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Garantias processuais constitucionais.

A atuação da Defensoria Pública do Estado do Maranhão como forma de efetivação do princípio do acesso à Justiça

03/09/2011 às 09:39
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Faz-se abordagem histórica da Defensoria Pública, apontando como este órgão estatal procura suprir as necessidades de uma sociedade, de forma a garantir um efetivo acesso à Justiça.

SUMÁRIO: Introdução; 1 O processo e seu regime constitucional; 2 O acesso à justiça como corolário dos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa; 3 A Defensoria Pública; 3.1 O acesso à justiça no âmbito maranhense; 3.2 A atuação da Defensoria Pública no Estado do Maranhão; Conclusão; Referências bibliográficas.


RESUMO

O presente trabalho visa fazer uma abordagem histórica concernente à Defensoria Pública, bem como apontar de que forma este órgão estatal procura suprir as necessidades de uma sociedade, de forma a garantir um efetivo acesso à Justiça. A partir dos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, será feita uma análise de forma à relacionar a importância dos mesmos para a própria efetividade do acesso à justiça por parte da Defensoria no que diz respeito aos indivíduos de classe baixa, que não dispõem de recursos ao amparo Judicial por não poder custear com os altos honorários patenteados pela elite advocatícia.

PALAVRAS-CHAVE: Acesso. Defensoria Pública. Justiça. Princípios.


INTRODUÇÃO

O acesso à justiça é considerado, nas palavras de Cappelletti, "o requisito fundamental- o mais básico dos direitos humanos- de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas proclamar os direitos de todos". [01]

De que forma, as partes de um processo têm a garantia do efetivo acesso à justiça, se na maioria das vezes, se deparam com os obstáculos criados pelos sistemas jurídicos?

A proposta doartigo é fazer uma análise da Defensoria Pública, através do paralelo existente entre o processo e o regime constitucional em que o processo se desenvolve, evidenciando os princípios do Acesso à Justiça, do Devido Processo Legal, do Contraditório e da Ampla Defesa.


1 O processo e seu regime constitucional

O direito processual tem suas linhas fundamentais traçadas pelo direito constitucional, devido à alguns pressupostos constitucionais, como exemplo, a garantia a distribuição da justiça, a fixação da estrutura dos órgãos jurisdicionais, e a efetividade do direito objetivo, que estabelece alguns princípios. A tutela constitucional do processo possui configuração dúplice, dividindo-se em direito ao acesso à justiça, e direito ao processo - garantias do devido processo legal-. [02]

A Constituição Federal de 1988 configura o direito processual como instrumento público de realização da justiça, atribuindo competências à União (para legislar sobre o direito processual), ao Estado e ao Distrito Federal; garantindo regras para a defesa dos interesses difusos e coletivos, como forma de facilitação ao acesso à justiça.

O direito em si, é um instrumento que se presta a gerar segurança para a sociedade, tanto no que se refere ao ordenamento jurídico, quanto no que tange às relações jurídicas individualizadas. Portanto, as partes de um processo necessitam primeiramente ter direito de ação, ou seja, ter direito de acesso à justiça para a defesa dos direitos individualmente violados (art. 5º, inciso XXXV, CF).

Além de se preocupar com a assistência judiciária aos desprovidos de recursos, a Carta Magna a estendeu à assistência jurídica pré-processual, obrigando o Estado a organizar a carreira jurídica dos defensores públicos. [03]


2.O acesso à justiça como corolário dos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, garante a todos os indivíduos o acesso à justiça. Mas em verdade, podemos perceber uma espaçosa diferença entre a garantia oferecida por esta, e a prática, uma vez que todas as pessoas deveriam ser assistidas por princípios e garantias fundamentais, havendo no plano material uma enorme dificuldade no que se refere à prestação da Tutela Jurisdicional para que este acesso à justiça seja garantido.

Nas palavras de Mauro Cappelletti, o que existe, em verdade, são "obstáculos processuais" que tornam o Poder Judiciário mais burocrático e patriarcal, uma vez que surgem barreiras econômicas, sociais, pessoais, jurídicas, entre outras a serem rompidas. [04] Sem um acesso efetivo à justiça, não pode haver um exercício eficaz da dignidade da pessoa humana e, por via de conseqüência, não pode haver justiça social.

