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Peculiaridades dos contratos de trabalho dos atletas profissionais de futebol

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24/02/2011 às 11:23
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4 EXTINÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO DO ATLETA PROFISSIONAL DE FUTEBOL

O contrato de trabalho do atleta profissional de futebol pode ser extinto tanto de forma anormal, como normal. A forma normal é o cumprimento do prazo determinado, extinguindo-se naturalmente o contrato na data aprazada. A forma anormal pode ocorrer por resilição (manifestação de vontade de uma das partes ou de ambas) ou por resolução (inexecução faltosa do contrato de trabalho, justa causa).

Na lição de Sussekind (1996), a resilição do contrato de trabalho é um direito potestativo das partes em findar a relação.

Dá-se a resilição do contrato quando as próprias partes desfazem o ajuste que haviam concluído. Em conseqüência da força obrigatória dos contratos, o que caracteriza a resilição, em princípio, é o mútuo acordo para extinguir o contrato antes da expiração do seu termo ou de obtidos os seus fins normais. É o distrato, a que se refere o art. 1.093 do Código Civil. Excepcionalmente, pode a lei autorizar a resilição pela vontade unilateral, que supõe, sempre, um contrato em curso, de prestações sucessivas. (SUSSEKIND, 1996, p. 551).

A resolução, por sua vez, pode ser tácita ou expressa. Há resolução expressa quando o contrato está sujeito a causa resolutiva. A resolução tácita é inerente ao contrato sinalagmático, onde ambas as partes envolvidas possuem obrigações recíprocas, que se subentende nos casos de inexecução faltosa da obrigação dos contratantes. "Dá-se, então, resolução do contrato por inadimplemento da obrigação. Assim pode ocorrer a dissolução do contrato de trabalho, em virtude de pacto comissório, quando empregado ou empregador não cumprem as respectivas obrigações" (SUSSEKIND, 1996, p. 553).

Neste capitulo estudaremos, portanto, as formas que se extinguem a relação de emprego do atleta profissional de futebol.

4.1 Extinção normal – chegada do termo

Conforme já estudado, o contrato de trabalho do jogador de futebol somente pode ser fixado com prazo determinado, de três meses a cinco anos de duração, não se aplicando as regras dos artigos 445 e 451 da CLT.

Pactuados regularmente os contratos a termo, eles irão firmar clara especificidade também no tocante a suas características, regras e efeitos jurídicos. Nesse quando, eles distinguem-se por estarem submetidos a lapsos temporais geralmente estreitos e rígidos (...) (DELGADO, 2008, p. 526).

O contrato por prazo determinado já nasce com data certa para encerrar, perdendo força imediatamente após a chegada do termo (NASCIMENTO, 1997).

Nos contratos a termo da CLT, a extinção do vínculo já traz efeitos rescisórios mais restritos em favor do empregado, inexistindo, por exemplo, o pagamento da indenização de 40% do FGTS, nos termos do artigo 7º, inciso I, da CF/88, combinado com o artigo 10 do ADCT (DELGADO, 2008).

Na extinção do vínculo do atleta profissional de futebol pelo simples decurso do prazo do contrato, nenhuma indenização compensatória é devida por quaisquer dos contratantes, ficando o atleta livre para se transferir para outro clube independentemente do pagamento de qualquer valor ao seu ex-empregador. A Lei Pelé, ao extinguir o passe e vincular o vínculo federativo ao contrato de trabalho beneficiou sobremaneira os atletas, que se liberam dos clubes com o vencimento do contrato.

Contudo, as regras da CLT se aplicam aos atletas profissionais de futebol naquilo em que não se contrapor à legislação específica (artigo 28, § 1º, da Lei n. 9.615/98). Assim, mesmo que o vínculo se dissolva de pleno direito com o término do prazo do contrato (artigo 28, § 2º, inciso II, da Lei n. 9.615/98), não há óbice para a aplicação do artigo 146 da CLT e do artigo 1º, § 3º, inciso I, da Lei n. 4.090/62.

Com efeito, o artigo 146 da CLT dispõe que: "Na cessação do contrato de trabalho, qualquer que seja a sua causa, será devida ao empregado a remuneração simples ou em dobro, conforme o caso, correspondente ao período de férias cujo direito tenha adquirido".

