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Argumentos em defesa da Tabela Price.

Comprovação prática da inexistência de anatocismo ou de capitalização composta das taxas de juros

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14/08/2011 às 08:53
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IV. TABELA PRICE E CORREÇÃO MONETÁRIA

Percebendo que por ocasião da aplicação da correção monetária, esta muitas vezes desnatura a finalidade da Tabela Price fazendo com que no final do financiamento o saldo devedor não reste zerado, e atentando-se para o fato de que possivelmente muitos juízes, juristas, estudiosos e doutrinadores acabam sendo induzidos a erro no entendimento e formulação de um correto julgamento a respeito da Tabela Price, por interpretar tal aplicação como ocasião da capitalização composta de juros, e não da correção monetária, passamos a esclarecer os efeitos da incorreta aplicação da correção monetária em financiamentos de longo prazo.

Em economias de grande inflação, que oneram o poder de compra da moeda, desgastando-o sobremaneira, os contratos de longo prazo, especialmente os financiamentos do Sistema Financeiro da Habitação, não comportam em suas taxas de juro, percentual suficiente para re-equilíbrio do poder de compra da moeda desgastado, tendo de ser aplicada a competente correção monetária.

A aplicação dessa correção monetária, contudo, nos valores da prestação e nos valores do saldo devedor, devem ser iguais. Ou seja, deve ser aplicado o mesmo índice de correção monetária, tanto para a prestação, quanto para o saldo devedor. Assim fazendo, a Tabela Price será integralmente respeitada, operando-se da maneira como explicitada acima.

No entanto, freqüentemente se vê, sobretudo nos financiamentos do Sistema Financeiro da Habitação, por ocasião de políticas do Governo, a aplicação de um índice de correção monetária para os valores das prestações mensais, e outro, para os valores do saldo devedor. Essa aplicação incorreta da correção monetária desnatura e distorce o financiamento habitacional de diferentes maneiras. Vejamos os cenários possíveis.

1) É possível que as prestações sejam corrigidas por índices menores que os aplicados ao saldo devedor. Neste caso, sendo o juro calculado pelo saldo devedor, sempre será nele computada a diferença da correção, ocasionando, por conseguinte, uma menor amortização que a devida, caso os índices de correção fossem uniformes. Assim, a diferença dessa amortização a menor em relação a que existiria caso os índices de correção monetária fossem uniformes, ocasionará um resíduo na amortização do mês.

Evoluindo dessa forma até o final do financiamento, não será possível a extinção da dívida, haja vista que todos os valores desses desajustes de correção aplicados mensalmente resultarão num saldo residual a ser pago, saldo este que de maneira nenhuma provém da capitalização, mas da diferença na aplicação de correção monetária não uniforme para a prestação e o saldo devedor do financiamento.

2) A segunda possibilidade é extensão da primeira. É possível que os índices de correção aplicados às prestações sejam demasiadamente menores que os aplicados ao saldo devedor, de tal forma que a prestação corrigida não seja muitas vezes nem mesmo suficientes para pagar os juros calculados com base no saldo devedor corrigido.

Neste caso, não sendo possível pagar o total dos juros, haverá um remanescente de juros a ser pago, que por ser débito do mutuário, incorporar-se-á ao saldo devedor. A este fenômeno, dá-se o nome de amortização negativa, haja vista que a prestação paga do mês resultará num saldo devedor referente aos juros remanescentes.

Advertimos que neste caso haverá incidência de anatocismo, porém importante frisar que este anatocismo em nada se relaciona com a utilização da Tabela Price, mas sim com a distorção ocasionada pela aplicação incorreta da correção monetária, já que esta anomalia poderá acontecer com todos os sistemas de amortização existentes (SAC; SACRE; SAM e etc).