De acordo com Cappelletti, existem três ondas processuais de acesso à justiça, quais sejam a sincrética, a autonomista e a instrumentalista, havendo nesta última onda o surgimento de um progresso na obtenção de reformas da assistência jurídica e da busca por mecanismos de reprodução dos interesses da sociedade, fator este que pôde proporcionar maior acesso à justiça. [05]

O processo é um procedimento em contraditório, para as partes reagirem ao que forem informadas, garantindo dialeticidade ao processo. O princípio do contraditório refere-se a garantia às partes da informação das causas levantadas, e à situação do processo, a fim de dar ciência de todas as informações processuais, para que possam interpor recurso; contrarrazoar, de modo que nesta tese versus antítese o judiciário produza uma síntese.

A cláusula do devido processo legal deve ser compreendida como uma garantia fundamental do cidadão, servindo de instrumento para superação de eventuais injustiças processuais ou substanciais. Além de garantia constitucional do cidadão, o devido processo legal é uma esperança a garantia de justiça no processo, e em qualquer decisão. Já o princípio da ampla defesa garante às partes que se valham dos meios probatórios e lícitos estipulados pela Constituição e pelo Código de Processo Civil. O juiz deve se colocar entre as partes, mas eqüidistante delas.

O acesso à justiça não significa apenas a admissão ao processo, pois para haver efetivação a este acesso, é indispensável que várias pessoas sejam admitidas a demandar e a defender-se adequadamente, visando uma solução justa, acabando com a insatisfação das partes. Para que o processo seja concretizado, as partes devem ser admitidas ao processo, eliminando dificuldades para os indivíduos. Além disso, o devido processo legal deve ser observado para que as partes dialoguem com o juiz, e as decisões devem se pautar na justiça, e obter efetividade.


3. A DEFENSORIA PÚBLICA

O art. 5°, inciso LXXIV da Constituição prevê assistência jurídica integral e gratuita aos necessitados, sendo tal assistência um direito e uma garantia fundamental de cidadania.

De acordo com o art. 134 da Carta Magna, a Defensoria é uma instituição essencial à função jurisdicional do Estado, que deve ser instalada em todo o país, como estabelecido pelo art. 134 da Lei Complementar 80/94. Sendo assim, há uma correlação entre os dois artigos da CF, uma vez que um prevê a instituição da Defensoria como essencial a função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa em todos os graus dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV que prevê que o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos.

A criação da Defensoria Pública é prevista pela Constituição Federal, logo os direitos e garantias abarcados por ela são constitucionais a partir do momento que são inseridos no texto constitucional, possuindo eficácia e aplicabilidade imediatas. [06]

O Defensor Público tem a incumbência de defender de forma integral e gratuita os indivíduos que não tem condições de contratar um advogado particular. Sendo assim, não poderá cobrar por seus serviços, e nem exercer a função da advocacia fora das atribuições institucionais, uma vez que há vedação na própria Constituição.

A remuneração dos Defensores Públicos é aquela estabelecida na forma do § 4º do art. 39 da Constituição Federal, conforme determina o art. 135, ou seja, por meio de ‘subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória (...) [07]

Sendo a

Defensoria Pública uma instituição essencial à função jurisdicional do Estado; e essencial à própria Justiça (art. 134, CF), sem esta não seria possível concretizar, de forma mínima, o dever estatal de assegurar o acesso à Justiça, e a própria efetividade da Constituição seria reduzida, quando se trata de direitos fundamentais como a ampla defesa e o devido processo legal, por exemplo.