Assim, ao alcançar o termo do contrato, o empregado atleta profissional de futebol teria direito ao pagamento das férias proporcionais.

Registro que, conforme já estudando acima, o atleta profissional de futebol terá direito a férias de 30 dias que coincidirão sempre com o período de recesso do calendário desportivo, que implica, teoricamente, que o novo clube arcaria com as férias do jogador independentemente do tempo de contrato.

Entretanto, as férias proporcionais devem ser pagas independentemente da possibilidade de concessão de férias no outro clube, já que ao se extinguir o contrato nada garante que o atleta conseguirá imediata colocação no mercado de trabalho (GRISARD, 2004).

Já o artigo 1º, § 3º, inciso I, da Lei n. 4.090/62 dispõe sobre o pagamento do 13º salário proporcional:

§ 3º A gratificação será proporcional:

I – na extinção dos contratos a prazo, entre estes incluídos os de safra, ainda que a relação de emprego haja findado antes de dezembro.

Portanto, do mesmo modo que as férias proporcionais são devidas ao atleta profissional de futebol no caso de extinção normal do vínculo, pelo decurso do prazo, também é devido o pagamento do 13º salário proporcional aos meses trabalhados no ano.

Para efeitos rescisórios, em caso de extinção normal, o contrato do atleta profissional de futebol se equipara aos demais contratos a termo regidos pela CLT.

4.2 Extinção anormal – resilição e resolução

Em sede de contratos de trabalho por prazo determinado, conforme já dito, a extinção normal se dá com a chegada do seu termo, sendo causa anormal de extinção o distrato ou a resolução por culpa das partes.

Ressalto, contudo, que mesmo quando o contrato tem seu fim antes do prazo pré-estabelecido, ele é cumprido de forma alternativa, consistente em uma indenização substitutiva.

4.2.1 Cumprimento alternativo

Os contratos por prazo determinado se extinguem normalmente pela chegada do termo. Mas há, também, uma forma alternativa de cumprimento, consistente em uma espécie de conversão do contrato em perdas e danos.

Para os contratos a prazo da CLT, de acordo com os artigos 479 e 480 da Consolidação, se o empregador quiser extinguir o contrato antes do termo será obrigado a pagar ao empregado, a título de indenização, a metade da remuneração a que teria direito até o fim do contrato. Se o empregado quiser rescindir o contrato antes do termo, será obrigado a indenizar o empregador dos prejuízos que causou, cujo valor, no entanto, não poderá ser superior ao devido pelo empregador em condições idênticas (DELGADO, 2008).

Já para o caso dos atletas profissionais de futebol, o caput do artigo 28 da Lei n. 9.615/98 estabelece que o contrato formal de trabalho deverá conter, obrigatoriamente, uma cláusula penal para os casos de descumprimento, rompimento ou rescisão unilateral.

A cláusula penal, que poderá ser livremente estipulada pelas partes até o limite de cem vezes o valor da remuneração anual do atleta (§ 3º), é uma forma alternativa de cumprimento do contrato, tanto que o valor da cláusula é automaticamente reduzido em até 80% na medida em que cada ano do contrato é cumprido (§ 4º).

Urge salientar, apenas para conhecimento, que não há qualquer limite para o valor da cláusula penal para casos de transferência internacional, desde que haja previsão expressa no contrato de trabalho (§ 5º).

Há certa divergência no sentido de que parte faria jus à cláusula penal pela extinção antecipada.

A corrente ampliativa defende que qualquer uma das partes terá direito à indenização substitutiva se a outra quiser rescindir o contrato.

Verifica-se da leitura do art. 28 supra que o mesmo não traz menção expressa à parte que pode ser responsabilizada pelo pagamento da cláusula, havendo respeitável corrente que entende pela possibilidade de aplicação da mesma tanto em favor do atleta como em favor da entidade desportiva, até mesmo em virtude do princípio in dúbio pro operário, norteador do direito do trabalho.

Destaca-se, neste aspecto, ementa do eg. Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, no sentido de que: ‘A cláusula penal tratada no art. 28 da Lei nº 9.615/98, que institui normas gerais sobre o desporto e dá outras providências, aplicável tanto ao atleta profissional quanto à entidade de prática desportiva, pois não há nada nesse dispositivo legal que autorize interpretação diversa (...).