3) A terceira possibilidade é exatamente inversa às outras duas. Ocorre quando os índices de correção monetária aplicados às prestações são maiores que os índices aplicados ao saldo devedor. Aqui, o valor da amortização será sempre maior que o valor previsto caso os índices de correção monetária fossem uniformes. Isto porque os juros serão calculados com base no saldo devedor corrigido por índice menor, e subtraídos de amortização corrigida com maior índice, o que resulta numa amortização maior. Assim sendo, o que haveria seria a quitação do financiamento antes do prazo final do contrato.

Da análise dos cenários expostos acima, conclui-se que as distorções eventualmente ocasionadas na Tabela Price não são causadas por conta da incidência de juros sobre juros, ou anatocismo, mas por ocasião da aplicação incorreta da correção monetária, em índices distintos para as prestações e para o saldo devedor.

Todavia, se utilizados índices uniformes, tanto para as prestações, como para o saldo devedor, a Tabela Price em nada se altera em seu funcionamento, permanecendo incólume e perfeito o plano de financiamento, que será liquidado invariavelmente quando do pagamento da última prestação.


V. TABELA PRICE E SISTEMAS DE AMORTIZAÇÃO

Os críticos da Tabela Price, ainda não convencidos das incontestáveis teses acima cabalmente demonstradas, afirmam que outros Sistemas de Amortização, como o Sistema de Amortização Constante (SAC), oferecem mais vantagens aos mutuários que a Tabela Price, já que ao final do financiamento a soma dos juros atinge quantia menor do que àqueles calculados num financiamento pela Tabela Price, presumindo que isso ocorreria devido à cobrança de juros de forma composta na mesma.

Todavia, o entendimento supra, decorre da falta de conhecimentos técnicos elementares de finanças, haja vista que tanto a Tabela Price como qualquer outro Sistema de Amortização são sistemas de amortização absolutamente equivalentes, ou seja, em que pesem serem os valores finais dos pagamentos de cada sistema, diferentes, em qualquer sistema de amortização o mutuário sempre amortiza 100% da dívida, e sempre paga juros proporcionais ao saldo devedor de cada período.


VI. TABELA PRICE X MÉTODO DE GAUSS

Quanto a sistemas de amortização de dívidas tem-se visto, ainda, no âmbito do Judiciário Brasileiro, a constante incidência de casos em que por ordem judicial o sistema Price tem sido substituído pelo mais novo sistema denominado Método de Gauss, sob o fundamento de que este último não calcula juros compostos, mas tão-somente juros simples no decorrer de todo o período do financiamento.

Como se vê, o ponto central de base para que se opere referida substituição concentra-se no equivocado entendimento de que a Tabela Price calcula juros compostos e o Método de Gauss, juros simples. Todavia, tal entendimento realmente é equivocado. Primeiro, porque a Tabela Price não calcula juros compostos, como já se demonstrou por todos os meios possíveis anteriormente. Segundo, porque o Método de Gauss não se presta a amortização de dívidas, não sendo um sistema de amortização, conforme passamos a demonstrar e analisar pormenorizadamente.

Inicialmente, insta esclarecer que o Método de Gauss foi originalmente formulado pelo matemático e renomado cientista, Sr. Karl Friederich Gauss, que deu continuidade aos estudos de Abraham de Moivre sobre o que se denomina na matemática de curva normal, utilizada no campo da estatística, a qual ficou posteriormente conhecida como distribuição de Gauss, ou curva normal de distribuição de erros.

Para melhor entender o Método de Gauss, portanto, necessário se faz entender, ainda que não profundamente, a respeito da curva normal de distribuição de erros, e para tanto, transcrevemos o exemplo da época para explicação, exemplo este denominado de lei dos grandes números de Bernoulli: numa situação de eventos casualóides, onde as alternativas são independentes, obter coroa em lances de uma moeda de cara e coroa, tem a probabilidade matemática exata de 50% (porque são somente dois eventos possíveis: cara ou coroa), mas na prática esta probabilidade de 50% é apenas aproximada.