Os serviços jurídicos deveriam ser prestados por escritórios de vizinhança, atendidos por advogados, pagos pelo governo e encarregados de promover os interesses dos hipossuficientes, enquanto classe. Esse sistema é caracterizado pela tentativa de fazer com que as pessoas menos favorecidas estivessem conscientes de seus novos direitos e desejosos de utilizar os serviços advocatícios para sua obtenção. (CAPPELLETTI, 2002)

3.1.O Acesso à Justiça no âmbito MaranhensE

O Estado do Maranhão é caracterizado pela miserabilidade, pobreza e pela negação ao exercício material dos direitos fundamentais, principalmente no que se refere ao direito fundamental de acesso à justiça, o que dificulta a possibilidade de exigências em juízo deste acesso, e de qualquer outro direito fundamental. [08]

Sobre os principais problemas ligados ao Maranhão, Cândida da Costa diz:

Entre os elementos existentes na realidade maranhense que revelam como a violência tem sido uma das mediações fundamentais nas relações sociais estabelecidas no Estado, acentuando processos de exclusão, podem ser citados a concentração de renda, a relação predatória com o meio ambiente, a configuração da questão agrária e urbana, a configuração do mercado de trabalho e o padrão político de dominação. A privação cultural imposta pela ausência absoluta de direitos torna-se constitutiva da privação material e da exclusão política. [09]

Há necessidade de que se suceda uma mobilização, para que haja facilidade ao acesso à justiça por parte da população desprovida de recursos do Estado do Maranhão.

Necessita-se de uma extensão no que concerne à conquista de direitos e condições de vida, devendo as instituições públicas (como o Ministério Público, a Defensoria Pública e o próprio Poder Judiciário como um todo) agirem como garantidores e facilitadores do acesso à justiça, que é conseqüência dos princípios constitucionais da ampla defesa, do contraditório, do devido processo legal, dentre outros de suma importância para o andamento do processo.

3.2 A atuação da Defensoria Pública no Estado do Maranhão

A Defensoria do Estado do Maranhão foi instalada em 2001, funcionando na Procuradoria-Geral do Estado. Porém, foi instituída em 1994 através da Lei Complementar n. 19 regulando o seu funcionamento, com a criação de 85 cargos de Defensores Públicos. No ano de 2002, se desvinculou da Procuradoria-Geral do Estado, passando a agir de forma independente.

Atualmente a Instituição possui 43 Defensores Públicos, sendo que estes exercem funções nos órgãos de administração superior (Defensoria Geral, Subdefensoria Geral e Corregedoria), trinta e um (31) estão em São Luís, nas áreas criminal, de família, cível, infância e adolescente, defesa do idoso e da mulher vítima de violência, tribunal do júri e execução penal; dois (2) Defensores encontram-se em Caxias, nas varas cível e criminal; quatro (4) Defensores em Timon, nas varas cíveis e criminais; um (1) em São José de Ribamar; outro (1) em Paço de Luminar; e quatro (4) Defensores Itinerantes. [10]

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Este número se torna insuficiente para atender a demanda de um Estado que possui 217 municípios. Além do mais, dessa quantidade de Defensores, alguns são incumbidos de tarefas administrativas, e por isso não podem exercer a função de Defensor Público, sem contar com os que são afastados ou tiram licença, o que acaba diminuindo ainda mais o número de defensores atuantes no Estado. Ao fazer uma análise mais profunda desta situação, pode-se observar que apenas um defensor é referente à diversos municípios, o que se torna uma tarefa inviável.

Além do número de defensores ser insuficiente, grande parte deles encontra-se na capital, sendo assim, a população do interior do Estado, na maioria das vezes, tem que se dirigir a capital para solucionar os seus problemas jurídicos com a Defensoria, o que torna o acesso a justiça cada vez mais difícil, pois além da falta de informação, em grande parte dos casos, a distância dos órgãos de proteção jurídica faz com que a população não recorra à justiça.

Ao longo do tempo o atendimento foi melhorado, o prédio em que hoje a Defensoria é instalada na capital tem fácil acesso, já que se encontra no centro da cidade e é próximo ao terminal da Praia Grande, onde passam ônibus oriundos de toda cidade. As filas que antes acabavam por afastar as pessoas da busca pelos seus direitos foram diminuídas, a informação entre a população é maior, a assistência tanto jurídica quanto social e psicológica é dada àqueles que a procuram, ou seja, ela está se tornando um órgão realmente acessível à população mais carente e que garante o acesso à justiça a essas pessoas.


