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O mandado de segurança, a compensação tributária e as Súmulas 213 e 460 do STJ

04/02/2011 às 16:23
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Há muita confusão e equívocos processuais que envolvem o mandado de segurança e a compensação tributária. Observa-se uma profusão de decisões judiciais que diariamente vem reconhecendo a carência de ação dos impetrantes, causando sérios prejuízos, exclusivamente pela impropriedade dos termos deduzidos nos pleitos vestibulares.

No passado, a jurisprudência pátria vacilava em reconhecer ou não o mandado de segurança para a declaração do direito à compensação. Pacificando a jurisprudência, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu a idoneidade do writ com a edição da Súmula 213.

Com a edição da referida súmula, os operadores do direito se animaram e enxergaram no mandado de segurança o processo que em relação a compensação tributária, tudo podia e tudo solucionava.

Neste afobamento e falta de estudo dos precedentes que deram origem a súmula 213, milhares de mandados de segurança foram extintos sem julgamento de mérito e provavelmente outros milhares ainda terão o mesmo destino.

Com a edição em setembro de 2010 da súmula 460, que registra ser "incabível o mandado de segurança para convalidar a compensação tributária realizada pelo contribuinte", muitos desavisados alardearam que a súmula 213 teria sido desprestigiada e que hodiernamente a compensação tributária não mais poderia ser ventilada no seio do remédio heróico.

Sobre o assunto já escrevi [01]:

"

Basicamente dois dispositivos tratam da compensação tributária. No art. 170, do Código Tributário Nacional e no art. 66, da Lei n. 8.383/91. No primeiro, a compensação pressupõe edição de lei autorizativa, não gerando ao contribuinte um direito à compensação, bem como a existência de crédito tributário (tributo com lançamento já consumado). No segundo dispositivo citado, cuidou a lei da possibilidade de compensação de tributos pagos indevidamente e sujeitos ao lançamento por homologação, registrando que ‘nos casos de pagamento indevido ou a maior de tributos, contribuições federais, inclusive previdenciárias, e receitas patrimoniais, mesmo quando resultantes de reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória, o contribuinte poderá efetuar a compensação desse valor no recolhimento de importância correspondente a período subseqüente’ (art. 66, da Lei 8.383/91).

A própria lei assevera que se trata de compensação que se realiza por ato do próprio contribuinte (cabendo ao Fisco apenas a homologação da atividade), de forma que não há que se falar em lançamento já consumado, nem de crédito tributário, eis que pressupõe lançamento futuro. É o que se colhe da lição de Hugo de Brito:

A compensação a que alude o art. 170 do Código Tributário Nacional pressupõe a existência de crédito tributário. Pressupõe, em outras palavras, lançamento já consumado. Já a compensação a que alude o art. 66 da Lei n. 8.383/91, diversamente, pressupõe tributo futuro, cujo lançamento ainda não foi feito, e cujo fato gerador pode até nem ter ainda ocorrido. [02]

Assim, como orienta o autor, não há dúvidas que a compensação autorizada pelo art. 66 da Lei n. 8.383/91 não é suficiente para extinguir o crédito tributário porque se faz em momento anterior à sua constituição. Esta compensação teria a mesma natureza do pagamento antecipado a que alude o parágrafo 1º, do art. 150 do CTN.

Para obter o deferimento da segurança e o reconhecimento judicial da existência do direito à compensação, o impetrante não direciona no reconhecimento da compensação propriamente dita, mas no ‘direito à compensação’, restringida indevidamente pela Fazenda Pública. O mandado de segurança, portanto, é ação adequada para a declaração do direito à compensação (Súmula 213, do STJ).

A averiguação da liquidez e certeza dos créditos e débitos compensáveis é da competência da Administração Pública, que fiscalizará o encontro de contas efetuadas pelo contribuinte, providenciando a cobrança de eventual saldo devedor. [03] É que ‘na compensação de tributos na via estreita do mandado de segurança, o aparelho jurisdicional limita-se a declarar a compensabilidade entre débitos e créditos, resguardado à Administração Fiscal o direito de verificar a regularidade do creditamento, apurando o quantum a ser compensado e lançado de ofício o que considerar resultante de erro na apuração’. (STJ, ArRg no AI n. 1.074.870/SP, Rel. Min. Castro Meira, j. 10.02.2009, DJe de 02.03.2009.)"

Ou seja, o mandado de segurança é instrumento adequado à declaração do direito de compensação de tributos indevidamente pagos, em conformidade com a súmula 213, mas é defeso, ao Judiciário, na estreita via do mandamus, a convalidação da compensação tributária realizada por iniciativa exclusiva do contribuinte, porquanto necessária a dilação probatória, de forma que a intervenção judicial deve ocorrer para determinar os critérios da compensação objetivada, a respeito dos quais existe controvérsia, v.g. os tributos e contribuições compensáveis entre si, o prazo prescricional, os critérios e períodos da correção monetária, os juros, etc, bem como para impedir que o Fisco exija do contribuinte o pagamento das parcelas dos tributos objeto de compensação ou que venha a autua-lo em razão da compensação realizada de acordo com os critérios autorizados pela ordem judicial, sendo certo que o provimento da ação não implica reconhecimento da quitação das parcelas ou em extinção definitiva do crédito, ficando a iniciativa do contribuinte sujeita à homologação ou a lançamento suplementar pela administração tributária, no prazo do art. 150, parágrafo 4º, do CTN. Inadmissível provimento jurisdicional substitutivo da homologação da autoridade administrativa, que atribua eficácia extintiva, desde logo, à compensação efetuada. [04]

Em suma: a convivência pacífica entre as súmulas 213 e 460 apresenta-se manifesta, na medida em que aquilo que é permitido por uma, a outra não proíbe. Enquanto a súmula 213 incentiva o uso do mandado de segurança de natureza preventiva para a declaração do direito à compensação, a súmula 460 deixa claro que esse reconhecimento não contempla a hipótese de convalidação das compensações de créditos já efetuados por iniciativa do próprio contribuinte.

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Notas

  1. JANCZESKI, Célio Armando. Dierito Tributário e Processo Tributário. Editora Plenum, 2011, p. 446/447.
  2. MACHADO, Hugo de Brito. Mandado de Segurança em Matéria Tributária, 8ª edição, Dialética, 2009, p. 294.
  3. Neste sentido: STJ, REsp 641.844, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJU 1 de 26.09.2005, p. 312/3.
  4. Neste sentido a manifestação do STJ, 1ª Seção, nos autos do REsp n. 1124.537/SP, Rel. Min. Luiz Fux, submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008. DJe de 18/12/2009.
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Sobre o autor
Célio Armando Janczeski

advogado e consultor empresarial em São Lourenço do Oeste (SC), professor de Direito Tributário da Faculdade Mater Dei, professor convidado permanente da Escola Superior da Advocacia da OAB

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

JANCZESKI, Célio Armando. O mandado de segurança, a compensação tributária e as Súmulas 213 e 460 do STJ. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2774, 4 fev. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18431. Acesso em: 19 abr. 2024.

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