No mesmo sentido, decisão proferida pelo eg. Tribunal Regional do Trabalho da 12º Região, embasando-se na afirmativa de que o ‘contrato de trabalho é, por natureza, sinalagmático, ou seja, preleciona reciprocidade de direitos e de obrigações’. (POLAK, 2004, p. 8).

Esse é o entendimento que vem prevalecendo na jurisprudência.

Pela interpretação teleológica da Lei n. 9.615/98, contudo, é possível concluir que a cláusula penal é devida apenas pelo empregado, tendo sido criada tão-só para substituir o "passe", extinto pela Lei Pelé.

Nesse sentido, Polak (2004, p. 8), escreve:

Há, porém, corrente que vai em sentido diverso do indicado anteriormente, pregando pela aplicabilidade da cláusula penal apenas e tão-somente em favor do clube empregador, sendo que, nas rescisões por iniciativa do mesmo, não há a obrigação de pagar o valor previsto na cláusula.

Com efeito, o § 3º, do mesmo artigo 28, limita o valor da cláusula nas transferências ocorridas dentro do território nacional (a cem vezes o montante da remuneração anual do atleta), o que é excepcionado pelo § 5º para as transferências para clubes do exterior.

Tendo em vista o fato de que a transferência para o exterior ocorre por opção do atleta, denota-se, a partir de uma interpretação teleológica, que a finalidade da norma é, ao mesmo tempo, proteger o clube contra rescisões decorrentes de transferências no curso de competições esportivas, eis que a cláusula acaba por desmotivá-las, bem como proteger o empregado contra estipulações de multa em valores astronômicos. Lembre-se que a Lei nº 9.615 traz limites aos valores fixados para transferências internas, uma vez que os clubes nacionais possuem menor poder aquisitivo que os clubes do exterior, além de fomentar a permanência dos atletas em território nacional.

Reforça esta conclusão o § 4º do mesmo artigo que prevê a redução gradativa da cláusula penal com o passar dos anos do contrato. A razão de ser desta previsão decorre do fato de que, com o decorrer do tempo, o contrato já restou cumprido em parte, tendo o clube, beneficiário da cláusula, utilizado-se do trabalho do atleta, sendo descabido manter-se o valor no mesmo patamar estipulado para o início do pacto.

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Tal regra é inclusive adotada pelo Código Civil de 2002 (assim como já ocorria com o Código de 1916), no sentido de que, cumprida em parte a obrigação, o juiz pode reduzir a penalidade eqüitativamente, nos termos do artigo 413.

Ademais, atentaria contra toda a sistemática do direito do trabalho concluir-se que quanto mais o atleta ficasse integrado ao clube, dada a longevidade de seu vínculo, menor seria a multa a que teria direito. Tome-se por parâmetro a antiga indenização aos empregados que não possuíam estabilidade decenal correspondente a um mês de remuneração por ano de serviço efetivo.

Por fim, deve ser considerado o contido no art. 57, inciso II, da própria Lei nº 9.615, que destina à assistência social e educacional dos atletas profissionais ‘II - um por cento do valor da cláusula penal, nos casos de transferências nacionais e internacionais, a ser pago pelo atleta’. Verifica-se, portanto, que a própria lei, expressamente, prevê que a cláusula penal do art. 28 é paga pelo atleta, e não pela entidade desportiva.

Observe-se também a previsão do art. 33, no sentido de que as entidades desportiva somente podem conceder condição de jogo ao atleta que estiver ‘acompanhado da prova de pagamento da cláusula penal nos termos do art. 28 desta Lei’.

Em se entendendo que a cláusula penal também é devida pelo clube empregador, bastaria a este deixar de pagar a cláusula para que o atleta não pudesse adquirir condição de jogo junto à entidade para a qual se transferira, o que não se apresenta lógico.

Segundo defensores desta tese, seria cabível, na hipótese de rescisão imotivada por parte do clube empregador, a multa prevista pelo art. 479 da CLT, específica para os contratos por prazo determinado, como o é o do jogador profissional de futebol.

