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Dos limites subjetivos da eficácia da coisa julgada

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CONCLUSÃO

Como de início consignado, o presente trabalho objetivou analisar o clássico problema envolvendo os limites subjetivos da eficácia da coisa julgada.

A estabilidade das relações jurídicas e a proteção à certeza e confiança do cidadão perante o Estado são as diretrizes que norteiam o fenômeno da coisa julgada como direito fundamental estabelecido na ordem constitucional pátria.

Pontue-se que só há de se falar em indiscutibilidade da sentença fora do processo, ou seja, em situações externas à relação processual, quando existe a coisa julgada material.

Para que se viabilize a formação da coisa julgada material, há que se garantir que a sentença seja capaz, de fato, de declarar a existência ou não de um direito, ou seja, há necessidade da realização de cognição judicial exauriente, no sentido de conferir ao Poder Judiciário a oportunidade de aprofundar-se no exame dos fatos e do direito, de modo a compatibilizar a segurança jurídica proveniente da imutabilidade da sentença com a justiça da decisão.

Nos termos da ordem constitucional pátria, a coisa julgada não é instrumento de justiça, visto que não objetiva assegurar a "justiça das decisões", ligando-se, inexoravelmente, à noção de verdade. A coisa julgada tem o fito de, em atenção à segurança jurídica como postulado do Estado Democrático de Direito, impor definitividade à solução da lide então confiada ao Poder Judiciário.

Várias são as teorias sobre a coisa julgada no direito processual. Com fulcro na concepção do art. 467 do CPC, segundo o qual a coisa julgada é um efeito da sentença, tem-se que o legislador pátrio de 1973 aderiu à teoria alemã.

Contudo, mostra-se mais adequado à realidade prática e compatível com as implicações processuais do instituto da coisa julgada material no Brasil a concepção segundo a qual a coisa julgada consiste na imutabilidade do comando dispositivo da decisão. O próprio art. 468 do CPC contempla tal tese ao prescrever que: "a sentença, que julgar total ou parcialmente a lide, tem força de lei nos limites da lide e das questões decididas". Temos aí os chamados "limites objetivos da coisa julgada".

De toda forma, somente se submeterá à coisa julgada material a norma jurídica concreta - situada na parte dispositiva da sentença - decorrente da atuação da jurisdição, que julga, de forma profunda e exauriente, a questão principal posta na demanda. Logo, só haverá coisa julgada em relação à questão abordada em caráter principaliter tantum.

A parte inicial do art. 472 do CPC oferece a regra geral sobre os limites subjetivos da coisa julgada: "a sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros".

Resta claro, assim, a título de regra geral, que somente as partes ficam vinculadas à decisão judicial que estabelece a lei do caso concreto. Afinal, foram elas, sujeitos da relação jurídica deduzida em juízo, que, sob o pálio do contraditório e ampla defesa, tiveram condições de influenciar na função jurisdicional. Dessa forma, tais partes passam a se sujeitar à resposta jurisdicional quanto à questão posta em juízo e, não sendo esta mais passível de discussão (esgotamento das vias recursais), o conteúdo da decisão torna-se imutável àquelas partes.

Ocorre que, no ordenamento jurídico pátrio, existem exceções à regra estatuída no art. 472 do CPC. Tratam-se daqueles casos em que a eficácia da coisa julgada se estende àqueles que não participaram do processo, ou seja, às partes.

O termo "parte" no direito processual apresenta uma acepção polissêmica.

Fala-se em parte em sentido formal como sendo aquele que demanda, aquele em cujo nome se demanda e aquele em face de quem se demanda a atuação da vontade concreta da lei. Por outro lado, a parte em sentido material é aquele que integra a relação jurídica discutida em juízo.

Portanto, por enquadrar-se no conceito de parte, na acepção material, não se pode considerar o substituído processual como terceiro atingido pela imutabilidade característica da coisa julgada. Assim, para o substituído, aplica-se a regra geral estatuída no art. 472 do CPC.

Delimitado o polissêmico conceito de "parte", temos que a concepção de "terceiro" é resultante de um juízo de exclusão, segundo o qual, o que não for parte (material ou formal), será terceiro.

Com efeito, tratando a sentença de ato emanado do Estado, terá, indubitavelmente, eficácia erga omnes, todavia, seus efeitos serão imutáveis apenas inter partes. Por outro lado, demonstrando a injustiça da decisão, poderão os terceiros destruir a eficácia do ato que os atinge.

Resta claro que os terceiros indiferentes não mantêm nenhuma relação jurídica concernente àquela deduzida em juízo e, em sendo assim, não possuem qualquer interesse jurídico na solução do litígio, motivo pelo qual não são admitidos a intervir no processo na qualidade de "sujeito interessado".

