INTRODUÇÃO
Tema de importante relevo jurídico-tributário, profundamente controvertido, conflitante e dúbio é o instituto da incidência do ICMS por substituição tributária sobre a operação interestadual, com petróleo, inclusive lubrificante, combustível líquido e gasoso dele derivados.
Deste panorama, O presente trabalho consiste na análise de um de seus aspectos, qual seja: a incidência do ICMS por substituição tributária nas aquisições destes produtos para integrar processo produtivo, seja como matéria-prima ou material secundário de outros produtos que não outro lubrificante. Alvo de rigorosa fiscalização, resultando, na maior das vezes em pesadas autuações, longe de pretendermos o esgotamento do assunto, ansiamos, contudo, à luz da doutrina e da jurisprudência, trazer uma breve explicação acerca do significado e dos princípios que regem esta imposição tributária.
O PRINCIPIO DA REPARTIÇÃO TRIBUTÁRIA
Um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil é a redução das desigualdades sociais e regionais, tal como está prescrito no inciso III do artigo 3º e no artigo 150, inciso II que versa sobre a vedação à instituição de tratamento desigual entre os contribuintes, ambos da Constituição Federal de 1988.
Cabe ao Estado traçar metas, diretrizes e propor normas para a fiel consecução desse objetivo constitucional. Com efeito, uma das formas de atingi-lo é a correta repartição tributária entre as diversas unidades federadas. Em relação ao petróleo e a energia elétrica a repartição tributária significa beneficiar os estados consumidores, a eles recolhendo o montante do ICMS devido, em detrimento dos produtores, dado ser grande o número dos primeiros e poucos os produtores. Ele está insculpido no artigo 155, no seu §2º, inciso X, "b" e, in verbis:
"Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
II - operações relativas à circulação de mercadorias
§2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
X - não incidirá:
b) sobre operações que destinem a outros Estados petróleo inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica “.
Interpretando o dispositivo apregoado na Carta Magna, no julgamento do RE 198.088/SP, de Relatoria do Ministro Ilmar Galvão, concluiu o Plenário do STF, por maioria, o seguinte:
"De acordo com a norma do art. 155, §2º, X, b, da Constituição Federal, o ICMS "não incidirá: a)...; b) sobre operações que destinem a outros Estados, petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica”. Salta à vista, com efeito, que objetiva ela eliminar, como fonte geradora de ICMS, os poços de petróleo e as refinarias instaladas em poucos Estados, na medida em que exclui da incidência do tributo às operações destinadas ao abastecimento das demais unidades federadas, prevenindo o agravamento das desigualdades regionais, um dos objetivos fundamentais da República (art. 3º, III da CF). Prestigiou o constituinte, nesse passo, os Estados consumidores em detrimento dos Estados produtores.”
Na dicção da norma constitucional acima transcrita, podemos verificar que não se distingue, para fins da incidência do ICMS, entre operação interestadual, com petróleo, inclusive lubrificante, combustível líquido e gasoso dele derivados, destinada aos contribuintes do ICMS e a operação interestadual destinada ao consumidor. Tampouco estamos diante de imunidade ao imposto, mas de uma hipótese de não-incidência do tributo como, aliás, já reconheceu o Pretório Excelso em tantos outros julgados.
No dizer do ilustre Mestre Roque Antonio Carrazza [1], “as normas constitucionais que tratam das imunidades tributárias fixam a incompetência das pessoas políticas para fazerem incidir a tributação sobre determinadas pessoas, seja pela natureza jurídica que estas tem, seja porque realizam certos fatos, seja, ainda, por estarem relacionadas com dados bens ou situações. ... Estamos, pois, percebendo, que, as regras imunizantes conferem aos beneficiários, direito público subjetivo de não serem tributados.”