Funcionaria, assim, a cláusula penal, como um sucedâneo do velho ‘passe’, previsto pela Lei nº 6.354/76, representando uma forma de compensação, para os clubes, pela extinção do vínculo.

Embora a corrente restritiva seja a mais lógica, o caráter sinalagmático do contrato de trabalho não deve ser deixado de lado, bem como o Princípio da Proteção, que é o principal orientador do Direito do Trabalho. Nesse sentido, não pode subsistir, na seara trabalhista, um ônus que seja exclusivamente do empregado. Sublinhe-se que o Princípio da Igualdade implica em tratar os desiguais desigualmente. Entretanto, para se conseguir a igualdade material os benefícios devem ser alcançados à parte mais forte, isto é, ao empregado, e não à parte mais forte, o empregador. Assim, entendo que a corrente ampliativa é a mais acertada e condizente com as diretrizes históricas trabalhistas.

Nesse sentido, colaciono a seguinte ementa de jurisprudência:

TRT-PR-17-04-2007 CLÁUSULA PENAL. ART. 28 DA LEI 9.615-1998. ATLETA PROFISSIONAL DE FUTEBOL. RESILIÇÃO ANTECIPADA DO CONTRATO. APLICAÇÃO A AMBOS OS CONTRATANTES. Não se afigura razoável nem condizente com as normas protetoras do direito do trabalho admitir a previsão contratual relativa à cláusula penal (campo 25 do contrato-fl. 25) para o caso de rescisão antecipada somente a pedido do atleta. Isso porque o contrato de trabalho é comutativo, o que faz com que tal estipulação seja considerada também em relação ao empregador, pois, em caso contrário, estar-se-ia a chancelar disposição leonina-incompatível com as relações de trabalho. Consoante art. 28 da Lei n 9.615-98, "a atividade do atleta profissional, de todas as modalidades, é caracterizada por remuneração pactuada em contrato formal de trabalho firmado com a entidade de prática desportiva, pessoa jurídica de direito privado, que deverá conter, obrigatoriamente, cláusula penal para as hipóteses de descumprimento, rompimento ou rescisão unilateral". Assim, a lei prevê a obrigatoriedade de estipulação de cláusula penal nos contratos pactuados entre o atleta profissional e o clube, restando conforme com os princípios da razoabilidade e da igualdade entre as partes contratantes o entendimento de que a cláusula penal estipulada livremente no contrato de trabalho firmado abrange também o descumprimento das obrigações contratuais assumidas pela entidade desportiva contratante, mesmo porque o referido dispositivo legal não autoriza interpretação diversa. (TRT-PR-01176-2004-654-09-00-2-ACO-09485-2007 - 2A. TURMA. Relator: ROSEMARIE DIEDRICHS PIMPÃO. Publicado no DJPR em 17-04-2007).

Estudada a forma alternativa de cumprimento, mister que se adentre, especificamente, nos tipos de extinção do contrato de trabalho do atleta profissional de futebol.

4.2.2 Resilição do contrato de trabalho

Resilição é a extinção do contrato de trabalho forçada pela vontade das partes. É equivalente ao distrato. Excepcionalmente a lei pode conferir o poder potestativo à resilição pela vontade unicamente de uma das partes, como nos contratos de trabalho por prazo indeterminado na CLT, em que há a necessidade apenas da concessão do prévio aviso (SUSSEKIND, 1996).

No caso específico dos atletas profissionais de futebol, o artigo 21 da Lei n. 6.354/76 prevê que "é facultado às partes contratantes, a qualquer tempo, resilir o contrato, mediante documento escrito, que será assinado de próprio punho, pelo atleta, ou seu responsável legal, quando menor, e duas testemunhas".

Como a resilição, neste caso, é efetivada pela vontade de ambas as partes, a cláusula penal que foi livremente estabelecida no contrato pode vir a ser, também de forma livre, reduzida ou até suprimida, desde que seja de interesse dos envolvidos.

Como o artigo 28, § 2º, inciso II, da Lei n. 9.615/98 prevê que o contrato se extingue com o pagamento da cláusula penal, neste tipo especial de vínculo subsiste o direito potestativo das partes de extinguir unilateralmente o contrato de trabalho, desde que arque com o valor estipulado para o rompimento.