Noutro prumo, tratando-se de sujeitos que possuam interesse de ordem jurídica em relação ao litígio e, consequentemente, à solução judicial delineada, apresentam legitimidade para oporem-se à afetação de sua esfera jurídica por tais efeitos.

Conclui-se que, enquanto a eficácia da sentença pode trazer prejuízo ao terceiro, a imutabilidade da decisão vincula-o tão-somente quando lhe propiciar benefício.

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Notas

  1. Chiovenda apud MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de Conhecimento. São Paulo: RT, 2009, p. 643.
  2. MARQUES, José Frederico. Manual de Direito Processual Civil, vol. 3. São Paulo: Saraiva, 1980, p. 226.
  3. MARINONI, op. cit., p. 644.
  4. Cf. MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de Conhecimento. São Paulo: RT, 2009, p. 643.
  5. É válido lembrar que a concepção que preceitua ser a coisa julgada formal é modalidade de preclusão não é compartilhada por diversos doutrinadores de escol. LUIZ EDUARDO MOURÃO aduz que "coisa julgada formal é a indiscutibilidade externa (fora do processo), que se refere às decisões cujo conteúdo é processual (art. 267 do CPC), em contraposição à coisa julgada material, que é a mesma indiscutibilidade externa, só que das decisões de mérito (art. 269 do CPC), distinguindo-se ambas de preclusão, que opera efeito dentro do processo (indiscutibilidade interna)" (apud DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil, vol. 2. Salvador: Jus Podivm, 2007, p. 480). Tal distinção auxiliaria na compreensão do que se preconiza no art. 268 do CPC, em que se veda a repropositura de demanda cujo processo inicial fora extinto sem resolução de mérito. Note-se que, para o mencionado autor, por produzir efeitos externos e versar sobre questão meramente processual, trata-se de coisa julgada formal e não de preclusão.
  6. Op. cit., p. 645.
  7. Cf. DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil, vol. 2. Salvador: Jus Podivm, 2007, p. 478.
  8. Ibidem, p. 478.
  9. DIDIER JR., op. cit., p. 482.
  10. Por todos: DIDIER JR., op. cit., p. 482.
  11. in Eficácia e autoridade da sentença. 2. ed. Trad. Alfredo Buzaid e Benvindo Aires. Rio de Janeiro: Forense, 1981.
  12. in Institutos de Direito Processual Civil, vol. 3. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 303-304.
  13. in Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, vol. 3. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 57-58.
  14. in Manual de Direito Processual Civil, vol. 3. São Paulo: Saraiva, 1980, p. 226.
  15. in Temas de direito processual: 3ª Série. São Paulo: Saraiva, 1984, p. 108-109.
  16. Op. cit., p. 485.
  17. Ibidem, p. 483-484.
  18. apud CRUZ E TUCCI, José Rogério. Limites subjetivos da eficácia da sentença e da coisa julgada civil. São Paulo: RT, 2007, p. 25.
  19. apud DIDIER JR., op cit., p. 485.
  20. DIDIER JR., op cit., p. 239.
  21. Oportunamente, sobre o fato de não ficar acobertada pela coisa julgada a fundamentação da sentença, aduz FREDIE DIDIER JR. (op. cit., p. 235) que "é justamente por isso que (...) o reconhecimento, como questão incidental (fundamento), da paternidade numa ação em que se pedem alimentos pode ser objeto de discussão em outro processo, seja como questão principal ou, novamente, como questão incidental".
  22. Op. cit., p. 656-657.
  23. DIDIER JR., op. cit., p. 487.
  24. Partes, terceiros e coisa julgada (os limites subjetivos da coisa julgada). In: DIDIER JR., Fredie; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (coords.). Aspectos polêmicos e atuais sobre os terceiros no processo civil e assuntos afins. São Paulo: RT, 2004, p. 203.
  25. Op. cit., p. 35-36.
  26. apud CRUZ E TUCCI, José Rogério. Limites subjetivos da eficácia da sentença e da coisa julgada civil. São Paulo: RT, 2007, p. 226.227.
  27. in Substituição Processual. In: DIDIER JR., Fredie (org.). Leituras Complementares de Processo Civil. Salvador: Jus Podivm, 2009, p. 62-63.
  28. No tocante à coisa julgada, o princípio da relatividade deve ser entendido com a diretriz segundo a qual a coisa julgada material vale apenas inter partes.
  29. CRUZ E TUCCI, op. cit., p. 40-41.
  30. Cf. MARINONI, op. cit., p. 653.
  31. MARINONI, op. cit., p. 654.
  32. Cf. MARINONI, op. cit., p. 653.