A NÃO-INCIDÊNCIA DO ICMS NAS SAÍDAS INTERESTADUAIS
Como já dissemos, a não-incidência do imposto concebida no Texto Maior tem por escopo o incentivo ao Estado onde se dará o consumo do produto, como forma de efetivar a repartição tributária. De fato, não é um benefício fiscal concedido ao contribuinte ou ao consumidor do produto. Aliás, esta é a lição que com muita propriedade o eminente Ministro Ilmar Galvão nos ensina no citado acórdão de sua relatoria:
“...não beneficia, portanto, o consumidor, mas o Estado de destino do produto, ao qual caberá todo o tributo sobre ele incidente, até a operação final. Do contrário, estaria consagrado tratamento desigual entre consumidores, segundo adquirissem eles os produtos de que necessitam, no próprio Estado, ou no Estado vizinho, o que não teria justificativa".
É assim, por exemplo, que o Estado de São Paulo disciplinou a matéria incorporando no Regulamento do ICMS paulista, aprovado pelo Decreto 45.490/2000, a regra constitucional contida artigo 155, §2º, X, “b” alhures mencionada, conforme poderemos observar na leitura do artigo 7º, inciso VI deste Diploma Legal:
“Art. 7º- O imposto não incide sobre:
VI - a saída com destino a outro Estado de energia elétrica ou de petróleo, inclusive lubrificante ou combustível liquido ou gasoso, dele derivados;”
Isto não significa hipótese de inexigibilidade da exação tributária, mas apenas alteração do sujeito ativo a quem será devido e recolhido o imposto, que passará do Estado produtor para o Estado consumidor. Destarte, a não-incidência ao ICMS está restrita ao Estado de origem, não abrangendo, portanto, o Estado de destino, onde são tributadas todas as operações que compõem o ciclo econômico por que passam estes produtos, desde a produção até o consumo, pois assim dispõe o artigo, 155, § 4º, inciso I, da Constituição Federal, in verbis:
“Art. 155...
§ 4º Na hipótese do inciso XII, h, observar-se-á seguinte:
I – nas operações com os lubrificantes e combustíveis derivados de petróleo, o imposto caberá ao Estado onde ocorrer o consumo.”
A SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA DO ICMS NAS OPERAÇÕES INTERESTADUAIS
Por delegação da Carta Magna, compete à lei complementar dispor sobre o imposto dos Estados e do Distrito Federal sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação. Neste diapasão foi promulgada a Lei Complementar 87/96 (Lei Kandir), que no inciso III do §1º do seu artigo 2º e inciso III do artigo 3º, preconizam:
“Art. 2° - O imposto incide sobre:
§ 1º - O imposto incide também:
III - sobre a entrada, no território do Estado destinatário, de petróleo, inclusive lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e de energia elétrica, quando não destinados à comercialização ou à industrialização, decorrentes de operações interestaduais, cabendo o imposto ao Estado onde estiver localizado o adquirente.”
e
“Art. 3º O imposto não incide sobre:
III - operações interestaduais relativas a energia elétrica e petróleo, inclusive lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, quando destinados à industrialização ou à comercialização;”
O recolhimento do ICMS na modalidade de substituição tributária, por sua vez, encontra-se disciplinado no artigo 6º e parágrafo 1º da citada lei complementar, sendo que a adoção do regime requer celebração de prévio acordo entre os Estados, conforme poderemos verificar nos dispositivos normativos em comento:
“Art. 9º A adoção do regime de substituição tributária em operações interestaduais dependerá de acordo específico celebrado pelos Estados interessados.
