Artigo Destaque dos editores

A jurisprudência brasileira sobre responsabilidade do provedor por publicações na internet.

A mudança de rumo com a recente decisão do STJ e seus efeitos

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17/02/2011 às 15:26
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Notas

  1. Esse caso emergiu como resultado de uma ação judicial contra um dos maiores provedores de serviços on line do mundo, a CompuServe. Nesse caso, Cubby, Inc. v. CompuServe, uma mensagem eletrônica foi distribuída por via de um sistema de fórum on line, mantido pela CompuServe à disposição de seus usuários, contendo mensagens difamatórias sobre um provedor rival (Cubby). A Corte Distrital de Nova Iorque entendeu que, sem poder examinar e sem ter controle sobre a informação que circulava em seu sistema, a CompuServe não podia ter conhecimento do caráter danoso da mensagem, sendo isentada de responsabilidade.
  2. Uma dessas primeiras iniciativas veio com o Communications Decency Act, lei editada nos EUA, em 1996. A Lei proibia a difusão de material obsceno e pornográfico na rede, colimando como fim último a proteção das crianças. Como parte desse Ato, no entanto, foi adicionada uma disposição atribuindo imunidade aos provedores que meramente transportam na rede conteúdo fornecido por outras pessoas. Ainda nos EUA, foi aprovado em 1998, o Digital Milllenium Copyright Act (DMCA), que estabelece várias regras sobre a utilização de obras intelectuais em meio eletrônico. Numa de suas seções, enuncia a regra da não responsabilização dos provedores por conteúdo colocado em rede por terceiros. Nos países europeus também foram estabelecidas várias tentativas de regulamentação da responsabilidade do provedor. No âmbito comunitário, cumpre referir a Diretiva da União Européia sobre comércio eletrônico (Diretiva 31/2000/CE), que traz uma seção completa sobre a "responsabilidade dos prestadores intermediários de serviços" (Seção 4 do capítulo segundo). Nos artigos 12º. a 15º. construiu um regime de responsabilidades muito parecido com o do DMCA, embora não se limitando à violação da proteção de obras autorais. A regra geral é a da não responsabilização do provedor por conteúdo de terceiro e quando se limite a prestar serviços de acesso e transmissão de informações (mensagens de e-mail, p. ex.). No que diz respeito à prestação de serviço de webhosting (armazenagem de páginas eletrônicas e outras informações fornecidas pelos usuários), o art. 14 prevê a possibilidade de responsabilização do provedor quando tem conhecimento da ilicitude do conteúdo que armazena ou de fatos e circunstâncias que a tornem aparente, e não adota nenhuma iniciativa no sentido de remover o conteúdo ou de impedir o acesso dos usuários a ele.
  3. Processo Nº 196.01.2006.028424-6, Comarca/Fórum Fórum de Franca, Cartório/Vara 2ª. Vara Cível, autor: Carmen Steffens Franquias Ltda. Réu Google Brasil Internet Ltda. No caso julgado, terceiro não identificado criou uma comunidade indicando que a empresa autora encontrava-se em estado falimentar. A empresa, sentindo-se ofendida em sua honra objetiva, ingressou com ação por danos diretamente contra a Google (empresa a qual pertence o serviço Orkut), sustentando que a divulgação lhe causara danos ante o constrangimento da falsa informação. A defesa de mérito do Google centrou-se na alegação de que não tinha o dever de fiscalizar o conteúdo divulgado no site, não se lhe podendo atribuir culpa in vigilando.
  4. Apelação Cível n. 431.247-4/0-00 - São Paulo – 8ª Câmara de Direito Privado - Relator: Salles Rossi – 22.03.07 – V.U.
  5. Processo 1.0439.08.085208-0/001. Nesse caso, a vítima foi um diretor de faculdade, que, após demitir um coordenador do curso, passou a sofrer hostilidades em um blog com textos de conteúdo ofensivo. Ele ajuizou ação contra a Google e, além da retirada do conteúdo ofensivo do blog, pediu indenização por danos morais. Em sentença proferida em agosto de 2008, o juiz Marcelo Alexandre do Valle Thomaz, da 3ª Vara Cível de Muriaé, julgou procedentes seus pedidos, condenando a Google a pagar vinte mil reais.
