como pela maior parte da doutrina.

Somente é possível considerar que uma sentença proferida em ação coletiva produza efeitos oponíveis contra todos, sem limitação territorial dentro da jurisdição em que houve a instrução processual, caso permita a participação de todos os interessados, observando o devido processo legal, oportunizando, assim, o contraditório e a ampla defesa.

E também só é possível considerar legitimo um provimento jurisdicional quando construído com a participação de todos os seus interessados, como proposto pelo modelo participativo do processo coletivo proposto por Vicente de Paula Maciel Junior, caso em que inviável estabelecer quaisquer limites para a eficácia e os efeitos do provimento jurisdicional.


REFERÊNCIAS

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DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho. Responsabilidade do Estado pela função jurisdicional. Belo Horizonte: Del Rey, 2004.

DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho. Processo Constitucional e o Estado Democrático de Direito. Belo Horizonte: Del Rey, 2010

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Ação Civil Pública: comentários por artigo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.

DINIZ, Suzana Rocha Savoi. A Coisa Julgada no Processo Coletivo na Perspectiva das Ações Temáticas.2008. Dissertação (Mestrado em Direito Processual) – Pontifícia Universidade Católica, Belo Horizonte.

FREITAS, Sérgio Henriques Zandona Freitas; FREITAS, Carla R. C. C. Z. Direito processual e hermenêutica constitucional democrática. In: CASTRO, João Antônio Lima (Coordenador); NEVES, Isabela Dias (Colaboradora). Direito Processual: uma análise crítica no Estado Democrático de Direito. Belo Horizonte: PUC MINAS, 2008.

GIDI, Antônio. Coisa Julgada e Litispendência em Ações Coletivas. São Paulo: Saraiva, 1995.

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Sobre a autora
Gabriela Oliveira Freitas

Bacharela em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). Pós-Graduada em Direito Processual pelo Instituto de Educação Continuada na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (IEC PUC Minas) em convênio com a Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes (EJEF). Assessora Judiciária do Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FREITAS, Gabriela Oliveira. Os efeitos da sentença no processo coletivo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2734, 26 dez. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18120. Acesso em: 23 nov. 2024.

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