  33. CRUZ E TUCCI, op. cit., p. 191. O próprio autor esclarece que em tal situação, "a extensão ultra partes geralmente ocorre porque o terceiro, no plano do direito material, situa-se na mesma posição jurídica de um dos demandantes ou então é titular de relação conexa com a res de qua agitur. É mais do que suficiente, para esclarecer tal hipótese, o enunciado do art. 274 do Código Civil: ‘O julgamento contrário a um dos credores solidários não atinge os demais; o julgamento favorável aproveita-lhes...’" (op. cit., p. 209).
  34. Ibidem, p. 176.
  35. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Mandado de Segurança. Matéria Cível. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 14.554/PR . Relator: Min. Francisco Falcão. Brasília, DF, 28 de outubro de 2003. Lex: Diário de Justiça da União, data: 15/12/2003, p. 181.
  36. Cf. CRUZ E TUCCI, op. cit., p. 209.
  37. Op cit., p. 150.
  38. Ibidem, p. 240.
  39. apud CRUZ E TUCCI, op cit., p. 242.
  40. Posicionando pela admissibilidade do litisconsórcio necessário ativo: NELSON NERY JR., CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO, JOSÉ ROBERTO DOS SANTOS BEDAQUE, ARRUDA ALVIM, LUIZ GUILHERME MARINONI e JOSÉ MIGUEL GARCIA MEDIDA. Todos por DIDIDER JR., op cit., p. 285-286.
  41. In Curso de Direito Processual Civil, vol. 1. Salvador: Jus Podivm, 2007, p. 287.
  42. Op cit., p. 249.
  43. in Partes e terceiros no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 103.
  44. CRUZ E TUCCI, op cit., p. 250.
  45. in Coisa Julgada e sua Revisão. São Paulo: RT, 2005, p. 101-102.
  46. É essa também a lição de TUCCI E CRUZ (op cit., p. 252).
  47. in Curso de Direito Processual Civil, vol. 1. Salvador: Jus Podivm, 2007, p. 294.
  48. Art. 91. O juiz, quando necessário, ordenará a citação de terceiros, para integrarem a contestação. Se a parte interessada não promover a citação no prazo marcado, o juiz absolverá o réu da instância.
  49. CRUZ E TUCCI, op cit., p. 37.
  50. Cumpre observar que pelo atual estágio do constitucionalismo brasileiro não mais se pode coadunar com a concepção liberal de direito individual calcado na prevalência absoluta da autonomia da vontade privada (individualismo possessivo). Forjada a partir da teoria contratual de LOCKE, "essa concepção do individualismo possessivo influenciará, em parte, decisivamente,a teoria liberal dos direitos fundamentais que os considerará sempre como direitos de defesa do cidadão perante o Estado, devendo abster-se da invasão da autonomia privada" (GOMES CANOTILHO, José Joaquim. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2008, p. 384). Destarte, para o próprio LOCKE, assim como para ROUSSEAU, a liberdade do indivíduo deveria ser compreendida como "liberdade perante o Estado-sociedade", de modo que a liberdade não seria observada de modo absoluto, dado que estaria limitada aos direitos dos outros.
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Sobre o autor
Victor Aguiar Jardim de Amorim

Doutorando em Constituição, Direito e Estado pela UnB. Mestre em Direito Constitucional pelo IDP. Coordenador do Curso de Pós-graduação em Licitações e Contratos Administrativos do IGD. Professor de pós-graduação do ILB, IDP, IGD, CERS e Polis Civitas. Por mais de 13 anos, atuou como Pregoeiro no Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (2007-2010) e no Senado Federal (2013-2020). Foi Assessor Técnico da Comissão Especial de Modernização da Lei de Licitações, constituída pelo Ato do Presidente do Senado Federal nº 19/2013, responsável pela elaboração do PLS nº 559/2013 (2013-2016). Membro da Comissão Permanente de Minutas-Padrão de Editais de Licitação do Senado Federal (desde 2015). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Administrativo (IBDA). Advogado e Consultor Jurídico. Autor das obras "Licitações e Contratos Administrativos: Teoria e Jurisprudência" (Editora do Senado Federal) e "Pregão Eletrônico: comentários ao Decreto Federal nº 10.024/2019" (Editora Fórum). Site: www.victoramorim.com

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AMORIM, Victor Aguiar Jardim. Dos limites subjetivos da eficácia da coisa julgada. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2841, 12 abr. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18883. Acesso em: 22 nov. 2024.

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