Desse modo, é possível também a resilição do contrato de trabalho quando qualquer das partes assim o desejar. Conforme entendimento acima registrado, a cláusula penal sempre será devida, inclusive pelo clube empregador, se for ele quem quiser resilir o liame empregatício.

4.2.3 Resolução do contrato de trabalho

O contrato de trabalho do atleta profissional de futebol também pode se extinguir no caso de inexecução faltosa das obrigações assumidas. É a despedida por justa causa. A falta pode ser tanto do empregado quanto do empregador, caso em que incidirá a figura conhecida na doutrina e na jurisprudência como "rescisão indireta".

As hipóteses de despedida por justa causa e de rescisão indireta previstas nos artigos 482 e 483 aplicam-se aos atletas profissionais de futebol por força do § 1º do artigo 28 da Lei Pelé. Mas a Lei n. 6.354/76 traz causas especiais para a extinção do contrato do trabalho do atleta profissional de futebol por culpa das partes.

Sobre a rescisão indireta,

Além das causas arroladas no art. 483 da CLT, o art. 31 da Lei n. 9.615, de 24.03.1998, autoriza o atleta a postular a rescisão indireta de seu contrato de trabalho, ficando inclusive livre para se transferir para outra agremiação, quando o empregador estiver em atraso com o pagamento de salário, no todo ou em parte, por período igual ou superior a três meses. São considerados salários, para estes efeitos, o abono de férias, o 13º, as gratificações, os prêmios e demais verbas inclusas no contrato de trabalho. A mora contumaz, ensejadora da rescisão indireta, configurar-se-á também nas hipóteses de não-recolhimento do FGTS e das contribuições previdenciárias (art. 31, §2º da Lei nº 9.615, de 1998). (BARROS, 2002, p. 91/92).

A eminente Alice Monteiro de Barros (2002, p. 93) entende, ainda, que

o atleta fará jus, além das verbas advindas da dispensa injusta, a uma multa rescisória equivalente ao disposto no artigo 479 da CLT, isto é, à metade da remuneração a que teria direito pelo tempo restante do contrato e, ainda, à liberação do passe. Caso seja o atleta o autor da prática faltosa, também incorrerá nesta multa, comprovado o prejuízo do empregador, tudo na forma do art. 31, § 3º da Lei nº 9.615/98.

Entretanto, não há como concordar com a doutrinadora. Com efeito, conforme já explanado acima, neste contrato especial de trabalho já há uma multa para o caso de extinção antecipada, que se aplica tanto quando o vínculo se rompe pela manifestação expressa da vontade, quanto na hipótese da existência de culpa de alguma das partes.

Assim, os artigos 479 e 480 da CLT não se aplicam aos contratos dos atletas profissionais de futebol, já que incompatíveis com este tipo especial de vínculo.

Esse é também o entendimento de parte da jurisprudência:

CLÁUSULA PENAL. ATLETA PROFISSIONAL. LEI PELÉ. A Lei nº 9.615/98 obriga a inclusão de cláusula penal em todos os contratos de trabalho firmados com atletas profissionais de futebol, tendo-se como equivocado o entendimento segundo o qual essa cláusula somente é devida pelo atleta que rescinde o contrato de trabalho antes do prazo determinado, visto que a exegese do art. 28 da Lei Pelé leva à conclusão de que é de aplicação bilateral, sendo devida no caso dos autos, em que o reclamado tomou a iniciativa de romper prematuramente o contrato de trabalho do reclamante. Recurso provido. (Número do processo: 01084-2006-201-04-00-3 (RO). Desembargador(a): CLEUSA REGINA HALFEN. Data de Publicação: 27/09/2007).

Há resolução do contrato de trabalho, também, quando o empregado não cumpre com suas obrigações do contrato, incorrendo ele em falta e ficando obrigado a pagar a multa da cláusula penal.

O art. 20 da Lei nº 6.354, de 1976, arrola as justas causas para a resolução do contrato de trabalho do jogador de futebol e sua conseqüente eliminação do futebol nacional. São elas: a improbidade, a grave incontinência de conduta, a condenação à pena de reclusão, superior a dois anos, transitada em julgado, e a eliminação imposta pela entidade de direção máxima do futebol nacional ou internacional. A Lei nº 9.615, de 1998 (Lei Pelé), não alterou essa questão. (BARROS, 2002, p. 93).

