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A aquisição de medicamentos, produtos e insumos estratégicos, sem registro na Anvisa, por intermédio de organismos internacionais.

Mecanismo indispensável ao Estado brasileiro para concretização do dever constitucional de prestar a saúde

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08/01/2012 às 13:22
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As aquisições de imunobiológicos, inseticidas, medicamentos e outros insumos estratégicos, por intermédio de organismos multilaterais internacionais, para uso em programas de saúde pública pelo Ministério da Saúde, podem ser dispensadas de registro pela Anvisa.

Palavras-chave: Direito Internacional, Constitucional, Administrativo e Sanitário. Aquisição de medicamentos e insumos adquiridos, sem registro na Anvisa, para uso em programas de saúde pública pelo Ministério da Saúde e suas entidades vinculadas.

Sumário: 1 Introdução - 2 Dever constitucional de garantir a saúde - 2.1 Formas de execução de ações e serviços de saúde - 2.2 Licitação como princípio para a contratação pública - 2.3 Da aquisição de produtos e insumos para implementação de ações de saúde no âmbito do Ministério da Saúde - 2.3.1 A Lei n. 10.191, de 2001 - 3 Organismos internacionais como entidades parceiras - 3.1 Da aquisição de medicamentos e insumos via organismos internacionais e a busca pela qualidade e segurança - 4 Anvisa e o exercício de poder de polícia - 4.1 Do registro concedido pela Anvisa e seu substrato - 4.2 A Lei n. 6.360, de 1976, e o registro de medicamentos, drogas e insumos farmacêuticos de procedência estrangeira - 4.3 Dispensa de registro, pela Anvisa, de imunobiológicos, inseticidas, medicamentos e outros insumos estratégicos e anuência com a importação e exportação de produtos e serviços que envolvam risco à saúde pública - 5 A Lei n. 12.401, de 2011, e a proibição de dispensação, pagamento, ressarcimento ou reembolso de produto, nacional ou importado, sem registro na Anvisa - 5.1 Houve revogação ou limitação do poder de polícia da Anvisa? Inocência primitiva de Alberto Caeiro - 5.2 Qual o alcance da vedação trazida, então, pela Lei n. 12.401, de 2011? - 6 Conclusão – 7 Referências


1 INTRODUÇÃO

No dever de prestar a saúde, o Ministério da Saúde e suas entidades vinculadas podem adquirir imunobiológicos, inseticidas, medicamentos e outros insumos estratégicos, para a implementação de ações de saúde, por intermédio de organismos multilaterais internacionais, de que o Brasil faça parte, obedecendo aos procedimentos por eles adotados.

Nesse intento, é permanente a cooperação técnica internacional firmada por meio de Termos de Cooperação pela União (Ministério da Saúde), que representam, antes de tudo, tratados internacionais.

Lei especial n. 9.782, de 1999, de criação da Anvisa – Agência de Vigilância Sanitária – faculta àquela agência reguladora dispensar de registro medicamentos e produtos quando adquiridos nessas condições.

Recentemente, contudo, houve inovação legislativa com a edição da Lei n. 12.401, de 2011, que acresceu o art. 19-T à Lei n. 8.080, de 1990, vedando, em todas as esferas de gestão do SUS, o pagamento, o ressarcimento ou o reembolso de medicamento, produto e procedimento clínico ou cirúrgico experimental, ou de uso não autorizado pela Anvisa, bem como a dispensação, o pagamento, o ressarcimento ou o reembolso de medicamento e produto, nacional ou importado, sem registro na Anvisa.

Desse aparente conflito normativo emerge a importância do presente trabalho que, transfixando o arcabouço normativo existente, conclui que referido procedimento aquisitivo permanece intangível no ordenamento jurídico brasileiro, apresentando-se como mecanismo indispensável ao Estado brasileiro para concretização do dever constitucional de prestar a saúde, restando, ainda, preservadas as atribuições da Anvisa.


2 DEVER CONSTITUCIONAL DE GARANTIR A SAÚDE

A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício. Sob tal premissa, o dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação. [01]

2.1 Formas de execução de ações e serviços de saúde

O Poder Público, ao executar as ações e serviços de saúde, pode fazê-lo diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado. [02]

2.2 Licitação como princípio para a contratação pública

A Constituição da República tracejou princípio extensivo a toda a Administração Pública brasileira – direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios – consistente no dever de licitar para as contratações, nos seguintes termos:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

[...]

XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

2.3 Da aquisição de produtos e insumos para implementação de ações de saúde no âmbito do Ministério da Saúde

2.3.1 A Lei n. 10.191, de 2001

Quanto à aquisição na área de saúde, contudo, é interessante notar que em 14 de fevereiro de 2001, foi editada a Lei n. 10.191, a qual dispôs sobre a aquisição de produtos para a implementação de ações de saúde no âmbito do Ministério da Saúde, estabelecendo que as aquisições de imunobiológicos, inseticidas, medicamentos e outros insumos estratégicos, efetuadas pelo Ministério da Saúde e suas entidades vinculadas, para a implementação de ações de saúde, poderão ser realizadas por intermédio de organismos multilaterais internacionais, de que o Brasil faça parte e obedecerão aos procedimentos por eles adotados. [03]


3 ORGANISMOS INTERNACIONAIS COMO ENTIDADES PARCEIRAS

Ao trilhar seu dever constitucional de prestar a saúde, conta o Ministério da Saúde do Brasil com a colaboração, de regra, viabilizada por Termo de Cooperação Técnica internacional [04], de vários organismos internacionais, entre os quais a OPAS – Organização Pan-Americana de Saúde/OMS, o UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância - e UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.

3.1 Da aquisição de medicamentos e insumos via organismos internacionais e a busca pela qualidade e segurança

As aquisições de medicamentos, vacinas, inseticidas e kits diagnósticos, por intermédio desses organismos internacionais, são realizadas em situações consideradas estratégicas, não podendo o Ministério da Saúde brasileiro delas prescindir, mesmo porque, em alguns casos de medicamentos antimaláricos, antirretrovirais e inseticidas, não existem fornecedores nacionais ou não há produção suficiente no mercado interno para tanto.

Não se pode olvidar, contudo, a par da imprescindibilidade de tal cooperação internacional, da busca constante pela garantia de fornecimento de medicamentos e insumos com qualidade e segurança, sendo conveniente ao gestor observar os princípios da economicidade e da eficiência, uma vez que dispõe de outros instrumentos legais para a consecução desse mesmo fim.

Deve, assim, o gestor buscar o melhor resultado estratégico possível na alocação dos recursos financeiros de forma a obter a melhor relação de custo e benefício. [05]


4 Anvisa e o exercício de poder de polícia

Nesse prumo, relevante o papel desenhado pelo legislador, especialmente com a criação da ANVISA – Agência de Vigilância Sanitária – ao atribuir-lhe a finalidade institucional de promover a proteção da saúde da população, por intermédio do controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária, inclusive dos ambientes, dos processos, dos insumos e das tecnologias a eles relacionados, bem como o controle de portos, aeroportos e de fronteiras. [06]

Trata-se, como bem lembrado por Cristiano Carvalho [07], de "típica atividade sanitária, i.e, modalidade do exercício do poder de polícia do Estado, com o fim de proteger a saúde da população. Tal fiscalização não só se dará em relação aos produtos em si e serviços envolvendo a saúde, como também o próprio processo de produção, os ambientes em que ocorrem esses processos e as técnicas utilizadas neles. Outro ponto importante da vigilância é o controle de portos, aeroportos e fronteiras, potenciais portas de entrada para todo tipo de ameaça à saúde pública".

Denota-se, desse modo, que a Anvisa é dotada de poderes regulatórios, de fiscalização e controle de produtos e serviços, que ofereçam risco à saúde pública, possuindo tal agência reguladora [08], portanto, perfil de excepcional interesse e relevância pública. [09]

4.1 Do registro concedido pela Anvisa e seu substrato

No que diz respeito aos medicamentos, drogas e insumos farmacêuticos, afirma Helio Pereira Dias [10], as normas aprovadas se esmeram no sentido de proteger a saúde dos usuários, exigindo, para registro, comprovações científicas, inclusive laboratoriais, sobre a segurança e eficácia dos produtos, sobre a identidade, atividade, qualidade, pureza e inocuidade deles e, quando julgado necessário, são exigidas amostras para análises e experiências.

4.2 A Lei n. 6.360, de 1976, e o registro de medicamentos, drogas e insumos farmacêuticos de procedência estrangeira

Consoante previsto no art. 18 da Lei n. 6.360, de 1976, o registro de drogas, medicamentos e insumos farmacêuticos de procedência estrangeira dependerá, além das condições, das exigências e dos procedimentos previstos para os produtos fabricados no Brasil, a comprovação de que já é registrado no país de origem.

