A Lei n. 12.023, de 27 de agosto de 2009, dispõe sobre as atividades de movimentação de mercadores executadas por trabalhadores em áreas urbanas e rurais sem vínculo empregatício – trabalhadores avulsos, portanto –, com exceção dos trabalhadores portuários, cujo regime jurídico está previsto em legislação específica (Lei n. 12.023/91, artigos 1º e 11). Trata-se, portanto, dos trabalhadores avulsos fora do porto, segmento até então ignorado pelo legislador.
A atividade de movimentação de mercadorias, entretanto, não é exclusividade dos trabalhadores avulsos, podendo exercida por trabalhadores com vínculo empregatício (Lei n. 12.023/91, artigo 3º). Deve-se destacar, a esse respeito, que a natureza da atividade da empresa poderá resultar na necessidade da existência de quadro de trabalhos permanentes destinados à movimentação de mercadorias. É o caso, por exemplo, das grandes redes varejistas, cujo fluxo de cargas diário é intenso, restando ao empregador a obrigação de contratar trabalhadores na modalidade prazo indeterminado.
Quanto desenvolvidas por avulsos nas áreas urbanas e rurais, a atividade de movimentação de mercadorias requer intermediação obrigatória do sindicato que representa a categoria mediante acordo ou convenção coletiva firmado com as empresas ou com os sindicatos que representam os tomadores de serviços, cujas cláusulas estabelecerão a remuneração, as funções, a composição de equipes e as demais condições de trabalho (Lei n. 12.023/91, artigo 1º, caput e § único).
Deve-se frisar que o objetivo do legislador foi assegurar aos movimentadores de carga sem vínculo empregatício, avulsos, portanto, a possibilidade de se organizarem e, com a intermediação do sindicato profissional, prestarem serviços a empresas que necessitam desse tipo de trabalho. Da mesma forma, a atuação do sindicato profissional tem como objetivo proporcionar a tais trabalhadores condição de negociação isonômica em relação aos tomadores. Quer dizer, os trabalhadores organizados poderão acordar sua remuneração em condições mais favoráveis do que se contratados diretamente pelas empresas tomadoras como avulsos.
A intermediação do sindicato é obrigatória? Da redação do texto legislativo é possível a construção de interpretação quanto à obrigatoriedade da intervenção do sindicato profissional nessa modalidade de contratação de trabalhador avulso:
Art. 1º As atividades de movimentação de mercadorias em geral exercidas por trabalhadores avulsos, para os fins desta Lei, são aquelas desenvolvidas em áreas urbanas ou rurais sem vínculo empregatício, mediante intermediação obrigatória do sindicato da categoria, por meio de Acordo ou Convenção Coletiva de Trabalho para execução das atividades.
Essa intermediação obrigatória representa a criação de um sistema de contratação de trabalhadores avulsos fora do porto, cuja característica principal seria monopólio do sindicato profissional? Antes de responder a tal questão, é necessário analisar se o ordenamento jurídico prevê outras modalidades de contratação do trabalhador avulso, bem como se há previsão de contratações temporárias destinadas a atender a demanda desse setor da economia.
A Consolidação das Leis do Trabalho ao tratar dos serviços de estiva e da capatazia dos portos, fez menção a trabalhadores, não necessariamente sindicalizados, que poderiam ser contratados junto ao Sindicato dos Trabalhadores na Movimentação de Mercadorias (CLT, artigos 257 e 285, revogados pela Lei n. 8.630/93).
O Legislador Constitucional de 1998 assegurou a igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso (CF, artigo 7º, XXXIV). Da tutela constitucional, é possível apurar, além da isonomia de direitos trabalhistas, a diferenciação entre trabalhador avulso e trabalhador com vínculo empregatício. Para tanto, seguindo a conceituação legal, o trabalhador avulso é aquela que presta, a diversas empresas, sem vínculo empregatício, serviços de natureza urbana ou rural (Lei n. 8.212/90, artigo 12, VI).
É interessante observar que o Decreto n. 3.048/99, que regulamenta a Lei n. 8.212/90, estipula a intermediação obrigatória do Órgão Gestor de Mão de Obra para os trabalhadores avulsos dos portos, bem como do sindicato da categoria para as demais hipóteses de movimentadores de mercadoria avulsos (Decreto n. 3.048/99, artigo 9º, VI).
A negociação coletiva é obrigatória?
Os tomadores podem contratar avulsos sem a intermediação do sindicato?
Os tomadores podem contratar avulsos via cooperativas?
E via empresas de serviços temporários (lei 6.019)?
E empresas prestadoras de serviço?
Ainda que mantida a intermediação obrigatória do sindicato profissional, não há que se falar em necessária filiação à entidade sindical para fins de contratação como trabalhador avulso, sob pena de violação aos princípios da liberdade sindical e da não discriminação. A filiação ao sindicato que representa os movimentadores de carga não é condição para integrar as escalas de trabalho. A inscrição no cadastro de trabalhadores elaborado pelo sindicato profissional, portanto, não depende da filiação ao referido sindicato, não havendo, pois discriminação entre trabalhadores filiados e não filiados para efeito de acesso ao trabalho (CF, artigo 8º e Lei n. 12.023/91, artigo 5º, § 2º).