§ 1º A responsabilidade a que se refere o art. 6º poderá ser atribuída:
I - ao contribuinte que realizar operação interestadual com petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, em relação às operações subseqüentes;”
O instituto da substituição tributária é um regime diferenciado de recolhimento do ICMS, mediante o qual se atribui a determinado contribuinte a responsabilidade pelo recolhimento do imposto relativo a fato gerador praticado por terceiro. Em outras palavras, na substituição tributária o contribuinte “A”, denominado contribuinte-substituído, realiza uma operação ou prestação que configura fato gerador do imposto, porém cabe ao contribuinte “B”, denominado contribuinte-substituto, efetuar o respectivo recolhimento. A aplicação do regime da substituição tributária apresenta-se como instrumento de política tributária, na medida em que favorece e facilita o controle fiscal e promove a recuperação de receita do ICMS em vários setores da economia. Como técnica de tributação nas operações subseqüentes, tende a corrigir as distorções concorrenciais de natureza tributária, promovendo justiça fiscal, equalizando as condições competitivas entre contribuintes do mesmo setor.[2]
A permitir a adoção do instituto da substituição tributária para recolhimento do ICMS antecipado, pelas operações subseqüentes com petróleo, inclusive lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, as unidades da federação por meio do Conselho Nacional de Política Fazendária - CONFAZ, na sua 127ª reunião ordinária, realizada em Florianópolis, SC, no dia 28 de setembro de 2007, resolveram celebrar o Convênio ICMS 110/2007, o qual revogou o Convênio ICMS 03/99, estabelecendo que ficam os Estados e o Distrito Federal, quando destinatários, autorizados a atribuir ao remetente de combustíveis e lubrificantes, derivados ou não de petróleo, a condição de sujeito passivo por substituição tributária, relativamente ao ICMS incidente sobre as operações com estes produtos, a partir da operação que o remetente estiver realizando, até a última, assegurado o seu recolhimento à unidade federada onde estiver localizado o destinatário.
Em relação às operações interestaduais com esses produtos, destinadas a integrar o processo produtivo do destinatário, estabelece o Convênio ICMS 110/2007:
“Cláusula primeira:
§ 1º O disposto nesta cláusula também se aplica:
IV - na entrada no território da unidade federada destinatária de combustíveis e lubrificantes derivados de petróleo, quando não destinados à sua industrialização ou à sua comercialização pelo destinatário”. (grifos nossos)
Neste ponto faz-se necessário traçar um paralelo entre a norma contemporânea e a antiga agora revogada. Estabelecia, então, o antigo Convênio ICMS 03/1999, também, para fins de incidência do ICMS por substituição tributária:
“Cláusula primeira:
§ 1º O disposto nesta cláusula também se aplica:
III - na entrada de combustíveis e lubrificantes derivados de petróleo, quando não destinados à industrialização ou à comercialização pelo destinatário.”
Percebemos pois, na análise de cada um dos dispositivos normativos conveniados, que o atual dispositivo inovou o ordenamento, ao acrescentar o pronome possessivo “à sua” antes do substantivo “industrialização”. Essa inovação teve como conseqüência restringir a operação de industrialização a que se submete o lubrificante derivado de petróleo àquelas que transformam lubrificantes em outros lubrificantes, Isto é, a operação de industrialização que decorre do próprio produto – não se trata, enfatizamos, de lubrificantes como insumos na fabricação de qualquer outro produto, mas de lubrificante como matéria-prima de outro lubrificante.
Embora no convênio ICMS anterior (03/99), a restrição do conceito de industrialização à operação que decorre do próprio produto não estava explícita, essa interpretação vinha sendo adotada pelo Estados, mesmo antes da edição do citado convênio ICMS 110/2007, os quais editaram normas regulamentadoras internas corroborando essa assertiva.
Neste contexto, citamos, exemplificativamente, a Instrução Normativa SLT nº 01, de 03 de junho de 2003, editada pela Secretaria de Estado de Fazenda de Minas Gerais, cujo fragmento do texto abaixo reproduzimos:
“Considerando que uma interpretação extensiva do termo "industrialização", a que se referem os supracitados dispositivos legais, de modo a alcançar todo e qualquer processo industrial de que façam parte o petróleo, inclusive lubrificantes, os combustíveis líquidos e gasosos dele derivados e a energia elétrica, implicaria indevida subordinação do mandamento constitucional à eventualidade da tributação das mercadorias resultantes de tal processo, quando distintas daqueles produtos; considerando, também, a uniformidade de entendimento existente nas demais unidades da Federação, relativamente à presente matéria; considerando, por fim, a necessidade de orientar os servidores, os contribuintes e os profissionais que atuam na área jurídico-tributária quanto à correta interpretação dos dispositivos em tela, resolve expedir a seguinte Instrução Normativa:
Art. 1º - Incide o ICMS sobre a entrada no território mineiro de petróleo, inclusive lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e de energia elétrica, quando não destinados à comercialização ou à industrialização.
