Capa da publicação Flexibilização do Direito do Trabalho: geração de empregos?
Capa: http://www.flickr.com/photos/stevec77/
Artigo Destaque dos editores

Flexibilização do Direito do Trabalho: geração de empregos?

Exibindo página 2 de 5
11/11/2011 às 08:01
Leia nesta página:

CAPÍTULO II - CAUSAS MOTIVADORAS DA FLEXIBILIZAÇÃO TRABALHISTA: ENFOQUE NA CRISE EMPREGATÍCIA

Insta no presente capítulo abordar as possíveis causas apontadas pela doutrina especializada como ensejadoras das ideias relacionadas à flexibilização das normas do direito do trabalho.

Tais causas, que via de regra possuem conotação econômica, são fatores determinantes para criação e desenvolvimento dos conceitos pertinentes à flexibilização trabalhista (ROBORTELLA, 1994, p. 98).

Segundo Sergio Pinto Martins (2009, p. 35), diversas são as causas motivadoras da flexibilização, a saber:

As causas da flexibilização compreendem vários fatores: (a) desenvolvimento econômico; (b) globalização; (c) crises econômicas; (d) mudanças tecnológicas; (e) encargos sociais; (f) aumento do desemprego; (g) aspectos culturais; (h) economia informal; (i) aspectos sociológicos.

Luiz Carlos Amorim Robortella, em sua obra ímpar sobre do tema, arrola os seguintes fatores determinantes da flexibilização:

a) os imperativos de desenvolvimento econômico; b) a competição econômica no plano internacional; c) a velocidade das mudanças tecnológicas; d) o aumento do desemprego; e) a tendência à formação de forte economia submersa, informal, para fugir à rigidez da lei.

Muitas, como exposto, são as causas mencionadas pela doutrina especializada como determinantes para o crescimento das noções de flexibilização trabalhista. No presente trabalho, mencionar-se-á algumas destas causas, dando-se enfoque especial à crise empregatícia.

Cumpre esclarecer que a exposição de tais causas não possui conteúdo ideológico, é dizer, o objetivo do presente capítulo não é defender a prática da flexibilização trabalhista, mas apontar as principais causas motivadoras arroladas pela doutrina.

2.1 Crises Econômicas

As crises econômicas, correntes ao decorrer da história da economia mundial, são apontadas como uma das causas motivadoras da flexibilização trabalhista. Conforme assevera Sergio Pinto Martins (2009, p. 35):

A partir de 1973, começaram a surgir as crises econômicas, como a que ocorreu com o petróleo, aumentando o preço destes produtos. Em seguida, vieram várias outras crises, como a das bolsas de valores nos países, do dólar, etc. As crises acabam sendo permanentes e cíclicas. Trouxeram as crises um agravamento do processo inflacionário nos países de um modo geral, não apenas no Brasil e nos países em vias de desenvolvimento, mas em toda parte.

Como corolário das crises econômicas, advém dificuldades financeiras às empresas (empregadoras por excelência), influenciando-se de forma direta a oferta empregatícia. Daí a necessidade, aclamada pela doutrina defensora da tese, da adequação das normas trabalhistas, como forma de que estas atuem como fiel da balança entre a oferta de emprego e o desenvolvimento econômico, conforme assevera Sergio Pinto Martins (2009, p. 37):

As crises econômicas, a globalização das economias, a automação são situações que não se identificam com a rigidez da legislação. Ao contrário, esta acaba atrapalhando ou até impedindo a maleabilização das relações trabalhistas para enfrentar aquelas situações. Daí a necessidade da flexibilização, de forma a poder adaptar a situação, de fato, mediante norma estabelecida pelas próprias partes, assegurando um mínimo obrigatório e que deve estar previsto em lei.