Caso considere necessário, está a Anvisa autorizada, por lei, a exigir do fabricante as alterações indispensáveis, de modo que a simples comprovação de registro no exterior não implicará, necessariamente, no direito ao registro no Brasil, assim como a interdição ou cancelamento posterior do registro no exterior não induz à obrigatoriedade de igual procedimento em território nacional, salvante se sobejarem razões de convencimento no plano científico pelos órgãos competentes da Anvisa para tanto. [11]

4.3 Dispensa de registro, pela Anvisa, de imunobiológicos, inseticidas, medicamentos e outros insumos estratégicos e anuência com a importação e exportação de produtos e serviços que envolvam risco à saúde pública

Insere-se, ainda, nas atribuições da Anvisa, entre outras, anuir com a importação e exportação dos produtos e serviços que envolvam risco à saúde pública [12], podendo, ainda, regulamentar outros produtos e serviços de interesse para o controle de riscos à saúde da população, alcançados pelo Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, bem como dispensar de registro os imunobiológicos, inseticidas, medicamentos e outros insumos estratégicos quando adquiridos por intermédio de organismos multilaterais internacionais, para uso em programas de saúde pública pelo Ministério da Saúde e suas entidades vinculadas (§§4º e 5º do art. 8º da Lei n. 9.782, de 1999), verbis:

Art. 7º  Compete à Agência proceder à implementação e à execução do disposto nos incisos II a VII do art. 2º desta Lei, devendo:

(...)

VIII - anuir com a importação e exportação dos produtos mencionados no art. 8º desta Lei;

................

Art. 8º

(...)

§ 4º A Agência poderá regulamentar outros produtos e serviços de interesse para o controle de riscos à saúde da população, alcançados pelo Sistema Nacional de Vigilância Sanitária.

§ 5º A Agência poderá dispensar de registro os imunobiológicos, inseticidas, medicamentos e outros insumos estratégicos quando adquiridos por intermédio de organismos multilaterais internacionais, para uso em programas de saúde pública pelo Ministério da Saúde e suas entidades vinculadas.

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5 A LEI N. 12.401, DE 2011, E A PROIBIÇÃO DE DISPENSAÇÃO, PAGAMENTO, RESSARCIMENTO OU REEMBOLSO DE PRODUTO, NACIONAL OU IMPORTADO, SEM REGISTRO NA ANVISA

Recentemente, contudo, a Lei n. 8.080, de 1990, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes, foi alterada pela Lei n. 12.401, de 28 de abril de 2011, a qual acresceu o art. 19-T, que assim dispõe:

Art. 19-T. São vedados, em todas as esferas de gestão do SUS:

I - o pagamento, o ressarcimento ou o reembolso de medicamento, produto e procedimento clínico ou cirúrgico experimental, ou de uso não autorizado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA;

II - a dispensação, o pagamento, o ressarcimento ou o reembolso de medicamento e produto, nacional ou importado, sem registro na Anvisa.

5.1 Houve revogação ou limitação do poder de polícia da Anvisa? Inocência primitiva de Alberto Caeiro

A interpretação gramatical do dispositivo precedentemente transcrito pode induzir ao raciocínio de que restaria vedado o pagamento de produtos adquiridos por organismos internacionais dispensados de registro pela agência reguladora, bem como ter ceifado à Anvisa sua atribuição, lastreada em discricionariedade técnica, de autorizar a importação de medicamentos sem registro no país, ainda que excepcionalmente e para atender programas públicos de seu órgão supervisor ministerial, qual seja, o Ministério da Saúde.

Tal, contudo, apresenta-se equivocado, como é próprio da interpretação calcada apenas na literalidade de simplicidade primitiva, sem o olhar sistêmico de todo o arcabouço normativo, o que não permite visualizar seu verdadeira sentido, nem extrair seu real, como, aliás, acontece com Alberto Caeiro [13] ao negar o mistério e sentido das coisas:

"Porque o único sentido oculto das coisas

É elas não terem sentido oculto nenhum,

[...]

As coisas não têm significação, tem existência.

As coisas são o único sentido oculto das coisas.

Passa uma borboleta por diante de mim

E pela primeira vez no Universo eu reparo

Que as borboletas não têm cor nem movimento,

Assim como as flores não têm perfume nem cor.

A cor é que tem cor nas asas da borboleta,

No movimento da borboleta o movimento é que se move

O perfume é que tem perfume no perfume da flor.

A borboleta é apenas borboleta.