  6. TJMG-13ª. Câmara Cível, Apelação Cível n. 1.0439.08.085208-0/001, relator Cláudia Maia, ac. un., j. 12.02.09, DJ 16.03.09
  7. Apelação Cível n. 1.0105.02.069961-4/001, rel. Des. Elpídio Donizetti, j. 18.11.08, DJ 10.12.08.
  8. Uma comunidade on line compreende grupos de pessoas que compartilham informações (textos, vídeos, músicas, fotos e quaisquer outros artefatos digitais), além de experiências.
  9. O argumento utilizado pelo TJRO para considerar que o provedor teria meios de vigilância sobre o conteúdo das comunidades criadas no Orkut foi um tanto quanto extravagante, pois comparou a situação posta nos autos com o que acontece na China, onde existe vigilância na Internet. Nos termos do voto-condutor, "o provedor de serviços responsável pela manutenção do orkut já se utiliza da fiscalização de conteúdo em outros países, como é o caso da China, não sendo possível vislumbrar, de início, em que a situação ora analisada difere da que vem sendo empregada naquele país".
  10. STJ-2ª. Turma, REsp 1.117.633-RO, rel. Min. Herman Benjamin, ac. un., j. 09.03.10, DJe 26.03.10.
  11. STJ-3ª. Turma, REsp 1193764-SP, rel. Min. Nancy Andrighi, ac. un., j. 14.12.10. Não tivemos acesso à integra do acórdão, que ainda não foi publicado. As informações sobre os fundamentos do voto da relatora foram colhidas em notícia publicada no site do STJ, em 20.01.11.
  12. A responsabilidade pelo risco tem como fundamento não um erro de conduta do agente, mas o simples exercício de atividade que possa trazer perigo de lesão ao patrimônio moral (à vida ou saúde) ou material de outras pessoas. Com efeito, estabelece o § único do art. 925 do C.C. que "haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem". É difícil conceber que a atividade dos provedores de serviços na Internet tem um risco especial, uma carga elevada de perigo com grande probabilidade de risco às pessoas. Tradicionalmente, somente as atividades que criam situações com grande possibilidade de ano à vida ou à saúde de terceiros, como, p. ex., a produção e distribuição de energia elétrica ou nuclear, de explosivos e o transporte de combustíveis, é que têm sustentado a aplicação da teoria da responsabilidade objetiva.
  13. Um operador de sistema informático não advertido dos problemas legais que sua atividade acarreta pode tanto falhar em reduzir ou eliminar conteúdo prejudicial em áreas submetidas a seu controle, como pode restringir alguns serviços desnecessariamente, pelo simples temor de ser responsabilizado.
  14. Atualmente, os provedores exigem o preenchimento de cadastro como condição para liberação do serviço, mas não têm como conferir a real identidade da pessoa (usuário). O ideal seria que instalassem sistemas mais seguros, capazes de checar a identidade antes do início da prestação do serviço.

15.A responsabilização do provedor que estamos a cogitar seria sempre uma responsabilidade "substituta" ou "secundária", só operante nas situações onde não for possível identificar o infrator primário. Não seria nunca uma responsabilidade solidária (entre o provedor e o autor direto do dano), no sentido de o ofendido poder escolher contra quem demandar. Admitimos, unicamente, uma responsabilidade secundária, significando a possibilidade de chamar o provedor à responsabilização como substituto do autor direto do dano, diante de uma situação fática que impede alcançá-lo.

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Sobre o autor
Demócrito Reinaldo Filho

Juiz de Direito. Doutor em Direito. Ex-Presidente do IBDI - Instituto Brasileiro de Direito da Informática.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

REINALDO FILHO, Demócrito. A jurisprudência brasileira sobre responsabilidade do provedor por publicações na internet.: A mudança de rumo com a recente decisão do STJ e seus efeitos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2787, 17 fev. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18513. Acesso em: 22 dez. 2024.

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