Parágrafo único - Para efeito do disposto no caput, entende-se por industrialização a operação em que os mencionados produtos sejam empregados como matéria-prima e da qual resulte petróleo, inclusive lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos dele derivados ou energia elétrica.”
Mais tarde, em 14 de novembro de 2005, o executivo mineiro editou o Decreto nº 44.147, que promoveu alteração no anexo XV do Regulamento do ICMS de Minas Gerais, introduzindo novas regras relativas à substituição tributária. Dentre estas regras está a previsão de ocorrência do fato gerador do ICMS por substituição tributária incidente sobre operação que remete petróleo, lubrificante e combustível líquido ou gasoso dele derivados ou de energia elétrica, quando não destinados à industrialização do próprio produto, como podemos observar, in verbis, com nossos destaques:
“Art. 1º - Ocorre a substituição tributária, quando o recolhimento do imposto devido:
III - pelo adquirente ou destinatário da mercadoria ficar sob a responsabilidade do alienante ou do remetente, nas hipóteses de entrada ou recebimento em operação interestadual de:
b) petróleo, de lubrificante e combustível líquido ou gasoso dele derivados ou de energia elétrica, quando não destinados à comercialização ou à industrialização do próprio produto, ainda que o adquirente ou destinatário não seja inscrito como contribuinte deste Estado”;
Note-se, por oportuno que no mesmo anexo XV do Regulamento do ICMS do Estado de Minas Gerais, agora no inciso IV do seu artigo 18, há previsão da hipótese de inaplicabilidade da substituição tributária às operações que destinem mercadorias a estabelecimento industrial para emprego em processo de industrialização como matéria-prima, produto intermediário ou material de embalagem. Então, estamos aqui, diante de uma aparente antinomia, uma vez que há no ordenamento duas normas conflitantes, e, a opção por uma delas implicará em violação da outra. A Professora Maria Helena Diniz [3], com brilhantismo nos ensina que a ordem jurídica prevê uma série de critérios para a solução de antinomias no direito interno. Dentre esses, o critério da especialidade - lex epecialis derogat legi generali – é o que melhor teremos para solucionar esse conflito. Citando Norberto Bobbio, assevera a ilustre Mestra que “a superioridade da norma especial sobre a geral constitui expressão da exigência de um caminho da justiça, da legalidade à igualdade. Ter-se-á, então, de considerar a passagem da lei geral à especial, isto porque ... em certas circunstâncias, uma norma ordena ou permite determinado comportamento somente a algumas pessoas, as demais, em idênticas situações, não são alcançadas por ela, por se tratar de disposição excepcional, que só vale para as situações normadas.”
Temos, então, o produto in casu em duas situações aparentemente idênticas: numa delas o lubrificante derivado de petróleoé remetido ao destinatário estabelecido no Estado de Minas Gerais para ser empregado como matéria-prima ou produto intermediário em processo produtivo do qual o resultado seja outro lubrificante.
Noutra, o lubrificante derivado de petróleo também é remetido ao destinatário estabelecido no mesmo Estado, mas desta vez, para ser empregado como matéria-prima ou produto intermediário em processo produtivo do qual o resultado seja outro produto qualquer diferente de lubrificante, como, por exemplo, produto da indústria metalúrgica.
Nos termos da legislação mineira supracitada, para fins da incidência do ICMS por substituição tributária essas situações não se confundem: No primeiro caso, a operação de remessa estará amparada pela regra contida no inciso IV do seu artigo 18 do anexo XV do Regulamento do ICMS, não incidindo, sobre ela, o recolhimento do ICMS por substituição tributária.