E a flor é apenas flor"

A par de a Lei 12.401, de 2011, ser genérica, e a Lei n. 9.782, de 1999, específica, com relação às atribuições da Anvisa, o que, de plano, permite concluir que ambas coexistem e são compatíveis, não se pode concluir de outro modo que não o de que as atribuições da Anvisa estão preservadas, não havendo revogação expressa nem tácita pela nova Lei.

Isso porque a saúde é um bem inalienável, espectro do direito inviolável à vida, e de interesse público, devendo, nesse azimute, ser propiciada sua promoção, proteção e recuperação. Como destinatários da norma mandamental, tanto o Ministério da Saúde permanece-se apto a concretizar a política pública de saúde e pagar pela internalização de produtos pelos organismos internacionais, quanto a Anvisa, sua autarquia vinculada, encontra-se incólume no que se refere as suas atribuições legais reguladoras, normativas e fiscalizatórias, podendo, nesse passo, dispensar de registro produtos e medicamentos para ações estratégicas.

5.2 Qual o alcance da vedação trazida, então, pela Lei n. 12.401, de 2011?

A falta de um fluxo normatizado de incorporação de novos medicamentos, com prazos e procedimentos administrativos definidos, com as garantias de um processo administrativo, alimentava a burocracia em si mesma e atentava contra o princípio da eficiência administrativa.

A inserção do art. 19-T pela Lei n. 12.401, de 2011, nesse vértice, foi decorrência lógica de toda uma sistematização legal ao se estruturar procedimentos e ritos para a incorporação/inclusão de novos medicamentos nos componentes do Sistema Único de Saúde, estabelecendo procedimento administrativo para tanto, prazo para conclusão do pedido de incorporação, permitindo a participação da sociedade na Comissão integrada para tal fim, além de revisão periódica das tabelas de medicamentos elaboradas pelo gestor federal do SUS.

Com a premissa maior de estruturação de processo administrativo voltado à inclusão de novos medicamentos, por intermédio do Subsistema de Dispensação de Medicamentos e Produtos de Saúde, o que se afigura uma garantia ao cidadão, não haveria porque permitir o dispensação e pagamento pelos gestores do SUS produtos e procedimentos sem registro ou não autorizados pela Anvisa.

Daí porque a proibição trazida pela lei de restarem vedados, em todas as esferas de gestão do SUS (como de fato está, salvante por ordem judicial em sentido contrário) o pagamento, o ressarcimento ou o reembolso de medicamento, produto e procedimento clínico ou cirúrgico experimental, ou de uso não autorizado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa, bem como a dispensação, o pagamento, o ressarcimento ou o reembolso de medicamento e produto, nacional ou importado, sem registro na Anvisa, formando-se, pois, um silogismo perfeito, não havendo, pois, incongruências normativas, conforme se verifica em interpretação sistemática e finalística extraída da Lei nova.

É norma, portanto, direcionada às esferas de gestão SUS e também a particulares, até mesmo para se repelir o fenômeno crescente denominado judicialização da saúde [14], não se aplicando, como se percebe, à atuação da Anvisa, que, para suas finalidades institucionais, continua a poder se valer dos poderes regulatórios, de fiscalização e controle de produtos e serviços, que ofereçam risco à saúde pública, nem muito menos ao ente ou órgão definidor da política pública de saúde que, em seu dever constitucional de articular e prestar a saúde, pode adquirir medicamentos e produtos sem registro na Anvisa, na hipótese prevista nos arts. 7º e 8º da Lei n. 9.782, de 1999.

Corrobora tal assertiva a exposição de motivos da Lei n. 12.401, de 2011, da lavra do Senador Flávio Arns, que, pela clareza, é transcrito:

Assim, a proposta que apresento tem por objetivo inserir um novo Capítulo à Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências.

Este novo Capítulo proposto (VIII), sob a denominação "DO SUBSISTEMA DE DISPENSAÇÃO DE MEDICAMENTOS E PRODUTOS DE SAÚDE", estaria dividido em 2 (duas) Seções: a Seção I dispondo sobre o "Subsistema de Dispensação de Medicamentos e Produtos de Saúde constantes de tabelas elaboradas pelo gestor federal do SUS, e a Seção II que aborda "Subsistema de Dispensação de Medicamentos e Produtos de Saúde não constantes de tabelas elaboradas pelo gestor federal do SUS".

Discorrendo inicialmente sobre a Seção I, a proposta objetiva, muito mais que "legalizar" a previsão das tabelas, normatizar o modo pelo qual estas são elaboradas e, NECESSARIAMENTE, revistas periodicamente.