São atividades de movimentação de mercadorias a carga e descarga de mercadorias a granel e ensacados, costura, pesagem, embalagem, enlonamento, ensaque, arrasto, posicionamento, acomodação, reordenamento, reparação da carga, amostragem, arrumação, remoção, classificação, empilhamento, transporte com empilhadeiras, paletização, ova e desova de vagões, carga e descarga em feiras livres e abastecimento de lenha em secadores e caldeiras; operações de equipamentos de carga e descarga; pré-limpeza e limpeza em locais necessários à viabilidade das operações ou à sua continuidade (Lei n. 12.023/91, artigo 2º, I a III).
Fazer paralelo com lei dos portuários.
Cabe ao sindicato profissional elaborar a escala de trabalho e as folhas de pagamento dos trabalhadores avulsos, com a indicação do tomador do serviço e dos trabalhadores que participaram da operação, cuja especificação requer a identificação pelo sindicato dos respectivos números de registros ou cadastro no sindicato; o serviço prestado e os turnos trabalhados; as remunerações pagas, devidas ou creditadas a cada um dos trabalhadores, registrando-se as parcelas referentes a repouso remunerado, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, 13º salário, férias remuneradas mais 1/3 (um terço) constitucional, adicional de trabalho noturno e adicional de trabalho extraordinário (Lei n. 12.023/91, artigo 4º, I a III).
Ainda, é dever do sindicato profissional que intermédia a contratação dos trabalhadores avulsos divulgar amplamente as escalas de trabalho dos avulsos, com a observância do rodízio entre os trabalhadores; proporcionar equilíbrio na distribuição das equipes e funções, visando à remuneração em igualdade de condições de trabalho para todos e a efetiva participação dos trabalhadores não sindicalizados; repassar aos respectivos beneficiários, no prazo máximo de 72 (setenta e duas) horas úteis, contadas a partir do seu arrecadamento, os valores devidos e pagos pelos tomadores do serviço, relativos à remuneração do trabalhador avulso; exibir para os tomadores da mão de obra avulsa e para as fiscalizações competentes os documentos que comprovem o efetivo pagamento das remunerações devidas aos trabalhadores avulsos; zelar pela observância das normas de segurança, higiene e saúde no trabalho; firmar Acordo ou Convenção Coletiva de Trabalho para normatização das condições de trabalho (Lei n. 12.023/91, artigo 5º, I a VI).
Outrossim, agiu com prudência o legislador ao estabelecer a responsabilidade pessoal e solidária dos dirigentes sindicais quanto aos valores devidos e pagos pelos tomadores do serviço, relativos à remuneração do trabalhador avulso. Igualmente, são responsáveis solidariamente as empresas tomadoras pela efetiva remuneração do trabalho contratado junto ao sindicato profissional (Lei n. 12.023/91, artigos 5º, § 1º, e 8º).
Compete ao tomador de serviço pagar, no prazo máximo de 72 (setenta e duas) horas úteis, contadas a partir do encerramento do trabalho requisitado ao sindicato, os valores devidos pelos serviços prestados ou dias trabalhados, acrescidos dos percentuais relativos a repouso remunerado, 13º salário e férias acrescidas de 1/3 (um terço), para viabilizar o pagamento do trabalhador avulso, bem como os percentuais referentes aos adicionais extraordinários e noturnos. É também de responsabilidade do tomador o recolhimento do FGTS acrescido dos percentuais relativos ao 13º salário, férias, encargos fiscais, sociais e previdenciários (Lei n. 12.023/91, artigo 6º, I a III).
São também responsáveis as empresas tomadoras pelo recolhimento dos encargos fiscais e sociais, pelas contribuições ou de outras importâncias devidas à Seguridade Social, no limite do uso que fizerem do trabalho avulso intermediado pelo sindicato, bem como pelo fornecimento dos Equipamentos de Proteção Individual e por zelar pelo cumprimento das normas de segurança no trabalho (Lei n. 12.023/91, artigos 8º e 9º).
Interessante observar que, ao contrário do regime estabelecido para os trabalhadores avulsos nos portos (Lei 8.630/93, artigo 18, VII), ao tomador de serviços recai a obrigação do recolhimento do FGTS referente aos movimentadores de carga, o que dificulta ao sindicato profissional verificar o cumprimento da referida obrigação, já que não haveria a obrigação legal do tomador informar ao sindicato a respeito remetendo-lhe, por exemplo, cópias das guias de recolhimento.
Esse problema pode ser resolvido no âmbito do acordo ou da convenção coletiva de trabalho que, como visto, é requisito essencial para a intermediação de trabalhadores avulsos pelo sindicato profissional. Quer dizer, caberá ao sindicato profissional e ao tomador estabelecerem no instrumento coletivo cláusula referente à obrigação do tomador em remeter ao sindicato profissional cópias das guias do FGTS, a fim de essa possa verificar o cumprimento da obrigação em prol do interesse dos trabalhadores representados.
Referência
BARROS, Alice Monteiro de. Contratos e regulamentações especiais de trabalho. São Paulo: LTr, 2002.