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A possibilidade de compensação através de medida liminar de acordo com a modificação trazida pela Lei Complementar nº 104/2001

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Estuda-se o instituto da compensação tributária, pela observância do momento inicial do direito ao crédito pelo contribuinte. Discute-se a possibilidade ou não da sua ocorrência através de medida liminar.

RESUMO

A compensação é um instituto há tempos presente no âmbito do direito privado. Diferentemente de outros países, tal instituto encontra-se expresso no diploma tributário brasileiro como forma de garantir ao contribuinte de forma mais ágil o seu direito ao crédito. O advento da Lei Complementar nº 104/01, no que tange ao limite temporal da compensação tributária, acrescentou os artigos 151 e 170-A ao CTN. Deste modo, com a edição da referida Lei Complementar restou claro a impossibilidade da utilização do instrumento liminar para a realização da compensação. No entanto, é de se notar que o acréscimo do último não trouxe significativas mudanças ao ordenamento jurídico nacional, uma vez que tal entendimento já era partilhado através de uma conclusão lógica obtida com a interpretação do artigo 151. A questão então gira não em torno da permissão ou não que o artigo 170-A do CTN traz quando da compensação via liminar, mas da natureza jurídica deste instituto bem como do ponto inicial para a possibilidade de sua utilização, ou seja, o reconhecimento do crédito tributário do contribuinte. O presente trabalho, portanto, tem como objetivo elucidar o instituto da compensação através da observância do momento inicial do direito ao crédito pelo contribuinte bem como discutir a possibilidade ou não da sua ocorrência através de medida liminar.

Palavras-chave: Lei Complementar 104/01. Compensação. Artigo 170-A.


1                    INTRODUÇÃO

A compensação, instituto destinado à extinção de obrigações e inicialmente presente no âmbito civil, foi trazida para o Direito Tributário como uma forma de evitar a dupla execução e colaborar com o princípio da economia processual. A transferência para outra área do direito, como forma de adaptação a uma nova organização, trouxe algumas particularidades. A primeira delas é o marco inicial da possibilidade da utilização do instituto mencionado que geralmente incide com a constituição do crédito tributário. Este, por sua vez, pode ocorrer de duas formas: através do reconhecimento deste pela Administração Pública ou do Poder Judiciário.

Ocorrendo o reconhecimento do crédito através de ato administrativo, tem-se a possibilidade de compensação se restarem presentes os requisitos para tanto, quais sejam, tributos vencidos, líquidos e da mesma espécie. Quando não, há a necessidade do reconhecimento do crédito tributário através do Poder Judiciário, que só aparecerá após sentença transitada em julgado.

No que tange a esfera judicial, o advento da Lei Complementar nº 104/01 trouxe a obrigação da constituição do crédito tributário com o devido trânsito em julgado da sentença para só então ser possível a utilização da compensação. Deste modo, só resta possível a compensação após o trânsito em julgado de sentença reconhecendo o crédito tributário do contribuinte.

Este é o entendimento que corrobora com o art. 170-A do Código Tributário Nacional vigente. O presente artigo, portanto, visa o estudo do instituto da compensação no que tange as possíveis mudanças havidas pela introdução do art. 170-A, fruto da Lei Complementar nº 104/01.


2                    COMPENSAÇÃO

O instituto da compensação é uma forma de se extinguir duas obrigações contrapostas entre duas pessoas que sejam ao mesmo tempo credora e devedora uma da outra. Desse modo, ao invés de dois pagamentos, realiza-se um só, extinguindo completamente dívidas iguais, porém opostas, ou caso haja algum saldo restante, fazendo o respectivo pagamento.

O artigo 368 do Código Civil (CC) vigente dispõe que se duas pessoas forem ao mesmo tempo credora e devedora uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem.

É necessário observar que tal regra decorre da vontade da lei, portanto não depende de convenção das partes, ou seja, mesmo que uma delas se oponha é possível a utilização da compensação em juízo. Contudo para a utilização do instituto citado é imperioso que as obrigações em questão sejam líquidas, vencidas e fungíveis, tal como dispõe regra constante no artigo 369 do CC-02.

