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Guerra de Buritis:

sobre o STF e o caso da fazenda de Fernando Henrique

01/10/2000 às 00:00
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Para quem lê a integra da nota divulgada pelo Palácio do Planalto sobre a decisão do STF que negou o pedido de liminar formulado em mandado de segurança impetrado pelo Governo do Estado de Minas Gerais, mesmo sendo um neófito em direito constitucional, fica com a sensação que a insanidade assola aqueles a quem a própria Constituição designa como guardiões.

Afirmar que a decisão presidencial não se submete ao juízo de outras autoridades, é no mínimo um rompante de arrogância e autoritarismo, se não bastasse isso, só podemos ficar atônitos quando lemos na nota presidencial: "que para os objetivos de manutenção da autoridade presidencial, é irrelevante a qualificação jurídica dos imóveis utilizados pelo Presidente da República. Assumem relevo a identificação e o vínculo do imóvel com a figura do Chefe do Poder Executivo. É, portanto, relevante a relação simbólica com a autoridade institucional".


Como a imprensa amplamente divulgou, a fazenda Córrego da Ponte, localizada em Buritis-MG pertence a uma empresa da qual duas filhas do Presidente Fernando Henrique Cardoso são sócias. Li e reli a Constituição várias vezes à procura de um fundamento constitucional, procurei também alguma Lei ordinária que justifique o emprego de tropas federais para proteger a Fazenda da Família de FHC e juro não encontrei.

Os defensores de FHC dirão que trata tal medida do chamado Estado de Defesa previsto no art. 136 da Constituição, "onde o Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente reestabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza". Creio que o fato de um grupo de trabalhadores sem terra, que vêem reiteradas vezes tirando a paciência dos habitantes do planalto central, precisamente, do Palácio do Planalto, terem acampado pacificamente frente à fazenda de Buritis não configura nenhuma iminente instabilidade institucional ou uma calamidade de grande proporção que justifique o emprego das forças armadas para proteger a fazenda das filhas de FHC, onde 50 % pertence, segundo o líder do MST João Pedro Stedille, ao senhor Jovelino Mineiro, que é grileiro de terras públicas no Pontal.

As regras do Estado de Direito estão sendo usadas para o exercício do autoritarismo, FHC ao se fazer representar no STF pelo seu amigo, o Ministro Nelson Jobim, fazendo que o mesmo vilipendie a Constituição presta um desserviço ao processo de consolidação democrática em que em muitos momentos da sua trajetória política o Presidente disse defender. A Supremacia da Constituição é uma valor e uma conquista da cidadania, que não pode ficar passiva diante de tantos desmandos do nosso Príncipe esclarecido, onde a guerra de Buritis que não veio só é mais um exemplo.

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Sobre o autor
Maurício Leal Dias

advogado em Belém (PA), mestre em Direito pela UFPA

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DIAS, Maurício Leal. Guerra de Buritis:: sobre o STF e o caso da fazenda de Fernando Henrique. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 46, 1 out. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1885. Acesso em: 25 abr. 2024.

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