As crises econômicas, pelo seu caráter de excepcionalidade, exigem medidas urgentes dos Estados, de forma a controlar o impacto econômico nos setores produtivos. Para os defensores da flexibilização trabalhista, a maior abertura das normas trabalhistas seria uma forma dinâmica de adequação das empresas frente a um novo quadro econômico, de forma a evitar problemas maiores à economia interna, e. simultaneamente, garantir a manutenção do emprego. Assim discorre José Francisco Siqueira Neto, em artigo bastante aprofundado sobre o tema (OLIVEIRA et al, 1996, p. 334-335):

A flexibilização do direito do trabalho é também entendida como um instrumento de adaptação rápida do mercado de trabalho. Neste sentido é concebida a parte integrante do processo maior de flexibilização do mercado de trabalho, consistente no conjunto de medidas destinadas a dotar o direito laboral de novos mecanismos capazes de compatibilizá-lo com as mutações decorrentes de fatores de ordem econômica, tecnológica ou de natureza diversa exigentes de pronto ajustamento.

Aclara-se, desta forma, que a flexibilização das normas laborais é apontada como meio de solução rápida em meio a crises econômicas, consoante à atenuação do impacto negativo nas empresas, de forma a atuar em prol da manutenção e oferta de emprego.

Cita-se como exemplo do presente subtópico, o grande acordo coletivo feito pela General Motors na Alemanha, onde pactuou em maio de 2010, com o sindicato operário, que defende o interesse de cerca de 50.000 (cinquenta mil) empregados, o congelamento dos salários por dois anos, como forma de enfrentamento de séria crise financeira [02].

Trata-se de reação rápida e flexível em relação à garantia de manutenção do valor real do salário, utilizada como forma de contenção de crise financeira, buscando-se evitar despedida em massa de um grande número de empregados. Entretanto, deve-se observar a garantia mínima de direitos aos obreiros, de forma que a maleabilização das normas jurídicas laborais não seja uma forma oculta de extinção dos direitos fundamentais dos trabalhadores.

2.2 Globalização

A globalização é apontada como causa ensejadora da flexibilização das normas trabalhistas à medida que acentua a competição econômica internacional. As empresas, analisadas em âmbito global, buscam investir seu capital e montar suas linhas de produção em locais onde se possa, pelo menor custo possível, oferecer ao mercado produtos de boa qualidade. Neste quadro, buscam localidades onde a oferta de mão de obra, além de ampla, seja menos dispendiosa, do ponto de vista do rigor das normas trabalhistas. Neste sentido é a arguta lição se Sergio Pinto Martins (2009, p. 35):

A globalização determina a competição econômica internacional. Houve a expansão do comércio internacional. A partir da década de 1960, a tendência do sistema internacional foi a competição entre as empresas. Para onde são levados os capitais, são criados empregos. Os capitais fogem de economias excessivamente regulamentadas, do ponto de vista do custo do trabalho. O mundo tem sido extremamente competitivo, para efeito da colocação dos produtos nas empresas, como a concorrência entre Japão, Europa e Estados Unidos, em que se pretende colocar um produto pelo preço mais baixo possível, mas com a melhor qualidade desejada pelo consumidor.

Observa-se pelo trecho acima mencionado que o autor faz uma correlação entre a maleabilidade das normas trabalhistas e a atração de investimentos (capital) de empresas estrangeiras, com a consequente oferta de empregos. Normas trabalhistas extremamente rígidas, de outra face, afastariam investimentos externos, e prejudicariam a concorrência com empresas estrangeiras, à medida que aumentariam o custo de produção e oferta de bens de consumo.

A tendência trazida pela aproximação de países, assim como a concorrência entre empresas estrangeiras, é a aproximação dos modelos jurídicos trabalhistas observados nos países de uma maneira global. É dizer: busca-se uma aproximação da realidade justrabalhista dos diversos países, em face da crescente concorrência internacional. Neste sentido é a esclarecedora lição de Pedro Paulo Teixeira Manus (2006, p. 125):

Vemos, portanto, que o fenômeno da globalização interfere no Direito do Trabalho, trazendo como uma de suas consequências a tendência de modificações nas relações entre prestadores e tomadores de serviço, como forma de aproximação entre os modelos jurídicos dos vários países.