Líquidas no sentido de que não haja dúvidas quanto à sua existência e nem indeterminação do objeto da obrigação – deve a dívida, portanto, não ser passível de questionamento quanto à sua essência e o seu montante. Também há de se notar se as dívidas estão vencidas, caso contrário, o devedor será privado do benefício do termo e ocorrerá a injustificável antecipação do pagamento. Por último, as obrigações devem ser fungíveis, homogêneas entre si e da mesma natureza. Neste caso não é necessário se tratar de dívidas monetárias, bastando tão somente que o objeto da dívida seja substituível.

Partindo de uma visão geral, percebe-se então que o instituto da compensação em muito contribuiu para a sociedade, principalmente se notarmos o quanto esta regra é prática. Evita-se a deslocação de numerários em sentidos opostos, fazendo com que haja insolvência recíproca das partes e o acúmulo de processos do âmbito judiciário.

Neste sentido, Sacha Calmon (2008, p. 823) ressalta que a compensação é uma questão de praticabilidade. Leciona o mestre que o Código Tributário Nacional foi neste ponto inovador em relação a países do setentrião europeu que não admitem a compensação no âmbito tributário em razão da natureza pública do crédito.

Arremata o professor a importância da presença do instituto no âmbito tributário brasileiro, uma vez que a postura do Estado é de sempre cobrar tributos e não pagar seus débitos. Desse modo, o advento da compensação na esfera tributária traz a possibilidade do contribuinte obter seu crédito de forma mais rápida e eficaz.

No mesmo sentido, Márcio Severo Marques (2001, p. 101) observa que o Código Tributário Nacional, em respeito à unidade do sistema jurídico brasileiro, estabeleceu em seu artigo 156, inciso II, a compensação como forma de extinção do crédito tributário. O diploma legal dessa forma se coaduna com a legislação civil e comercial que já anteviam a compensação como forma de extinção da obrigação.

 


3                    A LEI COMPLEMENTAR Nº 104/01 E O ART. 170-A DO CTN

A Lei Complementar nº 104/01 introduziu o inciso V no artigo 151 do CTN, confirmando assim a concessão de medida liminar e de tutela antecipada em qualquer espécie de ação, como hipóteses de suspensão do crédito tributário. Se a própria norma legal já traz a determinação de suspensão do crédito tributário nesses casos, lógico que não haveria que se pensar em extinção dos mesmos através da mesma medida. Isso ocorre porque o crédito tributário ainda é objeto de lide na ação em que foi concedida tutela provisória.

Desse modo, o artigo 170-A do CTN apenas repete o comando já regularizado pelo artigo 151, uma vez que este enquadra as concessões de liminares e de tutela antecipada como forma de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, por exclusão, tem-se que para a extinção do crédito tributário faz-se necessária a decisão transitada em julgado.

Entende Marques (2001, p. 108) que antes mesmo da entrada em vigor da Lei Complementar em questão já havia previsão que somente decisão judicial transitada em julgado seria hábil a produzir o efeito de extinção de crédito tributário. Do mesmo modo, a compensação já era prevista no Código Tributário Nacional como forma de extinção de crédito tributário. Seguindo interpretação lógica, vê-se que resta impossível a compensação se efetuar através de simples medida liminar.

Acrescenta o mesmo autor que a introdução do artigo 170-A através da LC 104/01 só inovaria a ordem jurídica se caso a compensação não fosse, no passado, forma de extinção do crédito tributário, pois nessa hipótese poderia esta ser concedida através de liminar, ou no caso se a mesma fosse expressamente enquadrada como forma de suspensão de crédito tributário.

É interessante observar que mesmo que não houvesse enquadramento dos efeitos advindos da aplicação do instituto da compensação, dado o sistema unitário da jurisdição brasileira, seriam aplicados os conceitos referentes ao direito privado. Nesse sentido, o artigo 110 do CTN reza que “a lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado (...)”.

Na mesma linha de entendimento, o Superior Tribunal de Justiça[1], tem entendido que “a suspensão de pagamento de tributos, até o limite dos créditos que o contribuinte alega possuir, mediante a concessão de antecipação de tutela, configura, na verdade, uma forma de compensação oblíqua”.