CONCLUSÃO

Devido ao descaso do Poder Público e a falta de informações por parte da população, constata-se que a garantia de acesso ao Judiciário não é suficiente para assegurar uma ordem jurídica justa, devendo, portanto, haver a observância de alguns princípios para que o acesso à justiça seja efetivo a todas as pessoas, sem distinções.

No que concerne a efetividade dos direitos fundamentais, deve haver uma preocupação referente a conscientização da sociedade como um todo, devendo cada indivíduo ser visto como sujeito de direitos.

Sendo assim, o papel da Defensoria Pública é resguardar os direitos violados ou ameaçados de cada cidadão, devendo afirmar e garantir tais direitos, observando os princípios do devido processo legal; do acesso à justiça; do contraditório e da ampla defesa, através de uma relação horizontal entre o jurista e a pessoa atendida, havendo uma democratização e desmistificação do conhecimento jurídico e a interação do mesmo com o conhecimento popular [11].

Em verdade não é o que ocorre, uma vez que a relação da "assistência" dada pela Defensoria Pública é vertical. Assim sendo, percebe-se a necessidade de luta dos movimentos sociais, para que a própria sociedade possa garantir a defesa e promoção dos direitos humanos, com a finalidade de concretizar o direito fundamental principal: o acesso à justiça; o acesso à efetividade dos direitos fundamentais que garantam uma vida digna à população.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ANDRADE, Carlos Augusto Medeiros de. O acesso à justiça e a defensoria pública. Disponível em: <www.pge.ce.gov.br/arquivos.>. Acesso em: 09. abril. 2010

CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Tradução: Ellen Gracie Northfleet. 1ª ed., Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1988.

CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pelegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Malheiros, 2007.

Defensoria Pública do Estado do Maranhão. Disponível em: <http://www.dpe.ma.gov.br/index.php>. Acesso em: 22.abril.2010

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 24.ed. São Paulo: Atlas, 2009

NETO, Ulisses Pereira Tetor. O acesso à justiça como direito aos direito fundamentais. REVISTA OAB/MA. São Luís, MA, n. 2. 2007.

PEREIRA, Diana Melo; ROCHA, Felipe José Nunes; LOUREIRO, Nathália Freitas. O diálogo entre a cultura jurídica e a popular através da assessoria jurídica universitária: o programa de pesquisa e extensão universitária NAJUP "Negro Cosme". V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22-setembro 2005.


Notas

  1. CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Tradução: Ellen Gracie Northfleet. 1ª ed., Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1988, pág. 12.
  2. CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pelegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Malheiros, 2007, pág. 80.
  3. CINTRA. op. cit., p.84
  4. CAPELLETI. op. cit., p.28
  5. CAPELLETI. op. cit., p. 32
  6. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 24 ed. São Paulo: Atlas, 2009, pág. 638
  7. ANDRADE, Carlos Augusto Medeiros de. O acesso à justiça e a defensoria pública. Disponível em: <www.pge.ce.gov.br/arquivos.>. Acesso em: 09. abril. 2010, p. 18.
  8. NETO, op. cit., p. 193.
  9. NETO, apud COSTA, Cândida da. op. cit., p. 195.
  10. Defensoria Pública do Estado do Maranhão. Disponível em: <http://www.dpe.ma.gov.br/index.php>. Acesso em: 22. abril.2010
  11. PEREIRA, Diana Melo; ROCHA, Felipe José Nunes; LOUREIRO, Nathália Freitas. O diálogo entre a cultura jurídica e a popular através da assessoria jurídica universitária: o programa de pesquisa e extensão universitária NAJUP "Negro Cosme". V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22-setembro 2005.
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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUSA, Natália Lago. Garantias processuais constitucionais.: A atuação da Defensoria Pública do Estado do Maranhão como forma de efetivação do princípio do acesso à Justiça. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2985, 3 set. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19915. Acesso em: 16 abr. 2024.

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