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A aplicação da desconsideração da personalidade jurídica segundo decisões do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo e seu impacto nas decisões empresariais

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11/11/2011 às 14:06
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6. CONCLUSÕES

As pessoas jurídicas têm personalidade e patrimônio próprios, distintos dos de seus constituintes e, portanto, capacidade para, em seu próprio nome, exercer direitos e contrair obrigações.

Em decorrência do princípio da autonomia patrimonial, os bens da sociedade é que respondem, regra geral, pelas obrigações por ela assumidas. Tal princípio, ao limitar a possibilidade de perdas de seus sócios, estimula o empreendedorismo.

Apenas excepcionalmente, em caso de abuso da personalidade jurídica, ou confusão patrimonial, pode o magistrado desconsiderar a personalidade jurídica, estendendo a responsabilidade da sociedade ao patrimônio de seus sócios ou administradores.

O bom funcionamento da Justiça, assegurando o cumprimento dos contratos e tutelando os direitos de propriedade, são fundamentais ao crescimento da economia de um país, influenciando, também, no custo do crédito. De outro lado, um sistema judicial imprevisível e incapaz de garantir tais direitos tende a inibir a execução de determinados negócios por parte das empresas.

A elevação dos riscos das sociedades provoca o aumento dos preços dos produtos e serviços, bem como, na impossibilidade da incorporação destes riscos aos preços, redução ou até mesmo a paralisação das atividades empresariais.

Pela teoria maior (subjetiva) da desconsideração da personalidade jurídica de que trata o artigo 50, do Código Civil, o magistrado, desde que comprovado desvio de finalidade ou confusão patrimonial por parte dos sócios, poderá afastar pontualmente o "véu" da pessoa jurídica, para atingir os bens pessoais destes. Pela teoria menor (objetiva), o pressuposto para a desconsideração é simplesmente a demonstração, pelo credor, da inexistência de bens da empresa para saldar suas obrigações e da solvência de qualquer sócio, para atribuir a este a obrigação da pessoa jurídica.

Os magistrados do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo vêm aplicando ampla e abusivamente o instituto da desconsideração da personalidade jurídica, sob as seguintes alegações: a não incidência do artigo 50, do Código Civil, na esfera laboral; a aplicação analógica da teoria objetiva do instituto, previsto no artigo 28, caput e parágrafo 5º, do Código de Defesa do Consumidor; que o simples descumprimento da obrigação trabalhista, por parte da empresa, caracteriza abuso da personalidade jurídica; e, por fim, o caráter alimentar do crédito trabalhista.

O Direito Civil, fonte subsidiária do Direito trabalhista, torna obrigatória a observância do artigo 50, do Código Civil, sendo que o abuso de direito a que ela se refere diz respeito ao desvio de finalidade, e não a eventuais inadimplências trabalhistas. Não se aplica, na seara trabalhista, o Código de Defesa do Consumidor, conjunto de normas aplicável, apenas às relações de consumo.

Com relação à responsabilidade do sócio retirante da sociedade, os desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo têm interpretado a matéria sem uniformidade. Ora entendem não se aplicar o 1.003, parágrafo único, do Código Civil, que limita a responsabilidade do sócio ao prazo de dois anos depois da sua retirada regular da empresa, ora compreendem que esse se aplica, mas estabelecem pontos de partida divergentes para sua contagem.

A desconsideração da personalidade jurídica é necessária para coibir os abusos cometidos por sócios ou administradores de empresas, mas é preciso que ela seja aplicada de forma criteriosa. A banalização do instituto representa um desestímulo à livre iniciativa, comprometendo as atividades empresariais e, consequentemente, a economia do país.


ANEXO A

Ementas do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo

EMENTA – Desconsideração da Personalidade Jurídica – Agravante – Ex- sócio. Responsabilidade Mantida – O artigo 1032, do CC, de 2002, não altera a responsabilidade do agravante, pelo simples motivo de que a dívida que originou o título executivo está associada a fatos contemporâneos ao tempo em que figurava como sócio. (TRT/SP, Agravo de Petição em Embargos de Terceiro, processo nº 00230200800802004, 12ª Turma, Rel. Des. Benedito Valentini, v.u., j. 16/04/2009).