Vale frisar que o entendimento do Tribunal não é pela impossibilidade de suspensão da exigência do crédito tributário[2] quando houver indícios de possíveis créditos relativos ao contribuinte, mas a imediata suspensão de pagamento, de modo a configurar uma extinção do crédito discutido. É que neste caso o STJ preservou a natureza jurídica do instituto da compensação, independente da área de direito em que esta esteja incluída.

Acredita-se, então, que a intenção do legislador foi de destacar a impossibilidade da utilização de medidas liminares como forma de extinção do crédito tributário através do instituto da compensação para evitar qualquer tipo de dúvidas a respeito do instituto, uma vez que, como visto, em nada inovou o ordenamento jurídico.


4        O DIREITO SUBJETIVO À COMPENSAÇÃO NO ÂMBITO DO DIREITO TRIBUTÁRIO

A obrigação tributária surge com a ocorrência do fato gerador previsto em lei. Neste momento, nasce para o Estado o direito ao tributo respectivo. O direito ao crédito concretiza-se com a verificação pelo Fisco do fato gerador e a quantificação da quantia a ser paga, que consiste no lançamento[3].

Com relação ao contribuinte, o direito ao crédito nasce no momento em que houver o pagamento indevido, seja porque não deveria ter sido feito em razão de o tributo ser inadmissível ou pelo fato de que foi realizado por valor maior que o devido. O que se tem então é o direito ao crédito do contribuinte no instante imediatamente posterior ao recolhimento.

Ressalta Rolim e Martins (2001, p. 87) que enquanto a Fazenda Pública obtém o crédito tributário com o nascimento do fato gerador, o contribuinte o obtém mediante pagamento indevido. O fato gerador, então, equivale ao pagamento indevido no que tange a sua natureza de fato aquisitiva do direito para o contribuinte.

Havendo, então, direito ao crédito, tanto pelo Fisco quanto pelo contribuinte há a possibilidade de compensação e a consequente extinção do crédito tributário (art. 156 CTN). Todavia, tal compensação há de ser feita com estrita observância aos ditames legais, senão vejamos previsão do Código Tributário Nacional:

Art. 170. A lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda pública.

Parágrafo único. Sendo vincendo o crédito do sujeito passivo, a lei determinará, para os efeitos deste artigo, a apuração do seu montante, não podendo, porém, cominar redução maior que a correspondente ao juro de 1% (um por cento) ao mês pelo tempo a decorrer entre a data da compensação e a do vencimento.

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O comando do art. 170 faculta a autorizar a compensação, que não se restringe às hipóteses de créditos tributários, podendo também haver previsão de compensação com créditos de qualquer natureza, desde que, como já previsto no CC-02, sejam líquidos, vencidos e fungíveis. O professor Sacha Calmon (2008, p. 824), explica que créditos como contratos com os Poderes Públicos, créditos provenientes de precatórios, títulos de dívida pública ou desapropriação são passíveis de compensação perante a Fazenda Pública.

O artigo supracitado reza que legislação posterior cuidará dos requisitos necessários a autorizar a compensação de créditos tributários. Tal regra se coaduna com o respeito à competência tributária dos entes públicos. No entanto, o legislador não estará livre para estipular quaisquer condições.

Neste ínterim, destaca o Ilustre Hugo de Brito Machado (2010, p. 222-223) a importância da lei não deixar margem larga ao estabelecimento de condições para a utilização da compensação pelo contribuinte. É que este possui garantias constitucionais que não podem ser ignoradas. Desse modo, a expressão “em cada caso”, contida na cabeça do artigo 170 do CTN, deve ser entendida em harmonia com os princípios inerentes ao direito tributário e com a natureza da cobrança de tributos e da atividade administrativa. Ademais, não se trata de um poder discricionário[4], estando a autoridade administrativa obrigada a fixar os critérios à luz do reconhecimento do direito à compensação.

No mesmo sentido, Paulo de Barros Carvalho (1996, p. 331) defende que a atividade da autoridade administrativa é vinculada, não restando ao agente público qualquer discricionariedade. Ou seja, a compensação é um direito inerente ao contribuinte previsto na legislação e pode ser exercido sempre que preencher os requisitos para tanto, não estando atrelada à vontade da administração pública, mas da lei em si.

É necessário frisar que de acordo com legislação federal (Lei nº 9.250/95, artigo 39) o direito subjetivo à compensação de valores pelo contribuinte está atrelado a prestações da mesma espécie (imposto com imposto, taxa com taxa e assim por diante) e destinação, ou seja, devem ser compensados tributos que possuam a mesma destinação orçamentária. Sendo assim, seria inadmissível, por exemplo, a compensação de imposto de renda com imposto de importação, visto que o primeiro possui receita na qual participam Estados e Municípios, enquanto a receita do último é exclusivamente da União.

A despeito desta regra legal, no âmbito administrativo da Secretaria da Receita Federal (SRF), o contribuinte pode utilizar quaisquer créditos sujeitos a restituição que sejam administrados por este órgão para quitar dívidas perante o mesmo. Tal comportamento decorre da regra prevista nos artigos 73 e 74 da Lei nº 9.430/96.

Com efeito, o mestre Manoel Álvares (2005, p.697) defende que em decorrência da legislação posterior referente à atuação da SRF, houve expressiva modificação no objeto jurídico da compensação que poderá sempre ser efetuada entre quaisquer tributos e contribuições e não mais entre tributos e contribuições de mesma espécie.

Vale frisar, que a despeito do entendimento do mestre, para fins de compensação é necessário observar a destinação orçamentária do referido crédito. Tal importância decorre do princípio constitucional da independência dos entes federativos. Sendo assim, há uma garantia quanto a não intervenção por parte dos entes maiores do patrimônio destinado aos entes menores.

Quanto o tipo, a compensação se visualiza em três formas: legal, judicial e voluntária. É enquadrada como legal quando essa é feita nos termos da lei, ipso jure, judicial quando a dívida se faz líquida e certa por decisão judicial e voluntária quando resulta de convenção entre as partes. No momento trataremos da compensação judicial, objetivo do trabalho.

4.1              Compensação e extinção do crédito tributário na esfera judicial

Como visto, a compensação do tipo judicial se faz liquída e certa através de decisão judicial. Esta ocorre quando há impasse no que tange a natureza da obrigação tributária. Por vezes o Fisco entende que é devido o tributo, ou não há nada que se discutir quanto ao valor pago a mais pelo contribuinte, por outro lado o contribuinte se sente injustiçado uma vez que entende não ser devido o tributo ou seu valor.

Desse modo, não seria razoável conceder a liquidez e certeza, aspectos quantitativos e qualitativos do crédito a ser manejado, por ato exclusivo do contribuinte. O crédito líquido e certo, necessário para realização da compensação, requer, neste caso, um procedimento de acertamento oficial que é a sentença judicial.

Isto ocorre porque milita em favor dos atos administrativos a presunção de legalidade e, das leis, a de constitucionalidade. Sendo assim, a ilegalidade do ato administrativo ou a inconstitucionalidade da lei só podem ser concedidas através de um meio, que é o Judiciário. É que este deve se pronunciar a respeito da questão para que então o direito do contribuinte ao crédito surja.

Podemos afirmar que tal requisito não é só comum à compensação no âmbito tributário como também no sistema jurídico lato sensu em si, uma vez que este se perfaz com o reconhecimento pelo juiz, uma vez que antes disto há mera expectativa de direito. Faz-se necessário, portanto, o trânsito em julgado da sentença.

Sobre a matéria, entende Márcio Severo Marques (2001, p. 101) que a compensação já era utilizada no sistema jurídico positivo como forma de extinção do crédito tributário que a impedia, desta forma, de ser exercida antes do trânsito em julgado da sentença.

A Lei Complementar nº 104/01 repassou regra já existente para o âmbito da compensação no direito tributário com o acréscimo do artigo 170-A no Código Tributário Nacional, que veda a compensação antes do trânsito em julgado da decisão judicial.

É necessário frisar que o art. 170-A não restringe o direito à compensação de um modo geral. O dispositivo discutido somente aplica condição para o processamento da compensação: a necessária constituição do crédito através de decisão judicial transitada em julgado. As compensações ditas legais e voluntárias não necessitam, por óbvio, do trânsito em julgado de decisão judicial, uma vez que o crédito é prontamente reconhecido em esfera administrativa. Desta forma, tal regramento só diz respeito às compensações de caráter judicial, ou seja, aquelas que se encontram em litígio, havendo uma dúvida quanto ao crédito do contribuinte.

Destaca-se que não é a compensação que fica restrita à decisão judicial, mas o crédito, e, sendo este necessário para a realização da compensação, só deve ser feita após o trânsito em julgado de sentença judicial. Mais uma vez é imperioso lembrar que no caso do contribuinte, o pagamento indevido e o direito ao crédito somente surge com a aquiescência de autoridade, seja perante o Fisco, ou, neste caso, perante o juízo.

 Além disso, somente a decisão com trânsito em julgado possui a natureza satisfativa fazendo com que o direito em questão seja ou não reconhecido. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça tem firmado entendimento em suas decisões[5] de que não possuindo o crédito a certeza devida, certeza esta que no âmbito judicial se dá através do trânsito em julgado da sentença de mérito, inviável estaria a compensação. Tal entendimento restou cristalizado através da Súmula 212, que versa que “a compensação de créditos tributários não pode ser deferida por medida liminar”.

Há, porém, um questionamento a ser formulado: por vezes já há decisões no STF ou Resoluções do Senado afirmando ser o tributo inconstitucional ou indevido. Seria possível neste caso a aplicação da regra de que o crédito do contribuinte se perfaz com o trânsito em julgado da sentença?

Primeiramente é necessário frisar que as decisões supracitadas possuem uma característica peculiar – o efeito erga omnes. Desse modo, em se tratando de tributo já declarado inconstitucional, não há o que se discutir em relação e certeza ao crédito, só resta é a verificação se o crédito é líquido e vencido (art. 369 CC-02).

Neste sentido, explica o mestre Leandro Palsen (2004, p. 1.170) que o mero erro de cálculo ou de enquadramento legal e no caso de já houver ADI ou Resolução do Senado no sentido que há inconstitucionalidade do tributo devido, afasta a aplicação da regra contida no artigo 170-A do CTN bastando o reconhecimento judicial do direito à compensação em tal e qual forma.

Isto ocorre porque o processo de validade do crédito relativo ao contribuinte já ocorreu em instância superior não restando razão para se ingressar ação de conhecimento a algo que já é dito como certo. Tal entendimento prima pelo princípio da economia processual, em que só haverá perante o judiciário a execução de um crédito já existente de acordo com decisão de índole coletiva anterior, uma vez que seria inconcebível rever toda uma matéria em que já foi analisada.

Rolim e Martins (2001, p. 90) destacam que a exigência de trânsito em julgado no caso de tributo que já foi declarado inconstitucional no entender do Supremo é desprovida de qualquer fundamento visto que já há a certeza ao crédito do contribuinte. Desse modo, as condições exigidas para tanto já se encontram preenchidas.

Em resumo, o entendimento explicitado é que o crédito do contribuinte objetivando compensação judicial há de ser feito após o trânsito em julgado de sentença condenatória. Tal procedimento é feito desta maneira pela natureza jurídica da decisão em comento ser definitiva, não havendo como questionar depois. No caso de crédito já analisado pelo STF ou através de Resolução do Senado, a incerteza relativa ao crédito do contribuinte some na medida em que já foi analisado via decisão erga omnes.

4.2              Compensação e suspensão da exigibilidade do crédito tributário na esfera judicial

Para se entender como funciona a suspensão de exigibilidade do crédito tributário é necessário primeiramente uma breve explanação acerca das medidas liminares[6], uma vez que estas possuem objetivos e razões de ser próprios que diferenciam do processo principal.

Podemos afirmar que as medidas cautelares apesar de possuírem uma autonomia que se enquadra dentro da sistemática do processo cautelar, são acessórias, ou seja, sempre irão depender da ação principal. Ademais, possuem função predominantemente preventiva, de forma a evitar que o tempo ou atividades das partes do de terceiro possam frustrar a realização do provável direito do autor.

A eficácia das medidas liminares é provisória, destinadas a durar certo lapso temporal. Consequentemente são processos curtos de rito sumário e uma vez preenchidos os pressupostos têm efeitos imediatos. E que tanto a ação de liminar quanto a sentença baseiam-se em prova não exauriente. Por tais características é que se pode afirmar que são revogáveis na medida em que podem se adaptar às novas circunstâncias de fato.

A decisão judicial que concede medida liminar não declara a existência ou inexistência de direito subjetivo ou de relação jurídica entre as partes. O que há é a simples proteção do bem de vida. Tal decisão como se viu está imersa de requisitos não tão cobertos pela certeza se for comparada a uma sentença transitada em julgado. É que o objetivo da medida liminar é somente a proteção de um direito para que este possa ser concretizado no futuro.

Sendo assim, não há como se conceber a compensação de créditos tributários através de uma decisão que possui simplesmente a natureza preventiva. É que uma vez concedido o direito à compensação estará dando certeza ao crédito tributário, e como visto alhures, tal reconhecimento é revestido de formalidades intrínsecas a decisão de caráter definitivo. E sendo uma das características da medida liminar o caráter não definitivo, resta impossível a compensação feita somente com respaldo na medida liminar. 

O entendimento relativo a impossibilidade de compensação de créditos tributários através de medida liminar já chegou até a ser sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça, através da Súmula de número 212.

Ademais, a medida liminar pode ser cassada no curso da ação caso não existam os requisitos existente quando de seu deferimento. A “satisfatividade” das medidas liminares só engloba as circunstâncias fáticas, antecipando ou protegendo alguns efeitos sem a apreciação do mérito da questão. Desse modo, é necessário ressaltar que tal satisfatividade só é alcançada com o trânsito em julgado da decisão proferida nos autos, quando então se tem a coisa julgada.

Conquanto não possam servir para a construção do crédito tributário e por consequência a sua compensação, as medidas liminares possuem um papel muito importante no que tange a proteção do direito. Nessa medida, dispõe o art. 151 do CTN que suspende a exigibilidade do crédito tributário a moratória, o depósito do seu montante integral, as reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do processo tributário administrativo, a concessão de medida liminar em mandado de segurança, a concessão de medida liminar ou tutela antecipada (esta também introduzida pela Lei Complementar 104/01), em outras espécies de ação judicial e o parcelamento.

Em contrapartida o Código Tributário Nacional traz como forma de extinção do crédito tributário, em seu artigo 156, dentre outras a decisão judicial passada em julgado. Destarte, apenas no caso de decisão judicial transitada em julgado que haverá a possibilidade de compensação não excluindo, desse modo, a possibilidade de suspensão da exigibilidade do crédito tributário quando presentes os requisitos autorizadores do processo cautelar.

Em outras palavras, se há a possibilidade de compensação de tributos pagos indevidamente e se esta é forma de extinção do crédito tributário, conforme versa o artigo 156 do CTN, assim como também o é a decisão transitada em julgado, resta claro que a medida liminar ou tutela antecipada, que como visto acima estão enquadradas como formas de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, não poderiam ensejar a extinção do crédito tributário.

Em consonância com o entendimento supracitado, entende o mestre Ricardo Alexandre (2010, p. 449) que a compensação pode trazer a suspensão da exigibilidade do crédito mediante ato jurisdicional que não dependa de trânsito em julgado da decisão.

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Sobre a autora
Júlia Brilhante Portela Vidal

Advogada. Pós-graduada em Direito Tributário pela UFRN.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIDAL, Júlia Brilhante Portela. A possibilidade de compensação através de medida liminar de acordo com a modificação trazida pela Lei Complementar nº 104/2001. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3225, 30 abr. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21586. Acesso em: 25 nov. 2024.

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