A globalização, sob a ótica da concorrência internacional, orienta-se a uma contínua flexibilização das normas referentes ao salário e contratos de trabalho dos empregados. Segundo Amauri Mascaro Nascimento (2009, p. 47):

Assistimos: a) à diminuição dos seus níveis em alguns setores do processo produtivo, e ao aumento, em outros; b) a novas formas de remuneração do trabalho que procuram ancorar o ganho do trabalhador ao aumento da produtividade e ao desempenho das empresas, redesenhando-se um novo quadro remuneratório, que se distancia dos padrões legais tradicionais, formas de enfrentar a competitividade, as incidências salariais e os encargos salariais; c) às jornadas de trabalho reduzidas para reduzir gastos.[...] Assiste-se à retipificação dos contratos individuais de trabalho. Cresceu a adoção de contratos a prazo determinado, e a experiência da Espanha foi no sentido da sua ampla concessão seguida de alterações nessa política. Incentivou-se o contrato por prazo indeterminado com subsídios previdenciários, com o que foi possível a redução do número de contratados por prazo determinado e por curto tempo.

A tendência relativizadora gerada pela concorrência internacional é um dos fortes argumentos dos defensores da flexibilização das normas trabalhistas, de forma a situar a economia interna de país aos padrões internacionais de disputa de mercado. José Francisco Siqueira Neto manifesta-se neste sentido (OLIVEIRA et al, 1996, p. 334-335):

Neste sentido, a desregulamentação e a flexibilização teriam, então, por fundamento o aumento da produtividade e da competitividade das empresas e das economias nacionais. Oscar Ermida Uriarte traduz com clareza e objetividade o sentido do movimento desregulador, quando descreve que a proposta flexibilizadora consiste em afrouxar, eliminar ou adaptar, de acordo com os casos, a proteção trabalhista clássica, para aumentar o emprego, a inversão ou a competitividade internacional.

Em um mercado tão voltado ao comércio externo como o brasileiro, é de se pensar as proposições da doutrina defensora da flexibilização das normas laborais, sob a ótica da concorrência internacional, tendo em vista que o crescimento do empresariado e do setor produtivo nacional traduz-se em maior geração de empregos.

Neste contexto, pertinente a crítica feita por Sergio Pinto Martins (2009, p. 37), quando esclarece que, por vezes, a rigidez extrema das normas trabalhistas, em determinadas situações, geram efeito diametralmente inverso ao originalmente objetivado:

O Direito do Trabalho, de modo geral, é extremamente rígido, de forma a estabelecer uma proteção à parte mais fraca da relação trabalhista, que é o empregado, o hipossuficiente. Em razão dessa rigidez, acaba criando um efeito inverso. Em vez de proteger, acaba desprotegendo, porque o trabalhador é colocado à margem do sistema legal.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Interpretando-se o trecho acima sob a ótica do presente subtópico (globalização), observa-se pelas colocações doutrinárias dos defensores da flexibilização que a excessiva rigidez das normas juslaborais, ao invés de exercer a proteção da forma intentada ao empregado, acaba por gerar diminuição da oferta do emprego e menor duração do vínculo empregatício, de forma a gerar, ao menos em parte, efeito inverso ao pretendido.

Trata-se de opinião controversa, onde encontramos posições doutrinárias diametralmente opostas, tendo em vista a necessidade de proteção dos direitos dos trabalhadores. Quando se padronizam as relações trabalhistas, não são levadas em conta as diferenças socioeconômicas e culturais dos diversos países envolvidos, fazendo com que trabalhadores menos favorecidos ou esclarecidos sejam explorados pelo capital. Esta é a oposição suscitada pelo ilustre Pedro Paulo Teixeira Manus (2006, p. 126):

Eis por que não tem cabimento afirmar que o fenômeno chamado de globalização, que não é recente, mas apenas mais incisivo nos dias de hoje, possa ser benéfico às relações de trabalho nos países do Terceiro Mundo, pois o capitalismo impõe sempre medidas que preservem e aumentem o lucro, o que importa, sempre, em diminuir os custos de mão-de-obra e, por consequência, agravar as condições de trabalho.

E, ainda (2006, p. 129):

[...] a flexibilização e a terceirização são prejudiciais aos trabalhadores. Isso porque ambas são modos de tratamento da prestação de serviços que oferecem vantagens ao capital, mesmo porque, se assim não fosse, ao empregador de nada adiantaria e, portanto, delas não se utilizaria. E, se são formas de economizar com mão-de-obra, é evidente que resultam em prejuízo aos trabalhadores. Não obstante isso, tais fenômenos são fruto dos tempos atuais, da grande concentração de capitais e das leis de mercado que vivemos.

