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Da necessidade de adesão do Brasil à convenção da ONU sobre contratos de compra e venda internacional de mercadorias

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4. Possibilidade de utilização da Arbitragem nos Contratos Internacionais

Conforme afirma a jurista Georgette Nacarato Nazo, professora emérita da Faculdade de Direito de Itu-SP:

"[...] A arbitragem em sentido amplo caracteriza-se todas as vezes que um conflito de interesses for solucionado através da decisão de um terceiro que não esteja investido das funções de magistrado. É a autonomia de vontade das partes, que podem escolher o direito material e processual aplicável à solução da controvérsia, assim como fazer decidir o litígio com base nos princípios gerais do direito, nos usos e costumes ou nas regras internacionais do comércio" 12

A arbitragem no Brasil permaneceu dormente por décadas, e as condições a ela relativas estavam como letra morta. As dificuldades impostas por um modelo superado, jogaram-na num estado de perda de essência, sem que se tivesse qualquer esperança quanto à sua real utilidade.

No entanto, a promulgação e vigência, a partir de novembro de 1996, da Lei n° 9.307, de 23 de setembro de 1996, fizeram como que num passe de mágica, a exemplo do que ocorreu no conto infantil, que a sociedade acordasse para a importância desse mecanismo extrajudicial de solução de controvérsias e nele encontrasse um meio eficiente de busca da estabilidade social.

Com o advento da nova Lei produziu-se um fenômeno de renascimento do instituto no Brasil, desenhada que foi de acordo com as mais modernas teorias e fundamentos desenvolvidos em países que dela se servem há muito tempo.

A nova Lei colocou o Brasil na dianteira da modernidade, dotando-o de uma legislação afinada com as conquistas obtidas pela arbitragem ao longo dos anos em que esta, no Brasil, estava dormente.

Nesse sentido, a Lei de Arbitragem brasileira (Lei n.º 9307/96) consagra, no seu Art. 2º, § 1º, a autonomia da vontade das partes, ao conferir-lhes a possibilidade de escolher livremente as regras de Direito aplicáveis durante o procedimento arbitral, desde que não haja violação dos bons costumes e da ordem pública. 13

É certo, pois, dizer que a arbitragem é forma de solução dos conflitos, na qual as partes envolvidas convergem as suas vontades no intuito de eleger uma ou mais pessoas, terceiro, distinto dos envolvidos, para que aprecie a demanda e profira uma decisão, que previamente, se comprometem a aceitar e cumprir.

Desse modo, o contratante brasileiro poderá decidir pela aplicação da Convenção de Viena ao submeter eventual disputa à arbitragem, ocasião em que um terceiro investido na função de árbitro julgará com base nos preceitos da CISG.

A escolha pela arbitragem é no nosso ordenamento jurídico, voluntária ou facultativa, a teor da maioria das legislações estrangeiras. Ela é instituída através de cláusula compromissória ou do compromisso arbitral, aquela expressa no contrato, e esta consistente numa convenção entre as partes que submetem litígio atual aos termos da arbitragem. Seu início se dá após a aceitação e nomeação do árbitro e termina com a sentença arbitral.

Para o ilustre jurista e advogado Carlos Alberto Carmona, os motivos que levam as partes a escolher a solução do conflito pela arbitragem são:

"[...] A ausência de formas solenes, a possibilidade de julgar por equidade ou escolher livremente a lei a ser aplicada e ainda a neutralidade dos árbitros na solução de litígios envolvendo partes de nacionalidade diferentes, além da especialização." 14

Assim, será primordial para definir a nacionalidade de uma arbitragem na resolução de um conflito internacional, o lugar onde o tribunal arbitral adotar a sua sede, a nacionalidade ou domicílio das partes envolvidas. Como regra geral, a lei que regular a arbitragem será, de fato, a lei dessa nacionalidade. A arbitragem é uma excelente opção a jurisdição estatal, mas será preferível que as partes tenham posição de igualdade jurídica dentro da lide.

Talvez por isso, tal juízo seja mais bem aplicado em relações jurídicas entre empresas, Estados e outras entidades que tenham igualdade na relação contratual, tal como ocorre no âmbito do direito internacional privado.


5. Da necessidade de adesão do Brasil à CISG

O fundamento para que o Brasil possa aderir ao texto da Convenção de Viena é esperado há muitos anos, como sendo em primeiro lugar a necessidade de harmonizar as regras contratuais de compra e venda de mercadorias.

A importância surge através do pensamento que se tem sobre a diminuição da insegurança jurídica com relação às normas vigentes, pois tal diminuição contribuirá ainda mais para o aumento das exportações, e dos negócios de compra e venda entre pessoas residentes e ou domiciliadas nos Estados signatários.

Todavia, não basta apenas a ratificação da Convenção de Viena, é preciso que os países signatários a apliquem efetivamente, principalmente no que se refere aos contratos de compra e venda internacionais de mercadorias.

