Conclusão
A estrutura epistemológica do programa de pesquisa da integridade possui definições ontológicas, metodológicas, axiológicas, teóricas, pragmáticas e contextuais, que representam implicitamente a convergência das filosofias moral, existencialista, democrática e hermenêutica concentradas no comportamento institucional de um juiz vinculado ao Poder Judiciário que, por sua vez, está inserido no Estado democrático de direito.
A ontologia considera fundamentalmente que o direito é um conceito argumentativo. A metodologia determina a aplicação do método interpretativo construtivo. A axiologia rejeita o convencionalismo e o pragmatismo jurídicos. A teoria define a integridade como virtude política e instrumento de ligação prático-transcendente. A práxis declara, por sua vez, que o programa de pesquisa tem capacidade para fazer diagnóstico e prognóstico da realidade legal-constitucional. O contexto identifica, por último, o tempo e o espaço onde o princípio da integridade pode se expandir normalmente.
O programa de pesquisa da integridade é uma tecnologia observacional da realidade fabricada conceitualmente por Ronald Dworkin para descrever, avaliar, especular e intervir na ordem legal-constitucional.
Funciona como aplicativo crítico modificando o raciocínio e a releitura constitucional dominante enfrentando o convencionalismo, que supervaloriza a função das regras do direito, e o pragmatismo jurídico, que supervaloriza, de outro modo, os critérios e as estratégias intuitivas da pessoa do juiz.
O programa de pesquisa da integridade tem capacidade para desenvolver uma releitura principiológica sobre determinado material ou estudo de caso definido pelo pesquisador, apresentando no final de sua aplicação uma nova paisagem crítica sobre as informações sociais, jurídicas e judiciárias disponíveis.
Ao fazer a releitura principiológica do direito, o pesquisador conhece os fatores que dificultam a emergência do conceito de integridade e pode especular, ao mesmo tempo, sobre o que poderia ser feito constitucionalmente de melhor na prática de um juiz inserido na estrutura de raciocínio definida pelo autor Ronald Dworkin.
O programa de pesquisa da integridade descreve o perfil das práticas judiciárias observando se existe ou não a convergência do moralismo com o existencialismo, a democracia e a hermenêutica. Investiga se acontece ou não a síntese do direito com a política e a moral por força da interpretação do juiz quando este mobiliza a aplicação de uma lista de critérios autocomplementares, especificamente: adequação aos fatos e às regras; coerência entre princípios; abrangência constitucional; fundamentação das convicções; integridade e criatividade do juiz.
O programa de pesquisa da integridade desenvolve projeções acerca do que poderia acontecer de melhor constitucionalmente se incluíssemos na estrutura principiológica da integridade oportunamente a participação do juiz filósofo Hércules como hipótese de trabalho.
Essa estrutura principiológica da integridade é formada, especificamente, por um conjunto de princípios práticos e transcendentes. Os práticos são representados pelo princípio legislativo, jurisdicional e processual. Os transcendentes, por sua vez, são representados pela igualdade, liberdade, responsabilidade, dignidade, fraternidade e legitimidade. No meio desses princípios, Hércules intervém, hipoteticamente, com sua força argumentativa extraordinária, dinamizando toda essa estrutura e manipulando os critérios anteriormente definidos.
A fórmula de pensamento do programa de pesquisa da integridade pode ser esquematizada então da seguinte maneira:
Princípios transcendentes ou reflexivos (1-liberdade; 2-igualdade; 3-responsabilidade; 4-fraternidade; 5-dignidade; 6-e legitimidade) ? princípios práticos ou técnicos (1-legislativo; 2-jurisdicional; e 3-processual) ? possibilidade do princípio sintetizador da integridade (o juiz utiliza critérios ligadores: 1-coerência de princípios; 2-adequação moral aos fatos e regras; 3- justificativa de convicção; 4-abrangência constitucional; 5-integridade e 6-criatividade do juiz) ? diagnóstico (o programa de pesquisa observa empiricamente se há ou não uma correlação construtiva entre o juiz e a estrutura principiológica definida por Ronald Dworkin) ? prognóstico (Hércules vai conhecer, virtualmente, as possibilidades hermenêuticas do sistema constitucional) ? contribuição sociológica: o estudo de caso descreve uma prática judicial vinculada a uma possível comunidade ou cultura jurídica de princípios emergente nas instituições públicas, confirmando a tese de Ronald Dworkin.
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