A preocupação em legiferar neste sentido decorre de uma grave constatação, qual seja, a Portaria n. 1.318/GM, de 23 de julho de 2002, que dispunha sobre constituição do componente de medicamentos excepcionais somente foi revista em outubro do ano passado, culminando em sua revogação pela Portaria 2.577, de 27 de outubro de 2006, republicada em 13 de novembro de 2006.

Agravante ainda maior é constatado quando, transcorridos 4 (quatro) anos sem alteração da lista de dispensação de medicamentos, percebemos que a Portaria que hodiernamente regulamenta a constituição do Componente de Medicamentos de Dispensação Excepcional da Assistência Farmacêutica – CMDE, não relaciona todos os medicamentos de dispensação excepcional ou de alto custo necessários ao tratamento de doenças graves, irreversíveis ou potencialmente fatais.

Segundo a Nota Técnica n. 4/2007/DAF/SCTIE/MS, de 23 de maio de 2007, o anexo II da Portaria lista os medicamentos do CMDE, atualmente compreendendo 102 (cento e dois) fármacos em 218 (duzentas e dezoito) apresentações farmacêuticas, indicando também para quais doenças cada medicamento é autorizado.

(...)

Para justificar esta limitação o Ministério da Saúde afirma que a inclusão de novos medicamentos no componente de medicamentos de Dispensação Excepcional para possibilitar o tratamento de outras doenças depende "da existência de sólidas evidências científicas que comprovem a efetividade e segurança do tratamento, além da definição e o estabelecimento de um protocolo clínico qu defina as condições de uso dos medicamentos, a fim de que seja garantida a cura ou recuperação do paciente."

Atualmente, a admissibilidade de novas tecnologias no âmbito do SUS ocorre nos termos da Portaria GM/MS n. 3.323, de 27 de dezembro de 2006, que criou a Comissão para Incorporação de Tecnologias do Ministério da Saúde – CITEC, composta tão somente por representantes das diversas secretarias e agências do Ministério da Saúde, responsável pelo encaminhamento do "fluxo de incorporação de tecnologias".

A leitura atenta desta Portaria permite as seguintes considerações: 1) denomina toda a série de atos que desencadeiam a incorporação de medicamentos como ‘fluxo’, ao invés de processo administrativo que é; 2) estabelece prazos para o protocolo do pedido de incorporação, mas não estabelece prazo para a conclusão do pedido; 3) é conduzido por Comissão integrada apenas por entes governamentais, não permitindo a participação da sociedade.

(...)

E nem se alegue, então, a desnecessidade de um projeto de lei com vista a disciplinar matéria já disciplinada por legislação precedente, na medida em que o ‘fluxo’ de incorporação hoje existente desatende às disposições aplicáveis ao processo administrativo federal.

(...)

Assim, o projeto de lei que enfatiza o "fluxo" de incorporação configura um procedimento administrativo, que atenderá prazos e será conduzido e julgado por um Conselho paritário, também composto por integrantes da sociedade.

A previsão de obediência a prazos legalmente fixados objetiva conferir maior dinâmica ao processo administrativo, sobretudo porque a Administração Pública, em seu proceder, deve se pautar pelo princípio constitucional da eficiência administrativa, expressado na Constituição Federal de 1988 pela Emenda Constitucional n. 19/98.

A interpretação histórica, como evidenciada na Exposição de Motivos precedentemente transcrita, também harmoniza a assertiva de que as atribuições de a Anvisa (§§4º e 5º do art. 8º) persistem no ordenamento jurídico pátrio e coexistem com a Lei n. 12.401, de 2011, sendo com ela compatíveis.

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Sobre o autor
Elias Higino dos Santos Neto

Advogado da União. Chefe da Divisão de Legislação Aplicada e Estudos Normativos da Consultoria Jurídica no Ministério da Saúde. Especialista em direito processual pela Universidade do Sul de Santa Catarina. Pós-graduado em direito público pela Faculdade Processus - Brasília. É autor de vários artigos jurídicos. Foi Coordenador Substituto de Procedimentos Licitatórios e Negócios Jurídicos da Consultoria Jurídica no Ministério da Saúde, Técnico Judiciário na Seção Judiciária do Distrito Federal e Analista Judiciário Executante de Mandados no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS NETO, Elias Higino. A aquisição de medicamentos, produtos e insumos estratégicos, sem registro na Anvisa, por intermédio de organismos internacionais.: Mecanismo indispensável ao Estado brasileiro para concretização do dever constitucional de prestar a saúde. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3112, 8 jan. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20789. Acesso em: 22 dez. 2024.

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