Ou seja, efetuando, por exemplo, quatro lances, segundo a média exata, as moedas cairão duas vezes coroa, e duas vezes cara, porém assim não ocorre na prática, pois é possível que dos lances seja resultado quatro, três, dois, ou um lance que resulte em cara ou coroa. Logo, a média de 50% é aproximada, e não exata, de tal forma que à medida que os lances aumentam, a proximidade com a média é maior.

Assim elaborou-se a curva normal de distribuição de Gauss, onde a média exata é o vértice da curva, e as aproximações são os lados da curva, que decaem para a esquerda e para a direita, formando uma imagem de sino, de tal sorte que se entendeu que a média da curva é a norma, isto é, as coisas todas deviam ser como a média, de forma que tudo que se desvia da média é considerado erro - à esquerda, erros que subestimam a média; à direita, erros que superestimam a média - distribuindo-se, portanto, os erros em relação à média.

Da análise do esquema, portanto, forçoso concluir que o Método de Gauss calcula aproximações, bem como que o método, como originalmente concebido, não se presta a amortizações de dívidas, visto que o matemático Karl Friederich Gauss dedicou-se ao estudo da estatística e da curva normal, com enfoque especial em dados astronômicos, que em nada se relacionam à Matemática Financeira ou à amortização de dívidas, e que, portanto, não podem ser utilizados neste campo.

Para demonstrar a impropriedade do método como sistema de amortização de dívidas, faremos a análise minuciosa do mesmo, buscando comprovar que na prática não se presta a este fim, sendo, como se relatou, um método da estatística de aproximação e distribuição de erros. Para tanto, iniciaremos a exposição pelo modo de cálculo das prestações, para após analisarmos o desenvolvimento dos pagamentos de juros e amortização, vez que o cálculo dos juros tem como requisito o valor da prestação.

Assim, a fórmula matemática do cálculo da prestação é expressa da seguinte maneira:

Utilizando o exemplo que citamos para o cálculo da Tabela Price, de financiamento no valor de R$ 10.000,00, à taxa de juros de 1% ao mês, no prazo de 12 meses, e substituindo os dados na fórmula, constataremos o seguinte:

O valor resultante no numerador será de 11.200,00; o valor resultante do denominador será de 12,66, e o valor da prestação será igual a R$ 884,68, pouco abaixo do valor encontrado pela Tabela Price, de R$ 888,49.

Diante dessas conclusões e resultados, algumas ponderações se impõem.

Note-se que a fórmula constante do numerador da fórmula é exatamente igual à fórmula de cálculo dos juros simples. Ou seja, o numerador da fórmula do Método de Gauss calcula o valor dos juros simples distribuído por todo o período do financiamento: R$ 11.200,00.

Já o denominador apresenta o cálculo de um fator de distribuição dos erros no decorrer do financiamento, nos moldes da curva normal de distribuição de erros acima explicada, a fim de oferecer, como acima demonstrado, um cálculo por aproximação do que se entende por exato, ou normal.

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Tal assertiva é confirmada pelo valor resultante da fórmula do denominador. Veja que ali se encontra o valor de 12,66, que significa o prazo do financiamento (12 meses), somado a um acréscimo de 0,66, provavelmente decorrente da aproximação do cálculo de distribuição de erros da curva normal. Caso fosse um cálculo exato, o valor do denominador seria 12, e não 12,66.

O valor da prestação (884,68) simboliza esta distribuição, pois é o resultado da divisão de R$ 11.200,00 (valor total do financiamento somado aos juros simples do período), pelo fator divisor 12,66 (prazo do financiamento acrescido de um fator de distribuição dos erros). O cálculo da prestação se trata, portanto, de uma média aritmética simples que utiliza um fator de distribuição de erros, proveniente da curva normal de distribuição de erros dos estudos de estatística de Gauss.