EMENTA – Agravo de Petição. Desconsideração da Personalidade Jurídica da empresa. Constrição de bem imóvel de ex-sócio que se retirou da sociedade há mais de 02 (dois) anos da propositura da Reclamação Trabalhista. É absolutamente legal a desconsideração da personalidade jurídica da empresa quando esta não apresenta força financeira capaz de suportar a execução, conforme estabelecem o art. 28 da Lei n° 8.078/90 e arts. 50 e 1.024, ambos do Código Civil. Nessa circunstância o juiz pode determinar que a execução avance no patrimônio dos sócios para satisfazer as dívidas da sociedade executada. No entanto, o art. 1032 e o parágrafo único do art. 1.003, ambos do Código Civil, estabelecem que o sócio retirante ou excluído só responde pelas obrigações da sociedade no prazo de até 2 (dois) anos após a averbação da sua retirada ou exclusão. (TRT/SP, Agravo de Petição, processo nº 01548200103202000, 12ª Turma, Rel. Des. Marcelo Freire Gonçalves, v.u., j. 08/07/2009).

EMENTA - Desconsideração da personalidade jurídica. Excesso de penhora. Na Justiça do Trabalho, adota-se a teoria objetiva da desconsideração da personalidade jurídica, a teor do art. 28, parágrafo 5º, da Lei 8.078/90, motivo pelo qual carece de relevância a alegação de que não houve fraude ou abuso de direito (art. 50 do Código Civil). (...). Agravo não provido. (TRT/SP, Agravo de Petição, processo nº 00339200406202003, 12ª Turma, Rel. Des. Adalberto Martins, v.u., j. 30/07/2009).

EMENTA - Dívida trabalhista. Incapacitação financeira do empreendimento. Responsabilidade direta do devedor subsidiário. Impossibilidade jurídica. Execução em face dos sócios do devedor principal. A informação alusiva ao prosseguimento da atividade empresarial constitui-se em informação salutar, pois o encerramento das atividades do empreendimento (devedor principal) pode levar à excussão dos bens dos sócios; ressalte-se que os bens da empresa subsidiária não preferem aos do sócio do devedor principal, por força do disposto no art. 596 do CPC. A exegese do texto de lei em comento traz em favor do sócio tão somente o benefício de ordem; primeiramente respondem os bens da empresa pela dívida, e, após, os dos sócios. Isso quer dizer que a responsabilidade principal pela liquidação da dívida transfere-se da pessoa jurídica para a pessoa física do sócio. Não há juridicidade em se direcionar a execução para o devedor subsidiário antes da comprovação da insuficiência patrimonial da empresa principal e do esgotamento dos bens dos sócios. Atente-se para a previsão do art. 28 do CDC, de aplicação subsidiária ao processo do trabalho (art. 769): (...) A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração. Na hipótese de comprovação do estado falimentar, de insolvência, ou mesmo de encerramento ou inatividade da pessoa jurídica, transfere-se o liame obrigacional à figura dos sócios. Apenas na hipótese de insuficiência financeira dos componentes da base societária é que a dívida pode ser cobrada do subsidiariamente vinculado ao pagamento das verbas condenatórias. Apelo parcialmente provido. (Agravo de Petição, processo nº 00160-2005-231-02-00-5, acórdão nº 20100070960, 8ª Turma, Rel. Des. Rovirso Aparecido Boldo, j. 10/02/2010, publicação 19/02/2010).   

EMENTA - Penhora de conta corrente e desconsideração da personalidade jurídica. Agravo de Petição em Embargos de terceiro. Ex sócios. Importa, para fins de mensuração da responsabilidade dos agravantes (ex sócios) no caso em tela, a data da averbação da alteração do quadro societário perante a JUCESP (22/10/1996). Para fins de direito, os agravantes valeram-se dos préstimos trabalhistas da agravada durante o período que perdurou entre o início do contrato de trabalho desta e a averbação da retirada daqueles. O ordenamento veda o enriquecimento sem causa, bem como prevê a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica, admitida na Justiça do Trabalho para salvaguardar o trabalhador hipossuficiente. Assim sendo, não havendo bens em nome da Sociedade Empresária que garantam a execução, cabível a responsabilização subsidiária dos agravantes (ex sócios) em relação aos valores devidos à agravada (empregada). A penhora é legítima. Quanto à desconsideração da personalidade jurídica, os agravantes não lograram comprovar a alegada precocidade da medida, já que apenas fizeram genéricas alusões aos autos principais onde corre a execução, não se ocupando em, quanto a isso, formar devidamente o instrumento do presente recurso. Mantenho." (Agravo de Petição em Embargos de Terceiro, processo nº 01265-2008-031-02-00-8, acórdão nº 20100319917, 10ª Turma, Rel. Des. Marta Casadei Momezzo, j. 13/04/2010, publicação 28/04/2010).      

EMENTA - Desconsideração da personalidade jurídica. Penhora na conta de sócio. Respondem pessoalmente, em razão da administração perpetrada, os sócios de empresa que não apresenta liquidez mínima à satisfação de dívida (CC, art. 50; CPC, art. 592, II). (TRT/SP, Mandado de Segurança, processo nº 10102-2009-000-02-00-9, SDI, j. 15/04/2010, publicação 06/05/2010).   

EMENTA - 1. Desconsideração da personalidade jurídica ex officio. Aplicação, por analogia, do artigo 28, "caput" e parágrafo 5º da Lei 8.078/90. Pode o Juiz, de ofício, desconsiderar a personalidade jurídica da empresa executada, caso constate ser a personalidade óbice à quitação da dívida trabalhista. Aplicação analógica do artigo 28, "caput" e "parágrafo 5º", da Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990. (...). (TRT/SP, Agravo de Petição e Embargos de Terceiro, processo nº 02416-2009-341-02-00-8, 8ª Turma, Rel. Des. Rovirso Aparecido Boldo, j. 28/04/2010, publicação 04/05/2010).          

EMENTA – Desconsideração da Personalidade Jurídica da Empresa – Possibilidade – Penhora em bem de sócios - Induvidoso que a pessoa jurídica, empregadora, é a executada na ação principal, devendo a execução recair sobre seus bens. Mas, na ausência deles, passíveis de penhora, pode a constrição recair sobre bens de propriedade dos titulares da pessoa jurídica quando esta ficou inadimplente sem que tenham sido encontrados bens ou recurso financeiro suficiente para que se pudesse dar efetividade à execução. (TRT/SP, Agravo de Petição, processo nº 02776-1999-074-02-00-3, 3ª Turma, Rel. Des. Mercia Tomazinho, j. 11/05/2010, publicação 21/05/2010).      

EMENTA – Penhora de Bens de Ex-Sócio. Desconsideração da Personalidade Jurídica. Apenas na impossibilidade de prosseguimento da execução em face da devedora principal, tanto da pessoa jurídica quanto dos atuais sócios, é que pode a execução voltar-se para ex-sócio, observados os termos do parágrafo único do artigo 1003 do CPC. Agravo de Petição a que se dá provimento. (Agravo de Instrumento em Agravo de Petição, processo nº 00018-2005-069-02-01-7, acórdão nº 20100432330, 3ª Turma, Rel. Des. Mercia Tomazinho, j. 11/05/2010, publicação 21/05/2010).       

EMENTA - Execução. Ex-sócio cotista. Responsabilidade. Se a empresa executada não dispõe de bens para a satisfação da obrigação, responde, com os seus pessoais o ex-sócio que integrava a sociedade no período do contrato de trabalho, ainda que apenas na condição sócio cotista, notadamente porque se beneficiou da força de trabalho do credor e deixou, ele mesmo, de dar cumprimento às obrigações trabalhistas. Teoria da desconsideração da personalidade jurídica, já há muito adotada na Justiça do Trabalho e que hoje avança para o direito comum. Agravo de Petição a que se nega provimento. (TRT/SP, Agravo de Petição em Embargos de Terceiro, processo nº 01418-2009-055-02-00-8, 11ª Turma, Rel. Des. Eduardo de Azevedo Silva, j. 07/07/2010, publicação 20/07/2010).

EMENTA - Desconsideração da personalidade jurídica. Validade. A desconsideração da personalidade da pessoa jurídica no Processo do Trabalho encontra fundamento no art. 135, III do Código Tributário Nacional, ao qual se refere expressamente o art. 4º da Lei de Execuções Fiscais que é aplicável subsidiariamente à execução trabalhista por força do art. 889 da CLT. Possível invocar também o art. 28 do Código de Defesa do Consumidor, este compatível com o Direito do Trabalho eis que ambos têm igual pressuposto (proteção ao hipossuficiente, lá - consumidor, aqui - empregado). Pela incompatibilidade com os Princípios do Direito do Trabalho, é afastada a aplicação do art. 50 do Código Civil. Recurso da agravante a que se nega provimento. (TRT/SP, Agravo de Petição em Embargos de Terceiro, processo nº 00966-2009-017-02-00-4, 3ª Turma, Rel. Des. Antero Arantes Martins, j. 03/08/2010, publicação 13/08/2010).

EMENTA - Da responsabilidade subsidiária - benefício de ordem. Foram esgotados todos os meio para excutir os bens da primeira reclamada e seus sócios, sendo legítima a execução em face da agravante, responsável subsidiária. Ademais, é pacífico que quem alega o benefício de ordem, deve nomear bens do devedor, sitos no mesmo município, livres e desembargados, quantos bastem para solver o débito, art. 827 do Código Civil, o que não ocorreu no presente caso. Mantenho. Do direcionamento da execução face aos sócios da primeira reclamada. Conforme se verifica às fls. 262/268, já houve a desconsideração da personalidade jurídica da primeira reclamada e prosseguimento da execução face seus sócios, a qual restou infrutífera, sendo legítimo o prosseguimento face a recorrente." (Agravo de Petição, processo nº 02725-2002-062-02-00-8, 10ª Turma, Rel. Des. Marta Casadei Momezzo, j. 31/08/2010, publicação 13/09/2010).

EMENTA – Responsabilidade do ex-sócio. Inaplicabilidade dos arts. 1003 e 1025 do atual Código Civil. Os arts.1003, parágrafo único, e 1025 do Livro II (Direito de Empresa e da Sociedade), seção II (Dos Direitos e Obrigações dos Sócios) e seção IV (Das relações com Terceiros), do Código Civil em vigor, concernentes à responsabilidade solidária do sócio cedente de suas quotas até 2 anos após a retirada da sociedade, passaram a viger somente a partir de 10.01.2003, nos termos do art.2044 do NCC. Tratando-se de disposições legais que versam sobre direito material, seus efeitos não retroagem para alcançar fatos já consumados sob a lei vigente à época (art.6º da LICC). E ainda que assim não fosse, o dispositivo em tela não se aplica à esfera trabalhista, por se tratar de crédito de natureza alimentar decorrente de serviços prestados pelo autor que beneficiaram diretamente a empresa e seus sócios, que desses encargos não podem se eximir a pretexto do desligamento societário. Assim, mantém-se a responsabilidade daquele que foi sócio à época de prestação de serviços pelo exeqüente, ingressando no pólo passivo da execução em andamento, em face da desconsideração da personalidade jurídica. (TRT/SP, Agravo de Petição, processo nº 02514200402202008, 4ª Turma, Rel. Des. Ricardo Artur Costa e Trigueiros, v.u., j. 27/10/2009).

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Sobre o autor
Victor Gustavo Lourenzon

Advogado especialista na área de contratos e Processo Civil, graduado pela Universidade Mackenzie de São Paulo e pós-graduado em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas - FGV LAW, pós-graduado em Direito Processual Civil pela Escola Paulista de Direito - EPD e em Direito Público pela Faculdade Damásio de Jesus. pós-graduado em Direito do Trabalho pelas Faculdades Metropolitanas Unidas - FMU.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LOURENZON, Victor Gustavo. A aplicação da desconsideração da personalidade jurídica segundo decisões do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo e seu impacto nas decisões empresariais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3054, 11 nov. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20401. Acesso em: 23 dez. 2024.

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