O ato de improbidade, também tipificado no artigo 482 da CLT, é conduta faltosa que provoca dano ao patrimônio empresarial ou de terceiro, em função de comportamento vinculado ao contrato de trabalho, com o objetivo de alcançar vantagem para si ou para outrem. Embora improbidade seja também mau procedimento, tem a peculiaridade, segundo a ótica justrabalhista, de afetar o patrimônio de alguém, em especial do empregador, visando, irregularmente, a obtenção de vantagens para o empregado ou terceiro ligado a ele (DELGADO, 2008).

A incontinência de conduta consiste na conduta culposa do empregado que atinge a moral, sob o ponto de vista sexual, prejudicando o ambiente de trabalho ou as obrigações contratuais (DELGADO, 2008).

O contrato de trabalho do atleta tem peculiaridades, entre elas o caráter muito amplo e intenso da subordinação, que se estende não só à atividade esportiva, incluindo treinos, concentração e excursões, mas também aos aspectos pessoais, como alimentação, bebidas, horas de sono, peso; aos aspectos mais íntimos, como o comportamento sexual; mais convencionais, como a vestimenta e a presença externa e, ainda, aos aspectos mais significativos como declarações à imprensa.

A extensão e a indiscrição do controle que existem nesse regime contratual é de ampla notoriedade, não podendo o atleta alegar engano sobre a intensidade da subordinação, tampouco a necessidade econômica de submeter-se ao rigor destas regras, mesmo porque trata-se de profissão insegura e fugaz. (BARROS, 2002, p. 94).

A autora complementa, registrando que "para os atletas, a incontinência de conduta é avaliada com mais rigor do que o critério adotado para os empregados em geral e poderá configurar-se mesmo fora das dependências da agremiação" (BARROS, 2002, p. 94).

Já a extinção do contrato pela condenação criminal em pena de reclusão superior a dois anos se dá não por alguma falta específica do empregado, mas pela impossibilidade de se continuar a prestação do labor (SUSSEKIND, 1996).

Conforme já afirmado, as hipóteses dos artigos 482 e 483 da CLT se aplicam aos contratos de trabalho dos atletas profissionais de futebol.

O rol a que alude o art. 20 da Lei nº 6.354, de 1976, é meramente exemplificativo. As outras justas causas arroladas no art. 482, da CLT aplicam-se ao jogador de futebol, mas só algumas delas autorizam a eliminação do futebol nacional. As outras faltas do art. 482, da CLT são: negociação habitual, desídia, embriaguez habitual ou em serviço, violação de segredo da empresa, indisciplina e insubordinação, abandono de emprego, ato lesivo da honra e da boa fama, praticada em serviço contra qualquer pessoa ou contra o empregador ou superiores hierárquicos. (BARROS, 2002, p. 95).

Continua a professora Alice Monteiro de Barros dizendo que:

Essas faltas, a que alude o art. 482, da CLT, podem autorizar a resolução do contrato de trabalho, por justa causa, sem acarretar a eliminação do futebol, com exceção do alcoolismo ou ingestão de outras drogas, que se apresente de forma freqüente, a ofensa física ou à honra e boa fama praticada contra colega de profissão, árbitro, auxiliares, ou mesmo torcedores, de uma forma reiterada ou contra superior hierárquico, mesmo fora do serviço. Estar últimas faltas, frise-se, podem acarretar, além da dispensa por justa causa, a eliminação do futebol. (2002, p. 96).

Vale ressaltar que, conforme explanações acima desenvolvidas, na hipótese de ocorrência de justa causa, seja por parte do empregado, seja por parte do empregador, incidirá apenas, pela parte culpada, o pagamento da multa contratual estipulada pelas partes, não se aplicando os artigos 479 e 480 da CLT.

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Sobre o autor
Evandro Luis Urnau

Juiz do Trabalho do TRT da 4 Região.<br>Especialista em Direito Material e Processual do Trabalho - IMED. <br>Especialista em Direito e Processo do Trabalho - LFG.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

URNAU, Evandro Luis. Peculiaridades dos contratos de trabalho dos atletas profissionais de futebol. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2794, 24 fev. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18561. Acesso em: 19 abr. 2024.

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