Evidentes são as discrepâncias doutrinárias acerca do tema. De toda forma, a globalização é apontada como causa motivadora dos ideais da flexibilização trabalhista, ainda que sejam de peso as opiniões contrárias ao avanço da concorrência global em detrimento das condições de trabalho, principalmente em países pobres.

2.3 Encargos sociais

Os protetores da tese da flexibilização das normas trabalhistas apontam os severos encargos sociais (no Brasil), como uma das causas motrizes da tendência à relativização de normas laborativas. Isto porque, com o peso dos encargos sociais (tributários via de regra) incidente sobre o vínculo de emprego, o valor da contratação do trabalhador tornar-se-ia por demais dispendioso, havendo necessidade de uma modificação na rigidez da pactuação entre tomadores e prestadores de serviço. Assim argumenta Sergio Pinto Martins (2009, p. 36):

Quando os encargos sociais são altos, dificultam a contratação de trabalhadores, pretendendo-se estabelecer flexibilização de certas condições de trabalho, até dos próprios encargos sociais. Se não houvesse a rigidez legal dos encargos sociais, talvez fosse possível a contratação de mais trabalhadores. Os desempregados também têm maior dificuldade de nova contratação pela rigidez da legislação. A carga tributária excessiva incidente sobre as empresas é suscetível de afetar sua competitividade num contexto global. Entretanto, no sistema brasileiro, as contribuições têm natureza tributária (art. 149 da Constituição), só podendo ser modificadas por lei (art. 150, I, da Lei Maior) e não por norma coletiva

De fato, a excessiva carga tributária incidente sobre a contratação de empregados pode ter o efeito de engessar o aumento da oferta de emprego. Ademais, como já explanado, em períodos de crise, tende-se o corte de gastos a recair sobre o emprego quando este é demasiado dispendioso para a empresa.

A doutrina que ostenta a bandeira da flexibilização propõe a flexibilização nas normas referentes à contratação de mão de obra como forma de aumentar a oferta de emprego e de adequar o mercado de trabalho ao crescimento econômico dos setores produtivos. Assim pontifica Luiz Carlos Amorim Robortella (1994, p. 99):

A Organização Internacional Du Travail, analisando a situação do emprego no mundo, destacava, em 1988, que todos os países vêm manifestando exigências de flexibilidade e de mobilidade, em razão da evolução técnica e da necessidade de preparar o mercado de trabalho para o crescimento da economia, da produtividade e do nível de emprego.

Veja-se que a discussão acerca dos excessivos encargos sociais incidentes sobre a contratação de empregados não é recente. Ainda na última década do século passado discutia-se doutrinariamente o tema. Conforme abordado por Anselmo Luis dos Santos (OLIVEIRA et al, 1996, p. 221):

A discussão sobre o peso dos encargos sociais no custo do trabalho no Brasil vem se acirrando nos últimos anos e ganhando importância nos estudos sobre economia do trabalho. Seguindo uma forma tradicional de calcular os encargos sociais, que assemelha-os aos custos decorrentes de todas as despesas legais incidentes sobre a folha de salários das empresas, alguns estudos (Pastore, 1994; FIESP 1993; IOB 1993ª) têm apontado que os encargos sociais representam um gasto adicional equivalente a pouco mais do que é gasto com a remuneração direta paga ao trabalhador.

Em estudo elaborado recentemente pelo DIEESE [03] (2010, p. 02), em fevereiro do ano corrente, temos uma definição bastante prática acerca dos encargos sociais, assim como um impacto mais realista deste na contratação dos trabalhadores:

Encargos sociais são aquela parcela do custo do trabalho que não vai para o bolso do trabalhador, como é admitido pelos próprios consultores empresariais. São a contribuição para o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), para o Serviço Social da Indústria (Sesi), o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e demais instituições que compõem o Sistema S, para o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), para o seguro de acidentes do trabalho, para o salário educação e para o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). No conjunto, representam 25,1% da remuneração total do trabalhador.