Se o Brasil assim proceder, isto é, na busca da harmonização de suas normas e efetivamente aplicar os tratados, acordos e convenções multilaterais que ratificar, ele estará se aproximando do modelo europeu, ou seja, do bem sucedido modelo de integração utilizado pela Comunidade Européia.

A adesão do Brasil ao texto da Convenção de Viena pode, e muito, contribuir para a capitação de investimentos externos, aumentando assim seu poderio econômico para se consolidar no novo cenário dos gigantes.

Sobre a presença no comércio internacional já sustentavam os juristas Iulia Dolganova e Marcelo Boff Lorenzen:

"[...] Do ponto de vista econômico, são marcantes a presença do Brasil no comércio internacional e a sua concomitante ausência relativamente a uma Convenção que regula a compra e venda no mundo. Como já se demonstrou, dos 20 maiores parceiros comerciais do Brasil em importações ou exportações, a maioria já ratificou a Convenção de Viena ou a ela aderiu. Há, além disso, uma importância crescente e renovada do Brasil no âmbito do comércio internacional e uma tendência de o número de partes contratantes da Convenção de Viena aumentar nos próximos anos, como já vem ocorrendo. Hoje os Estados contratantes respondem por três quartos do comércio mundial, cifra que deverá aumentar ainda mais. Deve-se levar também em consideração o papel de liderança local que o Brasil exerce, tanto no âmbito do Mercosul quanto da América do Sul." 15

Como se observa, as normas brasileiras não estão alinhavadas com as regras sobre comércio internacional, existindo apenas uma expectativa de harmonização legislativa. A CISG é considerada um instrumento eficaz ao contribuir para a segurança jurídica, a estabilidade e a harmonização das relações comerciais entre empresas estabelecidas em países diferentes.

Os estados participantes respondem por mais de 90% do comércio mundial, incluindo relevantes parceiros comerciais do Brasil como EUA, China e os membros do Mercosul.

A adesão do Brasil ao texto da Convenção de Viena é tão necessária que dados citados por Mário Lúcio Quintão Soares e Mateus Soares de Oliveira revelam que em 2002 o Brasil tinha participação de 1% do comércio mundial, estando envolvido em 10% dos litígios no Órgão de Solução de Controvérsias da OMC, na maioria dos casos como reclamado. 16

Sem sombra de dúvidas isso ocorre porque o Brasil não está em sintonia com o regramento jurídico internacional relacionado à matéria de contratos privados. É necessário, por óbvio, que o Brasil busque uma participação no comércio mundial condizente com a dimensão de sua economia, que já é crescente.

Para tanto seria preponderante adequar nossas leis às Convenções Internacionais, conforme ensina o advogado mineiro Quintão Soares:

"[...] A globalização internacional dos problemas, abrangendo o princípio da autodeterminação dos povos, o sistema de garantias dos direitos fundamentais, o princípio da subsidiariedade e dos mecanismos de proteção dos recursos e do meio ambiente, demonstra que a constituição jurídica do centro estatal, territorialmente delimitado, permanece como carta de identidade política e cultural e uma mediação normativa necessária de estruturas básicas de justiça de um Estado democrático de direito. Essa carta de identidade necessita, todavia, articular-se com outros direitos, gradativamente vinculantes e preceptivos hard law ou flexíveis soft law, progressivamente forjados por novas unidades políticas, tais como União Européia, o Mercosul, o Nafta, a unidade africana e outros blocos políticos e econômicos." 17

Por iguais razões, é preciso que a sociedade plural incentive a adesão do Brasil à Convenção de Viena, pois o desenvolvimento só virá se tivermos regras jurídicas eficientes às políticas econômicas condizentes com nossa realidade.

Há muito tempo o país carece de uma participação governamental séria e integrada a uma visão internacionalista dessa relação entre comércio e desenvolvimento, mas as expectativas de sucesso são esperadas.


CONCLUSÃO

Da análise dos argumentos citados, podemos concluir que tudo está caminhando para que o Brasil faça a adesão sem reservas à Convenção de Viena para contratos de compra e venda internacional de mercadorias.

Com base nisso, temos que a adoção seria uma ótima oportunidade de se atingir o desenvolvimento previsto no art. 3º, inciso II da CF/88. Vale lembrar que a vontade das partes prevaleceria em relação às normas aplicáveis aos contratos.

Em relação ao processo de adesão, é de se verificar pela nota técnica da Câmara de Comércio Exterior que não há incompatibilidades de ordem jurídica nacional que obstaculizem a adesão brasileira, sendo que a Lei de Arbitragem brasileira em vigor – Lei nº 9.307, de 1996, já legitima as partes contratantes a escolha das regras de direito que serão ali aplicadas.

Em tempos de globalização são evidentes as contribuições que o comércio internacional traz para o desenvolvimento da sociedade, principalmente em relação à geração de empregos, impulso econômico da nação e vários outros benefícios.

Outro fator relevante é que a adesão traz benefícios para as empresas brasileiras, que, ao diversificarem suas vendas, não mais precisariam arcar com o ônus de conhecer o direito internacional com profundidade, tendo em vista a padronização das regras pelos países.