Na forma de cálculo dos juros, esta aproximação e conseqüente distribuição de erros é mais facilmente visualizada. Isto porque o cálculo dos juros é elaborado a partir de uma segunda fórmula, que calcula um determinado coeficiente multiplicador do número de prestações restantes do financiamento. Vejamos, então, a composição desta fórmula, para após, analisarmos como se dá o pagamento de juros e amortização no decorrer do financiamento que utiliza o Método de Gauss.

Em nosso exemplo, o coeficiente seria 7,899487. Para cálculo dos juros, em cada período, deve-se, multiplicá-lo pelo valor das prestações restantes para o término do financiamento. Assim, em nosso exemplo, no primeiro mês o coeficiente deve ser multiplicado por 12; no segundo mês, o mesmo coeficiente deve ser multiplicado por 11; no terceiro, por 10, e assim sucessivamente, até o último mês, quando será multiplicado por 1. Vejamos a evolução dos pagamentos.

A partir desse cálculo de juros, que não tem por fundamento o saldo devedor, mas sim um coeficiente previamente determinado que é multiplicado pelo número de prestações restantes, é que se verifica o cálculo por aproximação que faz o Método de Gauss. Ou seja, o Método de Gauss não calcula 1% de juros ao mês, mas sim um valor aproximado de juros. Dividindo-se o valor do saldo devedor pelo valor dos juros cobrados obtém-se a taxa realmente praticada em cada período. Vejamos, então, no caso prático, quais os percentuais das taxas de juros praticadas em cada período:

Como se percebe, as taxas de juros efetivamente praticadas em cada período não alcançaram o percentual de 1% ao mês, sendo inferiores a esta, sendo que ao final do financiamento verificou-se uma taxa efetivamente praticada de 11,09% ao ano, também bem inferior aos 12% ao ano inicialmente contratado.

Dessa análise, verifica-se que o Método de Gauss calcula os juros por aproximação, utilizando-se da curva normal de distribuição de erros concebida por Gauss para cálculo no campo da estatística, pois em vez de calcular 12% ao ano, ou 1% ao mês, presta-se a calcular 11,09% ao ano de juros, e taxas mensais que variam de 0,90% a 0,95%.

De todo o estudo realizado a respeito do Método de Gauss, forçoso concluir que embora o método calcule prestações menores que as da Tabela Price, vale-se de cálculos por aproximação para tanto, utilizados no campo da estatística para distribuição de erros, bem como não se presta a cumprir estritamente com o que fora estipulado em contrato, nesse ponto prejudicando tanto o financiador quanto o tomador do empréstimo, sendo certo que, por fim, não se presta a finalidade de amortização de dívidas.


IX. CONCLUSÃO

De todo o exposto, forçoso concluir que o uso da Tabela Price utilizada como sistema de amortização de empréstimos em parcelas, não enseja a capitalização composta das taxas de juros, ou cobrança de juros dos juros, vez que, pela fórmula de cálculo que adota, sua prestação é constante e uniforme, valendo-se para o tomador do empréstimo de eficaz instrumento de planejamento financeiro de suas dívidas, bem como de inigualável praticidade, pois extingue totalmente a dívida ao final do empréstimo.

A assertiva supra é facilmente comprovada quando se percebe que os juros são calculados sobre o saldo devedor do período precedente ao considerado, e não se somam ao saldo devedor remanescente, que é resultado da subtração da parcela atinente à amortização do saldo devedor do período anterior quando a prestação é normalmente paga.

No mais, sua fórmula de cálculo de prestação, que se vale do fator TP, também não capitaliza juros, vez que não se trata de sistema que leva em conta os juros compostos, mas adota o que na Matemática Financeira se denomina desconto composto de juros, justificando, assim, a existência do fator exponencial em sua fórmula.

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Sobre o autor
Leonardo Carlo Biggi de Paiva

Advogado e Financista

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PAIVA, Leonardo Carlo Biggi. Argumentos em defesa da Tabela Price.: Comprovação prática da inexistência de anatocismo ou de capitalização composta das taxas de juros. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2965, 14 ago. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19721. Acesso em: 2 nov. 2024.

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