No segundo, a operação sucumbirá à regra contida no artigo 1º, inciso III, ”b” do mesmo anexo XV do Regulamento do ICMS do Estado de Minas Gerais, incidindo sobre ela o ICMS por substituição tributária.
A realçar e elucidar as diferenças apontadas, citamos trecho do acórdão prolatado pelo Conselho de Contribuintes do Estado de Minas Gerais, de nº 18.692/10/2ª, Rito Sumário - PTA/AI: 01.000161382-69, da relatoria do conselheiro Edwaldo Pereira de Salles:
“...Verifica-se, pois, que toda a legislação pertinente estabelece a incidência do imposto nas operações que destinem derivados de petróleo a este Estado, quando o produto não for destinado à comercialização ou à industrialização do próprio produto. Com base no dispositivo da Lei Complementar supracitado, o qual determina a não incidência do imposto nas operações interestaduais que destinem combustíveis à comercialização ou à industrialização, e considerando-se a previsão do dispositivo constitucional que estabelece que o imposto, relativo a tais operações, caberá ao Estado onde ocorrer seu consumo, razoável é a interpretação de que a base do sistema de tributação reside no próprio produto... Evidente que é inadequada a interpretação literal do dispositivo, feita pela Impugnante – que exclui a incidência do ICMS em operação interestadual quando destinado à industrialização - posto que não considera os demais dispositivos e princípios constitucionais como um sistema único. Um conflito normativo entre disposições constitucionais ocorreria caso se aceitasse essa interpretação, pois, ao concluir pela total liberação em relação à tributação, estaria negado o princípio da capacidade contributiva, conduzindo-se a uma discriminação em relação à origem das mercadorias, desigualando a concorrência. Vale colocar, a título de ilustração, uma situação hipotética em que duas indústrias, idênticas e vizinhas, necessitem de lubrificantes para aplicar em qualquer ponto de sua atividade industrial: aquela que comprasse lubrificante de industrial/distribuidor situado no mesmo Estado teria um custo maior do que aquela que recebesse o produto de remetente situado em outra Unidade da Federação. Isto porque o industrial/distribuidor sediado em outra unidade da Federação remeteria os lubrificantes sem retenção do ICMS/ST, enquanto que o seu concorrente situado em Minas Gerais iria enviar seus lubrificantes devidamente gravados pelo ICMS/ST. ..”
A jurisprudência estadual mineira, por sua vez, ao enfrentar o assunto, vem trilhando o mesmo caminho, no sentido de reconhecer a incidência do ICMS por substituição tributária nas operações que remetem lubrificantes para serem utilizados no processo produtivo de outros produtos, que não um novo lubrificante.
Veja-se, por exemplo, o julgado do recurso de apelação interposto contra sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Betim, que julgou improcedentes os embargos à execução opostos pela apelante, com nossos destaques:
Relator: Des.(a) LEITE PRAÇA
Relator do Acórdão: Des.(a) LEITE PRAÇA
Data do Julgamento: 15/03/2011
Data da Publicação: 08/04/2011