De fato, é importante a citação acima colacionada, tendo em vista que a maioria dos cálculos elaborados pelo setor produtivo acerca dos encargos sociais inclui nestes verbas como o décimo terceiro salário, o adicional de férias, o FGTS, a rescisão contratual, férias, repousos semanais, feriados e ausências remuneradas, que, consabidamente, são verbas revertidas direta ou indiretamente ao trabalhador. O cálculo elaborado por Anselmo Luis dos Santos (OLIVEIRA et al, 1996, p. 225) inclui tais verbas no rol de encargos sociais, fazendo, entretanto, a ressalva (OLIVEIRA et al, 1996, p. 226):

Assim, as estimativas do peso dos encargos sociais nos referidos estudos escondem diferenças importantes, tratando todas as despesas como se fosse da mesma natureza, e têm resultado (e muito provavelmente também um objetivo) que pode ser apreendido facilmente: confundir despesas decorrentes de importantes conquistas e direitos dos trabalhadores – que claramente estão associados à remuneração do trabalho, como o 13º salário, 1/3 de férias, férias FGTS e outros – com itens de despesas, também incidentes sobre a folha, embora de natureza muito distinta, que devem ser considerados como encargos sociais, como é o caso das contribuições para a previdência social, para entidades patronais e para financiamento de outras atividades de caráter social.

Observa-se, desta forma, que muito embora o peso dos encargos sociais possa engessar a oferta de emprego, deve-se analisar tal causa da flexibilização de forma criteriosa, tendo em vista que os cálculos elaborados pelo setor produtivo, dentro de um interesse próprio, distorcem em parte a realidade do peso desses encargos na contratação de mão de obra, incluindo verbas que possuem nítido caráter remuneratório ou que se traduzem em benefício imediato ao trabalhador.

2.4 Desemprego

Outra causa apontada pela doutrina especializada como motivadora da flexibilização, de especial interesse ao presente trabalho, é o desemprego. Trata-se da crise que de longa data é preocupação dos governos e da sociedade. Segundo Luiz Carlos Amorim Robortella (1994, p. 99):

Um dos mais graves problemas do Primeiro Mundo, e que se alastra pelo Segundo e Terceiro, é o persistente, contínuo e aparentemente incontrolável aumento do desemprego. Em todas as economias os estudiosos apontam para um desemprego estrutural e não meramente conjuntural. O modelo de industrialização ou reestruturação não favorece a criação de empregos; ao contrário, o que se vê é a diminuição de postos de trabalho, apesar da paradoxal realidade do aumento da produtividade.

Trata-se de discussão das mais importantes da atualidade, tendo em vista ser um problema global, de efeitos extramente prejudiciais à subsistência do homem e à economia interna de diversos países. O emprego fixo, outrora sólida instituição social, vem paulatinamente sendo derrubado, em face das demandas econômicas. Ainda segundo Luiz Carlos Amorim Robortella (1994, p. 100):

A questão colocou-se para o direito do trabalho de forma dramática. O contrato de trabalho clássico, sem duração determinada, com ânimo de permanência e perspectiva de estabilidade ou garantia de emprego, está a cada dia mais ameaçado pelo aumento das facilidades na demissão individual ou coletiva, bem como pelas formas atípicas de contratação, que se caracterizam pela precariedade.

No Brasil, são alarmantes os índices de desemprego. Observam-se nas tabelas a seguir [04] o nível de desemprego, por sexo, nas grandes metrópoles do nosso país:

Período

Regiões Metropolitanas e Distrito Federal

Belo Horizonte

Distrito Federal

Porto Alegre

Total

Homens

Mulheres

Total

Homens

Mulheres

Total

Homens

Mulheres

1998

15,9

13,7

18,7

19,7

17,4

22,1

15,9

13,7

18,6

1999

17,9

15,9

20,4

22,1

19,2

25,2

19,0

16,7

21,9

2000

17,8

16,1

19,9

20,2

17,7

22,9

16,6

14,2

19,6

2001

18,3

16,2

20,8

20,5

17,6

23,6

14,9

12,3

18,2

2002

18,1

15,7

20,8

20,7

18,0

23,6

15,3

13,1

17,9

2003

20,0

17,1

23,3

22,9

20,2

25,7

16,7

13,9

20,2

2004

19,3

16,8

21,9

20,9

17,9

24,0

15,9

13,1

19,1

2005

16,7

14,0

19,7

19,0

15,9

22,1

14,5

11,9

17,6

2006

13,8

11,0

16,9

18,8

15,9

21,8

14,3

12,0

16,9

2007

12,2

8,9

15,9

17,7

14,7

20,7

12,9

10,2

16,0

2008

9,8

7,2

12,7

16,6

13,4

19,8

11,2

8,8

13,9

2009

10,3

8,2

12,8

15,8

13,0

18,8

11,1

9,1

13,5

janeiro/2010

9,6

7,8

11,7

14,7

12,4

17,0

9,7

7,6

12,0

fevereiro/2010

9,7

7,9

11,9

14,1

11,5

16,9

9,6

7,8

11,6

 

 

Período

Regiões Metropolitanas e Distrito Federal

Recife

Salvador

São Paulo

Total

Homens

Mulheres

Total

Homens

Mulheres

Total

Homens

Mulheres

1998

21,6

19,0

24,9

24,9

22,9

27,1

18,2

16,1

21,1

1999

22,1

19,6

25,2

27,7

25,8

29,9

19,3

17,3

21,7

2000

20,7

18,2

23,9

26,6

24,1

29,3

17,6

15,0

20,9

2001

21,1

17,8

25,3

27,5

25,0

30,2

17,6

14,9

20,8

2002

20,3

17,6

23,6

27,3

24,9

29,9

19,0

16,4

22,2

2003

23,2

20,0

27,0

28,0

26,1

30,1

19,9

17,2

23,1

2004

23,1

20,3

26,5

25,5

23,2

28,0

18,7

16,3

21,5

2005

22,3

19,2

26,0

24,4

21,3

27,8

16,9

14,4

19,7

2006

21,3

18,4

24,8

23,6

20,4

27,0

15,8

13,4

18,6

2007

19,7

16,9

23,1

21,7

18,4

25,3

14,8

12,3

17,8

2008

19,6

16,9

22,9

20,3

16,5

24,1

13,4

10,7

16,5

2009

19,2

16,3

22,7

19,4

15,9

23,2

13,8

11,6

16,2

janeiro/2010

17,9

14,9

21,4

17,7

14,6

21,0

11,8

9,9

14,1

fevereiro/2010

19,0

16,0

22,5

18,8

15,4

22,5

12,2

10,4

14,3

Fonte: Fonte: Convênio DIEESE/SEADE, MTE/FAT e convênios regionais. PED - Pesquisa de Emprego e Desemprego. Amostras em porcentagem.

Pelo gráfico acima acostado, evidencia-se que a margem de desemprego nas grandes metrópoles do País, muito embora tenha retrocedido no começo de 2010, ainda encontra-se em taxas alarmantes.

O trabalho (seja oriundo de vínculo empregatício ou não) é um direito constitucionalmente valorado a todos os cidadãos. Reconhece o art. 1º, inciso IV, da Constituição Federal de 1988 o trabalho como um "Valor Social". Segundo Pedro Lenza (2009, p. 759):

Trata-se, sem dúvida, de importante instrumento para se implementar e assegurar a todos uma existência digna, conforme estabelece o art. 170, caput. O Estado deve fomentar uma política econômica não recessiva, tanto que, dentre os princípios da ordem econômica, destaca-se a busca do pleno emprego (art. 170, VIII). Aparece como fundamento da República (art. 1º, IV), e a ordem econômica, conforme os ditames da justiça social, funda-se na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa.

Como direito constitucionalmente garantido, o Estado, e a doutrina de uma forma geral, buscam alternativas para solução da crise empregatícia, onde surge, novamente, a ideia de flexibilização, para aqueles defensores da relativização dos direitos trabalhistas em prol de um bem maior: a oferta e manutenção do emprego.

