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O sistema da responsabilidade no Código Civil de 2002: prevalência da responsabilidade subjetiva ou objetiva?

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19/10/2012 às 15:36
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CONCLUSÃO

Depois dessa análise, percebe-se que o Código Civil de 2002 conseguiu compatibilizar ambos os sistemas de responsabilização civil existentes, o fundado na culpa do agente causador do dano e o que exclui a culpa dos seus elementos de análise.

Há convivência pacífica entre o art. 186 e o art. 927, parágrafo único, bem como entre o art. 186 e os demais dispositivos que veiculam responsabilidades objetivamente postas, mencionados nas seções anteriores.

Os casos que independem de culpa estão dispostos na lei, bem como podem ser aferidos pela jurisprudência, tendo-se em vista a natureza da atividade normalmente desenvolvida pelo agente e seu grau de risco. Afora essas duas hipóteses, é caso de verificação da voluntariedade da conduta danosa ou da imprudência, negligência e imperícia com que se conduziu o agente causador do dano que se pretende reparar.

Na visão da grande maioria dos autores estudados, o ordenamento civil brasileiro compatibilizou, como dito, ambos os sistemas, tendo conferido, contudo, prevalência à responsabilidade subjetiva que à objetiva.

Assim afirmam:

O Código Civil brasileiro, malgrado regule um grande número de casos especiais de responsabilidade objetiva, filiou-se como regra à teoria “subjetiva”. É o que se pode verificar no art. 186, que erigiu o dolo e a culpa como fundamentos para a obrigação de reparar o dano.[71]

Reiteramos, contudo, que o princípio gravitador da responsabilidade extracontratual no Código Civil ainda é o da responsabilidade subjetiva, ou seja, responsabilidade com culpa, pois esta também é a regra geral traduzida no corrente Código, no caput do art. 927. Não nos parece, como apregoam alguns, que o novel estatuto fará desaparecer a responsabilidade com culpa em nosso sistema. A responsabilidade objetiva, ou responsabilidade sem culpa, somente pode ser aplicada quando existe lei expressa que a autorize. Portanto, na ausência de Le expressa, a responsabilidade pelo ato ilícito será subjetiva, pois esta é a regra geral no direito brasileiro.[72]

O tempo demonstrou a possibilidade de conciliação desses sistemas, o da responsabilidade com culpa e o da responsabilidade sem culpa, bastando que se discipline quais as situações jurídicas que devem se sujeitar. Neste sentido, a nova codificação civil estabeleceu o sistema subjetivo como a regra (art. 186 e 389), porém reconheceu a existência de hipóteses que devem se submeter ao sistema objetivo de responsabilização, conforme expressamente disposto pela lei ou por deliberação judicial (art. 927, parágrafo único).[73]

O Código Civil consagra, em reiteração ao disposto no modelo Beviláqua, a responsabilidade subjetiva como a regra do sistema (art. 186, 927, caput, e 389), porém reconhece e expressamente admite a responsabilidade sem culpa, fixada por lei ou pela jurisprudência (art. 927, parágrafo único).[74]

A teoria subjetiva ou teoria da culpa continua a fundamentar, como regra geral, a responsabilidade civil, mas, em face das dificuldades inerentes à sua prova, o novo Código adota, diante de previsão legal expressa ou de risco na atividade do agente, a teoria objetiva ou teoria do risco no dispositivo em tela [refere-se ao art. 927, parágrafo único].[75]

Se a teoria da culpa ainda se encontra como sustentáculo da responsabilidade civil, o Código de 2002 fez-lhe peremptória exceção, ao prever a possibilidade de surgir a obrigação de indenizar, “independentemente de culpa”, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. A teoria do risco, pois, deixa de ser mera decorrência do sistema jurídico brasileiro como um todo, através de construções jurisprudenciais e doutrinárias e da legislação extravagante, para estar presente, de maneira clara, no corpo da codificação civil. Em outras palavras, a regra geral é a responsabilidade subjetiva, fundada na culpa – que, pois, há de ser provada –, constituindo exceção a responsabilidade objetiva, fundada no risco.[76]

Noutra esteira, como já dito em momento anterior, Sérgio Cavalieri Filho sustenta idéia diversa, não tendo receio em lecionar que a responsabilidade objetiva prevalece como sistema principal adotado pelo Código Civil de 2002, senão vejamos:

O Código Civil de 2002 fez profunda modificação na disciplina da responsabilidade civil estabelecida no Código anterior, na medida em que incorporou ao seu texto todos os avanços anteriormente alcançados. E foi necessário, para que não entrasse em vigor completamente desatualizado. Podemos afirmar que, se o Código de 1916 era subjetivista, o Código atual prestigia a responsabilidade objetiva. Mas isso não significa dizer que a responsabilidade subjetiva tenha sido inteiramente afastada. Responsabilidade subjetiva teremos sempre, mesmo não havendo lei prevendo-a, até porque essa responsabilidade faz parte da própria essência do Direito, da sua ética, da sua moral – enfim, do sentido natural de justiça. Decorre daquele princípio superior de Direito de que ninguém pode causar dano a outrem. Então – vale repetir –, temos no Código atual um sistema de responsabilidade prevalentemente objetivo, porque esse é o sistema que foi montado ao longo do século XX por meio de leis especiais; sem exclusão, todavia, da responsabilidade subjetiva, que terá espaço sempre que não tivermos disposição legal expressa consagrando a responsabilidade objetiva.[77]

Por fim, há aqueles que dizem não se poder afirmar que exista prevalência de um sistema sobre o outro, tendo ambos a mesma importância no sistema do Código Civil:

Sistema de indenização do Código Civil. São dois os regimes jurídicos da responsabilidade civil no sistema do Código Civil: a) responsabilidade subjetiva; b) responsabilidade objetiva. Ambas têm a mesma importância no sistema do Código Civil, não havendo predominância de uma sobre a outra. Conforme o caso, aplica-se um ou outro regime de responsabilidade civil, sendo impertinente falar-se em regra e exceção.[78]

De certo modo, Nelson Nery e Rosa Maria Andrade Nery têm razão ao afirmar acerca da idêntica importância que ambos os sistemas/regimes detém. Ambos visam reparar os danos causados norteados por um ideal de justiça. A dinâmica das relações sociais foi que exigiu que o sistema voltasse a buscar auxílio na reparação do dano independentemente de culpa, a fim de encontrar-se novamente com o ideal de justiça que um dia apontou para a responsabilização subjetiva, exclusivamente.

Com efeito, é a responsabilidade objetiva que confere o diferencial do sistema, já que a responsabilidade subjetiva, como dito acima por Cavalieri, existirá sempre mesmo não havendo lei prevendo-a, pois essa responsabilidade faz parte da própria essência do Direito, da sua ética, da sua moral.

Contudo, ousando discordar da maioria, tendemos a apoiar a conclusão de Cavalieri. Não se nega que a fórmula geral pretendida pelo Código fosse a da responsabilidade subjetiva. Todavia, ao que parecer, a exceção tornou-se regra em razão da enorme gama de situações em que a culpa poderá ser posta de lado na análise da reparação do dano, especialmente quanto à natureza da atividade, que poderá implicar em responsabilização sem a existência de culpa em face de uma construção jurisprudencial.

Deste modo, os dispositivos colacionados acima: art. 927, parágrafo único, art. 928, art. 931 e seus consectários do Código de Defesa do Consumidor (arts. 12 e 14), o art. 932, I, II, III, IV e V e o art. 933, fora as variadas atividades consideradas pela jurisprudência como sendo atividades naturalmente perigosas, que implicam, deste modo, em responsabilidade sem aferição da culpa do agente causador do dano, apontam, ao nosso sentir, para um sistema prevalentemente objetivista, ainda que não tenha sido este o intento original do legislador de 2002.


BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

1.        AGUIAR JUNIOR, Ruy Rosado de (organizador). IV Jornada de Direito Civil. 2º volume. Brasília: Conselho da Justiça Federal, 2007.

2.        ASSUNÇÃO, Alexandre Guedes Alcoforado, SILVA, Regina Beatriz Tavares da, et. al. Novo Código Civil Comentado. Coordenador Ricardo Fiuza, 1ª ed., 10ª tiragem. São Paulo: Saraiva, 2003.

3.        BRASIL. Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916, Código Civil.

4.        BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, Código de Defesa do Consumidor.

5.        BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, Código Civil.

6.        BRITTO, Marcelo Silva. Alguns aspectos polêmicos da responsabilidade civil objetiva no novo Código Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 314, 17 maio 2004. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/5159. Acesso em: 21 fev. 2011.

7.        BURGARELLI, Aclibes, et al. Contribuições ao estudo do novo direito civil. Organizadores: Frederico A. Paschoal e José Fernando Simão. Campinas: Millennium Editora, 2003.

8.        CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 9ª ed. São Paulo: Atlas, 2010.

9.        COSTA, Judith Martins. Os fundamentos da responsabilidade civil. Revista Trimestral de Jurisprudência dos Estados. São Paulo: Jurid Vellench, v. 93, ano 15, out. 1991.

10.    DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil.  11ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.

11.    GONÇALVEZ, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

12.    ______________. Principais Inovações no Código Civil de 2002: Breves Comentários. São Paulo: Saraiva, 2002.

13.    LIMA, Alvino. A Responsabilidade Civil pelo Fato de Outrem. 2ª ed. rev. e atual. por Nelson Nery Jr. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000.

14.    LISBOA, Roberto Senise. Manual de Direito Civil: Obrigações e Responsabilidade Civil. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

15.    NERY JUNIOR, Nelson, NERY, Rosa Maria Andrade. Código Civil Anotado e Legislação Extravagante. 2ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.

16.    RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil. 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009.

17.    SILVA, Roberto de Abreu e. Pressupostos da responsabilidade civil. Revista Forense. Rio de Janeiro: Forense, v. 377, jan./fev. 2005.

18.    VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2004.


Notas

[1] “forma primitiva, selvagem talvez, mas humana, da reação espontânea e natural contra o mal sofrido; solução comum a todos os povos nas suas origens, para a reparação do mal pelo mal.” Alvino Lima, Da Culpa ao risco, Apud DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil.  11ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 30.

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[2] LISBOA, Roberto Senise. Manual de Direito Civil: Obrigações e Responsabilidade Civil. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 421-422.

[3] Segundo informa a professora Judith Martins Costa, a cultura romana recebeu da cultura helênica a noção e epicikia, nomeada em latim como aequalitas, e guardou o seu significado original de EQUILÍBRIO: relação harmoniosa entre o todo e a parte: equidade.

Explica a autora que é daí que advém a noção de Justiça como equilíbrio, dar a cada um o que é seu, justiça distributiva, na busca de um critério de equivalências de prestações.

Desenvolvendo um raciocínio a contrario sensu, a professora Martins Costa conclui que se a justiça traz consigo o conceito de equilíbrio, a injustiça, por sua vez, traria consigo o conceito de desequilíbrio. Assim, a função primordial da justiça seria a de restabelecer o equilíbrio maculado. Nesse sentido, pouco importava se o desequilíbrio era proveniente ou não da culpa. Nessa fase, a justiça a ser buscada tinha por causa “um estado de coisas objetivo, a perturbação de uma ordem que deve restabelecida.” (COSTA, Judith Martins. Os fundamentos da responsabilidade civil. Revista Trimestral de Jurisprudência dos Estados. São Paulo: Jurid Vellench, v. 93, ano 15, out. 1991, p. 35)

Tem-se, segundo anota a autora, uma máxima objetivação do conceito de responsabilidade, já que “não se busca um culpado, mas um responsável pelo próprio fato do desequilíbrio.” (COSTA,1991, p. 35)

[4] COSTA, op. cit., p. 37.

[5] DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil.  11ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 30.

[6] COSTA, op. cit., p. 41

[7] DIAS, op. cit., p. 34-35.

[8] Por todos, vejamos o que diz Sérgio Cavalieri Filho: “A responsabilidade subjetiva era a regra no Código Civil de 1916, já que todo o sistema de responsabilidade estava apoiado na culpa provada, tal como prevista na cláusula geral do art. 159 – tão hermética que, a rigor, não abria espaço para responsabilidade outra que não fosse subjetiva. Apenas topicamente o antigo Código admitia a culpa presumida (art. 1.521) e a responsabilidade objetiva (arts. 1.527, 1.528 e 1.529). Em razão disso, a grande evolução ocorrida na área da responsabilidade civil ao longo do século XX (partimos da culpa provada e chegamos à responsabilidade objetiva, em alguns casos fundada no risco integral) teve lugar ao largo do Código de 1916, por meio de leis especiais.” (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 9 ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 22)

Nesse diapasão também afirma Carlos Roberto Gonçalvez: “O Código Civil de 1916 filiou-se à teoria subjetiva, que exige prova de culpa ou dolo do causador do dano para que seja obrigado a repará-lo. Em alguns poucos casos, porém, presumia a culpa do lesante (arts. 1.527, 1.528, 1.529, dentre outros).” (GONÇALVEZ, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 27)

[9] Os autores serão nominados no decorrer do presente artigo.

[10] “O Código Civil de 2002 fez profunda modificação na disciplina da responsabilidade civil estabelecida no Código anterior, na medida em que incorporou ao seu texto todos os avanços anteriormente alcançados. E foi necessário, para que não entrasse em vigor completamente desatualizado. Podemos afirmar que, se o Código de 1916 era subjetivista, o Código atual prestigia a responsabilidade objetiva. Mas isso não significa dizer que a responsabilidade subjetiva tenha sido inteiramente afastada. Responsabilidade subjetiva teremos sempre, mesmo não havendo lei prevendo-a, até porque essa responsabilidade faz parte da própria essência do Direito, da sua ética, da sua moral – enfim, do sentido natural de justiça. Decorre daquele princípio superior de Direito de que ninguém pode causar  dano a outrem. Então – vale repetir –, temos no Código atual um sistema de responsabilidade prevalentemente objetivo, porque esse é o sistema que foi montado ao longo do século XX por meio de leis especiais; sem exclusão, todavia, da responsabilidade subjetiva, que terá espaço sempre que não tivermos disposição legal expressa consagrando a responsabilidade objetiva.” (CAVALIERI, op. cit., p. 23-24)

[11] RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil. 4 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 01-02.

[12] Os autores relacionam os conceitos de culpa com o “quase-delito” e o de dolo com o “delito”.

[13] Não se deve confundi-lo com o conceito de dolo previsto pelo art. 145 e seguintes do Código Civil, o qual tem outro significado.

[14] RIZZARDO, op. cit., p. 03.

[15] Ao se falar de ação ou omissão voluntária tem-se a figura do dolo. Ao se falar em negligência e imprudência, tem-se a figura da culpa.

[16] CAVALIERI, op. cit., p. 23.

[17] Esta espécie de responsabilidade será melhor analisada no tópico 5 deste artigo: art. 932 do CC/02 – Responsabilidade dos pais pelos atos dos filhos menores; e os arts. 936, 937 e 938 do CC/02 – Responsabilidade por dano causado por animal ou coisa que estava sob sua guarda.

[18] Cavalieri, op.cit., p. 25.

[19] Conclusão do articulista.

[20] A diferença básica entre o dolo e a culpa é que naquele o agente quer a ação e o resultado, ao passo que neste ele só pretende a ação, sendo o resultado atingido acidentalmente, em face da falta de cuidado.

[21] CAVALIERI, op. cit., p. 29.

[22] A diferença básica entre o dolo e a culpa é que naquele o agente quer a ação e o resultado, ao passo que neste ele só pretende a ação, sendo o resultado atingido acidentalmente, em face da falta de cuidado.

[23] Art. 403. Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual.

[24] Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano. Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização.

[25] CAVALIERI, op. cit., p. 33.

[26] CAVALIERI, op. cit., p. 34.

[27] Embora o art. 186 do Código Civil só mencione como modalidades da culpa (estrito sensu) a negligência e a imprudência, o termo envolve outras formas de manifestação, como a imperícia, além do descuido, distração, leviandade etc., que ao final terminam por integrar uma das três primeiras modalidades.

Essa idéia se extrai de RIZZARDO, op. cit., p. 03.

[28] Cavalieri, op. cit., p. 39.

[29] Cavalieri, op. cit., p. 40.

[30] Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano.

Concorrência de culpa entre duas ou mais pessoas lesando um terceiro (solidariedade):

Art. 275. O credor tem direito a exigir e receber de um ou de alguns dos devedores, parcialmente ou totalmente, a dívida comum; se o pagamento tiver sido parcial, todos os demais devedores continuam obrigados solidariamente pelo resto.

Art. 942. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação.

[31] CAVALIERI, op. cit., p. 43.

[32] Muito parecida com a culpa in vigilando, sendo que voltada para animais e coisas, e não para pessoas.

[33] Dolo, culpa grave, culpa leve e culpa levíssima.

[34] RIZZARDO, op. cit., p. 10.

[35] VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 20.

[36] VENOSA, op. cit., p. 20.

[37] ASSUNÇÃO, Alexandre Guedes Alcoforado, SILVA, Regina Beatriz Tavares da, et. al. Novo Código Civil Comentado. Coordenador Ricardo Fiuza, 1ª ed., 10ª tiragem. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 819-820.

[38] LISBOA, op. cit., p. 425-426.

[39] GONÇALVES, op. cit., 28.

[40]Art. 159.  Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano. 

[41] GONÇALVES, Carlos Roberto. Principais Inovações no Código Civil de 2002: Breves Comentários. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 28.

[42] Ver nota de rodapé nº 11.

[43] LISBOA, op. cit., p. 444-445.

[44] LISBOA, op. cit., p. 613.

[45] GONÇALVEZ, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 30.

[46]“Para nossos melhores juristas (Orozimbo Nontao, Aguiar Dias e outros) o fundamento da responsabilidade do amental deve ser encontrado nos princípios de garantia e assistência social, que sacrificam o direito para a Humanidade. O restabelecimento do equilíbrio social violado pelo dano deve ser o denominador comum de todos os sistemas de responsabilidade civil estabelecendo-se como norma fundamental, que a composição ou restauração econômica se faça, sempre que possível, à custa do ofensor. A indenização, todavia, deve ser calculada de modo a não prejudicar os alimentos do inimputável, nem os deveres legais de alimentos que recaiam sobre ele. Antunes Varela, comentando o art. 489 do Código Civil Português, que corresponde ao nosso art. 928, faz considerações totalmente pertinentes ao nosso estudo: ‘Em resumo, pode dizer-se que para haver responsabilidade da pessoa inimputável é necessária a verificação dos seguintes requisitos: a) que haja um facto ilícito; b) que esse facto tenha causado danos a alguém; c) que o facto tenha sido praticado em condições de ser considerado culposo, reprovável, se nas mesmas condições tivesse sido praticado por pessoa imputável; d) que haja entre o facto e o dano o necessário nexo de causalidade; e) que a reparação do dano não possa ser obtida dos vigilantes do inimputável; f) que a eqüidade justifique a responsabilidade total ou parcial do autor, em face das circunstâncias concretas do caso. De todo modo – conclui o grande civilista luso –, a obrigação de indenizar deve ser fixada em termos de não privar o inimputável dos meios necessários aos seus alimentos ou ao cumprimento dos seus deveres legais de alimentos’ (Das obrigações em geral, 8ª ed., Almedina, p. 575)” (CAVALIERI, op. cit., p. 27-28)

[47] Isto se faz necessário, pois, caso contrário, o sistema estaria sendo muito mais rigoroso com o inimputável do que com o imputável.

[48] Ver nota de rodapé nº 20.

[49] Trata-se, in casu, de uma ficção jurídica de origem legislativa.

[50] “Durante séculos entendeu-se injusta toda sanção que prescindisse da vontade de agir. Assim, como não  há reprovação moral sem consciência da falta, e não há pecado sem a intenção de transgredir um mandamento, concluía-se que não podia haver responsabilidade sem um ato voluntário e culpável. O fundamento da responsabilidade era buscado no agente provocador do dano. Esse pensamento culminou na célebre expressão pás de responsabilité sans faute (não há responsabilidade sem culpa), que inspirou as concepções jurídicas dos ordenamentos da Europa de base romanista e da América Latina.

Esse enfoque, todavia, encontra hoje ultrapassado, em face das necessidades decorrentes de novos tempos, que estão a exigir resposta mais eficiente e condizente com o senso de justiça e com a segurança das pessoas. Em princípio, todo dano deve ser indenizado. A reparação dos danos tornou-se uma questão prioritária de justiça, paz, ordem e segurança, e, portanto, para o direito. O fundamento da responsabilidade civil deixou de ser buscado somente na culpa, podendo ser encontrado também no próprio fato da coisa e no exercício de atividades perigosas, que multiplicam o risco de danos.” (GONÇALVES, op. cit., p. 30)

[51] “Recorde-se que o princípio da reparação de danos encontra respaldo na defesa da personalidade, ‘repugnando à consciência humana o dano injusto e sendo necessária a proteção da individualidade para a própria coexistência pacífica da sociedade’, de modo que ‘a teoria da reparação de danos ou da responsabilidade civil encontra na natureza do homem a sua própria explicação’ (v. Carlos Alberto Bittar, Reparação civil por danos morais, cit., p. 13-28)” (ASSUNÇÃO et. al., op. cit., p. 823)

[52] Há mitigação dessa regra no parágrafo único do mesmo dispositivo. Ver nota de rodapé nº 25.

[53] Os incisos I e II do art. 932 tratam da responsabilidade dos pais, tutores e curadores pelos atos dos filhos, pupilos e curatelados menores (inimputáveis por ausência de maturidade) que estiverem sobre sua autoridade e em sua companhia; ou seja, é o anverso do art. 928.

[54] O art. 932 é praticamente a reprodução do art. 1.521 do Código Civil de 1916, verbis:

Art. 1.521.  São também responsáveis pela reparação civil:

I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob seu poder e em sua companhia;

II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições;

III - o patrão, amo ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou por ocasião dele (art. 1.522);

IV - os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos, onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos;

V - os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até à concorrente quantia.

[55] “É relevante mencionar que o artigo em análise estabelece que são também responsáveis as pessoas antes referidas, de modo que os agentes propriamente ditos, especialmente se tiverem patrimônio, responderão igualmente pelos danos causados por seus atos, como forma de responsabilidade solidária, nos termo do art. 942, parágrafo único.” (ASSUNÇÃO et. al., op. cit., p. 829) O mencionado dispositivo encontra-se assim versado:

Art. 942. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pelo reparação.

Parágrafo único. São solidariamente responsáveis os autores, os co-autores e as pessoas designadas no art. 932.

[56] LIMA, Alvino. A Responsabilidade Civil pelo Fato de Outrem. 2ª ed. rev. e atual. por Nelson Nery Jr. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 33-34.

[57] CAVALIERI, op. cit., p. 25.

[58]Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.

[59] “Histórico

·         O presente dispositivo foi objeto de emenda de redação na Câmara dos Deputados nos período final de tramitação do projeto, par ao fim de corrigir a falha anterior, já que referia somente os incisos I a III do artigo antecedente. O texto é bem diverso da disposição constante do art. 1.523 do Código Civil de 1916, pelo qual era necessária a prova da culpa em todas as hipóteses correspondentes àquelas elencadas no art. 932, excetuando-se apenas a hipótese constante do inciso V deste artigo.

Doutrina

·         Com este dispositivo foi adotada a responsabilidade objetiva, independente de culpa, em todas as hipóteses retratadas no art. 932, em razão de emenda de redação, por nós proposta e acolhida na Câmara dos Deputados, na fase final de tramitação do projeto. Não fazia sentido estabelecer que as pessoas referidas nos incisos I a III do artigo anterior deveriam responder, mesmo que sem culpa, e deixar de referi as demais pessoas, constantes dos incisos IV e V, ainda mais que as mencionadas no inciso V já recebiam tal tratamento no Código Civil de 1916.

·         Sob a égide do Código Civil de 1916, por força de interpretação jurisprudencial, em todas essas hipóteses de responsabilidade indireta a culpa atribuída ao imputado era presumida, inobstante no disposto no art. 1.523, que impunha o ônus da prova ao lesado, não só quanto ao ato praticado pelo terceiro como quanto à culpa in vigiliando ou in eligendo do imputado. Esse dispositivo excetuava somente a hipótese de participação gratuita em produto de crime da necessidade de prova, pelo lesado, da respectiva culpa.

·         A presunção da culpa por vezes era júris tantum, a admitir a prova em contrário, e por outras era absoluta, sem permitir contraprova. Assim, quanto ao pai, no que se refere aos atos praticados pelos filhos, há culpa in vigilando. O mesmo quanto a tutores e curadores, com vista aos tutelados e curatelados. E também quanto aos donos de hotéis e estabelecimentos de ensino. Quanto ao empregador, a culpa é in eligendo. No entanto, já que se tratava de presunção da culpa, a depender da hipótese, uma vez provado que não havia descuido quanto à vigilância ou eleição, deixava de ser atribuída responsabilidade às pessoas antes indicadas. No caso ocorrida tipicamente uma inversão do ônus da prova: em vez de o lesado ter de provar a culpa. Esta se presumia, cabendo ao réu da ação demonstrar que não havia agido culposamente. A possibilidade de comprovação da ausência de culpa pelo imputado, segundo nossa jurisprudência, existia nas hipóteses dos incisos I e II do art. 932 do novo Código; nos demais casos, a teoria aplicada aproximava-se muito mais do risco. Já quando se tratava de responsabilidade do empregador por atos de seus empregados, a interpretação jurisprudencial orientava-se no sentido de não aceitar a prova da ausência de culpa in eligendo do patrão (v. Súmula 341 do STF e Caio Mário da Silva Pereira, Responsabilidade civil, 9. ed., Rio de Janeiro, Forense, 1998, p. 122).

·         Com o novo Código Civil, os pais, com relação aos atos praticados pelos filhos, o tutor e o curador, referentemente aos atos praticados pelos tutelados e curatelados, o empregador, no que respeita aos atos praticados pelo empregado, os hotéis e similares, com referência aos hóspedes, e os estabelecimentos de ensino, quanto aos atos praticados pelos educandos, bem como aqueles que, mesmo gratuitamente, tenham participado de produtos de crime, passaram a responder objetivamente pelos danos causados, ou seja, independentemente de culpa in vigilando ou  in eligendo.” (ASSUNÇÃO et. al., op. cit., p. 830-832)

[60] Exclui-se a responsabilidade se as pessoas apontadas não tiverem condições financeiras (meios) de responder pelo dano, ou nos casos de exclusão da responsabilidade objetiva: inexistência de nexo de causalidade e culpa exclusiva da vítima.

[61] GONÇALVES, op. cit., p. 39.

[62] Art. 936. O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior.

[63]Art. 938. Aquele que habitar prédio, ou parte dele, responde pelo dano proveniente das coisas que dele caírem ou forem lançadas em lugar indevido.

[64] Conclusão do articulista.

[65] VENOSA, op. cit., p. 100-105.

[66] “Trata-se de típica responsabilidade indireta, com presunção da culpa do dono ou detentor do animal, presunção júris tantum por admitir prova em contrário, referente à culpa da vítima e à força maior. A força maior é excludente da responsabilidade, prevista no art. 393 deste Código, como o ‘fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir’, sem que seja realizada distinção do caso fortuito neste dispositivo; a principal característica dessa excludente da responsabilidade é a inevitabilidade do evento. Muito debatida foi essa espécie de responsabilidade civil, que em princípio deve caber àquele que causa o dano; mas, no caso, é exatamente a pessoa que concorrer para o dano, porque não cuidou, como devia, do animal que lhe pertence. Essa é a chamada culpa in custodiendo, modalidade da culpa in vigilando, que se presume, já que a pessoa descuida do animal que tem sob sua guarda, ou seja, não o vigia com o devido cuidado. Importa verificar a guarda ou poder de direção ou comando, de modo que são responsáveis pelo animal tanto seu dono como seu detentor.” (ASSUNÇÃO et. al., op. cit., p. 834)

[67] Art. 1.529. Aquele que habitar uma casa, ou parte dela, responde pelo dano proveniente das coisas que dela caírem ou forem lançadas em lugar indevido.

[68] VENOSA, op. cit., p. 98-100.

[69] “O presente dispositivo foi objeto de emenda por parte da Câmara dos Deputados no período inicial de tramitação do projeto. A redação original era a seguinte: ‘Ressalvados outros caso previstos em lei especial, os farmacêuticos e as empresas farmacêuticas respondem solidariamente pelos danos causados pelos produtos postos em circulação, ainda que os prejuízos resultem de erros e enganos de prepostos’. A justificativa da emenda apresentada pelo Deputado Emanoel Waisman no início da tramitação do projeto e anteriormente ao Código do Consumidor refere a necessidade de proteção ao consumidor, tendo como criada a responsabilidade objetiva das empresas, abrindo terreno fértil para a ‘...elaboração de um ‘código ou estatuto de responsabilidade do fabricante’ quanto aos produtos de sua fabricação’. No entanto, o dispositivo, conforme esta primeira emenda, estabelecia que, ‘Ressalvados outros casos previstos em lei especial, os empresários individuais e as empresas respondem pelos danos causados pelos produtos postos em circulação’, sem referir expressamente que essa responsabilidade civil deve existir independentemente de culpa, razão pela qual sofreu emenda de redação, na Câmara dos Deputados, na fase final de tramitação do projeto. Não há artigo correspondente no Código Civil de 1916.” (ASSUNÇÃO et. al., op. cit., p. 826)

[70] “Consoante a justificativa da primeira emenda realizada no artigo, acima mencionada, o dispositivo trata da responsabilidade objetiva das empresas pelos produtos nas relações de consumo, mas este dispositivo foi elaborado muito tempo antes da aprovação do Código de Defesa do Consumidor – Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990 –, razão pela qual o texto, para evitar dúvida na sua interpretação, devia ser alterado, como foi por nós proposto e acolhido em emenda de redação. Por fundamentar-se na responsabilidade sem culpa, baseada no risco da atividade, foi relevante a inserção da frase pela qual a responsabilidade da empresa existe independentemente de culpa. Como antes foi salientado, enquanto na responsabilidade subjetiva, ou baseada na culpa, examina-se o conteúdo da vontade presente na ação, se dolosa ou culposa, tal exame não é feito na responsabilidade objetiva, ou fundamentada no risco, na qual basta a existência do nexo causal entre a ação e o dano, porque, de antemão, aquela ação ou atividade, por si só, é considerada potencialmente perigosa.” (ASSUNÇÃO et. al., op. cit., p. 826-827)

[71] GONÇALVES, op. cit., p. 50.

[72] VENOSA, op. cit., p. 19.

[73] LISBOA, op. cit., p. 447.

[74] LISBOA, op. cit., p. 545.

[75] ASSUNÇÃO et. al., op. cit., p. 819.

[76] BURGARELLI, Aclibes, et al. Contribuições ao estudo do novo direito civil. Organizadores: Frederico A. Paschoal e José Fernando Simão. Campinas: Millennium Editora, 2003, p. 23-24.

[77] CAVALIERI, op. cit., p. 22-23.

[78] NERY JUNIOR, Nelson, NERY, Rosa Maria Andrade. Código Civil Anotado e Legislação Extravagante. 2ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 488.

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Sobre o autor
Filipo Bruno Silva Amorim

Procurador Federal, atualmente exercendo o cargo de Vice-Diretor da Escola da Advocacia-Geral da União. Bacharel em Direito pela UFRN. Especialista em Direito Constitucional pela UNISUL. Mestre em Direito pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AMORIM, Filipo Bruno Silva. O sistema da responsabilidade no Código Civil de 2002: prevalência da responsabilidade subjetiva ou objetiva? . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3397, 19 out. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22841. Acesso em: 26 abr. 2024.

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