Inteiro Teor: EMENTA: EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. SENTENÇA CITRA PETITA. NULIDADE AFASTADA. ICMS. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. DERIVADOS DE PETRÓLEO. NÃO INCIDÊNCIA DA IMUNIDADE PREVISTA NO ART. 155, X, "B", DA CF/88 E NO ART. 3°, III, DA LC N° 87/96. MULTA EMBARGOS REJEITADOS. MULTA. PREVISÃO LEGAL. RECURSO DESPROVIDO. I - In casu, não se justifica a invalidação da sentença citra petita, cabendo a este eg. Tribunal realizar o julgamento do fundamento não apreciado pelo juízo a quo, porquanto respeitado o contraditório e a ampla defesa, estando a causa madura para a apreciação do ponto omisso. II - Consoante precedente do Pleno do Supremo Tribunal Federal, a imunidade ou hipótese de não-incidência prevista no art. 155, inciso X, "b", da CF/88, restringe-se ao Estado de origem, não alcançando o Estado de destino da mercadoria. III - Na hipótese de distribuição de lubrificantes do Rio de Janeiro para contribuintes de Minas Gerais, que não industrializam ou comercializam tais produtos, sujeita-se a Recorrente ao recolhimento do ICMS, pelo regime constitucional da substituição tributária. IV - A teor do disposto no art. 2º, § 2º, da Lei de Introdução ao Código Civil, prevalece a lei especial sobre a geral, ainda que posteriormente editada, caso não haja revogação expressa de uma ou outra. V - Mostra-se, legítima a aplicação da multa no percentual de 100% sobre o valor do imposto devido, eis que amparada pelo art. 56, inciso II, §2°, da Lei nº 6.763/75. APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0027.08.154346-7/001 - COMARCA DE BETIM - - RELATOR: EXMO. SR. DES. ANDRÉ LEITE PRAÇA – ACÓRDÃO:Vistos etc., acorda, em Turma, a 7ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador WANDER MAROTTA , incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NEGAR PROVIMENTO.
A ilustrar o presente trabalho utilizamos legislação tributária e decisões do Estado de Minas Gerais porque é o que, de forma mais cristalina disciplinou a matéria. Diferencia, sobejamente, no seu ordenamento tributário, para fins da incidência ou da não-incidência do ICMS por substituição tributária, as operações em que o óleo lubrificante derivado de petróleo é destinado à industrialização de outros produtos e as operações em que é utilizado na industrialização do próprio produto, tendo inclusive incorporado as normas estabelecidas no Convênio ICMS 110/2007.
Outros Estados da Federação, entretanto, têm se manifestado neste mesmo sentido, o da incidência do ICMS por substituição tributária nas operações que a eles remetem lubrificantes derivados de petróleo para serem utilizados no processo produtivo de outros produtos. O Estado de Santa Catarina é um dos exemplos. Outro é o Estado do Paraná. Veja-se, resposta à consulta de nº 36/2009, sobre o assunto em tela, formulada à Secretaria da Fazenda deste Estado. O Setor Consultivo da Inspetoria Geral de Tributação respondeu que “quando são derivados de petróleo, nas mencionadas operações com lubrificantes, o imposto incide em favor da unidade federada de destino (Paraná), conforme estabelece o artigo 2º, §1º, “c”, que deverá ser recolhido por substituição tributária, como prevê o artigo 489, § 1º, “b”.” (dispositivos citados, todos do Regulamento do ICMS do Estado do Paraná).
Por derradeiro, e à guisa de arremate, citamos a modificação do Código Fiscal de Operações e Prestações, procedida pelo Ajuste SINIEF 09/2003, que introduziu o item 6.650 – Saídas interestaduais de combustíveis, derivados ou não derivados de petróleo e lubrificantes.