Neste sentido, do combate ao desemprego, surgem opiniões doutrinárias diversas, das mais brandas até àquelas que já apontam para o radicalismo. É o caso da apocalíptica opinião de Jeremy Rifkin (1995, p. 13):

Para alguns, especificamente para os cientistas, engenheiros e empregadores, um mundo sem trabalho sinalizará o início de uma nova era na história, na qual os seres humanos serão libertados finalmente de uma vida de árduo trabalho e de tarefas repetitivas sem sentido. Para outros, a sociedade sem trabalhadores evoca a idéia de um futuro sombrio de desemprego em massa e pobreza generalizada, acentuada por tumultos sociais e revoluções. Em um ponto, virtualmente todas as correntes em disputa concordam. Estamos, efetivamente, entrando em um novo período na história – em que cada vez mais as máquinas tomarão o lugar dos seres humanos no processo de fabricação e de transporte de bens e fornecimento de serviços. Esta conscientização levou o Newsweek a considerar o impensável num recente artigo dedicado ao desemprego tecnológico. ‘E se realmente não existissem mais empregos?’perguntou o Newsweek. A ideia de uma sociedade não baseada no trabalho é tão completamente estranha a qualquer conceito que tenhamos sobre como organizar grandes quantidades de pessoas num todo social, que nos defronta com a perspectiva de precisar repensar a própria base do contrato social.

Algumas opiniões significativas posicionam-se favoravelmente à prática da flexibilização trabalhista como forma de manutenção e oferta de emprego remunerado. Começa-se por Sergio Pinto Martins, que assevera (2009, p. 36):

O aumento do desemprego também é causado, entre outras hipóteses, pela rigidez da legislação trabalhista. Daí se pretender flexibilizar a relação de trabalho para a diminuição do desemprego, a eliminação de horas extras, o trabalho a tempo parcial, a divisão do posto de trabalho, etc.

Observa-se, no trecho supramencionado, opinião no sentido de que uma menor rigidez nas relações de trabalho seria apta a uma modificação no mercado de trabalho tendente a uma maior oferta de emprego. Discutíveis são as formas apontadas para tal intento, entretanto, tais formas serão discutidas no momento oportuno.

No mesmo sentido é a arguta lição de Luiz Carlos Amorim Robortella (1994, p.101), para quem:

O crescimento constante do desemprego é um fato concreto e, por isso, as políticas passam da lógica social para a lógica do emprego. A flexibilização do contrato individual pode contribuir para a manutenção dos empregos, quando propõe substituir a rigidez da qualificação profissional pela polivalência de funções do empregado, ensejando maior mobilidade ocupacional. Essa técnica beneficia o emprego na medida em que, ampliando o jus variandi, aumenta as possibilidades de sua conservação.

Para Luiz Carlos Amorim Robortella, conforme evidenciado pelo excerto acima colacionado, a flexibilização do contrato individual de trabalho é o caminho apto para uma maior oferta de empregos. Através, da ampliação do bojo de tarefas (polivalência) do empregado, este estaria apto a ocupar os mais diversos postos de trabalho, o que lhe possibilitaria tanto a permanência na mesma empresa (remanejamento), como a busca por outro posto de trabalho, com maior facilidade. Sugere ainda (1994, p. 101) a reforma das leis trabalhistas, de forma que estas sejam um incentivo à geração de empregos.

Segundo artigo elaborado pelo DIEESE [05], a redução da jornada de trabalho de 44 horas semanais para 40 horas seria uma forma hábil para criação de postos de trabalho. Trata-se, de fato, de uma forma de flexibilização extremamente benéfica aos trabalhadores. Assim dispões o artigo:

g) O Brasil tem um contingente grande de desempregados – em torno de 3 milhões, apenas nas sete regiões metropolitanas pesquisadas pela Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), realizada pelo DIEESE, a Fundação Seade e convênios regionais. A proposta de redução da jornada das atuais 44 para 40 horas semanais tem potencial para gerar mais de 2,5 milhões de postos de trabalho. [...] i) A jornada de trabalho no Brasil está cada vez mais flexível, dado que às tradicionais formas de flexibilização do tempo - como a hora extra, o trabalho em turno, o trabalho noturno, as férias coletivas -, somaram-se novas formas - como a jornada em tempo parcial, o banco de horas e o trabalho aos domingos. (grifo nosso)