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De igual modo, os principais parceiros comerciais do Brasil e os integrantes do Bloco Mercosul já aderiram à mencionada Convenção de Viena, que em verdade trará segurança e previsibilidade nas relações comerciais internacionais.

Por tais considerações, sustentamos o desafio de vencer o atraso que o direito interno brasileiro tem fama há muitos anos, no que se refere à legislação aplicável aos contratos internacionais, diante da importância da CISG, destarte, pela harmonização das normas brasileiras para o fim de integração econômica e cooperação internacional para o progresso da humanidade.


Notas Bibliográficas:

1 – Nota técnica nº 01/2009/CAMEX-SECEX. Disponível no site http://www.camara.gov.br/sileg/integras/815192.pdf Acesso em 06/06/2011.

2Encaminhamento de Projeto de Mensagem nº 00131/2010. Disponível no site http://www.camara.gov.br/sileg/integras/815192.pdf Acesso em 06/06/2011.

3 - CISG, abreviatura inglesa de Convention on Contracts for the International Sale of Goods. Tradutor de Incoterms. Disponível em http://tradutor.babylon.com/ingles/Incoterms/ Acesso em 06/06/2011.

4Mensagem nº 636/2010 da Presidência da República. Disponível no site http://www.camara.gov.br/sileg/integras/815192.pdf Acesso em 06/06/2011.

5Acompanhamento de matéria legislativa da MSC-636/2010. Disponível no site http://www.camara.gov.br/internet/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=485779 Acesso em 06/06/2011.

6 – PIMENTEL, Cácia. A importância da Convenção de Viena como Lei Substantiva nas Arbitragens Mercantis Internacionais. Artigo jurídico. Acesso em 06/06/2011. Disponível em: http://www.camarb.com.br/areas/subareas_conteudo.aspx?subareano=417

7 – STANTON, Michael. Legislação para o comércio eletrônico. Artigo jurídico. Acesso em 07/06/2011. Disponível em: http://www.wirelessbrasil.org/wirelessbr/colaboradores/michael_stanton/artigos/10_jul_00.html

8 – BITTENCOURT, Angela. Contratos Internacionais Virtuais. Artigo jurídico. Revista de Derecho Informático. Acesso em 07/06/2011. Disponível em: http://www.alfa-redi.org/rdi-articulo.shtml?x=564

9Convenção de Viena sobre contratos de compra e venda internacional de mercadorias. Disponível em: http://www.camara.gov.br/internet/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=485779 Acesso em 09/06/2011.

10 – DOLGANOVA, Iulia e LORENZEN, Marcelo Boff. O Brasil e a Adesão à Convenção de Viena de 1980 sobre Compra e Venda de Mercadorias. Artigo jurídico. Acesso em 13/06/2011. Página 10. Disponível em: http://www.cisg-brasil.net/doc/idolganova1.pdf

11Enunciados Aprovados – III Jornada de Direito Civil. Disponível em: http://daleth.cjf.jus.br/revista/enunciados/IIIJornada.pdf Acesso em 13/06/2011. Página 5.

12 – NAZO, Georgette Nacarato. Arbitragem: um sigilo histórico. Revista do Advogado, Associação dos Advogados de São Paulo, 1997.

13 – Lei nº 9.307/96. Lei da Arbitragem. Disponível no site www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9307.htm Acesso em 13/06/2011.

14 – CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e Processo um comentário à Lei n/ 9.307/96: Malheiros Editores, 1998. Página 27.

15 – DOLGANOVA, Iulia e LORENZEN, Marcelo Boff. O Brasil e a Adesão à Convenção de Viena de 1980 sobre Compra e Venda de Mercadorias. Artigo jurídico. Acesso em 13/06/2011. Pág. 21. Disponível em: http://www.cisg-brasil.net/doc/idolganova1.pdf

16 – QUINTÃO SOARES, Mário Lúcio e SOARES DE OLIVEIRA, Mateus. Artigo Jurídico. A relação das normas brasileiras com as convenções sobre contratos internacionais da OEA, ONU e UE. Acesso em 13/06/2011. Página 21. Disponível em: http://www.cisg-brasil.net/doc/mlqsoares1.htm

17 – QUINTÃO SOARES, Mário Lúcio. Constitucionalismo e Estado. In ALMEIDA FILHO, Agassiz e FILHO, Francisco Bilac M. P. Constitucionalismo e Estado. Rio de Janeiro: Forense, 2006, Pág. 53.

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Sobre o autor
Hebert Mendes de Araújo Schutz

Oficial de Justiça-Avaliador Judiciário do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás/Especialista em Direito Processual Civil/Pós-graduado em Ciências Penais e Docência Universitária. Mestrando em Direito, Relações Internacionais e Desenvolvimento pela PUC-GO. Professor do curso de Direito na Faculdade Objetivo em Rio Verde-GO

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SCHUTZ, Hebert Mendes Araújo. Da necessidade de adesão do Brasil à convenção da ONU sobre contratos de compra e venda internacional de mercadorias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2974, 23 ago. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19834. Acesso em: 22 nov. 2024.

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