Há que se observar abaixo, que o Código 6.651 cuida das operações de vendas do produto destinadas à industrialização subseqüente, enquanto o código 6.653 trata das operações de vendas destinadas a consumidor ou usuário final. Nas notas explicativas de cada código, todavia, temos que o código 6.651 refere-se à venda de combustível ou lubrificante, industrializados no estabelecimento e destinados à industrialização do próprio produto e o código 6.653 refere-se à venda de combustível ou lubrificante, industrializados no estabelecimento e destinados a consumo em processo de industrialização de outro produto, à prestação de serviço ou a usuário final. Podemos deduzir, por óbvio, que não haveria necessidade de codificações distintas se não houvesse também tratamento fiscal diferenciado em cada uma das situações codificadas:
6.651 - Venda de combustível ou lubrificante, de produção do estabelecimento, destinados à industrialização subseqüente
Venda de combustível ou lubrificante, industrializados no estabelecimento e destinados à industrialização do próprio produto, inclusive aquela decorrente de encomenda para entrega futura, cujo faturamento tenha sido classificado no código 6.922 – "Lançamento efetuado a título de simples faturamento decorrente de venda para entrega futura". (Dec. 26.174/2003- EFEITOS A PARTIR DE 01.01.2004)
6.653 - Venda de combustível ou lubrificante, de produção do estabelecimento, destinados a consumidor ou usuário final
Venda de combustível ou lubrificante, industrializados no estabelecimento e destinados a consumo em processo de industrialização de outro produto, à prestação de serviço ou a usuário final, inclusive aquela decorrente de encomenda para entrega futura, cujo faturamento tenha sido classificado no código 6.922 – "Lançamento efetuado a título de simples faturamento decorrente de venda para entrega futura". (Dec. 26.174/2003- EFEITOS A PARTIR DE 01.01.2004)
Das notas explicativas endereçadas a cada um dos códigos de operações e prestações, as remessas interestaduais de lubrificantes derivados de petróleo para serem integradas aos processos produtivos de outros produtos, que não outros lubrificantes, extrai-se tratar de uma operação análoga às que destinam o mesmo produto para uso ou consumo próprio do adquirente, também sujeitas à incidência do ICMS por substituição tributária devido à unidade federativa consumidora e calculado pelo diferencial de alíquotas.
CONCLUSÃO
Não sem razão, ao longo de toda a legislação retro reproduzida é diferenciada a industrialização do próprio produto da industrialização de outros produtos. Porquanto, em nosso sentir, sobre as operações que destinem a outros Estados, petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados para emprego no processo produtivo de outros produtos, que não seja novo lubrificante, recairá a incidência do ICMS por substituição tributária, devendo o montante do tributo apurado ser recolhido a favor da unidade federada destinatária.
Resta-nos certificar se o Estado destinatário contempla a legitimidade de utilização como crédito fiscal o montante do ICMS pago a título de substituição tributária nas circunstâncias acima mencionadas. Essa possibilidade, embora incompatível com a sistemática da substituição tributária, encontra perfeita sintonia no principio da não comutatividade do ICMS, que garante a neutralidade do ICMS na cadeia produtiva, independentemente das operações subsequentes que venham a ocorrer, e o da vedação a bi-tributação, pois é certo que os produtos fabricados pelo adquirente destes insumos, serão também, por sua vez, tributados pelo ICMS quando da saída do estabelecimento industrial.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E LEGISLAÇÃO CONSULTADA:
(1) Carrazza, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário - 20. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, v. 1.
(2) Conceito disponível em: <www.fazenda.mg.gov./empresas/substituição_tributária>
(3) Diniz, Maria Helena. Compêndio de Introdução à Ciência do Direito - 15. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 1.
Constituição da República Federativa do Brasil – Vade Mecum Saraiva – 12. ed. Atual e ampl. – São Paulo, Saraiva, 2011
Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996 – Vade Mecum Saraiva – 12. ed. Atual e ampl. – São Paulo, Saraiva, 2011 (CD-ROM)
Coletânea de Legislação Administrativa – Organização Odete Medauar. 7. ed. Ver. e ampl. – São Paulo, RT, 2007
Convênio ICMS 110, de 28 de setembro de 2007 disponível em <www.fazenda.gov.br/confaz/confaz/convenios/ICMS/2007/cv110_07.htm> - Acesso em: setembro de 2011
Convênio ICMS 03, de 16 de abril de 1999 disponível em <www.fazenda.gov.br/confaz/confaz/convenios/ICMS/1999/CV003_99.htm> - Acesso em: setembro de 2011
Regulamento do ICMS do Estado de Minas Gerais aprovado pelo Decreto 43.080/2002, disponível em <www.fazenda.mg.gov.br> - Acesso em: setembro de 2011
Regulamento do ICMS do Estado de São Paulo aprovado pelo Decreto 45.490/2000, disponível em <www.fazenda.sp.gov.br> - Acesso em: setembro de 2011