Mencionado artigo do DIEESE pauta-se em proposta de Emenda Constitucional, em trâmite no Congresso Nacional (PEC 231/95 [06]), voltado a redução da jornada máxima de trabalho semanal, atualmente de 44 horas, para 40 horas. Dentre as justificativas para tal atenuação da duração semanal de trabalho está justamente a possibilidade de abertura de novos postos de trabalho, advindos da brecha deixada pela redução da jornada, fazendo com que atuem dois empregados onde normalmente atua somente um. Acerca do assunto, importante a lição de Amauri Mascaro Nascimento (2009, p. 41):

A classe trabalhadora começou a lutar por bandeiras diferentes das tradicionais, dentre as quais a redução das horas de trabalho como meio de combate ao desemprego, na medida em que o tempo preenchido em horas extras com um empregado poderia servir à ocupação de outro. Na Europa, mediante acordos coletivos, houve significativas reduções da jornada de trabalho, exemplificando-se, na Alemanha, com o acordo entre a Volkswagen e o sindicato dos trabalhadores, que permitiu a conservação de cerca de 30.000 empregos. Ampliaram-se, em alguns países, os contratos por prazo determinado, como na Espanha e Argentina, autorizados em novas hipóteses e desonerando a empresa de alguns encargos sociais, com o objetivo de promover a absorção de desempregados na medida da redução do custo do trabalho no término do vínculo jurídico.

Deve-se, também, de outro giro, evidenciar a opinião de ilustres doutrinadores que repudiam a ideia da flexibilização, mesmo em situação emergenciais, como no caso da crise empregatícia. Neste, sentido, manifesta-se Maurício Godinho Delgado (2008, p. 201):

A indisponibilidade inata aos direitos trabalhistas constitui-se talvez no veículo principal utilizado pelo Direito do Trabalho para tentar igualizar, no plano jurídico, a assincronia clássica existente entre os sujeitos da relação socioeconômica de emprego. O aparente contingenciamento da liberdade obreira que resultaria da observância desse princípio desponta, na verdade, como o instrumento hábil a assegurar efetiva liberdade no contexto da relação empregatícia: é que aquele contingencialmente atenua ao sujeito individual obreiro a inevitável restrição de vontade que naturalmente tem perante o sujeito coletivo empresarial.

Para Maurício Godinho Delgado, deve prevalecer em todo o caso os princípios da Imperatividade das Normas Trabalhistas e da Indisponibilidade dos Direitos Trabalhistas (2008, p. 201), de forma que é incabível a flexibilização que de qualquer forma afete direitos dos trabalhadores de forma prejudicial.

Segundo Pedro Paulo Teixeira Manus (2006, p.130), não seria possível, por ser proibida constitucionalmente, a flexibilização de normas trabalhistas sem uma contrapartida de igual benefício, ou seja, a supressão de um direito trabalhista só seria permitida mediante uma contrapartida referente a um benefício de igual peso. Neste sentido:

Vemos, desde logo, que, dada a seriedade do tema, o legislador constitucional permite negociação, mas sempre coletiva, a fim de que haja negociação em situação de igualdade entre empresa e sindicato, o que não ocorre na relação empresa e empregado individualmente considerado. E a nosso ver, não permite o legislador constitucional, ainda que por instrumento coletivo, simples redução ou supressão de garantia constitucional ou legal, mas negociação que altere certo benefício em troca de outra vantagem, ou retire certo direito em favor de outra garantia compensatória. (Grifou-se)

Pelo exposto, observa-se a pertinência da flexibilização trabalhista quando aborda-se o tema do desemprego. Pautado na opinião da doutrina abalizada, evidencia-se que a relativização de algumas normas jurídicas trabalhistas poderia vir a ser meio hábil para criação de postos de trabalho. De outro giro, muitos são os que refutam com veemência a possibilidade de qualquer prejuízo aos direitos trabalhistas, ainda que em situação emergencial.

No próximo capítulo, onde serão abordados os limites da flexibilização trabalhista, ficará mais clara a posição daqueles que refutam tal tese, assim como os limites daqueles que a apregoam.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Joseph Bruno dos Santos Silva

Advogado no Mato Grosso do Sul.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Joseph Bruno Santos. Flexibilização do Direito do Trabalho: geração de empregos?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3054, 11 nov. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20414. Acesso em: 26 abr. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos